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Entreguei hoje (ontem) a minha dissertação de mestrado subordinada à temática "Do Conceito da Liberdade em Friedrich A. Hayek". Foi um investimento monetário, de tempo e intelectual que, no fim, me deixa insatisfeito por saber que poderia estar bem melhor em vários aspectos - desde logo porque se não fossem as limitações impostas pelos moldes pós-Bolonha, provavelmente as 81 páginas, 33564 palavras e 385 notas de rodapé seriam pelo menos o dobro, e se não fossem determinadas circunstâncias que me fizeram impor a mim mesmo um prazo tão apertado para a elaboração da dissertação, teria tido possibilidade de aprofundar algumas ideias que me parecem importantes mas que carecem de uma análise mais intensiva. Ficam as falhas para ser colmatadas num futuro trabalho. Só falta a prova pública de defesa da dissertação que, espero, acontecerá em breve. Por ora, depois desta esgotante corrida contra o tempo que foi a elaboração de uma dissertação de mestrado em 4 meses, de muitas horas de leitura, reflexão e escrita, com pilhas de livros ainda espalhadas pelo escritório e com a clara noção de que estou cerebral e fisicamente cansado, fica a música que neste dia feliz, me animou logo pela manhã. Depois da defesa pública, até Setembro só me vou mesmo preocupar com o usufruir do Verão.
Orlando Braga, que ontem já havia deixado um repto a um post meu, onde recorrendo aos estatutos do partido, acaba por incorrer numa omissão quanto aos pilares ideológicos do CDS - para além da democracia-cristã, o liberalismo e o conservadorismo - e entra em considerações sobre a suposta contradição em termos entre liberalismo e conservadorismo, que não subscrevo, já que são muitas mais as semelhanças e a herança filosófica comum do que as diferenças, e é preciso não esquecer que no famoso poscripto a The Constituion of Liberty, "Why I am not a conservative", Hayek tinha em mente essencialmente o conservadorismo que não tinha sido capaz de oferecer qualquer alternativa ao colectivismo, quando não mesmo se havia aliado a este no projecto de utilizar o estado para impôr uma determinada moral (e diga-se ainda de passagem que dois ensaios de John Gray são particularmente pertinentes a este respeito, "Hayek as a conservative" e "Oakeshott as a liberal", ambos incluídos em Gray's Anatomy; e também o ensaio de Roger Scruton "Hayek and conservatism", incluído no Cambridge Companion to Hayek, e o capítulo na obra de Chandran Kukathas Hayek and Modern Liberalism, intitulado "Hayek as a conservative"), deixa também hoje uma réplica ao meu post de ontem sobre Hayek, que me merece uma breve resposta.
Não entrando sequer pela contradição epistemológica entre a influência de Hume e de Kant, que Chandran Kukathas bem salienta em Hayek and Modern Liberalism, parece-me salutar assinalar que a consideração do Orlando carece da operacionalização do conceito de coerção que, obviamente, deve aqui ser entendido em termos hayekianos.
Hayek define coerção como sendo “um tal controlo do ambiente ou circunstâncias de uma pessoa por outra que, de forma a evitar um mal maior, aquela é forçada a agir não de acordo com um plano próprio e coerente mas para servir os fins da outra”1. A coerção impede que um indivíduo possa utilizar a sua inteligência ou conhecimento e prosseguir os seus planos ou crenças, eliminando a sua liberdade de pensamento e acção e tornando-o um instrumento nas mãos de outro ou outros indivíduos. Uma acção livre pressupõe que um indivíduo determine os seus fins de acordo com o seu próprio conhecimento, que não pode ser moldado pela vontade de outro. E uma acção não pode ser verdadeiramente livre se a sua escolha for imposta por outro indivíduo2.
Claro que a coerção não pode ser totalmente evitada, já que a única forma de a evitar é através da ameaça da coerção, no caso, por parte do estado, que detém o monopólio da coerção com vista à protecção das esferas privadas individuais em relação à eventual interferência por outros. Importa, contudo, limitar o poder do estado a este respeito apenas às circunstâncias onde é necessária uma delimitação das esferas privadas, criando as condições sob as quais um indivíduo pode determinar os seus fins e acções tendo em consideração as regras gerais prescritas pelo estado. Deve, portanto, ser uma coerção reduzida ao mínimo, restringida por regras gerais e abstractas, independente da vontade arbitrária de um indivíduo, que assim se torna um enquadramento para os indivíduos prosseguirem os seus próprios fins3.
A coerção implica uma intenção de levar um indivíduo a seguir uma determinada conduta, assim como a ameaça de um dano ou mal caso esta conduta não seja adoptada pelo coagido. Embora haja a possibilidade de escolha, as alternativas são determinadas por aquele que coage. O coagido deixa de ter a possibilidade de utilizar o seu conhecimento e prosseguir objectivos por si formulados, sendo as suas acções enquadradas pela mente de outro indivíduo4.
É importante distinguir entre coerção e a condição voluntária de fornecimento de bens ou serviços. Numa sociedade livre, todos os indivíduos dependem de outros para a satisfação das suas necessidades através do fornecimento voluntário destes bens ou serviços, podendo escolher em concreto a quem os pretendem adquirir ou requisitar. Contudo, só em circunstâncias excepcionais é que o controlo sobre um serviço ou recurso essencial pode conferir a alguém ou alguma instituição o poder de coerção. Desde que não se trate de um produto ou serviço crucial à existência humana ou à preservação do que um indivíduo mais valoriza, não se pode considerar como coerção as condições que sejam colocadas por quem o disponibiliza5.
E se várias situações podem, à primeira vista, parecer situações de coerção, não o são efectivamente se não forem preenchidas as duas condições referidas, a ameaça e a indução de um comportamento a um indivíduo com vista a servir os propósitos de outro. Hayek faz notar isto mesmo utilizando exemplos de diversas situações quotidianas e conclui que “Desde que um acto que me coloque em determinada situação não tenha como objectivo forçar-me a fazer ou não fazer coisas específicas, desde que a intenção do acto que me prejudica não seja a de servir os fins de outra pessoa, o seu efeito na minha liberdade não é diferente daquele de uma calamidade natural”6.
Dado que a coerção implica o controlo das acções de um indivíduo por outro, esta só pode ser prevenida através da garantia de uma esfera privada onde cada indivíduo está protegido da interferência de terceiros. Esta garantia só pode ser providenciada por uma instituição que tenha o poder necessário para tal, e é nesta situação é que a coerção a um indivíduo pode ser evitada através da ameaça de coerção por parte desta instituição7.
Para que o reconhecimento destas esferas individuais não se torne ele próprio uma ferramenta de coerção, o seu alcance e conteúdo devem ser determinados pelos próprios indivíduos, sendo variáveis em função da utilização dos seus conhecimentos e capacidades - e não fixados a priori como Stuart Mill, que o Orlando refere, tentou fazer. Ou seja, não deve o conteúdo das esferas individuais ser deliberado a priori e de forma definitiva por qualquer instituição – o que não passaria de uma forma de coerção. O que acontece é que existem regras gerais que “governam as condições sob as quais objectos ou circunstâncias se tornam parte da esfera protegida de uma pessoa ou pessoas. A aceitação de tais regras permite a cada membro da sociedade moldar o conteúdo da sua esfera protegida e permite a todos os membros reconhecer o que pertence à sua esfera e o que não pertence”8.
Hayek faz notar que a primeira e mais básica condição para a prevenção da coerção é o reconhecimento do conceito de propriedade privada9. A propriedade privada é um elemento fundamental para alcançar a liberdade individual, tal como Locke já havia teorizado, e como Gray assinala ao considerá-la como “um veículo institucional para um processo de decisão descentralizado”10 em estreita ligação com a capacidade de um indivíduo dispor de si próprio, das suas capacidades e talentos. E a este respeito já aqui elaborei por diversas vezes, sendo esta a mais relevante.
Talvez o maior incómodo para aqueles que se dizem nacionalistas, conservadores e que pretendem utilizar o aparelho estatal para impôr a sua própria moral a todos os outros seja o facto de Hayek repudiar o nacionalismo - esse filho da Revolução Francesa - , ser agnóstico e um pluralista no que diz respeito aos valores. Acontece que, precisamente neste sentido, e ao contrário do que o Orlando afirma noutro postal, Hayek enfatizou a importância da tradição como fonte de moralidade, inspirando-se em Burke, Hume e Smith, embora o seu agnosticismo religioso o levasse a não poder aceitar que Deus deseja ou comanda o estado. Como Linda Raeder faz notar "to his mind, such a conception too readily lends itself to the dangerous interpretation that some particular human will or wills should direct the course of social life. In other words, he feared that the attribution of the source of order to the Divine Will may lead to the anthropomorphic interpretation of that Will as the ‘will of society’ (which must, in reality, be the will of particular human beings) and inspire misguided efforts to control the spontaneous social process by conscious direction. Such, he believed, would be fatal not only to human liberty but to the survival of advanced civilization".
Mais, Hayek é, como Oakeshott, um conservador abstracto, por oposição ao conservadorismo substantivo advogado por Roger Scruton. E a este respeito, "On Being Conservative" providencia talvez a melhor definição do conservadorismo abstracto, que se dedica a limitar o poder do estado e a manter as regras gerais que permitem aos indivíduos prosseguir os seus fins sem entrar em colisão com outros, seguindo na tradição anglo-saxónica da tolerância e do governo limitado.
De resto, não entro sequer na discussão da definição da liberdade dos outros, cujos argumentos do Orlando recaiem numa tradição em que não me inscrevo, de liberdade como autonomia (inspirada em Hegel) e de libertação pela razão (inspirada em Rousseau, que Isaiah Berlin desmontou com uma mestria sem paralelo).
