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Os professores vêm de muito longe. A sua classe será porventura a que mais se sujeita a surrealidades políticas e logísticas. Não vale a pena mencionar o drama sustentado da colocação de professores ou a inadequação de salários. As escolas são as ETAR da matriz cultural, do nível sócio-económico do país. Tudo o que de ruim é gerado em casa sai porta fora e aterra na sala de aula. Os professores não leccionam apenas disciplinas. Apanham as maleitas todas; a falta de educação dos alunos, os vícios de comportamento enunciados em casa pelos pais e os insultos descabidos. Enfim, poderemos concordar que têm sido o saco para esmurrar, a cuspideira do barbeiro, a casa de banho pública manchada pela urina canina. Ser professor não acaba ali ao último toque. Os docentes acartam às costas papelada para rever, testes para corrigir, documentos para conferir e, acima de tudo, enormes dores de cabeça. Falam de calmantes e diazepan? Aposto que são os professores que mais consomem desses comprimidos. Assistimos hoje à continuidade, ao mesmo paradigma, e por extensão, ao mesmo grau de desagrado, de insatisfação, de ameaça à integridade física e mental dos professores. Quando António Costa diz que não tem onde ir buscar 650 milhões de euros adicionais para repor os quase dez anos de castigo da classe docente, corrobora toda uma abordagem negativa. Valida o executivo de Passos Coelho, e se quisermos, de todos eles, de António Guterres a Cavaco Silva. Não houve, desde o Portugal democrático (da educação universal) até aos dias de hoje, uma abordagem definitiva, integral e trans-ideológica. Foram sobretudo os socialistas, parentes das confederações e sindicatos, que fizeram da classe docente gato-sapato, usando o seu lastro para ir e vir nas demandas, eleger deputados e ganhar votos. Os professores por seu turno, não têm onde agarrar, e lá aparecem uns Nogueiras e pelo menos dois Carlos, para cantar da ardósia penada um conjunto de estrofes de ocasião. O metódo negocial que praticam é deveras estranho, fragmentado. Às vezes são as colocações o prato do dia, mas na época seguinte já é o dinheiro "cativado" por regimes mais austeros. Francamente não entendo esta lista de supermercado às pinguinhas. Se é para partir a loiça toda e começar de novo, então eu exigiria uma revolução total com destino final. Mas não. Os sindicalistas usam outra abordagem. Uma sequência de protestos como se o problema não fosse curricular, integral. Um apagão completo, um reset - de tudo ou nada. Greve absoluta.
O secretário-geral da Federação Nacional de Professores (Fenprof) revela que nada percebe de ensino. Um professor nunca deve chamar de imbecil a um aluno que coloca uma pergunta que ele julga despropositada, infantil. Não existem questões inferiores e perguntas superiores. Em Democracia todas as dúvidas fazem parte do método socrático e devem ser partilhadas. (eu sei, é uma má escolha de exemplo filosófico por causa do outro que aparece na TV aos Domingos). E já que o Nogueira tanto percebe de formação democrática e observa um enorme défice nas camadas jovens, talvez possa abrir uma escolinha na rua de São Caetano à Lapa onde vivem as tias e os enteados. Mas retomando a pergunta sobre os dinheiros que os sindicatos recebem ou deixam de receber, e uma vez que são os filiados que sustentam a missão sindical, serão os membros da Fenprof que devem perguntar se o seu dinheiro está a ser bem gasto. Serão os professores que terão de saber se houve um retorno satisfatório sobre o investimento, a sua dízima. Devem inquirir se o seu representante está coligado com outras partes, qual a sua agenda e quais os interesses em causa. Todas estas questões e outras que me escapam devem ser obrigatoriamente colocadas pelos accionistas do consórcio Fenprof. Porque, para todos os efeitos, se os professores pagam quotas e são detentores do capital da Fenprof, serão eles que terão de pedir contas ao CEO. Um sindicato, por mais sagrado que seja, deve responder perante a lei e às questões colocadas em abstracto ou em concreto por qualquer força política ou partidária. Só assim se pode credibilizar junto dos seus representados. Já agora, gostaria de saber se na Fenprof há diferentes categorias de sócio? Se há diversos escalões de acordo com as orientações políticas dos professores? O jubilado Nogueira, ao tentar intimidar os jovenzinhos do PSD, e ao chamá-los de ignorantes, está também a chamar de besta quadrada aos professores sociais-democratas. E esse dogmatismo não pode ser aceite dentro e fora da sala de aulas. Por esta ordem de ideias convém escolher a dedo os lideres sindicais. A selecção deve obedecer a um critério cego, surdo e mudo quando se trata de ideologia. O Mário Nogueira revela as suas preferências, mas teria sido melhor que não viesse a público partilhar o óbvio. Gostaria de aproveitar esta ocasião para perguntar novamente quanto recebe a Fenprof do Estado? Perdão. Não sabia que era uma pergunta proíbida. Este tipo de auto-censura deve ser influência dos livros do tempo de Salazar. Os livros que não li, mas de que ouvi falar.
