Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
No programa de governo hoje apresentado anuncia-se a intenção de eliminar o IMT e garantir financiamento a 100% do crédito à habitação para os jovens até aos 35 anos.
Tenho 37 anos, um vínculo laboral precário, e pago, em conjunto com a minha mulher, uma renda de quase 1500 euros num concelho limítrofe de Lisboa, cidade onde trabalhamos. Não beneficiamos de uma rede de suporte familiar em termos financeiros, atravessámos crises económicas sucessivas desde 2008 e temos tentado, na medida do possível, amealhar para adquirir habitação própria, o que se tem tornado verdadeiramente utópico num país com rendas exorbitantes (na região em que trabalhamos), condições de acesso ao crédito restritivas e (mais) um imposto absurdo, o IMT, que se constitui, em conjunto com a exigência de uma entrada de 10% do valor do casa, num enorme obstáculo, especialmente num contexto em que a especulação imobiliária vingou perante a inércia dos governos anteriores, tornando os preços da habitação incomportáveis para milhares de pessoas que se encontram em situação idêntica à nossa.
Impõe-se perguntar: por que raio seremos agora excluídos de uma medida que beneficia os que têm até 35 anos em vez de criar condições equitativas para todos aqueles que necessitam de adquirir uma primeira habitação neste contexto particularmente exigente e desafiante?
Que sentido faz introduzir esta distorção no mercado, privilegiando um segmento etário à custa de outros que estando há anos a lutar para ter uma primeira habitação própria se vêem agora completamente marginalizados pelo governo da AD?
Por que razão somos excluídos de uma medida essencial para as nossas vidas por um critério totalmente arbitrário assente exclusivamente na idade?
Daqui se deduz que, para a AD, todos os que têm mais de 35 anos e se vêem na contingência de pagar rendas exorbitantes e não conseguir adquirir habitação própria servem essencialmente para pagar impostos. Que miséria de país.
Que se faça então jurisprudência, cerceando-se as extorsões e abusos.
Tudo o que se tem dito acerca deste assunto, pertence ao domínio do óbvio e ao longo de muitos anos, as intenções ficaram-se pelo enunciado. Pretende-se um melhor funcionamento do mercado de arrendamento e para isso são apontadas algumas necessidades, como:
1. Dinamização do sector imobiliário. Esperemos que isto não signifique a continuação da desastrosa política de construção que tem desertificado os centros urbanos e levado a população a estabelecer-se nas caóticas periferias. Tem sido este o "dinamismo" do sector imobiliário nacional, aliás em clara convivência com os interesses da partidocracia na sua definição mais ampla (bancos e sociedades anexas, entidades municipais, "obras públicas", etc).
2. A mobilidade das pessoas. Um princípio baseado em exemplos exteriores e que poderá ser exequível se existir trabalho e as necessárias infraestruturas que garantam às famílias, as condições que permitam o seu desenraizamento. É uma intenção de bastante duvidosa concretização.
3. Redução do endividamento das famílias. Poderá ser um fim que apenas venha a afectar o sector dos empréstimos bancários, o da dívida galopante. Este endividamento poderá baixar significativamente, no caso do mercado de arrendamento proporcionar preços aceitáveis e compatíveis com os baixos índices salariais praticados em Portugal. Em 1974, uma renda de habitação equivalia a cerca de 1/3 do salário do "homem da casa", enquanto hoje, em 2011, normalmente equivale à quase totalidade do dinheiro recebido no mês. Na capital portuguesa, os preços praticados pelo mercado do arrendamento são absurdamente elevados, se os compararmos com os níveis salariais e das rendas que se praticam nas outras capitais europeias. A situação torna-se caricata, se levarmos esta comparação ao estado em que se encontram os imóveis. Os preços incitam à falta de cumprimento da obrigação do pagamento de rendas e levam aos conhecidos processos de despejo que entopem tribunais e à mútua falta de confiança entre senhorios e inquilinos.
