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Deixemo-nos de congressos do Partido Social Democrata e se a Sra. Dona Fraga tem uma voz semelhante àquela do ditador- acabaram-se-os-jornais, o Goeballs de Alvalade, para centrarmos as vistas em algo um pouco mais substantivo. Refiro-me a um facto que escapa ao controlo da Geringonça, do Banco Central Europeu (com ou sem o vice VÍtor Constâncio a imitar o chefe Draghi) ou de ideólogos de mãos largas e tesourarias falidas. Como todos sabemos, ou deveríamos conhecer, o fim da era dos juros baixíssimos de títulos de dívida pública aproxima-se a passos largos - assim teria de ser, a não ser que desejemos inflação e depois ainda mais inflação - galopante ou hiperbolante. O sistema financeiro internacional é, para todos os efeitos, um monstro que não se restringe à cerca da política monetária de um dado país. Ou seja, o que está a acontecer nos Estados Unidos da América (EUA), no que concerne à subida da taxa de juros de government bonds, far-se-á sentir na Zona Euro. A União Europeia, castigada pelo Euro forte (que em nada ajuda as exportações), não se encontrará nas melhores condições para acompanhar a Reserva Federal, ou seja, subir a taxa de juro de referência com efeitos inevitáveis para parceiros como Portugal ou a Grécia, a título de exemplo. Mas terá de o fazer porque a inflação pode ser madrasta quando menos se espera. Nesta toada de considerações, Portugal, que tem festejado sucessivas emissões de dívida (a 2, 5 e 10 anos) a níveis invulgarmente baixos, pode encontrar-se numa situação particularmente anti-gerigonçal no que diz respeito a financiamentos públicos. António Costa tem celebrado o grande desempenho da economia portuguesa, mas parece omitir o easy money, os tais dinheiros emprestados ao Estado português com prestações ao preço da chuva. Tudo isto está a mudar. Desde os anos 40 que não se registava tal fenómeno de subida abrupta das taxas de juro dos títulos de tesouro dos EUA. E isto tem de preocupar os gestores da economia portuguesa, mas sobretudo os governantes da república. Mas vejo algo diverso - rest and relaxation a mais deste governo de Esquerda que julga erradamente que isto é lá com eles. Nem a três conseguem vislumbrar o que aí vem - o dinheiro fácil algum dia tinha de acabar.
Antes que a Maria Luís Albuquerque e o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho cantem vitória em relação ao sucesso da emissão de dívida a 5 anos com juros perto dos 4,6%, convém olhar para ambos os pratos da balança, e não apenas para os aspectos favoráveis que têm grande utilidade política. Sem dúvida que é uma boa notícia conseguir realizar um bom negócio a um preço mais baixo do que o esperado, mas mesmo que as necessidades de tesouraria estejam cobertas neste período de maturidade, não deixa de ser dívida. Para além deste facto isolado, respeitante ao comportamento do mercado internacional em relação a Portugal e a percepção optimista que tem para com este país, somos invariavelmente obrigados a realizar a leitura do quadro económico, financeiro e social num contexto mais alargado. O dinheiro, como se sabe, obedece parcialmente à lei de Lavoisier. Embora possa ser criado através da impressão por bancos centrais mundo fora, este não se perde, mas fica sujeito a processos de transformação, que em maior rigor deveriam ser chamados de mecanismos de transferência. E é precisamente esse movimento de dinheiros e percepções que está a acontecer. A periferia que se encontrava no fundo da classificação, com o pior comportamento económico possível, apenas tem uma direcção a percorrer - o caminho da melhoria gradual. Contudo, essa expressão não acontece sem que hajam vítimas noutras paragens económicas e monetárias. Neste sentido, o que começa a acontecer em França e na Alemanha deve ser acompanhado com atenção, uma vez que os juros de dívida desses dois países correm em sentido contrário aos ponteiros de Portugal ou da Irlanda. Neste dia em particular, um ligeiro efeito de anulação fez-se sentir, se atendermos ao agravamento dos juros naqueles países. Não devemos esquecer, por um instante sequer, que a União Europeia, funciona de acordo com esse princípio de lastro financeiro, de transferências de uma paragem para a seguinte. Parece-me que à medida que a periferia melhora do seu estado clínico, o núcleo da União Europeia começa a sentir os efeitos secundários desse esforço. O mercado é uma dama caprichosa, que muito embora a queiram domesticar, acaba por revelar a sua verdadeira intenção. Existe até uma expressão que capta, de um modo imperfeito, a volatilidade que resulta das percepções, da procura e oferta do mercado, da reflexologia a que estamos todos sujeitos, mas não sei se se adequa aos tempos de incerteza que vivemos, por isso não a irei alvitrar. Só começarei a acreditar na recuperação firme quando vir o crescimento do emprego a entrar no esplendor das equações, dos resultados. Enquanto isso não acontece, parece-me um prémio menor o sucesso da emissão de dívida. Prefiro ser realista do que enbandeirar no arco da promessa do fim dos tempos difíceis. Deixo isso aos outros. Aos profissionais. Àqueles que precisam de ser eleitos ou reeleitos. Aos que seguem para candidaturas e recandidaturas.
