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Recomendam-se: Gravidade e Capitão Phillips

por João Quaresma, em 25.10.13
«Gravidade» de Alfonso Cuarón, com Sandra Bullock e George Clooney. Magnífico filme do realizador mexicano que, quando era rapaz, tinha o sonho de ser astronauta. Que melhor pessoa para escrever o argumento e realizar um filme espacial? Do princípio ao fim com imagens de grande beleza, bem escrito e realizado, sem nunca perder a atenção do espectador e com efeitos especiais excelentes e atentos aos detalhes, boa banda sonora e uma interpretação de Sandra Bullock que certamente lhe valerá galardões. Tem tudo para agradar a toda a gente... menos ao público russo.
Como aperitivo, sugiro um passeio espacial pelo mural no Facebook do astronauta italiano Luca Parmitano, que tem partilhado as suas fotos tiradas desde a Estação Espacial Internacional, AQUI.
«Capitão Phillips» de Paul Greengrass, com Tom Hanks no papel principal (um óscar provável), é um thriller baseado na história verídica do desvio de um cargueiro norte-americano por piratas somalis.
Sendo todos nós consumidores numa economia globalizada, compradores de mil e uma coisas feitas Ásia, de fruta sul-americana ou de borrego da Nova Zelândia, raramente nos lembramos de quem torna tudo isso possível ao manter as artérias do comércio internacional: a marinha mercante. E a vida de quantos navegam no Oceano Índico tornou-se mais difícil e arriscada quando surgiu o problema da pirataria baseada na Somália. «Capitão Phillips» elucida sobra esses riscos, de ataque e captura de reféns, consequência de uma actividade que alguns tentaram desculpar com a situação de pobreza extrema dos pescadores somalis. O filme dá essa grande lição: nada justifica o comportamento brutal que tem sido imposto a muitos tripulantes (e sofrimento das respectivas famílias, para já não falar nos danos à empresas envolvidas), e quem envereda pela pirataria é e será sempre um criminoso. O problema, que chegou a afectar a navegação no Oceano Índico e a desviar parte do tráfego para a Rota do Cabo, está hoje bastante diminuido por efeito da intervenção das marinhas de muitos países. Esta é, aliás, uma falha deste filme: cumpre uma lamentável tradição de Hollywood de omitir qualquer papel ou mérito a outros que não os norte-americanos e demais anglo-saxónicos, e quem vir «Capitão Phillips» pensará que a única força presente na zona para garantir a segurança da navegação é a Marinha dos Estados Unidos, quando na verdade se trata de um esforço multinacional envolvendo também forças navais do NATO, da União Europeia, da Rússia, Índia, Arábia Saudita, China e outras nações asiáticas, além da Austrália e Nova Zelândia.
A primeira metade do filme é excelente, com a acção a evoluir de forma dinâmica e realista. Mas a segunda parte alonga-se demasiado numa situação de alta tensão e violência psicológica, que leva a um fim perfeitamente previsível, tornando-se quase pornográfica do suplício de quem se vê na situação de refém dos piratas. Não estranha que, na sessão a que assisti, houvesse quem tenha abandonado a sala antes do fim.
Se a pirataria baseada na costa da Somália - e que se fez sentir em boa parte do Oceano Índico, mesmo a vários milhares de quilómetros de distância como aconteceu em águas da Índia - está hoje debelada, o problema está a surgir em força no Golfo da Guiné, também por movimentos ligados ao fundamentalismo islâmico. Hoje mesmo, um navio norte-americano foi atacado e os piratas fizeram dois reféns entre a tripulação, incluindo o capitão. A semelhança de situações e a coincidência com a exibição de «Capitão Phillips» poderão motivar ainda mais a Casa Branca para uma intervenção militar.
Sendo que este é um problema que assume proporções preocupantes para os países do Sul da Europa (sobretudo Espanha e Portugal, por via das ilhas Canárias, Selvagens e Madeira), o facto é que a costa africana é muito menos importante para o comércio mundial do que a rota Ásia-Europa pelo Canal do Suez, pelo que haverá menos voluntarismo de outros países e participar na sua abordagem. Retirando lições da Somália e antecipando uma previsível evolução da ameaça, Espanha, França, Portugal e o Reino Unido têm vindo a alertar a UE para tomar medidas firmes que deverão passar pela presença permanente de navios de guerra na costa africana. Escusado será dizer que, com ou sem o apoio de Bruxelas, Portugal terá necessariamente de participar nesse esforço e também reforçar a presença naval em águas da Madeira, tal como Espanha tem vindo a fazer nas Canárias. Com austeridade ou sem ela, o que tem de ser tem muita força e o dinheiro para financiar essa operação terá de aparecer de algum lado. Basta imaginar na gravidade que seria, por exemplo, um grupo de piratas desembarcar e ocupar temporariamente uma das Ilhas Selvagens, ou saquear e fazer reféns no Porto Santo. Não se pode consentir em correr esse risco.