Já há que tempos tinha entendido o porquê da prolongada vigência do Regime Corporativo da 2ª República. O país por ela formatado da esquerda à direita, gostou e quer, noutros moldes, continuar na mesma.
Deixem-me tentar entender qualquer coisa mais. Os professores fizeram greve aos exames e estando outros testes marcados para 2 de Julho, ninguém garante que suas excelências não decidam outra paralização exactamente para esse dia e com alguma pouca sorte, por aí fora, verão abaixo. Os alunos que pretendiam ir a exame e não o conseguiram devido à greve, invadiram as salas onde os seus colegas estavam a prestar provas. Se queriam mesmo ir a exame, o que terão dito aos professores em greve? Nada lhes ocorreu?
Cá fora desataram a berrar a Grândola e, vá lá por esta vez, A Portuguesa. O texto do Público é tão confuso como a situação:
“Esperemos que os exames não sejam considerados. Se houve alunos que os puderam fazer e outros não, têm que ser anulados”, reclamava, apelando à “equidade”.
Como assim?
"Na escola de Maximinos, todos os alunos realizaram a prova porque havia professores suficientes para vigiar as seis salas de aula onde foram feitos os exames. Mas os docentes foram recebidos com “assobios e apupos” pelos alunos, conta fonte da direcção."
Afinal queriam ou não queriam ir a exame?
"Francisco diz “compreender” as razões da greve dos professores, ainda que se sinta “prejudicado” pela decisão de fazer greve nesta segunda-feira. “Já tinham feito greve às reuniões de avaliação”, comenta, sugerindo que o protesto talvez pudesse ter ficado por essa acção.
A sua colega de turma Beatriz Simões teve sorte diferente e foi uma das estudantes da maior escola de Braga a realizar a prova de Português. Agora encara a possibilidade desta ser anulada em resultado da greve. A brincar, diz que só terá uma opinião sobre essa hipótese “quando souber a nota” da prova. Mas acaba por reconhecer que essa talvez seja a melhor solução para resolver o problema, ainda que espere “poder ficar com a melhor nota das duas”.
Credo...
Esta deve ser mais uma daquelas originalidades ao estilo da actual preocupação de Jerónimo de Sousa, muito aflito pela longínqua hipótese de as eleições autárquicas "poderem" realizar-se a 13 de Outubro, uma grave ofensa aos católicos que querem ir em peregrinação a Fátima! Aqui temos um PC mais papista que S.S. o Papa.
Ou tudo isto não passa de mais um episódio da guerrilha política em curso, ou então, a loucura definitivamente prevaleceu.
