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No dia em que se tornam públicas as consequências da gestão ruinosa da CGD, o assunto quase passa despercebido nos telejornais, as televisões noticiosas mantêm a sua programação habitual com os ignóbeis programas de comentário futebolístico, num dos quais até está André Ventura, pelo que é bom ver que um político à beira de formar um partido tem as prioridades bem definidas, e apenas a RTP3 dedica um programa à situação na banca, pasme-se, com Faria de Oliveira, Presidente da Associação Portuguesa de Bancos, em clara operação de contenção de danos. Já dizia Rodrigo da Fonseca que "nascer entre brutos, viver entre brutos e morrer entre brutos é triste”.
Os pequenos devedores lá vão fazendo o que podem para pagar as suas prestações, quando em risco de incumprimento mal conseguem renegociar os seus créditos e aqueles que entram em incumprimento não se livram de ter as empresas de cobrança de créditos à perna durante anos, sem esquecer que são ainda incluídos na lista negra do Banco de Portugal, ficando impedidos de contrair empréstimos junto de qualquer instituição bancária. Por isso, da próxima vez que pensarem em pedir um empréstimo à CGD não sejam tímidos. Peçam logo em grande e não dêem quaisquer garantias. Se a coisa correr mal, paga o Zé Contribuinte. Não conhecem ninguém na Administração? Azar o vosso. Todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais que outros, já dizia Orwell. Talvez esteja na hora de pararmos de brincar com o erário público e privatizarmos a CGD. E já agora, se não for pedir muito, responsabilizar criminalmente quem esteve nas Administrações que autorizaram estes empréstimos escandalosos.
Fernando Medina e a sua equipa de cobranças duvidosas apropriaram-se ilegalmente e inconstitucionalmente de 58,6 milhões de euros. Não consigo determinar com precisão durante qual período os contribuintes afectos à Câmara Municipal de Lisboa (CML) ficaram privados, cada um, de perto de 40 euros devido à tal ficção da Taxa de Protecção Civil, mas poderemos estabelecer que houve danos em termos financeiros. Não sabemos o que andaram a fazer na tesouraria da CML com os 58,6 milhões de euros de outrém, mas uma coisa é certa, se tivessem sido aplicados num veículo financeiro convencional o retorno seria interessante. Não faço recomendações de investimento, mas deixo ao critério de aforristas, pequenos e graúdos, o modo de aplicação de poupanças. Se a CML fosse idónea e honesta, acrescentaria, aos valores que agora devolve, uma percentagem para compensar potenciais perdas. Os residentes de Lisboa e contribuintes da Taxa de Protecção Civil teriam fundamentos legais e financeiros mais que suficientes para mover acções contra a CML. Paira no ar a seguinte pergunta: o que andaram a fazer com o dinheiro dos outros nesse período de tempo? Por motivos muito mais incipientes já apresentei queixas à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, quando uma instituição financeira da praça falhou nas suas obrigações. Mas haja esperança; pode ser que no tal vale postal que os lisboetas irão receber venha aposto um poema de Manuel Alegre - "o que tira uma mão, a outra não devolve", ou qualquer treta deste calibre. Chico-esperto, este Medina.
Vivemos tempos de excepção, de extrema raridade - raríssimos. Portugal acaba de ser apurado pela Fitch para o grupo de Itália. António Costa, que há não muito tempo rogava pragas às agências de notação, tece agora os maiores elogios à Fitch. Este jogo de patentes por conveniência acarreta algumas considerações penosas. Se Portugal agora se encontra ao nível da economia e finanças da Itália, devemos ficar preocupados, mas há algo ainda mais dramático - o nível de Dívida Pública. Se de facto Portugal está ao nível da Itália, então ocupa agora o 5º posto dos países mais endividados do mundo. Enquanto os sistemas financeiros dos EUA e outras nações pioneiras procuram integrar no seu mainstream as divisas digitais, Portugal não consegue passar da fase das artimanhas orçamentais para dissimular o real estado da economia. O Turismo tem sido o Bitcoin de Portugal, mas nem chega a tanto - não representa uma mudança de paradigma. Continua a ser o sector tradicional do mais do mesmo, correndo graves riscos associados a bolhas. Por outras palavras, a revolução tecnológica, que antecede o boom económico, ainda não aconteceu. Portugal continua a virar frangos e a natureza estrutural da economia não se alterou significativamente. As agências de notação não passam disso, dessa ficção contabilística. E têm uma tabela de preços a respeitar. Não são exactamente fake, mas têm de viver de alguma coisa. Servem-se de indicadores económicos todos catitas que omitem a economia paralela, as fraudes, a evasão fiscal e as demais maleitas que afligem países. A divisa Fitch é tão virtual quanto outra qualquer. Fixecoin - aposto que seria um sucesso em Portugal.