E, para finalizar, uma última nota em réplica ao último parágrafo do post do Orlando de inspiração platónica. Não por acaso, todos os grandes liberais clássicos foram tanto filósofos como economistas. Não por acaso, a metodologia hayekiana assenta na interdisciplinaridade, na qual a Ciência Política, ainda que sendo uma disciplina autónoma, se fundamenta. E também, não por acaso, no mundo anglo-saxónico existem cursos bastante reputados que dão pelo nome de Politics, Philosophy and Economics (PPE). Além do mais, julgo que Popper estava certo na formulação de sociedade aberta que aplica à ciência, pelo que é discutindo e revendo os nossos argumentos que todos aprendemos, ainda que nem todos possamos ser especialistas em tudo. E se é certo que cada qual tem a sua área de estudo primordial, certo é também que cada qual é livre de se debruçar sobre outras matérias. Porque senão, muito provavelmente corremos o risco de ser incoerentes e que nos partam os nossos telhados de vidro. O mesmo é dizer que assim como o Orlando é livre de advogar uma prática proteccionista completamente descabida e que só quem não conhece um mínimo do pensamento e da história económica pode advogar (ler o clássico e bastante simples Economics in One Lesson de Henry Hazlitt é talvez a forma mais rápida de o perceber, em especial os capítulos XI a XIV), também eu sou livre de me debruçar sobre matérias como a ética e a filosofia. E ninguém está livre de errar. É essa a beleza da ciência, como da vida: a imperfeição.
[1] F. A. Hayek The Constitution of Liberty, Londres, Routledge, 2010, p.19.
[2] Ibid., p.19.
[3] Ibid., pp. 19-20.
[4] Ibid., p. 118.
[5] Ibid., p. 119.
[6] Ibid., p. 121.
[7] Ibid., p. 122.
[8] Ibid., p. 122.
[9] Ibid., p. 123.
[10]John Gray, Liberalism, 2.ª ed.,Minneapolis, The Universityof Minnesota Press, 1995, p 62.
Dedico a todos os arautos da moralidade - socialistas, comunistas, jacobinos, nacionalistas, integralistas, beatos e afins - sempre prontos a prescrever as suas condutas morais como ideais e melhores, não hesitando em utilizar a coerção estatal para as impôr, e a condenar as dos outros que em nada os afectam, este naco de prosa directamente retirado da minha dissertação de mestrado sobre F. A. Hayek:
Apesar de o estado utilizar a coerção para determinadas actividades como a cobrança de impostos ou o serviço militar obrigatório, estas são previsíveis e gerais, aplicando-se a todos os indivíduos independentemente da forma como empregariam as suas energias em alternativa a estas imposições, e isto retira-lhes a carga valorativa negativa que normalmente reveste a coerção. Hayek considera que fora do campo da tributação, “é provavelmente desejável que devamos aceitar apenas a prevenção de coerção mais severa como justificação para a utilização da coerção pelo governo. Este critério talvez não possa ser aplicado a cada regra legal individual mas sim ao sistema legal como um todo. (…) Mas toda a concepção de interferência ou não-interferência pelo estado assenta na assumpção de uma esfera privada delimitada por regras gerais impostas pelo estado”[1].
A questão que Hayek coloca é se o estado deve ou não ir para além desta imposição de regras gerais, assinalando que “onde as práticas privadas não possam afectar outros que não os voluntários actores adultos, a mera oposição ao que seja feito por outros, ou até o conhecimento de que outros se prejudiquem a eles próprios através das suas acções, não providencia qualquer base legítima para a coerção”[2]. Em resumo, a moralidade de uma acção não é passível de ser objecto de controlo coercivo pelo estado, e a esmagadora maioria das regras de conduta que não afectam directamente a esfera privada de terceiros são de carácter voluntário - o que não significa que as regras de conduta estejam isentas da pressão da opinião pública. Como Hayek acaba por concluir, “É de facto provável que mais mal e miséria tenham sido causados por homens determinados a utilizar a coerção para acabar com um mal moral que por homens com a intenção de fazer o mal”[3].
Do artigo "The political economy of freedom", de Michael Oakeshott (Rationalism in Politics and other essays, Indianapolis, Liberty Fund, 1991, p. 401):
“Collectivism is indifferent to all elements of our freedom and the enemy of some. But the real antithesis of a free manner of living, as we know it, is syndicalism. Indeed, syndicalism is not only destructive of freedom; it is destructive, also, of any kind of orderly existence. It rejects both the concentration of overwhelming power in the government (by means of which a collectivist society if always being rescued from the chaos it encourages), and it rejects the wide dispersion of power which is the basis of freedom. Syndicalism is a contrivance by means of which society is disposed for a perpetual civil war in which the parties are the organized self-interest of functional minorities and a weak central government, and for which the community as a whole pays the bill in monopoly prices and disorder. The great concentrations of power in a syndicalist society are the sellers of labour organized in functional monopoly associations. All monopolies are prejudicial to freedom, but there is good reason for supposing that labour monopolies are more dangerous than any others, and that a society in the grip of such monopolies would enjoy less freedom than any other sort of society. In the first place, labour monopolies have shown themselves more capable than enterprise monopolies of attaining really great power, economic, political and even military. Their appetite for power is insatiable and, producing nothing, they encounter none of the productional diseconomies of undue size. Once grown large, they are exceedingly difficult to dissipate and impossible to control. Appearing to spring from the lawful exercise of the right of voluntary association (though as monopolistic associations they are really a denial of that right), they win legal immunities and they enjoy popular support however scandalous their activity. Enterprise monopolies, on the other hand (not less to be deplored by the libertarian), are less dangerous because they are less powerful. They are precariously held together, they are unpopular and they are highly sensitive to legal control. Taken separately, there is no question which of the two kinds of monopoly is the more subversive of freedom. But in addition to its great power, the labour monopoly is dangerous because it demands enterprise monopoly as its complement. There is a disastrous identity of interest between the two kinds of monopoly; each tends to foster and to strengthen the other, fighting together to maximize join extractions from the public while also fighting each other over the division of the spoils. Indeed, the conflict of capital and labour (the struggle over the division of earnings) is merely a sham fight (often costing the public more than the participants) concealing the substantial conflict between the producer (enterprise and labour, both organized monopolistically) and the consumer.”
(também publicado no blog da Causa Liberal)
Deixo à consideração dos preclaros leitores uma breve descrição do conceito de liberdade no entendimento inglês, da autoria de Michael Oakeshott ("The political economy of freedom", in Rationalism in Politics and other essays, Indianapolis, Liberty Fund, 1991, pp. 388-389). Em Portugal é mais ou menos o mesmo:
“Liberties, it is true, may be distinguished, and some may be more general or more settled and mature than others, but the freedom which the English libertarian knows and values lies in a coherence of mutually supporting liberties, each of which amplifies the whole and none of which stands alone. It springs neither from the separation of church and state, nor from the rule of law, nor from private property, nor from parliamentary government, nor from the writ of habeas corpus, nor from the independence of the judiciary, nor from any one of the thousand other devices and arrangements characteristic of our society, but from what each signifies and represents, namely, the absence from our society of overwhelming concentrations of power. This is the most general condition of our freedom, so general that all other conditions may be seen to be comprised within it. It appears, first, in a diffusion of authority between past, present and future. Our society is ruled by none of these exclusively. And we should consider a society governed wholly by its past, or its present, or its future to suffer under a despotism of a superstition in which forbids freedom. The politics of our society are a conversation in which past, present and future each has a voice; and though one or other of them may on occasion properly prevail, none permanently dominates, and on this account we are free. Further, with us power is dispersed among all the multitude of interests and organizations of interest which comprise our society. We do not fear or seek to suppress diversity of interest, but we consider our freedom to be imperfect so long as the dispersal of power among them is incomplete, and to be threatened if any one interest or combination of interests, even though it may be the interest of a majority, acquires extraordinary power. Similarly, the conduct of government in our society involves a sharing of power, not only between the recognized organs of government, but also between the Administration and the Opposition. In short, we consider ourselves to be free because no one in our society is allowed unlimited power – no leader, faction, party or ‘class’, no majority, no government, church, corporation, trade or professional association or trade union. The secret of its freedom is that it is composed of a multitude of organizations in the constitution of the best of which is reproduced that diffusion of power which is characteristic of the whole.”
(também publicado no blog da Causa Liberal)
Já aqui fiz referência ao artigo de Roger Scruton intitulado "Hayek and conservatism". Deixo agora a última secção deste, simplesmente demolidora quanto ao erro do igualitarismo:
«This same weakness infects Hayek’s response to socialism. As I remarked above, Hayek fails to account either for the passion among intellectuals for equality, or for the resulting success of socialists and their egalitarian successors in driving the liberal idea from the stage of politics. This passion for equality is not a new thing, and indeed pre-dates socialism by many centuries, finding its most influential expression in the writings of Rousseau. There is no consensus as to how equality might be achieved, what it would consist in if achieved, or why it is so desirable in the first place. But no argument against the cogency or viability of the idea has the faintest chance of being listened to or discussed by those who have fallen under its spell. Why is this? I shall conclude with a suggestion.