Há um professor que nunca fará greve. Existe um professor que prepara cada uma das suas aulas com afinco. Há um docente em particular versado na arte bibliográfica. Existe um professor que sabe sempre tudo. Há um professor que lecciona sempre acompanhado por uma assistente que muitos julgam ser uma vulgar contínua. Há um professor que responde às perguntas colocadas na maior sala de aulas do país. Há um professor que vai a todas, mas que em última instância, não é a paixão pela educação que o move. Contudo, não será a crise a empurrar este professor para fora da escola em busca de melhores condições de vida. Não será o desgaste excessivo e a indignidade a forçar este professor a buscar tratamento. Não haverá um atestado sequer ou uma baixa médica para tratar do esgotamento. Este professor, depois de acabar com o programa de tele-escola, abandonará todos os ciclos para se submeter ao escrutínio nacional. Este professor estará disposto a ser colocado numa freguesia que não fica assim tão longe. Este professor até nem se importa das horas extraordinárias. Pois é. Não me parece que o prof. Marcelo Rebelo de Sousa faça greve quando as inscrições para candidato presidencial forem abertas. O único problema que vejo tem a ver com a assistente. O que faremos com ela?
A pergunta é simples: quem quer ser professor por um dia que seja? Quem deseja acartar injustamente com os pecados e os défices dos outros? - A educação que não foi dada aos alunos pelos papás e pelas mamãs. A má criação que escoa directamente da sarjeta para a sala de aula. Quem quer trabalhar de acordo com modelos que não se adequam ao perfil cultural do país? Como podem constatar, tinha colocado uma pergunta que afinal se desdobra em muitas sem resposta. Desde que eu me lembre, os professores tiveram sempre mobilidade e não era pouca. Era imensa, de norte a sul do país. Quem não conhece o professor de Trás-os-Montes colocado no Algarve? Aqueles que tiveram de abandonar as suas famílias e prescindir de uma ideia de continuidade na residência, o sonho de viver na terra de origem. A profissão foi quase sempre malentendida pelos governantes de Portugal. Houve até quem a quisesse canonizar elevando a missão educativa a acto de fé, a bandeira de partido. Lembram-se de Guterres e a sua paixão? E houve outros como Roberto Carneiro que foram também cardeais da causa. Estou certo que mesmo que pagassem uma tarifa tripla a prospectivos docentes, não seria líquido que aceitassem o emprego. Por vezes não há dinheiro que chegue para pagar os ultrajes. Conseguem imaginar leccionar na franja da sociedade uma qualquer disciplina do programa curricular, quando no fundo estão a operar a múltiplos níveis que deveriam ser tratados por psícólogos, técnicos de reinserção social e polícias? Os professores levam para casa tantas horas extraordinárias que deixaram de ser horas, considerações de ordem pedagógica, trabalhos de casa, e, para além dessa normalidade, são obrigados a sacar da sua consciência para levar a bom porto uma barca tempestiva repleta de repetentes de um sistema caduco. Não existe repelente que consiga afastar dos professores os pesadelos, o stress, a insónia antecipada pela semana que se segue. A outra questão que coloco: quem quer ser manifestante por um dia apenas? Quem deve caminhar ao lado dos professores, se grita em nome dos docentes e de Portugal? Vou directo ao assunto. Se António José Seguro sente o mesmo ardor no peito que Guterres sentiu, então deve estar nas ruas, lado a lado com aqueles que alegadamente foram intimidados pelo governo, mas o lider socialista, se não está em Roma com o Papa, está noutro encontro ecuménico. No meio destes confrontos e da greve aos exames nacionais que se avizinha, os alunos irão agravar ainda mais a sua débil condição de aprendizagem. Na Segunda-feira provavelmente irão regredir na sua capacidade de expressão em língua portuguesa, a que se seguirão mais murros nas restantes disciplinas. Resta saber se os milhares de alunos devem ser tidos enquanto moeda de troca, ou se chegará o dia em que os próprios alunos se manifestam, para rejeitar de uma assentada, e em simultâneo, os políticos e os professores. A linha ténue que separa a sustentabilidade cognitiva e pedagógica do país, do perfeito caos, está a ser pisada. Qualquer dia para haver alunos nas salas de aulas teremos de ter uma requisição estudantil. Repito a pergunta: quem quer ser presidente do conselho directivo? Quem quer ser presidente? Quem quer Portugal?