O Orçamento do Estado (OE) de 2018 já está a arder. O governo encontrou um nome todo catita para ficcionar as contas e fingir que está tudo óptimo - cativações. Imaginem que têm os dentes a apodrecer, mas que ainda conseguem mastigar uma bela açorda, e em função desse repasto, decidem que afinal aquele investimento na placa dentária não vale a pena. De repente ficaram umas centenas de euros mais ricos. As contas lá de casa melhoraram. E os caninos e molares? - logo se vê. É mais ou menos assim que o Estado está a ser gerido. É quase definitivamente deste modo que governam. A derrapagem orçamental que aí vem, terá, no entanto, uma desculpa do tamanho do Pinhal de Leiria. Os incêndios florestais serão invocados sem piedade para espremer a simpatia de Bruxelas e uma interpretação excepcional do cumprimento ou não do OE. A falta de emoções de António Costa poderá agora ser transsexualizada directamente de São Bento para divisa política pura, para moelas deploráveis de troca. De um modo racional e mensurável, as tragédias florestais e a perda de vida humana, poderão ser cambiadas por argumentos no mercado político da União Europeia. Na lista de descalabros tudo poderá ser incluído. A saber, e a título de ilustração; as cabeças de gado bovino e caprino que sucumbiram na densa mata de fogo, a contaminação de cursos de água - decorrente da putrefação dos referidos animais; o impacto que se fará sentir no sector agrícola e florestal, a perda de empresas de base familiar e respectiva mão de obra, a sobrecarga do sistema de segurança social que terá de atender a pessoas em estado de carência e emergência, o peso sobre o sistema nacional de saúde que terá de cuidar dos queimados e outros feridos, mas também de um número insondável de pacientes que emergirão por degradação da qualidade do ar na proximidade das ocorrências ou em destinos mais afastados. Enfim, uma quantidade de alibis operacionais de natureza financeira e administrativa será sacada de uma espessa nuvem de consequências oportunas, mas mesmo com todas as cativações do mundo e todos os favores de Bruxelas as contas não baterão certo. Das duas uma; ou deixam a factura sair fora de controlo -"estou-me cagando para a dívida" ou assumem a iminência do descalabro à moda de 2011, e toca a aplicar ainda mais descaradamente efectivas medidas de austeridade que, em jargão geringonçal, terão outro nome mais adequado para não ferir a massa associativa de funcionários públicos que colocou no triatlo os três partidos de governação. Uma outra hipótese, mais remota porém, será o PCP ou BE acabarem de vez com esta fantasia cozinhada à La Carte dos interesses ideológicos dos partidos em causa. Esperemos para ver. E nem tem de ser sentado. Parece-me que tudo isto será rápido, mas a doer. Pacientes, paciência. Os portugueses, como sempre, são as vítimas.
Existe outra frente de incêndio activa em Portugal. Um fogo de proporções assinalável, que até 2015 estava a ser controlado, lavra agora sem que um corpo de bombeiros exista para o combater - a DÍVIDA PÚBLICA. Os incendiários, entretanto, já foram identificados. Alegadamente, o gangue composto por três elementos - o PS, o PCP e o BE -, anda a monte. A dívida privada, por seu turno, já conseguiu organizar um concerto de solidariedade para diminuir os seus encargos e inverter a tendência dessa chama financeira. Em breve mais notícias. Um estoiro, uma explosão. Mais um resgate.
