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De boas intenções está a autarquia cheia. Carlos Moedas é bom rapaz e educado, mas convenhamos, a cidade de Lisboa não está melhor. Bem (mal) pelo contrário. A capital é suja e ruidosa. Mas muito mais grave — a cidade já não pertence aos alfacinhas. Posso debitar à vontade sobre o assunto, mesmo sendo um eterno refugiado. Estou em Portugal há mais de 40 anos e bato-me pelo país e a capital com maior intensidade do que grande parte dos compadres. Sou um genuíno patriota. Só falta mesmo adotar a nacionalidade, embora não seja necessário para fazer honra à identidade e a cultura deste país. Até já escrevi um livro sobre Portugal a bater e a elogiar, na mesma demão, em cada página, e naquelas por escrever. Custa-me ver os portugueses expulsos do seu habitat. Os sucessivos presidentes da Câmara Municipal de Lisboa, de um modo consistente e ganancioso, estenderam a passadeira às massas turísticas, aos estrangeiros endinheirados, fazendo de seus inimigos bairros tradicionais e costumes locais. A folclorização de Lisboa arrastou consigo os tuk-tuks e as lojas da pseudo-portugalidade. Não sei ao certo como reverter a situação, porque questiono se os políticos o desejem — o regresso a um estado cada vez mais ténue, distante. E aí reside grande parte do problema — o provincianismo declarado ou dissimulado dos governadores do concelho: A falta de cultura, ensaiada por intelectuais (que palavra suja!) como Eduardo Lourenço, em tomos incontornáveis, de pouco consolo serve. Esse défice de leitura é a culpada radical, o extremo mental que habita dentro de portas, no gabinete e na tesouraria. A ausência de (auto)percepção, a falta de visão civilizacional dos lideres também é da responsabilidade das gentes. Um povo encantado por promessas de grandeza, estrofes históricas, que se deixou carregar para a subúrbia acrítica, deslavada e inconsequente. O eleitor que também esfregou as mãos estendidas em busca de um módico rápido. A situação é grave. A paisagem, habitada por espécies invasivas, já não pode ser acalentada em estufas frias. As tribos vivem agora em reservas, arriscando a sua própria extinção. A divisa alfacinha já não vale grande coisa.