4. Facilitar despejos e colocar um ponto final nos abusos dos trespasses e eternização de rendas antigas, alguns dos males que têm corroído o parque imobiliário português. Não havendo agora o recurso ao crédito fácil e barato, como poderão ser os senhorios ajudados a recuperar os seus imóveis? Aqui está uma questão premente e de difícil resolução.
Parecem acertadas, as medidas que o governo tenciona implementar com o fim da colocação de mais imóveis no mercado de arrendamento, protegendo os interesses dos senhorios. No entanto, estas medidas deverão ser acompanhadas por outras, tais como:
1. Legislação e respectiva fiscalização quanto ao estado em que os imóveis se encontram quando colocados para arrendar. Em bastos aspectos, Portugal é um país do terceiro mundo e os senhorios alegremente colaboram nesta situação, praticando preços que ultrapassam em muito, as reais possibilidades de pagamento dos inquilinos. Casas degradadas e sem as mínimas condições de habitabilidade - saguões imundos, escadas inseguras, quartos de banho em ruína e sem canalizações adequadas, vidros partidos, janelas emperradas, cozinhas arcaicas e sem préstimo, infiltrações e humidade, paredes degradadas e soalhos apodrecidos -, deverão ser obrigatoriamente adequadas à necessidade de ocupação pelos inquilinos. Até hoje, o caos que tem imperado, obriga quem esteja interessado em arrendar uma casa, a proceder por sua conta às obras de restauro, desde as pinturas à colocação em funcionamento da rede eléctrica e canalizações, ao mesmo tempo que as rendas atingem preços astronómicos e em clara contradição com o poder de compra do arrendatário. Esta é uma verdade inegável. Estamos numa época "quase soviética", em que as famílias são obrigadas a partilhar a habitação com pessoas exteriores ao seu núcleo, recorrendo à cedência de quartos em troca de uma renda não declarada, numa transumância de cumplicidades involuntárias: o senhorio fecha os olhos ao sub-arrendamento, pois isso permiti-lhe o recebimento de uma renda elevada e desproporcionada ao valor da fracção. Mais ainda, os trabalhos de recuperação executados pelos inquilinos, jamais são compensados em deduções sobre a renda ou no acto de saída, pelo pagamento parcial daquele injusto porque quase forçado benefício a favor do detentor da propriedade. Assim sendo, às rendas elevadas, há que acrescentar o preço das obras de beneficiação que correm quase sempre por conta do arrendatário. Um esbulho que decorre da necessidade de quem arrenda.
2. O governo é omisso quanto ao problema da invasão do sector terciário bem estabelecido em edifícios originalmente construídos para habitação e que ao longo de décadas viram os seus ocupantes despejados e substituídos por escritórios. Isto significou a expulsão da população, o estiolar do comércio tradicional, a degradação galopante dos imóveis, a descarada fuga ao fisco - os senhorios não têm declarado as parcelas como arrendamento comercial -, o aumento da insegurança urbana devido à desertificação de vastas áreas citadinas. Urge criar um mecanismo de apertado controlo que dificulte o estabelecimento de empresas/escritórios nos edifícios de habitação e incentivar a sua mudança para outros construídos especificamente para esse fim e que em numerosos casos - a zona das Avenidas Novas de Lisboa é um flagrante exemplo - se mantêm durante anos vazios devido aos exorbitantes preços exigidos.