Hayek is right to distinguish the intellectual from the scholar, and to see the intellectual as striving for an influence that the true scholar may abhor. And in his introduction to Capitalism and the Historians he argues plausibly for the view that recent historians, like other intellectuals, have been animated by an anti-capitalist bias. This bias has caused them to misrepresent capitalism as a form of exploitation, and private profit as achieved always at the expense of the workforce that helped to produce it. Indeed, it seems to be characteristic of a certain kind of intellectual to perceive all economic activity as a zero-sum game. If someone gains, another loses. This zero-sum vision underpins Marx’s theory of surplus value, and crops up again and again in the socialist attacks on private enterprise, selective schools, inheritance, and just about anything else that creates a benefit that not everyone can enjoy. The idea that inequality (of reward, status, advantage, or whatever) might be in the interest of both parties, the better off and the worse off, is either not accepted, or seen as irrelevant to the charge against the capitalist order. It is to the credit of Rawls that he believes that inequality can be justified. Yet, according to the Difference Principle, the justification must show that inequality benefits the worse off. But why does inequality have to be justified? And why must the justification be framed in terms of the benefits brought to the underdog, and not in terms of those enjoyed by the dog on top of him? These questions suggest that the belief in equality is being built in to the arguments offered in support of it. Like a religious belief, it is being protected rather than questioned by the arguments adduced in its favor.
Hayek sees that the zero-sum vision is fired by an implacable negative energy. It is not the concrete vision of some real alternative that animates the socialist critic of the capitalist order. It is hostility toward the actual, and in particular toward those who enjoy advantages within it. Hence the belief in equality remains vague and undefined, except negatively. For it is essentially a weapon against the existing order – a way of undermining its claims to legitimacy, by discovering a victim for every form of success. The striving for equality is, in other words, based in ressentiment in Nietzsche’s sense, the state of mind that Max Scheler identified as the principal motive behind the socialist orthodoxy of his day. It is one of the major problems of modern politics, which no classical liberal could possibly solve, how to govern a society in which resentment has acquired the kind of privileged social, intellectual, and political position that we witness today.
If you accept the Nietzschean explanation of egalitarianism, then you will perhaps accept the burden of my conservative critique of Hayek, which is that he pays too much attention to the search for rational solutions to socially generated problems, and not enough to the motives that prompt people to believe or disbelieve in them. For all his brilliance in uncovering a thread of argument that (in my view) decisively establishes the intellectual superiority of liberal-conservative over socialist politics, Hayek does not engage with the real, deep-down conflict between conservatism and socialism, which is a conflict over the nature and conditions of social membership. In this conflict liberalism must learn to fight on the conservative side. For liberalism is possible only under a conservative government.»
(também publicado no blog da Causa Liberal)
Agora que esta rubrica alcança o trigésimo post, aproveito para deixar uma secção de um artigo de Roger Scruton inserido no Cambridge Companion to Hayek, intitulado "Hayek and Conservatism", precisamente acerca de uma temática sobre a qual muitos debates se debruçam, a da compatibilidade entre a tradição e o mercado (a secção do artigo intitula-se "Tradition, Morality and the Market") :
«For a contemporary conservative, the most profound aspect of Hayek’s extended epistemological argument is the alignment between the defense of the market and the defense of tradition. Indeed, as Edward Feser has argued, the defence of tradition, custom, and common sense morality could well constitute the most important aspect of Hayek’s social and political thought. Hayek’s theory of evolutionary rationality shows how traditions and customs (those surrounding sexual relations, for example) might be reasonable solutions to complex social problems, even when, and especially when, no clear rational grounds can be provided to the individual for obeying them. These customs have been selected by the ‘‘invisible hand’’ of social reproduction, and societies that reject them will soon enter the condition of ‘‘maladaptation,’’ which is the normal prelude to extinction.
Embora Hayek o tenha escrito num contexto em que os partidos conservadores europeus haviam capitulado ante o colectivismo do pós-guerra, em 1960, o poderoso post-scriptum a The Constitution of Liberty, intitulado "Why I Am Not a Conservative", continua a ser uma fonte de onde várias ilações podem ser retiradas, quer quanto ao caminho prosseguido pelos partidos conservadores, ao apropriarem-se do que comummente se designa por neo-liberalismo, quer quanto ao que conservadorismo e liberalismo devem compatibilizar para fazer frente ao socialismo. Não por acaso, uma e outra doutrina reclamam-se herdeiras dos mesmos autores (Hume, Burke, Tocqueville, Acton, Smith, p. ex.). A versão integral pode ser consultada aqui, deixando ficar à consideração dos preclaros leitores e leitoras esta passagem:
«Personally, I find that the most objectionable feature of the conservative attitude is its propensity to reject well-substantiated new knowledge because it dislikes some of the consequences which seem to follow from it - or, to put it bluntly, its obscurantism. I will not deny that scientists as much as others are given to fads and fashions and that we have much reason to be cautious in accepting the conclusions that they draw from their latest theories. But the reasons for our reluctance must themselves be rational and must be kept separate from our regret that the new theories upset our cherished beliefs. I can have little patience with those who oppose, for instance, the theory of evolution or what are called "mechanistic" explanations of the phenomena of life because of certain moral consequences which at first seem to follow from these theories, and still less with those who regard it as irrelevant or impious to ask certain questions at all. By refusing to face the facts, the conservative only weakens his own position. Frequently the conclusions which rationalist presumption draws from new scientific insights do not at all follow from them. But only by actively taking part in the elaboration of the consequences of new discoveries do we learn whether or not they fit into our world picture and, if so, how. Should our moral beliefs really prove to be dependent on factual assumptions shown to be incorrect, it would hardly be moral to defend them by refusing to acknowledge facts.»
(também publicado no blog da Causa Liberal)
Deixo uma breve passagem retirada do terceiro capítulo da obra O Caminho para a Servidão, mais concretamente da versão disponível no site Ordem Livre, de Hayek:
"A centralização absoluta da gestão da atividade econômica ainda atemoriza a maioria das pessoas, sobretudo pela idéia em si mesma, mas também devido à tremenda dificuldade que isso implica. Se, todavia, estamos nos aproximando rapidamente de tal situação, é porque muitos ainda acreditam que seja possível encontrar um meio-termo entre a concorrência "atomística" e o dirigismo central. Com efeito, à primeira vista nada parece mais plausível, ou tem maior probabilidade de atrair as simpatias dos homens sensatos, do que escolher como meta não a extrema descentralização da livre concorrência nem a centralização completa representada por um plano único, mas uma judiciosa combinação dos dois métodos. Não obstante, o simples senso comum não se revela um guia seguro neste campo. Embora a concorrência consiga suportar certo grau de controle governamental, ela não pode ser harmonizada em qualquer escala com o planejamento central sem que deixe de operar como guia eficaz da produção. Tampouco é o "planejamento" um remédio que, tomado em pequenas doses, possa produzir os efeitos esperados de sua plena aplicação. Quando incompletos, tanto a concorrência como o dirigismo central se tornam instrumentos fracos e ineficientes. Eles constituem princípios alternativos usados na solução do mesmo problema e, se combinados, nenhum dos dois funcionará efetivamente e o resultado será pior do que se tivéssemos aderido a qualquer dos dois sistemas. Ou, em outras palavras, planificação e concorrência só podem ser combinadas quando se planeja visando à concorrência, mas nunca contra ela."
A respeito do actual estado de coisas, onde em vez das gerações futuras e da independência do país, é o aqui e agora dos Comensais Interesses Vigentes que toma primazia na desgovernação, apetece dizer, parafraseando Hayek e a famosa expressão que tomou emprestada de Keynes, que "se nos concentrarmos em resultados imediatos, o que certamente estará morto no longo prazo é a liberdade" (Law, Legislation and Liberty).
Já por aqui deixei o que penso sobre as duas grandes tradições da democracia, nomeadamente, a tradição anglo-saxónica e a francesa. Hoje, aproveito para deixar uma breve passagem de um ensaio de John Gray, intitulado "George Soros and the Open Society", incluído na sua obra mais recente, Gray's Anatomy:
"During much of the last century it seemed that the capture of power by irrational systems of belief could occur only in dictatorial regimes. Nazi Germany and the Stalinist Soviet Union were closed societies whose ruling ideologies could not be exposed to critical scrutiny. Given the success of liberal democracy in defeating its rivals and spreading throughout much of the world it was easy to assume that it has a built-in rationality that gives it advantage over any kind of authoritarianism. Open societies were liberal democracies, almost by definition, and it seemed they would come into being wherever dictatorship had been overthrown.
Soros is clear that this was much too simple a view:
The collapse of a closed society does not automatically lead to an open society; it may lead to continuing collapse and disintegration that is followed by some kind of restoration or stabilization. Thus a simple dichotomy between open and closed society is inadequate ... Open society [is] threatened from both directions: too much liberty, anarchy, and failed states on the one hand; dogmatic ideologies and authoritarian or totalitarian regimes of all kinds on the other.
In fact, Popper's taxonomy may need a more fundamental revision than Soros has yet realized. When closed societies collapse but fail to make the transition to openness the reason need not be that thet languish in anarchy or suffer a return to dictatorship. It may be that they adopt an illiberal form of democracy. Along with the liberal democratic tradition that goes back to Locke and the English civil war there is a tradition, originating in the French Revolution and formulated theoretically by Rousseau, which understands democracy as the expression of popular will. The elective theocracy that is emerging in much of post-Saddam Iraq is a democractic polity in the latter sense, as is the current regime in Iran; so is the Hamas government in Palestine.
To be sure, these regimes often lack freedom of information and expression and legal limitations on government power, which are essential features of democracy in the liberal tradition. In these respects, they are closed societies; but they are not dictatorships. It is often forgotten that democracy, defined chiefly by elections and the exercise of power in the name of the majority, can be as repressive of individual freedom and minority rights as dictatorship - sometimes more so."
"Government always finds a need for whatever money it gets."