Não sei como se tratam de problemas de visão, mas penso que ainda não existe cura para glaucoma jornalístico. Uma doença que afecta intensamente a vista panorâmica e as faculdades mentais que permitem ver o quadro maior de interdependências. Em primeiro lugar, a emissão de dívida de longo prazo serve para pagar a dívida da dívida da dívida da dívida da dívida.... É uma pescadinha de rabo na boca que nada tem a ver com os aspectos fundamentais da economia. É dinheiro mais barato. É a remissão plena da doença do crédito, que trata dos sintomas, mas que nada contribui para gerar crescimento e baixar o desemprego. Se é para mandar às urtigas o Banco Central Europeu e demonstrar que Portugal consegue angariar apoios financeiros no mercado aberto, não irá servir de muito no contexto de um quadro muito mais dramático. Infelizmente Portugal não está sozinho no mundo. Existe vida para além de Badajoz e esse facto parece passar ao lado dos analistas de mercado. Não sabem que estamos em Guerra? Que o conflito de que falo é global e irá causar imensas baixas? Enquanto se celebra o regresso ao futuro de Portugal, o resto do mundo está envolvido num confronto épico. Refiro-me à guerra de divisas. A corrida à desvalorização das moedas nacionais como forma de melhorar o nível de exportações dos países beligerantes. Eu sei que pode parecer que passa ao lado de Portugal, como se a sua guerra fosse outra, como se já não fosse uma nação, como se não importasse. Contudo, não é bem assim, e haverá um preço a pagar pela ligeireza de espírito. Portugal ofereceu de bandeja a sua política monetária aos lordes Europeus em troca de uma cartão de sócio do clube dos exemplares países desenvolvidos. Pois é. É o que dá não reflectir profundamente sobre as implicações de decisões tomadas. Mas regressemos ao tema dos murros e pontapés. O que pensam que os EUA estão a fazer ao Dólar e o que os Japoneses anunciam fazer ao Iene? Estão efectivamente a tornar as suas economias mais competitivas baixando o preço do seu dinheiro. Abriu a época de saldos de divisas. E a União Europeia, o que fará? O Banco Central Europeu fará exactamente o mesmo. Não tem alternativa, uma vez que a retoma económica da Zona Euro não acontecerá devido às suas forças intrínsecas, à dinâmica do mercado interno que está mais a coxear do que a marchar na direcção certa. Este procedimento de intervenção monetária gerará efeitos distorcidos, mas podem ter a certeza do seguinte. Pode entrar dinheiro a rodos em Portugal, mas essa não é questão principal. A pergunta que tem de ser colocada tem a ver com a qualidade do crédito. O rating do dinheiro quando comparado com outras moedas. O valor do Euro no contexto dos grandes descontos das outras divisas. Seria excelente que os jornalistas fossem capazes de equacionar cenários mais distantes e expor algumas das implicações deste quadro dinâmico. Eu sei que não tiveram bons exemplos, mentores adequados. Os economistas, por este mundo fora, falharam redondamente nas projecções que estabeleceram. Em busca de consolo e alguma razão, não me viro para os matutinos. Os jornais não reflectem. Os jornalistas são incapazes de conjecturar. São matutinos na verdadeira acepção da palavra. Estão a dormir.