3. Na urgente coordenação de esforços entre o governo e as Câmaras Municipais, há que liquidar a situação de desmazelo e criminosa política de abandono da propriedade imobiliária municipal que deverá ser alienada em benefício do mercado da habitação. A colocação à venda destas propriedades condenadas à degradação e abandono, deverá obedecer a critérios que impeçam a sua apropriação por entidades - como certos "fundos imobiliários" como o do BES, por exemplo - que destinariam os imóveis à especulação, consequentemente demolindo-os e prosseguindo a actual política de descaracterização das cidades. A recuperação destes edifícios - na totalidade ou em parcelas - comprados a preços acessíveis por jovens e também por gente menos jovem, permitirá a reocupação populacional dos centros urbanos, a segurança dos mesmos e o prosperar de numerosas pequenas empresas de construção, proporcionando mais emprego e a dinamização de alguns sectores da produção nacional. A proposta que agora chega da CML pela voz da arq. Helena Roseta, padece de alguns males que prolongam a situação de favoritismo e de exclusão até hoje verificada. Forçar os compradores a incluírem-se em grupos, obedece à obsessão colectivista - beneficiando os citados "fundos imobiliários", talvez o verdadeiro móbil da pia intenção camarária - que reside nas mentes dos proponentes, ao mesmo tempo que a criação do "júri de escolha" de candidaturas - aqui está uma vez mais o Sr. Salgado e o autocolante F.I. BES -, atribui ao vereador do pelouro da habitação, o poder do favorecimento e livre arbítrio. Conhecendo-se o que se tem passado neste sector da capital, cremos que estas teóricas boas intenções pouco ou nada mais significam, senão a manutenção do status quo. A intenção parece boa mas deverá ser revista, abrindo a possibilidade de aquisição da propriedade a outros sectores etários.
Via Agência Financeira:
"Nos planos do PSD está ainda pôr o Estado a ajudar as famílias com dificuldades no cumprimento dos seus empréstimos bancários. «Boa parte já não tem dinheiro para pagar a casa. E se os juros aumentarem, como vão aumentar, estes casos vão aumentar. Ora bem, isto não pode ficar assim. É preciso apoiar as famílias que estão a perder a sua habitação», refere ao «i».
A solução já está pensada: «Tem de se fazer uma vaquinha entre três entidades: as famílias, o Estado e os bancos. A situação de cada família tem de ser analisada, se for caso disso (se se provar que a família é viável, trabalha, está decidida, tem empenho) tem de ser apoiada. A dívida dessa família ao banco tem de ser reestruturada, tem de ser prolongada e o Estado tem de suportar uma parte dos custos. O Estado tem de assumir a sua responsabilidade pelo facto de ter colocado um certo número de famílias na insolvência pelo corte de ordenados e pelo aumento dos impostos», explica."
Portanto, agora os meus impostos e os de todos os portugueses (extraídos coercivamente, como é óbvio) também têm que servir para pagar empréstimos contraídos pelas famílias (por sua opção), com a desculpa de que o Estado cortou ordenados - aos funcionários públicos - e aumentou impostos - a todos os portugueses -, logo reduzindo o poder de compra e a capacidade dessas famílias cumprirem as suas obrigações contratuais. Sem enveredar sequer pela brutal dificuldade de cálculo do que está em causa, obviamente apenas possível com uma pesada máquina burocrática que não conseguirá responder a curto prazo a estas dificuldades, e focando-me na injustiça em causa (dando alguns breves exemplos, porque deverá uma família que vive numa casa arrendada e com um baixo nível de rendimentos pagar o empréstimo à habitação de outra? Porque deverá uma família que vive numa casa arrendada, mesmo tendo possibilidades para comprar uma, pagar a ânsia que outra teve de contrair um empréstimo à habitação? E porque deverá um empregador pagar impostos para subsidiar o empréstimo à habitação de um trabalhador? Ou porque deverão os pensionistas e reformados ver os seus rendimentos congelados, depois de uma vida de trabalho, ao mesmo tempo que vêem outros a serem subsidiados no seu desejo - legítimo, mas não a expensas do Estado, vulgo, dinheiro dos contribuintes - de serem proprietários da própria habitação?) e que tal se se concentrassem em reduzir a gordura da máquina estatal e a enorme carga fiscal (o que seria mais justo, para todos)? Ah e acabar com a estapafúrdia lei das rendas, dinamizando o mercado de arrendamento, que a preços reais seria muito mais atractivo.
Se o PSD continuar a dar tiros nos pés deste calibre, é bom que o pessoal da S. Caetano se prepare para uma surpresa desagradável.