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Há um argumento que vejo utilizado recorrentemente que me causa um certo espanto. Afirmam alguns que mandar a troika lixar-se seria condenar todo o país a uma desgraça, pretendendo passar a mensagem que só isso serviria para desqualificar qualquer tipo de manifestação, pelo que teremos de aceitar o que o governo tem feito. Desculpa-se a mediocridade e a incompetência deste governo, como se isto não pudesse ser de outra forma, mesmo sob uma intervenção externa.
Até quem organiza esta manifestação, tal como as anteriores onde o slogan foi utilizado, sabe perfeitamente que este é demagógico e que não podemos simplesmente mandar lixar a troika. Mas não deixa de saber interpretar e canalizar um descontentamento generalizado que o sistema político se esforça por ignorar.
Muitos dos que criticam o slogan aproveitam também para gozar com os manifestantes, a esmagadora maioria pessoas desempregadas e/ou que se vêem financeiramente asfixiadas por uma enorme carga fiscal. O mais das vezes fazem-no porque a maioria das pessoas nas manifestações são de esquerda, e quem as organiza é também de esquerda. Têm, os tais críticos, uma visão redutora, dicotómica, das coisas. Opõem-se aos manifestantes por discordâncias ideológicas, não percebem que existe um solo comum de revolta quando o descontentamento faz-se sentir de uma forma generalizada e não respeita fronteiras ideológicas e classes sociais e profissionais.
Ademais, para evitar um mal maior – a desgraça que aconteceria se mandássemos a troika embora – acabam a aceitar, e muitas vezes a defender, o mal menor, isto é, um governo que desde o início desrespeitou completamente a proporção entre o corte de despesas (2/3) e o aumento de receitas (1/3) preconizada no memorando de entendimento com a troika, que continua a alimentar uma gigantesca rede de interesses clientelares e a expropriar todos os portugueses do seu direito de propriedade sobre os frutos do seu trabalho para lá de um limite razoável e aceitável para que possa, por exemplo, financiar bancos falidos e instituições e empresas por onde circulam os amigalhaços.
Em resumo, perante aqueles que não deixam de tentar lutar contra quem, com requintes de sadismo e autismo, já para não falar na sofrível retórica amadora, nos vai condenando a um empobrecimento estrutural de proporções injustas, acabam a desculpar, a aceitar e, muitas vezes, a defender um governo incompetente que, como escreveu Alberto Gonçalves, tem "aura liberal, hábitos socialistas e processos napolitanos."
Estou a falar, como é óbvio, da direitalhada e de muitos liberais. São estes os principais responsáveis pela hegemonia da esquerda no debate público - não é tanto mérito desta como demérito daqueles. Não passamos disto, infelizmente.
Cada vez mais me convenço que existe uma contraparte à esquerdalhada e esquerdalhos. Só estou indeciso entre nomeá-los direitalhalhada e direitalhos ou direitolas. Entre carneirada e artolas, a acefalia e vistas curtas de que sofrem são idênticas às dos outros.