"Government does not solve problems; it subsidizes them."
"Government exists to protect us from each other. Where government has gone beyond its limits is in deciding to protect us from ourselves."
"Governments tend not to solve problems, only to rearrange them."
"Government's view of the economy could be summed up in a few short phrases: If it moves, tax it. If it keeps moving, regulate it. And if it stops moving, subsidize it."
"I am not worried about the deficit. It is big enough to take care of itself."
"No government ever voluntarily reduces itself in size. Government programs, once launched, never disappear. Actually, a government bureau is the nearest thing to eternal life we'll ever see on this earth!"
"Politics I supposed to be the second-oldest profession. I have come to realize that it bears a very close resemblance to the first."
"Politics is just like show business. You have a hell of an opening, coast for a while, and then have a hell of a close."
"The best minds are not in government. If any were, business would steal them away."
"There are no easy answers' but there are simple answers. We must have the courage to do what we know is morally right."
"We might come closer to balancing the Budget if all of us lived closer to the Commandments and the Golden Rule."
"We should measure welfare's success by how many people leave welfare, not by how many are added."
"Concentrated power has always been the enemy of liberty."
"Freedom prospers when religion is vibrant and the rule of law under God is acknowledged."
"How do you tell a communist? Well, it's someone who reads Marx and Lenin. And how do you tell an anti-Communist? It's someone who understands Marx and Lenin."
E para terminar, um apelo:
Com a devida vénia a Brain Quote
Há uns anos aprendi que saber rir de nós próprios, das nossas ideias, valores, crenças ou dogmas representa uma sublime forma de sentido de humor. Aquela que o anti-dogmatismo deixa antever. Recuperando o que introduzi aqui, absolutus significa à solta, ou seja, um Princípe à solta é, na realidade, um poder arbitrário. A justificação dos teólogos medievais para o poder absoluto dos Reis é a Divindade. Ou seja, todos os actos do Rei são justificados porque teoricamente o seu poder advém e está limitado por Deus - daí à solta em relação à realidade terrena. Isto só foi passível de durar séculos porque era aceite como um dogma. Ora eu, prefiro ser um dogmático anti-dogmático, até porque o dogma está sempre associado à intolerância e se há coisa de que um liberal se orgulha é de praticar a virtude da tolerância - bem mais premente no protestantismo, como todos sabemos.
Contudo, não deixo de notar alguma falta de sentido de humor em quem não é capaz de rir do vídeo de George Carlin que aqui deixei. É básico, de facto, e como o Zé de Portugal notou na caixa de comentários, mistura maldosamente Deus, religião e superstição. E talvez o meu post também seja básico. Assim sendo, aqui fica mais alguma filosofia básica. O que se segue faz parte de um ensaio de que já aqui dei conta, há uns meses. Não deixa de ser curioso que, na altura, o Manuel parecesse perceber claramente as diversas concepções de democracia, até aplaudindo o texto que escrevi, onde desconstruí a democracia inspirada em Rousseau. Claro que agora mudou radicalmente de opinião e encontrou na simplificação que faz da democracia - de que é apenas a vontade da maioria - o seu bode expiatório e alvo a abater para justificar o que agora defende. Isto não me parece lá muito Cristão. Na verdade, parece-me de uma verdadeira má-fé e desonestidade intelectual.
Deixo este texto em aberto, terminando com uma referência à Modernidade, pois o próximo texto desta série versará precisamente sobre a Modernidade e a sua relação com Deus.
(John Locke)
As chamadas Revoluções Atlânticas – Inglesa (1688), Americana (1776) e Francesa (1789) – encontram-se na origem daquilo que hoje denominamos por democracia liberal. Na verdade, a democracia liberal e os diversos entendimentos quanto a esta, podem dividir-se em duas grandes correntes, tendo como diferença essencial a forma como encaram o conceito de liberdade, que se encontra no âmago do liberalismo e em torno do qual existem complexas teorizações. Esta distinção permite-nos considerar que, na realidade, não há apenas um liberalismo, mas vários, embora o liberalismo constitua uma única tradição política1.
De um lado, os teóricos que inspiraram os revolucionários britânicos e norte-americanos, em especial John Locke e Montesquieu, respectivamente, convergem quanto ao cepticismo em relação ao exercício do poder, apesar de encararem o governo como um mal necessário, pelo que se preocupam essencialmente em arquitectar checks and balances que actuem como forma de difusão do poder, salvaguardando a liberdade individual da coerção por parte de terceiros, em especial do próprio Estado. Por outro lado, os revolucionários franceses, especialmente os jacobinos, inspirando-se em Jean-Jacques Rousseau e nas noções de bem comum e vontade geral, preferiram subscrever a ideia de soberania popular, em claro contraste com a ideia de governo limitado que é a base da tradição anglo-americana.
Embora se atribua normalmente a origem da democracia ocidental, de cariz liberal, apenas à Revolução Francesa, esta ideia é pouco exacta, como explica João Carlos Espada: “Em primeiro lugar, porque antes da Revolução Francesa ocorrera a Revolução Americana de 1776 e a Revolução Inglesa de 1688. Em segundo lugar, porque as democracias mais antigas e duradouras inspiraram-se na experiência americana e inglesa, não na francesa. Em terceiro lugar, porque o modelo francês inspirou sobretudo experiências radicais não propriamente democráticas: o republicanismo radical da América Latina e da I República portuguesa (1910-1926), bem como a revolução soviética de 1917”2.
Além do mais, embora as três visassem romper com o absolutismo monárquico e o que comummente se designa por Ancien Régime, os seus objectivos e o tipo de regime que propunham não era o mesmo. De acordo com Espada, “Nos casos inglês e americano, tratava-se de restaurar um governo limitado, fundado no consentimento dos eleitores. No caso francês, tratava-se de substituir o antigo absolutismo monárquico por um novo absolutismo, popular e republicano”3.
A estas duas concepções corresponde o que se pode denominar por liberalismo velho e liberalismo novo, ou liberalismo clássico e liberalismo contemporâneo, respectivamente4.
O liberalismo clássico assenta nos ensinamentos de John Locke, Montesquieu, David Hume, Adam Smith, Alexis de Tocqueville e, no século XX, em teóricos como Hayek, Popper ou Berlin. Foi com John Locke, o teórico da Revolução Gloriosa, que, pela primeira vez, os elementos centrais do liberalismo foram teorizados e articulados de forma coerente. Ao nível da prática, segundo John Gray, o liberalismo inglês compreendia um forte parlamentarismo sob a rule of law, i.e., o que normalmente designamos por Estado de direito, contra o absolutismo monárquico, em conjunto com uma enfática defesa da liberdade de associação e do conceito de propriedade privada, o que dá corpo ao conceito de sociedade civil, “the society of free men, equal under the rule of law, bound together by no common purpose but sharing a respect for each other’s rights”5. Locke acreditava que esta era alcançável por todos os homens, sendo as Revoluções Atlânticas formas de a alcançar e exemplos do combate ao absolutismo e à arbitrariedade6.
Considerando Locke que o primeiro direito de propriedade é o direito de propriedade pessoal, ou seja, a capacidade de podermos dispor de nós próprios, das nossas capacidades e talentos – embora, para Locke, essa liberdade devesse enquadrar-se na doutrina dos direitos naturais, enquanto criaturas de Deus –, há então uma relação inegável entre o direito de propriedade pessoal e a liberdade individual. A característica central e a mais importante contribuição de Locke para o liberalismo inglês é, sem dúvida, a percepção clara de que a independência pessoal e a liberdade individual pressupõem a propriedade privada, protegida pelo Estado de direito7.
Sendo um autor contratualista, à semelhança de Hobbes e de Rousseau, Locke teoriza a passagem do estado de natureza ao estado de sociedade com base num pacto social, a que os homens aderem renunciando ao “seu poder de executar a lei natural”, visto que a “cláusula fundamental do pacto social está na renúncia ao direito de reprimir as infracções à lei natural”, tendo ainda o pacto como característica essencial o reconhecimento de um “poder de coacção, independente e superior, encarregado de reprimir as violações da lei”, assim evitando que cada qual faça justiça pelas próprias mãos, como é apanágio do estado de natureza8.
Ou seja, para remediar o estado de natureza, é necessário um acordo, pacto ou contrato que crie primeiramente uma sociedade independente e, posteriormente, uma associação civil ou governo. Importa realçar a ordem em que se dá a formação destes dois elementos, pois só assim se torna claro que o poder é conferido aos governantes a partir dos indivíduos, com o propósito de prosseguir os interesses dos governados – no fundo, Locke introduz o que viria a ser teorizado como conceito de representatividade política9.
Para Locke, a actividade política é um instrumento que visa criar um enquadramento e condições de liberdade para que os fins privados de cada indivíduo possam ser alcançados na sociedade civil. O governo é um mal que os indivíduos têm de suportar para assegurar que isto seja possível, e o pacto que leva à sua criação torna os indivíduos em cidadãos e confere-lhes liberdade e responsabilidade, direitos e deveres, poderes e constrangimentos. Sendo os indivíduos, em última análise, os melhores juízes dos seus próprios interesses, as áreas de actuação do governo têm que ser restritas e o exercício do poder constrangido, para permitir o maior grau de liberdade possível a cada cidadão10. Esta é também uma característica central na distinção entre os dois liberalismos.
