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Enquanto a Espanha tem assinalado com pompa e circunstância o bicentenário do que designa como a sua Guerra da Independência, enaltecendo o seu esforço e exagerando o seu contributo para a derrota da França Napoleónica, em Portugal as comemorações do bicentenário das Invasões Francesas têm estado quase exclusivamente a cargo das Forças Armadas, e gozando de pouca ou nenhuma divulgação e visibilidade. Não faz qualquer sentido que assim seja, já que Portugal foi um dos vencedores daquela que foi, até então, a maior guerra a que o mundo assitiu, abrangendo o continente europeu e extendendo-se para além dele (campanha napoleónica do Egipto, conquista da Guiana Francesa por Portugal), tendo dado um contributo relevante para a vitória dos Aliados. E, no que toca a História, convém que Portugal saiba sempre marcar a sua posição caso contrário outros aproveitarão a oportunidade para revisionismos.
Quando, há uns anos, se deu início às comemorações dos 200 anos das Invasões Francesas, teve lugar em Lisboa um seminário internacional reunindo historiadores militares dos países envolvidos: Portugal, França, Espanha, Reino Unido e Brasil (que no momento das invasões foi elevado a reino e para onde foi transferido o governo e a capital). A perspectiva britânica era de que a Guerra Peninsular tinha sido uma vitória britânica, fruto da qualidade dos exércitos de Sua Majestade e do génio do general Arthur Wellesley (Duque de Wellington), numa campanha em que as tropas portuguesas tinham tido um papel digno mas de mero coadjuvante (as referências era feitas em tom de nota de rodapé...) Por seu turno, na perspectiva francesa, as invasões são ainda hoje referidas como as Expedições: não se tratava de invadir ninguém mas antes de combater o inimigo inglês, libertar os povos das trevas do Ancient Régime e implantar as luzes da Revolução Francesa. Não tardou muito a que tais pontos de vista tivessem resposta portuguesa e espanhola, dando a perspectiva dos invadidos. Recordo-me de ver, na pausa para café, o representante francês a "ferver" com o que tinha acabado de ouvir, vendo que a memória que dos Pirinéus para cá se guarda da ocupação francesa não é melhor do que a que os franceses guardam da ocupação nazi. Duzentos anos depois, as memórias e as feridas continuavam surpreendentemente presentes, e tinha bastado alguma arrogância e convencimento - e quiçá a ideia errada que o Português tudo perdoa, tudo aceita - para o revelar.
Duzentos e dois anos depois da derrota francesa frente ao Exército Anglo-português entrincheirado na Linhas de Torres, chegou às salas este filme português, proposto pela Câmara Municipal de Torres Vedras para comemorar o bicentenário do acontecimento que colocou a povoação do Oeste nos anais da História Militar mundial.
Mais do que uma reconstituição histórica e um filme de guerra, é sobretudo um relato sobre como a guerra (no caso, a Terceira Invasão Francesa) foi vivida por pessoas de todos os géneros, cujas vidas foram alteradas pelos acontecimentos: portugueses, ingleses, franceses ou cidadãos de outras nacionalidades que, por uma razão ou por outra, cá estavam na altura. Tudo isto tendo como pano de fundo a retirada estratégica do Exército Anglo-português e das populações para trás das Linhas de Torres Vedras, levando a cabo a política da terra queimada: uma estratégia que para muitos portugueses implicou passar fome para poder reconquistar a Liberdade e Independência. Serve para lembrar às gerações actuais o que significa para um povo passar por uma guerra e uma ocupação, no exemplo do maior suplício por que o Povo Português passou em toda a sua história.
É um filme de qualidade a todos os níveis, de que destaco a prestação do numeroso e competente elenco. Será emitido futuramente na versão de série de TV mas aconselho vivamente a vê-lo no cinema.
Estão de parabéns Paulo Branco (que produziu), Carlos Saboga (que escreveu), Raul Ruiz (que pré-produziu) e Valeria Sarmiento (que realizou). Está de parabéns o cinema português.
Site oficial do filme: http://www.linesofwellington.com/pt/linhas_wellington_home.php
Site oficial das Comemorações do Bicentenário das Linhas de Torres Vedras: http://www.linhasdetorresvedras.com/
É bem certo tratar-se de uma efeméride ingrata a este regime que procurou ignorá-la. A magnífica vitória portuguesa - povo e exército - sobre a França napoleónica, consiste num daqueles temas incómodos para quem insiste em ver na invasão, a semente de um porvir prenhe de "modernidades" de recorte estrangeiro. São sempre os mesmos, precisamente aqueles que também ignoraram o espolinhar de deputações aos pés do Corso, a extinção por decreto da soberania nacional, o arriar da bandeira das quinas, a terra queimada, os roubos, violações, abusos de toda a ordem e a própria partilha do território português. As fidelidades mantêm-se tão arreigadas como naquela época e pior ainda, hoje estamos numa situação em que já não há Corte num Brasil que nos valha. Em suma, o regime ignorou aquela vitória que garantiu a independência nacional por mais algumas gerações.
Há cento e dois anos, a Monarquia soube comemorar condignamente a libertação de 1810. O Rei D. Manuel II esteve no Buçaco, acompanhado pelo sucessor do Duque de Wellington e pelo nosso exército em entusiasmos que uma semana depois foram esquecidos no escuro cobarde das casernas onde se refugiou num demasiadamente habitual abstencionismo.Tal como hoje, um exército demasiadamente "quebra-espadas" e agarrado à defesa de interesses tão corporativos como qualquer bastoneirada de dentistas, engenheiros de amarga cepa ou contabilistas de caixa emperrada.
A Biblioteca Nacional prepara uma exposição comemorativa da presença da Legião Portuguesa na campanha da Rússia. A Legião combateu no lado errado da história e embora os seus elementos pudessem ter sido muito mais úteis na defesa do solo nacional, bateu-se bem às ordens do nosso inimigo. Nestes tempos difíceis, valham-nos as recordações de um tempo e de uma gente bem diferente. Aqui vos deixamos a magnífica obra de Tchaikovsky, exaltando a epopeia da resistência do Império da Rússia à horda invasora. No final, os sinos, o Deus Salve o Czar e o nutrido canhoneio, dizem muito acerca da têmpera de um povo.
Esta é uma boa notícia. Melhor ainda seria se possuindo um émulo do Dr. Zawi Hawass, o nosso país exigisse a devolução das centenas de espécimes roubados pelos franceses aquando as Invasões. São bem conhecidos e facilmente identificáveis em Paris.
Respondendo aqui à pergunta que me fez lá, Nuno, cuido que essa expressão terá tido origem no pavor que os portugueses sentiam de um general das hostes de Junot, que era maneta.