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O Dia D

por Nuno Castelo-Branco, em 06.06.14

Parecendo uma repescagem das diatribes, omissões e falsidades durante décadas urdidas nos volumes da História da Grande Guerra Patriótica, têm ultimamente surgido alguns interessados pela temática II Guerra Mundial apresentando uns tantos "ses" sem qualquer sustentação, quando confrontados com a miríade de problemas ditados pela realidade tal como se apresentava em Junho de 1944.

 

Estando os historiadores perante a evidência de um conflito que cabe no conceito de guerra total, alguns pretendem  considerá-la de forma sectorial, limitada e sem atender à sempiterna companheira dos eventos bélicos, isto é, a política interna e externa dos beligerantes, os interesses geoestratégicos dos principais contendores, fossem aqueles económicos, militares ou de exercício da soberania.

 

Dizem então que o desembarque anglo-americano na Normandia terá sido uma invasão desnecessária. Argumentam com a evolução das operações no teatro de guerra da frente oriental que estava a cargo dos aliados russos. Esta é uma consideração errada em todos os pressupostos, sejam eles militares ou políticos.

 

Em Junho de 1944, a Alemanha ainda era uma potência bélica de primeira categoria, apresentando ao mundo umas forças armadas muito numerosas,  perfeitamente capazes sob o ponto de vista anímico e dotadas de equipamento tecnologicamente avançado. A indústria conduzida por Speer, atingiu picos de produção que não devem ser negligenciados, apesar dos redobrados esforços das campanhas aéreas desferidas pelas potências anglo-saxónicas. Não mencionado em detalhe a imensa superioridade técnica da sua arma blindada - mesmo atendendo aos modelos mais pesados do adversário soviético -, esta qualidade era extensível às armas que ditariam as regras nos conflitos vindouros. Mísseis de todos os tipos que iam surgindo nos teatros de operações, aviões a jacto, armas automáticas, uma nova geração de submarinos apenas muito mais tarde eclipsados pelo advento das classes movidas a energia nuclear, entre toda uma série de inovações que durante quarenta anos decisivamente influenciariam o desenvolvimento dos arsenais das principais potências mundiais.

 

Os britânicos consideravam imprescindível o desembarque na Europa, cientes que estavam daquilo que significaria a outorga de toda a guerra terrestre aos exércitos levantados pelo regime soviético. No que respeita aos seus aliados americanos, destes divergiam quanto à zona escolhida para a invasão, preferindo o "baixo ventre da Europa"- Mediterrâneo central, ou seja, a Itália, Grécia e a costa jugoslava -  às praias do norte de França. A verdade é que desde o início da sua intervenção, os americanos sempre privilegiaram os pontos de vista do Kremlin, conhecendo-se também as conversações que Roosevelt e a sua administração foi entabulando com os soviéticos a respeito da liquidação dos impérios coloniais europeus, britânico incluído. A Estaline interessava a intervenção anglo-americana de uma forma limitada - permanente bombardeamento aéreo da Alemanha e caudaloso fornecimento material à URSS - e no sentido do alívio do envio pela indústria alemã, de equipamento destinado à Wehrmacht na frente leste. Os aliados ocidentais eram meramente utilitários e o lend-lease absorvia o seu quase exclusivo interesse por eles. 

 

O conceito de defesa elástica que apesar de tudo o marechal Von Manstein conseguira impor como incontornável recurso para a contenção da avalanche que vinha do leste, é facilmente compreensível quando observamos nos mapas o lento avanço soviético em direcção a Berlim. Se a seguir a Estalinegrado (início do ano de 1943) esse progresso para ocidente parecia fulminante, a partir de Kursk - um colossal erro estratégico de Hitler - e apesar da esmagadora superioridade material, as ofensivas estiveram  muito longe de atingirem aquela velocidade que teria pressuposto a queda do III Reich na primavera de 1944. A inversão de alianças da Roménia e da Bulgária - já após o D-Day -, criou um certo vazio naquela zona dos Balcãs, sem que isso significasse a imediata chegada do Exército Vermelho a Budapeste, Praga e Viena. Apesar de se encontrarem em grande desvantagem numérica, os alemães fizeram arrastar durante longos meses, as campanhas russas na Polónia e nas províncias germânicas do leste, a Prússia oriental, Silésia e  Pomerânia. 

 

A presença anglo-americana na Itália, não era um factor determinante para a derrota do Reich a ocidente, dados os condicionalismos impostos pelo terreno admiravelmente propício a quem nele estivesse numa posição defensiva. Assim sendo, havia que escolher outro sector que se prestasse a uma maciça concentração de recursos bélicos e capazes de decidirem pelo número, o resultado de uma batalha que se previa difícil e custosa.  Sob o ponto de vista estritamente militar, os actuais revisionistas da história apresentam  como certa a vitória soviética a leste, na presunção de Estaline contentar-se com a tomada de Berlim e zonas da Alemanha concedidas após as Conferências do Cairo e Teerão, ao domínio russo. Nada mais ingénuo. Consciente dos graves prejuízos causados ao esforço de guerra alemão pelas vagas de bombardeiros da RAF e USAF, Estaline decerto pretendeu estender o tão longe quanto possível, a presença dos seus exércitos na Europa central e ocidental. Quanto a isto não poderá existir a menor dúvida, conhecendo-se a importância decisiva que o factor político-ideológico exercia sobre a sua condução das operações militares e diplomacia. Poderá alguém alimentar algumas ilusões quanto a um esperado deter soviético nas margens Elba?  Há que atender à forte presença da coluna pró-soviética que os partidos comunistas representavam na Europa ocidental, não se desconhecendo a eficácia do PCF que mesmo após finda a guerra, pesadamente influiria na condução da política francesa. 