Para além de articular as concepções de liberdade, sociedade civil, justiça e Estado de direito, Locke dá às instituições liberais as suas bases técnicas, esboçando os modernos regimes contemporâneos, ou seja, a monarquia constitucional, o parlamentarismo e o presidencialismo11. Feroz inimigo de qualquer dominação absoluta, introduz o princípio da separação de poderes, ou melhor, teoriza com maior rigor aquilo que já Aristóteles havia distinguido – a deliberação, o mando e a justiça. Para Locke, há três domínios de acção: “o da lei, a disposição geral; o da aplicação da lei pela administração e pela justiça; e (..) o das relações internacionais, o poder «federativo»”12.
Além do mais, é necessário que não sejam os mesmos indivíduos a elaborar e executar as leis. Ao parlamento caberá o poder legislativo e a outras instituições o poder executivo. Finalmente, a separação em três poderes reverte, na prática, a dois, já que o federativo se junta ao executivo, no que concerne à condução das relações externas13.
Convém, no entanto, notar que apesar de Locke ser considerado um precursor da democracia liberal, esboçando muitos dos aspectos que se viriam a tornar centrais nesta, como sejam os direitos individuais, a soberania popular, a regra da maioria, a separação de poderes, a monarquia constitucional e a representatividade por via de um sistema de governo parlamentarista, estas ideias se encontram no seu pensamento de forma ainda algo rudimentar14.
(Montesquieu)
Vai ser Montesquieu quem desenvolve algumas das inovadoras ideias introduzidas por Locke. Charles-Louis de Secondat, baron de La Brède et de Montesquieu, considera-se discípulo de Locke e do constitucionalismo britânico, mas também sucessor do tradicionalismo aristocrático. Para Prélot e Lescuyer, sendo um agregador destas duas confluências, Montesquieu é “talvez o mais temível adversário do absolutismo, porque é o mais realista. A melhor maneira de enfraquecer o poder, no interesse da liberdade individual, não é transferi-lo (como depois proporá Rousseau), mas partilhá-lo”15.
Esta partilha de poder dá-se por duas vias, ou num sentido vertical ou num sentido horizontal. Na primeira acepção, criam-se corpos intermédios entre governantes e governados, ao passo que, na última, separa-se o poder em três diferentes poderes, o legislativo, o executivo e o judicial – este último introduzido por Montesquieu –, que criam um sistema de checks and balances, ou seja, servem de peso e contrapeso entre si, complementando-se mas vigiando-se e fiscalizando-se mutuamente16.
Embora a sua interpretação da constituição Inglesa, que considerava como um espelho da liberdade, tenha sido alvo de muito criticismo, não impediu que a sua obra-prima, O Espírito das Leis, alcançasse rapidamente um sucesso retumbante, tendo tido uma grande influência no pensamento dos Founding Fathers dos EUA.
Montesquieu preocupou-se essencialmente em responder à questão sobre como garantir um governo representativo que assegure a liberdade e minimize a corrupção e os monopólios advindos de privilégios inaceitáveis. A sua resposta vai no sentido de um Estado constitucional, que mantenha a lei e a ordem, como forma de assegurar os direitos dos indivíduos17, recaindo a sua preferência, naturalmente, sobre o sistema da monarquia constitucional britânica. Relacionando o governo monárquico com um sistema de checks and balances, segundo David Held, acabou por rearticular as preocupações republicanas e liberais sobre o problema de unir os interesses privados e o bem público, arquitectando institucionalmente a forma como estes interesses se devem relacionar sem sacrificar a liberdade da comunidade18.
Para Montesquieu, o Estado deve organizar-se de forma representativa, ou seja, deve formar-se um regime misto onde monarquia, aristocracia e povo se encontrem representados. E, partindo da sua famosa citação de que “every man invested with power is apt to abuse it, and to carry his authority as far as it will go”19, reforçou o princípio da separação de poderes, argumentando que a liberdade só pode ser assegurada através de uma cuidadosa e equilibrada separação institucional de poderes dentro do Estado. Esta institucionalização visa, por um lado, impedir a centralização de poder, e, por outro, despersonalizar o exercício do poder político20.
A grande contribuição de Montesquieu para a teoria e prática da democracia advém precisamente de uma concepção bastante realista da natureza humana e da forma como esta influencia a política. Alicerça-se na ideia de que os indivíduos são ambiciosos e colocam os seus interesses privados em primeiro lugar nas suas respectivas escalas de valores, pelo que só as instituições criadas cuidadosamente podem converter esta ambição em efectivas boas práticas de governação. Institucionalizando a separação de poderes e criando formas para que os diferentes grupos se manifestem e confrontem – precedendo o que Raymond Aron teorizaria como institucionalização do conflito – Montesquieu originou um arranjo político que viria a ser extremamente valorizado pela Modernidade: a divisão entre as esferas pública e privada da vida em sociedade21.
1 - Cfr. John Gray, Liberalism, 2.ª Edição, Minneapolis, The University of Minnesota Press, 1995, p. xiii.
2 - Cfr. João Carlos Espada, “Dois conceitos de democracia” in i online, 30 de Maio de 2009. Disponível em http://www.ionline.pt/conteudo/6601-madison-e-rousseau-dois-conceitos-democracia. Consultado em 22/11/2009.
3 - Cfr. Idem, ibidem.
4 - Cfr. João Carlos Espada, “A tradição da liberdade e a sua memória: razão da sua importância” in João Carlos Espada, Marc F. Plattner e Adam Wolfson, eds., Liberalismo: o Antigo e o Novo, Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 2001, p. 17.
5 - Cfr. John Gray, ob. cit., p. 13.
6 - Cfr. Idem, ibidem, p. 15.
7 - Cfr. Idem, ibidem, p. 14.
8 - Cfr. Marcel Prélot e Georges Lescuyer, História das Ideias Políticas, Vol. 2, Lisboa, Editorial Presença, 2000, p. 39.
9 - Cfr. David Held, Models of Democracy, Cambridge, Polity Press, 2008, p. 63.
10 - Cfr. Idem, ibidem, p. 64-65.
11 - Cfr. Marcel Prélot e Georges Lescuyer, ob. cit., p. 42.
12 - Cfr. Idem, ibidem, p. 43.
13 - Cfr. Idem, ibidem, p. 43.
14 - Cfr. David Held, ob. cit., p. 65.
15 - Cfr. Marcel Prélot e Georges Lescuyer, ob. cit., p. 44.
16 - Cfr. Idem, ibidem, p. 44.
17 - Cfr. David Held, ob. cit., p. 65-66.
18 - Cfr. Idem, ibidem, p. 67.
19 - Cfr. Montesquieu, The Spirit of Laws, Chicago, William Benton, 1952, p. 69 apud David Held, ob cit., p. 67.
20 - Cfr. David Held, ob. cit., p. 68.
21 - Cfr. Idem, ibidem, p. 69.
Fundamentar a monarquia através da doutrina do poder divino dos Reis é, no mínimo, anacrónico. Tal como recorrer à fundamentação de Bossuet. É que, absoluto é precisamente a mesma coisa que arbitrário. Desconstruindo, absoluto, do latim absolutus, significa à solta (*). Dizer que o Rei ou o Princípe está enquadrado pela Divindade é de uma arrogância suprema (que Saramago, em Caim, demonstra), e é abrir a porta à escravidão - para evitar o que o Manuel considera como democracia, a vontade das massas. A democracia rousseauniana, sim. Mas há uma Teoria e Prática da Democracia muito mais complexa que isso. Dahl, Sartori, Bobbio e Schumpeter são referências clássicas.
Aliás, o Manuel ao reduzir a democracia à tirania da maioria de que falava Tocqueville, cai no mesmo reducionismo dos republicanos portugueses para quem a chefia de Estado republicana é que é verdadeiramente democrática, porque assente no voto. A democracia é muito mais que votar. E por isso mesmo é que historicamente democracia e liberalismo se alinharam. Não sei se isto é um erro ou se é uma concepção que o Manuel tenta fazer passar deliberadamente. Seja como for, quem tem capacidade para mudar de opinião radicalmente - contra o que não tenho nada contra, muito pelo contrário - também presumo que tenha capacidade para aprofundar aquilo que diz, para não cair neste tipo de erros. Eu, como Conservador, continuo a preferir a máxima popperiana de que o que interessa em democracia é saber limitar o poder de quem manda, assumindo ainda a ideia de Churchill de que a democracia é o pior regime, exceptuando todos os outros.
A tentativa de procurar o Bem em Deus é a tentativa de sacralizar e tornar intocáveis valores que são terrenos e não divinos, para deixarmos de nos responsabilizar pelas nossas acções, ao externalizar para o transcendente as referências. Quando levamos isto para o campo das lideranças políticas, torna-se perigoso, dado que fundamenta fenómenos como os assentes no carisma dos líderes ligado ao transcendente, de que falava Max Weber. Fundamentar o Governo nisto é não só anacrónico, como o comunismo, como deixa antever todo um novo leque de idotices. Basta lembrar uma, a de George W. Bush que dizia falar com Deus e que as suas acções eram ordens deste.
Dito isto, e porque por ora não tenho tempo para escrever muito mais, deixo os caríssimos e caríssimas leitores e leitoras com um magnífico sketch de George Carlin. Bom fim-de-semana.
Tradição e Tradições – Conservar ou Fundamentar?
por Jorge Azevedo Correia (in Alameda Digital, n.º 10, Novembro/Dezembro de 2007)
O facto de estar em mudanças, sem acesso fixo à net, e também o facto de se avizinharem dois exames nos próximos dias, farão com que esta semana não ande muito por aqui. Contudo, para concluir, por agora, a animada discussão que vai neste blog, devo dizer que também acho que merecia uma boa resposta. Contudo, não a obtive. E não a obtive porque D. Rezende, como uma habitué deste nosso espaço lhe chama, não teve a humildade suficiente para procurar argumentar convenientemente.