publicado às 18:40

Sobre os Óscares e a pseudo-intelectualidade Hollywoodesca

por Samuel de Paiva Pires, em 26.02.12

Alberto Gonçalves na mouche, E o vencedor é...:

 

"Será talvez irónico que a televisão, responsável pelas maiores atrocidades na história do entretenimento desde a mulher barbuda (correcção: incluindo a mulher barbuda), seja hoje responsável por algumas das produções mais sofisticadas do género. Antigamente o refugo do audiovisual, a televisão desatou a exibir maravilhas como The Wire, Dexter, Arrested Development ou The Office. Em compensação, o cinema já raras vezes ultrapassa o primarismo assumido da banda desenhada ou, o que é pior, o primarismo da banda desenhada com pretensões "artísticas". Os melhores leading men da actualidade, de Hugh Laurie a Michael C. Hall, de Dominic West a Kelsey Grammer, recorrem à televisão para fazer carreira e ao cinema, onde se subjugam aos Pitt e aos Clooney desta vida, para fazer dinheiro. É inegavelmente irónico que o cinema nunca tenha facturado as fortunas actuais, e que a sua celebração anual nunca tenha sido tão épica e mentecapta.

 

Mesmo em épocas de fartura qualitativa, os Óscares jamais se distinguiram pelo esclarecimento (é escusado lembrar que Hawks, ou Cara Grant não ganharam um único). Em época de escassíssima qualidade, os Óscares distinguem-se pelo ridículo: na falta de filmes, não faltam fitas. Claro que nem sempre o ridículo e as fitas atingem os píncaros de 2003, em que a cerimónia foi reduzida a uma manifestação contra a guerra no Iraque. A imagem de Michael Moore a pedir a Bush que tivesse a vergonha que ele, um charlatão milionário, obviamente não possui simbolizou os abismos de hipocrisia a que a coisa desceu. Mas a coisa desce com regularidade. Não há cerimónia sem um par de vedetas a promover as "causas" a que aderiram na semana anterior (ou, no divertido caso de Sean Penn, vinte minutos antes), de resto a matéria da maioria das misérias a concurso.

 

No dia seguinte, os media aplaudem a coragem das vedetas. No léxico contemporâneo, "coragem" é o que leva uma pessoa a defender ou criticar o que é defendido ou criticado por quase toda a gente. É lícito louvar o ambiente, o "pacifismo" e "Che" Guevara, ou caricaturar o evangelismo cristão, Margaret Thatcher e o senador McCarthy, um monstro que, embora morto há meio século, as valentes celebridades não cessam de combater. Na verdade, as celebridades só não combatem inimigos reais e realmente perigosos. Os limites do seu activismo definem-se pelas maçadas que o activismo lhes poderá trazer. Grosso modo, os limites são o Islão.

 

Parece que Sacha Baron-Cohen, criador de Borat, sentiu agora as interdições da famosa "academia", cujo convite para os Óscares estaria dependente da garantia de que o actor inglês não aproveitará o evento a fim de promover O Ditador, paródia de um deposto líder de um país muçulmano. Suspeito que a palavra-chave, aqui, é "muçulmano": com o Profeta e respectivos seguidores não se brinca. À hora em que escrevo, consta que a "academia" deseja afinal integrar a personagem de Baron-Cohen no alinhamento da noite, uma tentativa de controlar danos à qual Baron-Cohen cederá ou não. Inclusive, corre por aí que tudo se resumirá a um truque publicitário combinado por ambas as partes. Pouco importa. O importante é a mera plausibilidade da cautela, uma extravagância num mundo orgulhoso de desafiar interditos excepto o interdito que mata.

 

Recentemente, transtornados locais promoveram pequenas chacinas a propósito da queima de exemplares do Corão numa base militar americana no Afeganistão. Em geral, as chacinas ou as ameaças não carecem de pretextos tão ofensivos (e dispensáveis). Uma palavra, um rabisco ou uma rábula cómica bastam para suscitar a fúria de quem, na última década, decide o que é admissível no nosso comportamento. Por isso o nosso comportamento se resigna ao medo, uma irrelevância quando restrito ao grotesco circo de Hollywood, um perigo quando alargado ao Ocidente. Logo veremos se o medo voltou a vencer. Ou verão os que seguem pelo televisor a homenagem a este cinema e, até certo ponto, a este Ocidente resignado. A TVI passa os Óscares. Enquanto não vir uma vedeta enxovalhar o fanatismo que conta ou um bom filme premiado, eu também passo."

 

publicado às 14:54






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