Acusam o camarada Sócrates, e logo no dia seguinte Centeno anuncia que a dívida vai baixar. Existe relação entre os dois factos? Talvez. Mas o ministro das finanças está a ser muito optimista. A haver condenação e compensação financeira, o dinheiro ainda demorará a ser cobrado, a chegar aos cofres do Estado - faltam os recursos, os julgamentos, as sentenças e as execuções. Eu entendo a excitação monetária da geringonça - os milhões do desfalque são muitos -, mas calma, aguentem os cavalos. Para além dessas fantasias, existem incontornavelmente outros factores a ter em conta. Como é que este economista ousa apontar uma melhoria no serviço de dívida, se sabemos sem margem para dúvida, que o Banco Central Europeu irá subir as taxas de juro de referência nos próximos tempos? Como dizia o acusado-mor 44 - "a dívida é para ir gerindo". Até parece que Centeno nunca ouviu falar em ceteris paribus, como se fosse possível congelar a realidade financeira do resto do mundo e analisar Portugal como se esta fosse uma entidade independente, uma Catalunha da dívida pública. Para atenuar de um modo irrisório a tendência fatal de crescimento da dívida o governo de Portugal teria de cortar o investimento público de um modo ainda mais significativo. Ou seja, fingir a ficção dos cofres abundantes, de tesouraria saudável. Mas há mais lições de economia para totós a ter em conta. Sem poupança não há investimento, e a máquina de propaganda da geringonça pura e simplesmente não consegue escamotear a ausência de poupança pública e privada. Diria mais; cada vez que os níveis de confiança dos consumidores se elevam, o governo e o ministério das finanças festejam o facto, brindando-se vezes sem conta pelo comportamento material dos portugueses. E isso é grave. Significa que os trabalhadores gastam a quase totalidade do salário auferido - chapa ganha, chapa gasta. Para além dessa fraude, servem-se de um indicador caduco para se congratularem antecipadamente por vitórias que não controlam. A saber, e a título de exemplo; a Inflação (core inflation) exclui do seu processo de cálculo a Energia e os Bens Alimentares, o que falsifica ainda mais a realidade financeira dos factos. Por outras palavras, o "acordão" de diminuição da dívida pública nem precisa de ter 4000 páginas para ser uma ficção de bolso, de levar por casa. A dívida está encravada e é uma unha sem fim.
foto: Jornal Económico
2011 não vos faz lembrar qualquer coisa? Não foi aquele ano em que tivemos o estoiro e a coligação PSD-CDS tomou conta das ocorrências? Vamos ver se eu entendo o que está em causa. Se estou a ler correctamente, António Costa e o tesoureiro Mário Centeno estão a ser particularmente selectivos, discriminatórios até - os trabalhadores promovidos pelo governo anterior ficam de fora do processo de descongelamento de rendimentos? É isso? Ou sou eu que vejo mal? Deve ser coincidência, mas soa a perseguição, a vingança, a derradeira ferroada nos resquícios do governo liderado por Passos Coelho. Em todo o caso, estes factos exprimem outra realidade. Doa a quem doer, já se começam a sentir os apertos das extravagâncias orçamentais e de gestão da geringonça. Às mãos largas seguem-se os pés chatos - a marcha da riqueza ficou comprometida. A Função Pública é uma espécie de mula para toda a carga. Puseram-lhe uma bela cenoura à frente do chanfro, mas aumentaram a distância entre a leguminosa e a fuça do funcionário. O Partido Socialista (PS) dá e tira. Deu ao Partido Comunista e tirou à CDU. Emprestou ao Bloco de Esquerda, mas penhorou a Catarina Martins. Meus senhores, isto vai acabar à estalada. Primeira regra dos negócios: nunca trair os parceiros. O PS constituiu sociedades de paz e progresso a jusante e a montante, mas foi avalista de si mesmo. Deu-se como garantia maior, mas o cheque político está careca. É tudo uma questão de crédito. Ou acreditamos ou não.