Os erros, para o serem objectivamente, necessitam de ser demonstrados por via de critérios e da retórica. E é necessário que todos os conceitos sejam operacionalizados, para todos sabermos do que estamos a falar - até porque muitas vezes os mesmos conceitos significam coisas diferentes para as diversas pessoas. Os erros não são auto-evidentes ou auto-explicativos. Aceito que me tentem explicar os erros em que caio. Não aceito é que se recusem a ver os erros em que caem ripostando novamente sem uma argumentação convincente, dizendo que "o que me têm tentado explicar...", sem no entanto se esforçarem por o explicar rigorosamente. Dou apenas 2 exemplos deste post do Manuel:
No meu texto indiquei até ao Samuel que a falta de critérios (democracia) causa a extorsão, i.e., o socialismo.
Não se percebe se o que o Manuel quer dizer é que a democracia tem como característica a falta de critérios. Convém, pelo menos, tentar fundamentar o que se diz, porque esta frase está ferida de morte de uma demagogia atroz e teria forçosamente de ser aprofundada. Que critérios, quanto ao quê, em que tipo de democracia, em que país, por exemplo. Sei que isto da blogosfera não é para andar a escrever teses académicas e também sei que é "mais fácil falar com Camilo do que escrever com a precisão que certos temas nos exigem". No entanto, eu, por outro lado, continuo a preferir tentar almejar uma certa precisão...
O problema é que estando o liberalismo ligado ao Rei Demos por um pacto de lealdade e laxismo, podemos esquecer totalmente o pacto de Neutralidade entre o Estado e a Sociedade que alguns ainda pensam ser possível.
E esta, também gostava de a ver fundamentada. É porque as interpretações possíveis são tantas que a falta de argumentação torna impossível a discussão.
Quanto ao Bem Comum, sabendo que obviamente Rousseau não é o autor original desta expressão, aquilo que eu gostava mesmo era que o Manuel concretizasse o seu critério de Bem Comum, a que tanto tem aludido. Tenho quase a certeza que posso refutar esse critério, desde logo com os autores que fundamentam o meu erro, Berlin, Hayek, Popper, Schumpeter. É que, eu também tenho um critério de Bem Comum. Todos temos. Ou pelo menos muitos de nós. E passível de ser refutado. O meu é seguir Popper na ideia de que em democracia não interessa saber quem manda, mas sim como se limita o poder de quem manda. Se isto é minimalista e um erro, ainda bem. Os britânicos e os norte-americanos que o digam. Nos respectivos países ainda se vai valorizando mais a liberdade individual do que nas sociedades mediterrâneas e latinas onde o jacobinismo/catolicismo do Bem Comum é tão propalado...
Só para finalizar, importa realçar que estou em acordo com o Pedro Félix, quanto ao que aqui escreveu sobre Rousseau. No entanto, quanto à responsabilidade e autoridade, talvez depois de passada esta semana tenha tempo para tentar esboçar algumas considerações. Até lá, vou-me dedicar à Filosofia e à Ética. A começar pela Encíclica Caritas in Veritae, do Papa Bento XVI.
Continuando a discussão que os últimos posts desta série têm gerado, procurarei, neste post, responder a alguns dos pontos que o Manuel levanta. Começo por salientar uma expressão de Isaiah Berlin que me parece particularmente feliz. Aludindo e tomando partido pela liberdade negativa, certo da imperfeição do conhecimento humano, aplica-se, na generalidade, às discussões teóricas sobre os tópicos que por aqui costumamos tratar: "Uma certa humildade nestas matérias é muito necessária"1. Acrescento que um certo conhecimento e uma certa clareza discursiva, que permita discutir os conceitos e chegar a conclusões, colocando as teorizações em diálogo, é um atributo inestimável. Só assim podemos chegar ao conhecimento cientificamente válido, pelo menos na acepção popperiana, saindo do campo da opinião ou senso comum, a doxa, para chegar à episteme.
A humildade, julgo eu, é também um princípio fundamental no cristinianismo. Por isso, se para um Cristão a propriedade pode não chegar, a humildade, por outro lado, tem de ser uma virtude praticada quotidianamente. O meu post anterior é uma simples interpretação de vários preceitos fundacionais do liberalismo clássico. Tendo sido a resposta a um post do Pedro, este optou por mostrar precisamente a humildade cristã, também exemplificada por Berlin. Também eu uso da mesma no que concerne a contextos académicos, já que a única certeza absoluta que tenho é que só sei que nada sei, na expressão de Sócrates, o filósofo. O que escrevi é uma interpretação, uma narrativa, que, obviamente pode e deve ser contestada e contrariada. Com propriedade. E quando não temos essa propriedade, é precisamente à humildade que devemos recorrer, como fez o Pedro:
Caro Samuel
Tenho de assumir de facto que é realmente difícil para mim a curto prazo desenvolver alguma resposta a um post tão bem elaborado e documentado como este. Por um lado, faltam-me conhecimentos, por outro, a velha e banal mas não menos verdadeira falta de tempo. No entanto, à medida que me for possível, e consoante o a-propósito dos diversos itens que aqui expões, tentarei nos próximos tempos retomar alguns aspectos que me parecem interessantes e outros que eventualmente mereçam esclarecimento. Como exemplo, a concepção rousseauniana de Estado, que inadvertidamente dei a entender (e com a qual pouco me identifico), e a relação Igreja-Estado e a orientação ética que a religião pode ter na elaboração de uma Constituição e subsequentemente no mercado e na economia.Vejo com muito interesse o ciclo de posts e consequente discussão que intitulaste "Em nome da liberdade", mas como a "discussão exige conhecimento", como se diz por aí, a minha participação será mais humilde, pois exigir-me-á tempo e estudo. No entanto, não obstante as limitações referidas, nunca abdicarei de pensar pela minha cabeça e assumir as diferenças e desacordo quanto a alguns aspectos. Nada que assuste, portanto.
Agradecendo os encómios que me parecem algo exagerados, devo dizer que estou em completo acordo quanto ao resto. Também eu muitas vezes preferi remeter-me ao estudo para poder adquirir conhecimento para fundamentar as minhas interpretações e opiniões. Não deixo, no entanto, de muitas vezes assumir diferenças e desacordo em vários aspectos. Contudo, não só uma certa humildade na forma como se abordam estas matérias deve ser apanágio como também um certo rigor.
O Manuel, em comentário a este meu post, referiu que o Bem Comum, na boca de alguns, é um conceito perigoso. Daqui depreende-se que o Manuel assume o conceito e considera que na boca de outros pode ser um conceito proveitoso, como na de ele próprio, julgo eu. Eu, como liberal céptico do exercício do poder, estou com Berlin, Hayek, Popper e Schumpeter - não existe qualquer Bem Comum, e relembro a magistral desconstrução que este último faz, para mostrar que a abstracção do Bem Comum é uma falácia e um princípio escravizante, de que já aqui há tempos dei conta.
E aquilo que me parece, muito sinceramente, é que na sua apressada - talvez daí as extrapolações sem nexo - e muito pouco humilde resposta ao meu post, até divertidamente jocosa, que como aspirantes a gentlemen que somos se reveste de uma deliciosa ironia, o Manuel caiu em alguns erros e falácias, mesmo que inadvertidamente. Assinalo, também, uma certa confusão e exacerbada mistura de conceitos que acabam por obscurecer e ferir a construção teórica. Para alguém que, neste blog, tem bastantes textos escritos que vão precisamente no sentido de tudo o que escrevi, não deixa de ser curioso que caia precisamente na mesma falácia da concepção rousseauniana do Estado, ao prescrever que este deve estar sujeito a uma determinada concepção de Bem. Remeto-me a deixar aqui parte de uma resposta de um animado debate que há uns meses tive com o Corcunda e o Afonso Miguel:
Quanto à "própria ideia de que a comunidade política não se deve submeter a uma concepção de Bem (que o Samuel parece aceitar como axioma, vindo sabe-se lá de onde)", é muito fácil. É que o Corcunda ou o Afonso Miguel, como os integralistas e certos direitistas, pugnam por uma completa submissão da política à religião católica e à concepção de Bem Comum que dessa advém. Isto é tão rousseauniano quanto utilitarista (Helvétius, Bentham), e está tão presente nas ideologias nazi como comunista. Schumpeter ou Berlin demonstraram magistralmente que não há qualquer Bem Comum ou Vontade Geral. Eu não sou colectivista ou totalitarista e, como tal, não posso tolerar um sistema que por englobar toda a sociedade nas suas concepções se torna intolerante. Quem é que tem mais legitimidade para definir qual a concepção de Bem que me satisfaz? Eu ou os outros? Lamento, para mim continuará a ser a minha pessoa. Portanto se esta "é uma ideia política luterana e que seria impossível em qualquer contexto religioso não-protestante", ainda bem que vivemos numa democracia liberal e que mesmo pensando assim tenho a liberdade de continuar a ser um católico, pouco praticante, confesso, mas que encara a Igreja como um actor social como qualquer outro - e se me quiserem chamar de herege, estejam à vontade, mas parece-me que a Igreja Católica é, hoje em dia, mais tolerante do que muitos daqueles que mais dizem defendê-la e que por se tornarem dogmáticos e intolerantes à crítica, acabam por prejudicar a imagem desta.
