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É o que dizem as sondagens. O Partido Socialista está fora da Zona Oiro das legislativas. Seguro não está a rir.
Já repararam que o termo desemprego já não faz parte do discurso dos que mandam? O Instituto Nacional de Estatística anuncia o fim da recessão, mas não é referido de que forma esse facto produz efeitos na geração de emprego. Os governos de Portugal, e dos demais países europeus, sabem que o pleno emprego jamais tornará a ser o que era. Os dias de desemprego na ordem dos 5% acabaram. Assistimos, deste modo, à residência definitiva de uma nova realidade dissimulada e por revelar nas palestras daqueles que estão no poder ou daqueles que sonham em lá chegar. Os "bons" resultados económicos são bons para o bottomline das empresas, para os fluxos de caixa, mas não para o trabalhador. Eu iria até mais longe. Há largos anos que os gestores de empresas aguardavam o momento certo para realizar o layoff, os despedimentos em massa e com justa causa. A pergunta que deve ser colocada aponta no sentido de saber quando haverá inversão da tendência no desemprego. Há escassas semanas foi divulgado que o desemprego em Portugal rondará os 17,4% em 2014, embora presentemente tenha caído para os 15,8%. Este anúncio de sucesso das exportações apresenta uma ligeira contradição, ou a corroboração da ideia de que há sérias dificuldades pela frente. A necessidade de emissão de dívida a 5, 10 ou 30 anos significa que a economia ainda não se aguenta nas suas pernas. O roll-over, o empurrar para a frente das obrigações de dívida, não altera a dinâmica económica substantiva, a geração de emprego. A demise dos estaleiros de Viana acaba por confirmar a ideia de desfalecimento, de que mais despedimentos seguir-se-ão. A situação económica e social, já de si incomportável pelos cidadãos, poderá agravar-se ainda mais se houver um processo simultâneo de declarações de insolvência ou inoperacionalidade. Temos os CTT e as Páginas Amarelas em pé de guerra. Temos professores na rua. Temos trabalhadores de todos os sectores económicos em profundo desconforto. Temos gente que caiu fora das estatísticas e que já não conta nas considerações governativas, porque não existe matematicamente. O fim da recessão é uma expressão muito desejada em termos económicos, mas uma nova figura conceptual nasceu com esta crise - a possibilidade de coexistência de depressão social e crescimento económico. Esta contradição, nunca como antes, desafiou todos os modelos e conceitos de desenvolvimento das nossas sociedades. O fosso entre os detentores de capital e os trabalhadores parece ser cada vez maior. Seria simpático se o INE apresentasse em tandem as duas partes da fórmula - o crescimento económico acompanhado pelo crescimento do emprego.
Pedro Arroja no Portugal Contemporâneo:
Os dados do emprego são conhecidos com tanta rapidez nos EUA porque eles representam uma estimativa do número de desempregados no mês anterior. Conhecer o número exacto de desempregados - contar cabeças - demora meses. Porém, os métodos de inferência estatística e as técnicas de amostragem estão de tal modo desenvolvidas, que a estimativa nunca difere significativamente daquele que virá a revelar-se o número exacto.
Então, e o INE não tem economistas e estaticistas para fazer estimativas? Claro que tem. Só que as estimativas, se existirem, ficam lá dentro e não saem cá para fora. Para os portugueses, com a sua obsessão pelo pormenor e pelo detalhe, os números que vierem a ser publicados têm de ser os números exactos e definitivos, obrigando a contar cabeças (*) e à demora inevitável deste processo. A consequência é que, enquanto nos EUA, a prontidão das estatísticas faz delas instrumentos privilegiados para a tomada de decisões, em Portugal elas não servem para nada - são peças de história económica.
Trata-se, obviamente, de mais uma manifestação da nossa cultura relativamente à cultura anglo-saxónica em tudo aquilo que diz respeito à esfera pública. A preocupação da cultura portuguesa com o detalhe, o pormenor, a perfeição, a exactidão irrelevante, tornando os portugueses excelentes, às vezes exímios, em tudo quanto o que se refere à esfera privada da sua vida, torna-os, aos mesmo tempo, literalmente, uma cambada de nabos em tudo o que concerne a esfera pública.
Este traço cultural dos portugueses tem pesadas consequências sociais. É como se os portugueses tivessem todos agachados no meio de um campo, em volta de um formiga, a discutirem uns com os outros, a côr dos olhos da formiga, o tamanho das suas patas, a sua forma de caminhar, ao mesmo tempo que, enquanto o fazem, mas sem nunca darem por isso, uma camada de nuvens negras se vai colocando sobre eles. Até ao momento em que a tempestade lhes cai em cima com toda a força, sem que eles tivessem dado por ela.