Catarina Martins nunca produziu o que quer que fosse na sua vida (incluindo ideias originais). Catarina Martins nunca gerou um emprego (a não ser aquele que abarbatou na geringonça e que deve ao Costa). Catarina Martins não estudou economia nem finanças (andou pelo teatro). Catarina Martins não entende o que representa um risco de investimento (nem sabe o que é uma start-up). Catarina Martins não sabe gerar riqueza (e muito menos repartí-la). O que Catarina Martins sabe, e bem, é tirar do bolso dos outros. A afirmação que produz: "Há rendimentos que não são do trabalho, que não são salários nem pensões. São pessoas que têm muitos rendimentos de capital ou de propriedade e que deviam ser obrigadas a englobá-los para pagarem uma taxa proporcional” confirma inequivocamente que a menina não percebe patavina sobre o significado de capital, meios financeiros e muito menos rendimentos. Os rendimentos de capital que refere (acções e títulos financeiros de outra natureza) correspondem à retribuição devida àqueles que se dispuseram a acreditar nas virtudes de uma unidade produtiva. Quando um indivíduo adquire uma posição accionista (seja pequena ou seja grande) de uma empresa, está de facto a financiar a operação, está a conceder um empréstimo e está a correr um risco (a operação produtiva pode correr bem ou não) e, naturalmente, de acordo com o desempenho (se positivo) da empresa em causa, o retorno há-de acontecer, quer na forma de dividendos, quer na expressão de mais-valias. Ora ao penalizar quem empresta à economia de um país, e em particular os privados, o ónus do risco e do investimento recai sobre o Estado de um modo ainda mais intenso. E é aqui que reside grande parte da sua argumentação falida. A missão do Estado não é a geração de riqueza ou a obtenção de mais-valias - esse papel é da responsabilidade do sector privado. Subsiste porém outra contradição infantil no seu enunciado. Como se pode beneficiar a classe média, se é esta mesmo que tem a propensão para investir em veículos financeiros como acções? Ou seja, Catarina Martins propõe uma bastonada na classe média para depois lhe passar a mão de admoestação pelo mesmo coiro. Por outras palavras, não se pode tirar a quem nos dá pão para a boca - a classe média não pode ser simultaneamente castigada e premiada. Eu já disse vezes sem conta: erros de casting pagam-se caro. Mas ignorância deste calibre não tem preço. Não existe mercado para tal. Se deixarem a rapariga se esticar, ela matará o tecido empresarial do país que deixará de se poder financiar em condições e gerar emprego. Catarina Martins é mesmo ignorante. Se ao mesmo tivesse lido Marx, saberia que a teoria do valor (e onde o mesmo reside) é complexa. Mas ela não faz caso disso. Leva tudo pela frente.
Uma emissão de dívida a 10 anos acima dos 4% nunca pode ser considerada um sucesso - "ter corrido bem". Por que razão deveríamos confiar em analistas e corretores de bolsa? Esses profissionais vivem da volatilidade, respiram especulação e irradiam a ideia de atalho económico - dinheiro fácil. Não são estes os médicos que devem ser consultados. Aliás, nem sequer são médicos. Tentam, a todo o custo, com SIVs (special investment vehicles) e outras receitas, alavancar ganhos e ignorar perdas. Os seus clientes são na maior parte dos casos uns borra-botas com ambições de Gordon Gekko, mas que não passam de tristes com carteiras compostas por títulos nacionais que "dizem conhecer melhor" e que por essa razão parva "confiam mais". No entanto, a concorrência do mercado de títulos de dívida é feroz. Não vejo porque razão um investidor no seu perfeito juízo arriscaria emprestar dinheiro à geringonça. Existem destinos de investimento mais sensatos, mais conservadores e mais rentáveis. E falo da Europa. Com tanta coisa boa ao dispor do freguês na mercearia, por que raio iria eu comprar títulos de DÍVIDA portuguesa? Prefiro olhar para titulos de CRESCIMENTO de pequenas, médias ou grandes empresas. Só um louco - como o Banco Central Europeu -, é que compra batatas podres. Mas cada um sabe de si, mesmo que aqueles que vos governam não tenham a mínima ideia do que andam a fazer. Chamem-lhe oxigénio, chamem. Génios.
