Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Estamos entregues aos bichos, sim senhor. A redução da taxa do IVA de 23% para 6% do pão com chouriço levanta algumas questões alimentares, mas não só. Se o governo pretende promover uma espécie de kit de salvação para matar a fome, esquece-se que o petisco não pode ser consumido às secas: o pãozinho achouriçado precisa de um lubrificante para descer pela goela. E é aqui que reside uma parte do problema. Que bebida é indicada para acompanhar este paniativo (de pan paliativo)? Um leite com chocolate? Um penálti de tinto? Uma taça de sangria? Como podem constatar, os cozinheiros fiscais apresentam apenas metade da ementa. Se fossem misericordiosos e entendessem o grau de pobreza que aflige o país, teriam pensado numa solução integrada, numa cesta de piquenique com diversos. Pelos vistos acordaram virados para o chouriço como poderiam estar inclinados para a salsicha. Em qualquer dos casos, baixar o chouriço não ajuda nada a taxa de natalidade. Não sei se consigo consumir tamanha dose de surrealidade - chiça, IVA Chouriça.
O aumento do IVA para 23,25% representa um acréscimo de 200 milhões de euros na receita, e o aumento de 0,2% na taxa de Segurança Social paga pelos trabalhadores significa mais 100 milhões de euros. Trocos, portanto, para o Estado glutão, mas que não deixam de reforçar o processo de empobrecimento da população portuguesa, retirando-lhe ainda mais poder de compra, o que se torna particularmente gravoso no caso dos que auferem salários baixos, ou seja, a maioria dos portugueses. Curiosa também a justificação de que assim se compensa a reposição dos cortes nas pensões mais elevadas, procurando mais uma divisão que tanto tende a distrair e ocupar os visados por estas engenharias orçamentais.
Mas, por serem trocos deglutidos em meia dúzia de dias pelo Estado (estarei a ser demasiado simpático?), isto mais parecem medidas alegadamente pedagógicas à Leal da Costa, preventivas, ou seja, aumentozinhos da treta para não nos desabituarmos muito de continuarmos a ser espoliados. No fundo, será mais ou menos assim: isto está tudo a correr muito bem, o país está melhor, as pessoas é que não - que se lixem as pessoas -, mas desenganem-se se julgam que podem gastar os frutos do vosso trabalho como bem entenderem, porque a crise e a austeridade são provisoriamente definitivas e vocês só têm é que continuar a alimentar o Estado e não se atreverem a gastar um pedacinho sequer acima das vossas necessidades. Poupem, para sustentar o Estado, e tentem sobreviver (viver é só para os ricos), que já vão com sorte. Para o ano há mais - logo depois das eleições e de uma eventual redução de impostos, claro.
O ímpeto reformista português tem sido muito mais ousado e mais rápido, apesar de todos os solavancos e adversidades, que o dos governos congéneres europeus da Zona Euro, daí o modo elogioso com que abençoam o nosso esforço. Ao conceder a Espanha mais dois anos para que o Governo de Mariano Rajoy cumpra as metas orçamentais, a Comissão Europeia recomenda, isto é, exige a implementação de medidas concretas em várias frentes: revisão do sistema de pensões, políticas activas de emprego, uma reforma estrutural do sector eléctrico e novas mudanças na tributação do IVA. Por que é que as Esquerdas Burras em Portugal, além das ânsias pela queda deste Governo, não sugerem também a queda dos outros governos da Zona Euro, a queda da Comissão Europeia, a queda de tudo e de todos que não sejam Esquerda?! Só a República pode ser Regime. Só a Esquerda pode ser Poder.
Aquele estranho momento em que um americano me diz que não existe IVA nos EUA e que o chamado Sales Tax apenas em alguns estados vai além dos 9%, existindo ainda os que nem sequer cobram este imposto. Deviam ter visto a cara dele quando lhe disse que em Portugal o IVA está nos 23%.
O anterior governo socialista, durante a negociação do acordo com a troika, plantou notícias sobre o apocalipse que nos ia atingir, para depois convocar uma conferência de imprensa onde José Sócrates trocou as voltas a todos e comunicou o que afinal não ia ser feito. O actual Ministro das Finanças segue a estratégia inversa, convocando uma conferência de imprensa para anunciar cortes na despesa, mas acabando a anunciar aumentos de impostos.
De salientar o apontamento de João Luís Pinto:
«Quando se convocam conferências de imprensa para apresentar colossais cortes na despesa e ao invés sai na rifa um novo aumento do IVA, e já se vão antecipando medidas e receitas acordadas para o ano de 2012 do lado da receita, sem qualquer vislumbre efectivo ao fim já de meses de governo de medidas substanciais de corte de despesa pública (muito menos ao nível dos aumentos de receita anunciados), parece que começamos a abandonar o domínio da boa-fé.
Começa sim a parecer que estão a querer gozar connosco.»
Sem comentários!