Continuando, não afirmei que o único dever da Autoridade é assegurar que ninguém nos prejudique a forma de obter, vender, dividir e partilhar propriedade, mas sim que é um dos principais - é aliás, o princípio que subjaz à Constituição dos EUA: a liberdade negativa, ou seja, a ausência de coerção por terceiros, em especial do Estado e do Governo. Também não diminuí a percepção do homem do Bem e do Mal à mera propriedade. Elaborei um ensaio, que me serviu para o post, sobre a relação entre liberdade económica e liberdade política, e não teci quaisquer concepções morais sobre o Bem ou o Mal. Impacienta-me que retirem ilações do que escrevo que não são as minhas intenções.
Impacienta-me, também, que alguém que se diz liberal afirme que Temos governo porque precisamos que se pratique o Bem e não o Mal. Bom, se as minhas abordagens fazem o Manuel afastar-se do liberalismo, talvez o mesmo deva ponderar rever algumas posições teóricas e ideológicas - que, mais uma vez, digo, me parecem algo estranhas dados muitos dos posts que vão no sentido contrário, ou seja, mais próximos do meu pensamento-, já que esta é precisamente a concepção de Rousseau. Não deixa de ser liberalismo. Um dos liberalismos. O continental, jacobino. O mesmo que permite achar que o homem se vê com uma moral social ambulante, incerta, e que cabe, portanto, ao Estado, impor uma moral social certa. Estranho. Mesmo para alguém que ainda há tempos admirava Rand, e agora parece desdenhá-la, pois saberá que a maioria dos indivíduos não se rege por quadros éticos coerentes. É dever de cada um dos indivíduos escolher o seu quadro ético e reger-se por esse, pelo menos segundo Rand. Não cabe, portanto, ao Estado, impor uma moral que advém de uma determinada concepção de Bem.
Como pessimista antropológico - distancio-me, neste ponto, da maioria dos liberais, e talvez esteja mais perto de Hobbes -, não acredito no Bom Selvagem mas sim que no estado de natureza a lei do mais forte gera anarquia e insegurança, praticando-se muitas vezes o mal supremo: a ofensa à integridade física de outrem. É precisamente para evitar isto e para garantir a segurança que temos governo. Isto, claro está, partindo de uma concepção contratualista quanto à origem do Estado. Temos governo, precisamente porque precisamos de evitar que se pratique o Mal. Prescrever activamente uma qualquer concepção de Bem a partir do Estado, é cair na falácia iluminista que levou gente cheia de boas intenções a criar e/ou apoiar regimes monstruosos como o nazi ou o soviético e abrir a porta à servidão.
No fim do post, percebe-se ainda outro problema da falta de clareza discursiva, que leva o Manuel à indistinção entre os clássicos poderes do estado: legislativo, executivo, judicial. Ao misturá-los, a discussão perde-se por si própria. Sendo os meus conhecimentos de Direito bastante parcos, parece-me óbvio que qualquer edifício jurídico é construído tendo em consideração as diferentes fontes do direito que emanam da sociedade. Estas, claro que obedecem a determinados preceitos éticos e advindos da tradição. Transpôr a mesma concepção para a prática do poder executivo e/ou legislativo no que diz respeito à economia é, no mínimo, um erro crasso, como demonstrei com a citação de Soros no meu post anterior. É o erro maior do texto do Manuel.
No fundo, recapitulando a ideia de Berlin, uma certa humildade nestas matérias é muito necessária...
E posto isto, relembro ainda parte de um post do Professor Adelino Maltez (recomendo ainda a leitura do seu post de hoje), onde fala daquela metafísica a que a política deve obedecer, a transcendência do humanismo:
Porque sou liberal, à Fernando Pessoa, odeio que artificalmente se criem clivagens entre a esquerda e a direita, ou, pior do que isso, entre laicistas e católicos, em nome de causas transversais, especialmente quando a demagogia pode levar à confusão entre política e religião e ao regresso às teorias da conspiração e da diabolização. Alguns catolaicos ainda estão na era de José dos Santos Cabral, esse que além da proposta de restauração da pena de morte, nos anos trinta do século XX, continuou até à primeira lei do regime do dito Estado Novo, já pleno de polícias secretos querendo extinguir aquilo que pensavam poder ser extinto, dando o primeiro sinal de ódio face àquele conceito de transcendência que se chama humanismo, mas que não pode ser medido por sacramentos, clérigos e dogmas, visando emancipar as consciências e não salvar as almas.
Grão a grão, nos vamos assim amargurando, com o consequente cortejo de intolerância, de fanatismo e de ignorância, tudo misturado com celestiais discursos de defesa do funcionamento regular das instituições.
1 - Cfr. Isaiah Berlin, “The Pursuit of the Ideal”, in Henry Hardy, ed., The Crooked Timber of Humanity: Chapters in the History of Ideas, Londres, Fontana Press, 1991, p. 18 apud José Castello Branco, “Isaiah Berlin: Da Liberdade Negativa à Sociedade Decente” in João Carlos Espada e João Cardoso Rosas, orgs., Pensamento Político Contemporâneo – Uma Introdução, Lisboa, Bertrand, 2004, p. 80.
A responsabilidade é uma característica que depende do indivíduo e de seus atributos, ao passo que a autoridade é algo externo ao indivíduo. Algo que lhe é imposto. Muitas vezes, bem ou mal, a autoridade pouco é questionada, pois é anterior à existência de cada um dos sujeitos a ela submetidos, os quais em geral têm consciência da sua necessidade. A responsabilidade está dependente da boa vontade de cada um, é algo que se pode relativizar em qualquer circunstância. A autoridade simplesmente é e permanece.
Os Estados de direito democráticos ocidentais vão buscar muita da sua fundamentação a Rousseau. Eu, porém, ponho em causa a infalibilidade da soberania popular, enquanto vontade imposta pela maioria, e não a defendo como um fim em si própria. Assim como ponho em causa a infalibilidade e a eficácia da centralização da autoridade num único órgão de soberania. Apesar disso, concordo com Rosseau quando ele define o Estado como "entidade abstracta e colectiva" e a isso acrescento que é também um entidade moral, cuja existência tem como base a tradição, o respeito pelas instituições e como fim último a defesa da soberania e dos direitos de propriedade. Assim, e um pouco diferentemente do sistema político defendido por Rousseau, o Governo não estará dependente unicamente da soberania popular, pois seu papel executivo e legislativo deve depender de uma Constituição (quanto mais poética melhor, refiro-me ao comentador R. Gomes da Silva) e do soberano, neste caso o rei. Os métodos de escolha de representantes para uma câmara legislativa poderão sim envolver características do sistema democrático, seja ele orgânico, directo, partidário ou outro.
Quanto ao mercado, à economia e ao sistema monetário, deixarei para futuros posts. Continuo a achar que dizer que "a autoridade centralizada" - e este termo é de Friedman e não meu - deve "ditar as regras do jogo", entra em contradição com a defesa de um "laisse faire" extremo que se demita de impor a Lei ao roubo, à extorsão e ao cartelismo. Eu sou daqueles cujo pessimismo antropológico leva a acreditar que a desregulação total dos mercados porá em causa as soberanias e respectivas instituições - e a realidade tem vindo a dar-nos razão.
O meu post anterior, desta série, provocou uma interessante resposta do Pedro. De salientar, ainda, a recomendação do Manuel sobre este post onde Rui Botelho Rodrigues considera Friedman como um autor que os liberais deveriam esquecer. Deste último, destaco a afirmação de que é aliás possível reconhecer o seu papel como «porta de entrada» para a ideologia liberal. Mas, uma vez passada a porta, Friedman deve ser esquecido e renegado, porque no fundamental foi um obstáculo à, senão um inimigo da, liberdade, tanto nas suas acções como nas suas palavras.
Na verdade, para o ensaio que elaborei, considerei apenas o capítulo de abertura de Capitalism and Freedom, intitulado "The relation between economic freedom and political freedom". E este é, na minha opinião, um texto que deveria ser lido por todos os liberais, precisamente como porta de entrada para o liberalismo.
Procurarei, de forma breve, aprofundar a análise respondendo aos pontos levantados pelo Pedro, recorrendo às interpretações e conclusões a que cheguei no já referido ensaio.
Em primeiro lugar, quanto à distinção entre a liberdade económica ou individual, a conclusão a que cheguei, partindo dos ensinamentos de Friedman, Hayek e John Gray, é que a liberdade individual assenta em dois tipos de liberdade: a económica e a política, sendo a segunda um resultado da primeira. Hayek assinala-o ao afirmar que “the subsequent elaboration of a consistent argument in favor of economic freedom was the outcome of a free growth of economic activity which had been undesigned and unforeseen by-product of political freedom”1. Milton Friedman sintetiza a mesma ideia, dizendo-nos que “the kind of organization that provides economic freedom directly, namely, competitive capitalism, also promotes political freedom because it separates economic power from political power an in this way enables one to offset the other”2.
A propriedade privada é, assim, um elemento fundamental para alcançar a liberdade individual, tal como Locke já havia teorizado, e como Gray assinala ao considerá-la como “an institutional vehicle for decentralized decision-making”3 em estreita ligação com a capacidade de um indivíduo dispor de si próprio, das suas capacidades e talentos. Isto só acontece, em termos económicos, num sistema de mercado, em que a coordenação sobre as actividades económicas não é coerciva, e, em termos políticos, num sistema liberal, em que o Governo seja limitado, assegure o rule of law, e respeite as liberdades individuais.