Não sou economista. Fiz uma cadeira do curso no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) - a casa-mãe-fornecedora de uma grande leva de economistas-socialistas - pensem Constâncio. Curiosamente, a única cadeira que completei antes de mudar de curso (para Relações Internacionais) era considerada um bico de obra: Estatística (I). Ou seja, sou a última pessoa à face da terra para oferecer modelos de salvação económica, seja de inspiração Chicagiana, ou seja com o sopro bafejado por Hayek. Em termos de mercado, posiciono-me do lado da oferta de perguntas, esperando que os técnicos de serviço possam procurar e conceder a resposta. O Governo de inspiração orçamental afirma que todos os pressupostos de aprovação do mesmo foram apresentados nesse mesmo documento. A minha pergunta é simples: quanto custa? Qual o custo de oportunidade de cada empregado? E qual o rendimento marginal de cada pensionista? Eu sei, eu sei. Depende de muita coisa. Blá blá blá, blá blá blá. Então simplifiquemos. Nesse caso, peço apenas uns rácios (sim, de racionalidade). Qual a relação entre a colecta de impostos e a geração de emprego? Em que medida as receitas fiscais impactarão a procura de emprego? De que modo os fundos provenientes do imposto sobre valores patrimoniais acima dos 600 mil euros contribuem para a dinamização de empresas? Talvez esteja a perguntar aos cientistas errados. Estas questões de linearidade talvez pertençam a outro domínio de pensamento directo. Cada vez que emitem uma nova guia de remessas tributárias atravessa-se-me pelo espírito uma sensação estranha - de vazio comportamental. Ninguém me conseguiu explicar cabalmente as ligações sinápticas entre uma coisa e outra. A gordura que sai do pêlo de cada um vai exactamente para onde? Para um aterro de margens de erro? Os economistas-políticos, ou o contrário, são uma espécie perigosa. São experimentalistas com cobaias avulso. Prefiro uma estirpe distinta. Os puros. Aqueles que pensam e dissecam, mas não se pôem a inventar soluções governativas à custa do freguês.
Mário Centeno não é Sinel de Cordes. O ministro das finanças pratica outro género de humor. A sua comédia é mais do tipo absurdo. Agora anda a pedir para que invistam em Portugal. E aqui reside uma grande parte da contradição. Portugal não é, decididamente, investor-friendly. Se esta malta da geringonça fosse inteligente já teria criado onshores - zonas de exclusão fiscal no país continental, e em particular nas zonas mais afectados por altas taxas de desemprego, pobreza crónica e ausência de tecido industrial. Simples. Já teria criado mecanismos de financiamento ao nível autárquico como acontece nos Estados Unidos - nunca ouvi falar de municipal bonds - títulos de dívida para financiar obras em concreto que se venham a desenvolver nas autarquias. Mas há mais matéria de nível infantil que não está a entrar na cabeça de Centeno. Um dos pressupostos que empresta confiança a um país consubstancia-se no seu grau de checks, controls and transparency. Ora a Caixa Geral de Depósitos está a ser protegida pelo governo que não apoia a ideia de uma comissão parlamentar de inquérito a seu propósito. Por outras palavras, um investidor estrangeiro nem sequer pode contar com o due diligence do governo nacional. Depois somos confrontados com outra barbaridade do mercado contaminado por preferências ideológicas. As "desprivatizações" em curso enviam um sinal claro a potenciais investidores - Portugal tem sintomas de Venezuela. E isso segue em sentido contrário à ideia de investimento seguro. Sabem lá essas multinacionais se a geringonça de repente decide afiambrar-se do que não lhe pertence com uma taxa inventada à pressão? O Commerzbank tem razão no que afirma. Portugal inverteu o rumo iniciado pelo governo anterior, mas essa mudança de sentido de marcha não melhorou nem o nível de vida dos portugueses nem as condições de atracção de investimento directo estrangeiro. O Centeno e os outros que andam em Paris nem sequer são capazes de esboçar um pacote de oferta para aqueles que venham a ser intensamente afectados pelo Brexit. Afinal o que anda Centeno a inventar para captivar algum incauto? Só pode ser ficção. Um conjunto de baboseiras.