 

É verdadeira a suposição de que a ausência de uma intervenção terrestre em França, teria significado a imediata transferência para a frente leste de importantes unidades da Wehrmacht, capazes de consideravelmente atrasarem o avanço russo e adiarem em longos meses, o desfecho do conflito. Neste caso, a pressão exercida pela guerra aérea anglo-americana apenas beneficiaria geoestrategicamente a URSS, dando-lhe campo livre para uma decisiva penetração na Europa ocidental e sendo impossível aventarmos até onde aquela poderia ter chegado. Paris?, Madrid? Lisboa? Nas  Conferências de Ialta e de Potsdam, Estaline insistiu na necessidade de um ataque aliado à Espanha de Franco e isto é por si demonstrativo de um aspecto que actualmente parece ter sido alijado das cogitações dos interessados pelo estudo dos últimos capítulos da II GM. Já é bem conhecido como um grave erro político - logo militar, num contexto de guerra total -, a negativa de Eisenhower em permitir um avanço dos seus comandantes em direcção a Berlim, considerada como um objectivo meramente simbólico. Estaline sabia que a capital alemã era muito mais que um simples objectivo de prestígio, pois o seu controlo pressupunha a reivindicação da legitimidade política sobre o conjunto da nação alemã, além de significar uma indefinida permanência do Exército Vermelho em pleno coração da Europa. E assim foi até 1990.

 

A vitória soviética era um facto iniludível, os números pesavam e a generosíssima contribuição material americana foi decisiva. Blindados na ordem de muitos milhares, milhares de aviões de todos os tipos, os uniformes que vestiram e as botas que calçaram as tropas russas, armas automáticas, artilharia, a prodigiosa quantidade de munições de todos os calibres, uma espantosa quantidade de veículos de transporte que decisivamente motorizaram o E.V., mares de combustível e de matérias primas, as rações de combate que fartamente alimentaram o gigantesco exército russo, eis a contribuição decisiva. Mas isto não era suficiente, pois americanos e britânicos receavam o advento das propaladas armas secretas à disposição do Führer, suspeitando da séria possibilidade de entre os recursos tecnológicos, poder encontrar-se a arma nuclear. Durante alguns anos - 1942-44 -, Estaline irrealistamente temeu a celebração de uma paz separada entre o Reich e as potências capitalistas ocidentais, jamais conseguindo entender o vasto quadro dos interesses dos EUA e do RU no concerto internacional e ostensivamente desdenhando do capital factor político na condução da guerra pelas potências demo-liberais. Jamais considerou a evidência de o seu regime se encontrar mais próximo daquele que Hitler simbolizava, desde a forma messiânica da condução do Estado, até à concentrada organização do mesmo. 

 

Os números apresentados pelo escalpelizar de forças presentes na frente ocidental, parecem ser uma pequena fracção daqueles outros com que deparamos na consulta dos registos da frente leste. No entanto, as campanhas em França, na Bélgica e na Alemanha ocidental, foram decisivas para o abreviar do conflito e garantir a sobrevivência das democracias ocidentais na Europa.  A partir desta realidade históricai, já estaremos no plano das suposições, onde apenas o Reino Unido dificilmente se teria mantido como a única parcela da Europa livre da ocupação e re-arranjo institucional ditado pela URSS. Daí até à quase imediata  eclosão de uma terceira guerra mundial, tudo é possível imaginarmos. 

publicado às 15:40

Reis do leste (1): Miguel I de Hohenzollern-Sigmaringen

por Nuno Castelo-Branco, em 11.07.08

 

 

Trineto de D. Maria II,  o derradeiro sobrevivente  (além de Simeão II da Bulgária) dos chefes de Estado da II Guerra Mundial, é o rei Miguel da Roménia. Subindo ao trono durante um período de convulsão política no seu país, Miguel teve que gerir desde muito jovem, uma dificílima situação política e militar. No início da década de 40, o país foi incluído na esfera de influência do III Reich e o seu exército participou activamente na campanha da Rússia (1941-44). O golpe de Estado de 23 de Agosto de 1944, conduzido pelo monarca, levou ao rompimento com os alemães e à participação da Roménia na coligação aliada. O ditador soviético viria a condecorá-lo com a Ordem da Vitória, ..."pela acção corajosa de radical modificação na política romena, rompendo com a Alemanha de Hitler e aliando-se às Nações Unidas, num momento em que não existia ainda um claro sinal da derrota alemã". Impossibilitado de forçar abertamente a sua deposição, Estaline foi obrigado a recorrer aos usuais métodos de intoxicação de uma opinião pública fortemente pró-monárquica e sob a direcção de Anna Pauker - a agente soviética no país -, o PC conseguiu apossar-se do poder, obrigando o rei a abdicar em 1947. Viveu o exílio na Suiça e regressou à Roménia após a liquidação do regime de Ceausescu. Em 1992, tinha um milhão de romenos à sua espera em Bucareste e esta popularidade, levou o governo de Illiescu a proibir Miguel de visitar o país durante os cinco anos seguintes Em 1997 foi-lhe restituída a cidadania romena e reside hoje na capital romena, no palácio Elisabeta.

publicado às 16:16






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