É por isso que, não pode existir uma autoridade centralizada. Friedman, Hayek, Popper, Berlin e tantos outros, tiveram como experiências formativas das suas vidas (na expressão de George Soros), os totalitarismos nazi e/ou comunista. Neste tipo de sistemas sociais, o Estado engloba todas as áreas da vivência individual, sendo o principal agente/jogador no sistema económico, que lhe está completamente subjugado. Julgo ser este tipo de entidade que se considerada uma autoridade centralizada, que pelas suas características se impõe e coarcta a liberdade dos indivíduos. O Pedro considera que não pode haver liberdade sem autoridade. Eu, porém, prefiro pensar que não pode haver liberdade sem responsabilidade. Além do mais, o entendimento do Pedro assemelha-se ao de Rousseau, que n'O Contrato Social diz explicitamente que o Estado é uma entidade abstracta e colectiva que tem como instrumento o Governo, i.e., “um corpo intermédio estabelecido entre os sujeitos e o soberano por mútua correspondência, encarregado da execução das leis e da manutenção da liberdade, tanto civil como política”4 que resulta de um acto do povo enquanto soberano5.
Naturalmente, para que se assegure a liberdade individual, é imperativo que a coerção seja minimizada, pelo que “o Estado só deve utilizar a força quando tal seja necessário para evitar que os indivíduos se coajam uns aos outros”6. Assim, não deve caber ao Governo a manutenção da liberdade, como defendia Rousseau, até porque tal acepção é uma contradição. O Governo constitui-se precisamente para constranger a liberdade de que os indivíduos gozam no estado de natureza mas, contudo, para assegurar que mantêm direitos e liberdades inalienáveis e se respeitam uns aos outros.
Esta interpretação está também presente no clássico ensaio de Isaiah Berlin, Two Concepts of Liberty, onde discorre sobre as concepções de liberdade negativa e liberdade positiva. Entende-se que existem duas esferas distintas, uma pública e outra privada, entre as quais deve ser demarcada uma fronteira, permanecendo inviolável uma certa área mínima de liberdade individual que nos permita prosseguir e conceber diversos fins como nos aprouver. No entanto, ao demarcarmos essa fronteira, estamos na realidade a constranger a liberdade, a sacrificar uma porção desta para preservar o resto, já que “we cannot remain absolutely free, and must give up some of our liberty to preserve the rest”7 – o que Rousseau se recusa a fazer e o levará à escravizante abstracção do bem comum e da vontade geral.
Robert Nozick, na mesma linha de Hayek, defendeu que o único modo legítimo de organização dos recursos materiais e humanos é o que resulta das actividades dos indivíduos em trocas competitivas uns com os outros. Em decorrência desta legitimidade, as únicas instituições políticas justificáveis são as que actuam com o objectivo de assegurar um enquadramento ou ambiente de liberdade, ou seja, as que contribuem para a manutenção da autonomia e dos direitos dos indivíduos8.
No seguimento, não creio que Friedman entre em contradição, como refere o Pedro. Parece-me é que, no fundo, é necessária uma clarificação discursiva do entendimento desse e da minha parte - no que, humildemente, posso interpretar do seu pensamento. Nenhum liberal prescinde do governo ou defende a extinção deste. Partindo do pensamento de Locke e de Montesquieu, autores fundacionais do liberalismo, há uma convergência por parte dos liberais quanto ao cepticismo em relação ao exercício do poder, apesar de encararem o governo como um mal necessário, pelo que se preocupam essencialmente em arquitectar checks and balances que actuem como forma de difusão do poder, salvaguardando a liberdade individual da coerção por parte de terceiros, em especial do próprio Estado.
Não se prescinde do governo. Prescinde-se, isso sim, da sua intervenção na economia. É fundamental o seu papel regulador, precisamente para assegurar o tal enquadramento ou ambiente de liberdade, já que é ao Governo que compete determinar as regras do jogo. Claro que, como refere o Pedro, as regras podem mudar. E aqui, só me posso socorrer da teoria do conhecimento de Karl Popper e também do princípio da ignorância constitutiva do ser humano, de Hayek . Sendo o nosso conhecimento inerentemente imperfeito e assentando num método dedutivo em que conjecturas e refutações servem para falsificar teorias, num diálogo que só é possível numa sociedade aberta, então é apenas legítimo que as regras mudem. Se o Estado desempenhar correctamente o papel de regulador e não de interventor na economia, prevenindo e corrigindo os desvios à liberdade como os monopólios e oligopólios, o mercado naturalmente será verdadeiramente livre.
Caso contrário, se o Estado tiver um papel determinante na organização dos recursos económicos, há um poder coercivo pendente a todo o momento sobre todos os actores - e tal situação não compreende um mercado livre. Saliento ainda que, concordando com o Pedro, a coerção não é um exclusivo do Governo. Aliás, os próprios indíviduos se coagem. É por isso mesmo que o Governo tem como uma das suas principais atribuições assegurar que os indivíduos não interferem nas esferas de liberdade uns dos outros, sendo este, de facto, um dos principais fundamentos na sua origem (pelo menos para o liberalismo de matriz anglo-saxónica).
Por último, pego no início do post do Pedro, quando refere que o Estado deve ser uma autoridade a ter em conta pelo mercado, no seu aspecto jurídico e constitucional. Estes, por sua vez, devem exercer a sua autoridade tendo como fim a defesa da soberania e dos princípios da moral cristã-católica e não quimeras igualitárias nem papel redistributivo da riqueza.
Peço desde já desculpa ao Pedro, pelo atrevimento, mas espero que me permitas a inversão do argumento. Se o Estado tem como fim a defesa da soberania e dos princípios da moral cristã-católica, presidindo estas ao seu edifício jurídico e constitucional, e se o mercado deve ter em conta a autoridade do Estado, significa, portanto, que o mercado deve ter um determinado quadro moral e fins fixados de acordo com este.
E se assim é, estou em total desacordo. Em primeiro lugar porque deve caber aos indivíduos a fixação dos fins que bem entendam que devem prosseguir, e não ao Estado. Se for o Estado a fixar os fins, esse é apenas um dos muitos caminhos para a servidão. Em segundo lugar porque da liberdade individual faz parte a liberdade de escolher os quadros éticos que se deseja prosseguir, bem como religiosos. Em terceiro lugar, porque não se devem estender concepções éticas ou morais ao mercado. Por ser amoral, e não imoral, é que o mercado é tão eficiente a criar riqueza, como assinala George Soros, numa das suas cinco palestras na Central European University, intitulada "Capitalismo vs. Sociedade aberta" (disponível em livro, editado pela Almedina, e também online).
Nos mercados em concreto, os actores são considerados individualmente, tendo cada qual o seu quadro ético e os seus fins. Numa realidade económica globalizada em que os mercados e os sistemas económicos e financeiros estão extremamente interligados, integrados, entrelaçados, tornando-se uma realidade demasiado complexa para qualquer ser humano conseguir compreender na sua totalidade, há, certamente, valores e quadros morais diversificados que servem de referência aos indivíduos. Contudo, não são estes valores, que decorrem precisamente da esfera da ética, e portanto, da esfera política e/ou religiosa, que estão em questão num mercado - a concepção de interesse nacional, utilizada para justificar a utilização da golden share pelo governo socialista é um exemplo paradigmático do quão desastrosa pode ser a intervenção estatal no mercado assente em determinadas concepções valorativas; ainda para mais, neste caso, tratando-se de uma conceptualização confrangedora, já que, como aqui salientei, não havendo Conceito Estratégico Nacional, o interesse nacional se torna uma abstracção de carácter demasiado volátil, convidando a utilizações e manipulações indevidas, que desvirtuam o próprio conceito.
Como Soros aponta, "os mercados são apropriados apenas para as escolhas individuais, e não para as decisões sociais. Permitem que os participantes individuais se dediquem à livre troca, mas não foram concebidos para o exercício de escolhas sociais, como o estabelecimento de regras que devem reger a sociedade ou governar o mecanismo do mercado. Isto pertence à esfera da política". E o inverso é também verdade, ou seja, alargar a concepção do mercado livre à política é um erro, pois ao tornar a política amoral, descaracteriza-a e coloca-a em causa, até porque não há qualquer possibilidade de neutralidade ética nesta esfera. Por isso, o mesmo autor aponta que "Estender a ideia de um mercado livre, que se governa e corrige a si próprio à esfera política é profundamente ilusório, pois retira as considerações éticas da política, sem as quais não pode funcionar correctamente"9.
Notas
1 - Cfr. F. A. Hayek, The Road to Serfdom: text and documents – The Definitive Edition, Bruce Caldwell (ed.), Chicago, The University of Chicago Press, 2007, p. 69.
2 - Cfr. Milton Friedman, Capitalism and Freedom, Chicago, The University of Chicago Press, 2002, p. 9.
3 - Cfr. John Gray, Liberalism, 2.ª Edição, Minneapolis, The University of Minnesota Press, 1995, p 62.
4 - Cfr. Jean-Jacques Rousseau, O Contrato Social, Mem Martins, Publicações Europa-América, 2003, p. 62.
5 - Cfr Idem, ibidem, p. 100.
6 - Cfr. Manuel Fontaine Campos, “ Friedrich A. Hayek: Liberdade e Ordem Espontânea”, in João Carlos Espada e João Cardoso Rosas, Pensamento Político Contemporâneo – Uma Introdução, Lisboa, Bertrand, 2004, p. 37.
7 - Cfr. Isaiah Berlin, “Two concepts of Liberty” in Isaiah Berlin, Four Essays on Liberty, Oxford, Oxford University Press, 1969. Disponível online em http://www.nyu.edu/projects/nissenbaum/papers/twoconcepts.pdf. Consultado em 01/07/10. P. 5.
8 - Cfr. David Held, Models of Democracy, Cambridge, Polity Press, 2008, p. 202.
9 - Cfr. George Soros, As Palestras de George Soros na Central European University, Coimbra, Almedina, 2010, p. 92.