A aceleração dos pedidos de reforma antecipada nos últimos 5 meses exige uma interpretação minuciosa. Indica certas aflições. As pessoas entre os 55 e 60 anos já viram governos e mais governos passar-se-lhes à frente. Já sentiram maior ou menor segurança em relação ao seu futuro. Já viveram intervenções do Fundo Monetário Internacional. Já tiveram de apertar o cinto vezes sem conta. O governo de inspiração socialista e natureza solidária não parece instigar grande confiança nos cidadãos portugueses perto da idade de reforma. Os governos socialistas, dada a sua natureza, dependem de um vasto corpo de legionários públicos. Foram esses funcionários que os elegeram à luz da certas promessas salariais e a reposição de privilégios. O actual governo anda um pouco baralhado. Por um lado, sem o declarar, gostaria de pôr a correr as brigadas infindáveis de trabalhadores do Estado e por outro lado irá sentir dificuldades de tesouraria para fazer face à grande demanda de reformas antecipadas. Ou seja, para continuar a merecer o estado de graça dos "seus" eleitores tem de continuar com a conversa do primado do funcionalismo público, mas sabe que tem de atenuar o fardo financeiro das reformas antecipadas. Os contribuintes deste escalão laboral, que já foram enganados vezes sem conta por governos de todas as cores e feitios, ainda têm instinto de sobrevivência. Querem fugir da casa que está prestes a arder. Já toparam as fagulhas. E não acreditam nos bombeiros.
Estava inclinado para escrever sobre o mais recente desabafo (recado?) de Cavaco Silva que partilhou uma parte do seu currículo, referindo que também tem experiência profissional na liderança de governos de gestão e que se recorda bem desse serviço político. Não é preciso ser grande decifrador para perceber que pelos vistos António Costa deve ficar apeado. O presidente da república tem todo o tempo do mundo para receber em audiência quem bem entender. Mas não está sozinho nessa corrida. O líder socialista António Costa reuniu-se com a malta dos bancos ainda antes de Cavaco Silva, para ver se lhes consegue prometer condições mais vantajosas do que aquelas oferecidas pelo governo de coligação. Não há mal algum nestas movimentações. O que acho questionável é António Costa ter reunido com os banqueiros no Hotel Ritz. Não sei quem pagou a conta (Sei, sei. Fomos nós), mas teria sido mais simpático se a reunião tivesse ocorrido num local menos faustoso. Das duas uma: ou não foi António Costa que escolheu o local do encontro ou António Costa não teve pulso para propor outra residencial - o Ibis não teria sido mal pensado. Poderia servir para contrariar a ideia de que os socialistas são despesistas. Ah! Agora entendo a frase: o encontro não estava incluído na agenda oficial de António Costa. Mau! Então, foi um convívio de amigos, com fados e tudo? Sem conversa entediante? Temas políticos, por exemplo? António Costa ainda nem sequer começou o que quer que seja, mas parece estar a replicar o seu amigo esquecido José Sócrates. Não sei, não. Pouca sorte tem tido António Costa com esta história de Paris. Aquela tragédia fez com que Cavaco Silva fosse ainda mais ponderado. Foi à Madeira e tudo. Ritz-te, Ritz-te!
Quem vai receber Yanis Varoufakis à Portela? O ministro das finanças grego está em tournée europeia, e embora ainda não tenha sido noticiado, Portugal deve constar do seu rol de visitas. Apenas sabemos que existem uns quantos em território nacional que já se estão a acotovelar, a dar uns empurrões para ficar bem na fotografia. É assim que funciona em política, seja qual for a causa, a missão a cumprir. A Catarina Martins, a Ana Drago, o Jerónimo de Sousa, ou mesmo o Daniel Oliveira, devem ser os candidatos com ganas de mostrar os cantos à casa - a desgraça que nada tem a ver com a tragédia grega. Nesse dia de recepção, António Costa encontrará uma desculpa para se esquivar - quiçá, a inauguração de mais uma ciclovia. Mas o amigo Yanis não vai ficar muito contente. Então malta? O que se passa? Na Grécia, Syriza! Em Espanha, Podemos! E em Portugal, nicles batatóide? Pois, sabe Dr. Varoufakis, aqui a malta tem dificuldade em instigar a mudança. Pode dar-nos uma ajudinha? Umas dicas. Mas a verdade é que nem Tsipras nem Varoufakis têm algo para oferecer. Aliás, a cada hora que passa as probabilidades de reestruturação da dívida são cada vez mais ténues. Vejam-se os números das casas de apostas. Estudem o comportamento das taxas de juro, das condições de mercado cada vez que sopram ventos de utopia financeira. Se Varoufakis pretende chegar a um acordo com credores deve meter-se no expresso e zarpar rumo aos Goldman Sachs e Rothschilds deste mundo. Se realmente quer marcar a diferença e cortar relações com a Troika e os interlocutores formais da União Europeia, deve demonstrar que consegue ser criativo e original. Para já o duo Tsipras-Varoufakis conseguiu conquistar o poder, muito à custa do rasgo visceral de uma população derreada pela Austeridade, ávida de pão e vingança. Pensando bem, vir a Portugal é uma perda de tempo. Nenhum dos esquerdistas radicais de ocasião que acima referi percebe patavina de como funciona o mundo. Não pretendo ser cínico com este desabafo. Mas, meus senhores, as grandes decisões já foram tomadas. O resto são flores de estufa. Decoração.
