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A Alemanha é a imagem quase perfeita do estado de arte política da Europa. Os resultados das eleições federais devem ser interpretados à luz de considerações trans-germânicas. Sabíamos de antemão que a questão da imigração e dos refugiados seria a linha divisória para afastar ou aproximar eleitores. O partido Alternativ für Deutschland (AfD) estreia-se deste modo no Bundestag com uma presença assinalável (12 a 13% com uma expressão parlamentar na ordem dos 90 membros). Merkel pode extrair vantagens desta situação se souber apaziguar os ânimos exaltados daquele partido, mas também de um espectro alargado da população que emprestou o seu voto ao AfD. Schulz, que admitiu a derrota, nem tentou sequer colocar em causa a "vitória" da CDU, mas ao afirmar o fim da coligação, declara que o desejo da SPD é liderar a oposição. A expressão Jamaicana do possível arranjo de coligação, integrando o FDP e os Grüne, terá forçosamente de significar a negociação contínua e tensa de soluções políticas de governação. Por outras palavras, a CDU de Merkel poderá inclinar-se mais à direita, arrastando o FDP, e com um teor menos intenso os Grüne e o partido Die Linke. Schulz, socialista de gema, ainda acredita nas eleições regionais para inverter o declínio do seu partido, mas fala irresponsavelmente e com alguma perda de sentido da realidade - nos territórios da ex-Alemanha de Leste, o AfD é a segunda força política, e não o SPD. Dito de outro modo, seja qual for o amor à camisola de cada um, o AfD contaminará os discursos e a orientação de uma panóplia de políticos e partidos. Os socialistas, que alimentaram o sonho de paz social e prosperidade um pouco por toda a Europa da União, terão de acordar para uma nova fase de realismo político. A Catalunha ou o Brexit fazem parte do mesmo ADN mutante de nacionalismos, sem referir os casos flagrantes da Húngria e da Polónia. Num caso está em causa a fragmentação de uma centralidade política e no outro caso a secessão de um Estado-membro da União Europeia, sem ajuizar sequer sobre o grau do que sucede nos outros países acima referidos. Temos deste modo um novo desenho endémico na Alemanha. Embora não possamos falar de um conflito bipolar e ideológico na Alemanha, registamos, sem escamotear a verdade, a afirmação dos anseios de uma boa parte da população. A bandeira do AfD é mais intensa do ponto de vista sociológico e existencial do que o estandarte ideário de um Die Linke ou de os Grüne. As causas clássicas da Esquerda são menos de "vida ou morte" e por essa razão não conseguem instigar vontades de um modo tão acultilante ou emocional, irracional. Se não estou em erro, e assumindo a pré-condição de preservação do poder político a todo o custo, veremos até onde irá o SPD e de que quadrante partirá Angela Merkel para este seu quarto e derradeiro mandato.