«Mais eis que, agora livres do peso de funções oficiais, ao abrigo do invejável título de ex-ministros, tudo o que dizem parece estar certo e carregado de sensatez, quando antes era tudo ao contrário. Agora têm soluções para todos os problemas e conseguem detectar falhas de calibragem na mais discreta medida. Curiosamente, se a memória não me falha, desde que aderimos à UE nenhum ex-ministro das Finanças alguma vez regressou à função em data posterior. Trata-se de uma infelicidade nossa porque, muito claramente, o ideal era ter um ministro das Finanças que fosse um ex-ministro das Finanças. Como o circuito da carne assada das conferências nos demonstra repetidamente, um ex-ministro das Finanças que fosse ministro das Finanças endireitava Portugal em 100 dias.»
Paulo Gorjão, «A sapiência que chega sempre atrasada», no Bloguítica.
(brevemente)
Há palavras que não devem ser utilizadas no jargão diário dos políticos. Uma dessas palavras é "garantia". A garantia pressupõe sempre a reparação do equipamento em caso de avaria. Ora a ministra das finanças garante que o défice não ultrapassará os 5,5%. Refere-se ao orçamento como se de um rádio se tratasse. Como se fosse fácil substituir o transístor queimado por outro e continuar a ouvir a música. Todos sabemos que em política, mais do que noutras disciplinas diletantes, o que é verdade hoje não significa que amanhã o seja. Já sabemos qual vai ser a justificação para a inesperada derrapagem dos números: o INE diz uma coisa e o Eurostat outra (e no meio não está a virtude). Porventura a garantia que refere com tanta convicção tenha uma validade de apenas 24 horas (não sei, é ler a letra miudinha). Realmente, devemos ficar com os cabelos em pé quando nos vêm com estas certezas absolutas. Há tantos factores endógenos e exógenos que podem fazer descarrilar as contas. Até uma criança seria capaz de elencar os riscos inerentes às previsões. Parece que a ministra das finanças não vive neste mundo de precalços e surpresas desagradáveis. Querem uma lista incompleta de catalizadores de escorregadelas? Cá vai: a impossibilidade do governo se financiar no curto e médio prazo por não conseguir regressar efectivamente aos mercados; a continuação do fortalecimento do euro face ao dólar, o que afectará o "bom ritmo" das exportações; uma escalada inesperada do preço do crude nos mercados internacionais decorrente de um evento excêntrico (uma guerra ou a escalada da situação na Síria); o agravamento dos juros de dívida nacional em consequência do mau comportamento das economias francesa ou italiana (ou seja, o efeito de contágio de outros países); o efeito das greves e manifestações nas receitas e em sede de IRS e IRC; as remessas de emigrantes que deixaram de ser repatriadas (porque afinal é melhor não regressar a Portugal); a possibilidade de uma catástrofre natural para juntar às políticas, e por último, a própria falência do avalista. A possibilidade do fabricante declarar insolvência e dar como nulas as claúsulas contidas na tal garantia. A hipótese do governo, e por arrasto o Estado, deixarem de funcionar numa lógica de último garante da nação. Pois é. Não sei se lêem com atenção aqueles certificados que geralmente acompanham a aparelhagem novinha em folha? Aquele documento que traz um selo prateado, a marca do fabricante e que se designa por garantia? O que diz, preto no branco? Diz que se mexerem no mecanismo interno a garantia vai à vida. Cá para mim o governo já mexeu vezes sem conta no mecanismo interno e já meteu os pés pelas mãos, que o cidadão nacional não pode dormir descansado com a cabeça encostada ao travesseiro da garantia. Decididamente, e há já muito tempo, as garantias políticas passaram a significar algo diverso - um sinónimo de falsa promessa.