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Paulo Tunhas, "Lenine explica":
Acerca da anulação da conferência de Jaime Nogueira Pinto na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e dos motivos dessa anulação, muita gente, da esquerda à direita, se pronunciou com as palavras certas. Há, no entanto, uns silêncios que convém interrogar. Que eu tenha reparado, ninguém do PC ou do Bloco de Esquerda julgou útil desta vez fazer ouvir a sua voz, o que em princípio devia espantar, tratando-se de gente particularmente vocal que aprecia sumamente dissertar sobre toda a espécie de direitos e que tem ideias bem definidas sobre a liberdade, ou sobre as “amplas liberdades”, como dantes o PC dizia.
(...).
Não custa muito encontrar uma explicação simples: porque concordam com a anulação da conferência. Demasiado simples? Francamente, não creio. A especialização nas chamadas “causas fracturantes”, que tornou o Bloco conhecido do bom povo português, tende a fazer esquecer algumas características ideológicas que identificam no essencial aquela tão moderna agremiação. É que, sob as vestes da modernidade, o que conta verdadeiramente são ainda as arcaicas concepções totalitárias que se encontram na sua origem. É isso que fornece uma unidade subjacente à multiplicidade das “causas”. Que isso permaneça imperceptível a uma grande parte das pessoas deve-se em grande parte a um efectivo talento para o marketing político que descobriu um muito conveniente nicho ecológico nos media. A maneira como esta ocultação da presença da origem no presente foi levada a cabo com sucesso é provavelmente um dos factos mais reveladores da facilidade do triunfo da impostura em política, uma impostura desde há um ano devidamente recompensada, para nossa grande desgraça, com a generosidade de António Costa.
(...).
É bom percebermos que estamos a lidar com gente para a qual não há, em domínio algum, qualquer espécie de neutralidade, inclusive académica. O silêncio em relação ao caso de Jaime Nogueira Pinto exibe-o perfeitamente e de forma inadulterada. O outro de que se discorda não é susceptível de merecer a distância que nos permita ouvi-lo. Insultá-lo, identificá-lo como inimigo, é mais fácil. No caso de Nogueira Pinto, é “fascista”. Noutros tempos, é bom lembrá-lo, bastava ser “socialista”. Desde que António Costa, com a sua proverbial fortitude, derrubou pela segunda vez o Muro de Berlim, os socialistas, tirando um excêntrico ou dois, podem estar tranquilos: “socialista” não é um nome feio. Mas nada garante que seja sempre assim. A não ser que certa gente do partido que Costa trouxe para junto de si tomar definitivamente conta do PS. Nesse caso, a paz poderá tornar-se definitiva. Com o PS a mudar até de nome: PSE – Partido Socialista de Esquerda. Lenine explica.
É absolutamente inacreditável que a ameaça de violência por parte de um grupelho de estudantes de extrema-esquerda da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa leve ao cancelamento de uma conferência de Jaime Nogueira Pinto subordinada ao tema ‘Populismo ou Democracia: O Brexit, Trump e Le Pen’. Parece que a praga do politicamente correcto que censura o pensamento que não seja de esquerda também já está entre nós, até no seio daquela instituição, a academia, que tem o dever de promover a liberdade de pensamento, a liberdade de expressão e o verdadeiro debate de ideias.
No próximo dia 21 de Outubro o Instituto Libera Ratio retoma as suas actividades com uma conferência subordinada à temática "Islão: uma ameaça para a Europa?", que terá como orador o Professor Jaime Nogueira Pinto. A conferência terá lugar no IDL - Instituto Amaro da Costa (Rua do Patrocínio, n.º 128 - A, 1350-232 Lisboa), pelas 21h15, e a entrada é livre.
António Marques Bessa e Jaime Nogueira Pinto, Introdução à Política:
«A direita caracteriza-se por cobrir as doutrinas e movimentos políticos com uma raiz filosófico-antropológica pessimista, com uma visão orgânica da sociedade, com uma valoração da experiência histórica e das forças e comunidades naturais, isto é, não voluntárias, como a família, o município e a nação; valoriza também o elemento religioso, defende a propriedade e o direito à diferença, e acredita na iniciativa e no lucro individuais como motores da economia, do mesmo modo que privilegia a subordinação do económico ao político.
As esquerdas, pelo contrário, assentam a sua construção ideológica numa antropologia optimista e, por isso, privilegiam o conceito de uma Humanidade naturalmente boa, e que tem sido corrompida pelas instituições «naturais», isto é, pela família, pela propriedade, pelo Estado. Por isso, a esquerda favorece a ideia de restabelecer a tábua rasa, de «libertar» o homem das «servidões» institucionais, de destruir os «valores tradicionais», como a religião ou a família monogâmica heterossexual e construir a sociedade segundo um projecto «racional», sem preconceitos. Daqui que as esquerdas aceitem como natural e desejável a igualdade dos indivíduos e procurem, em última instância, actuar sobre a sociedade para recriar as condições ideais de igualdade. E fazem-no, analisando e racionalizando, por um sistema de crítica das instituições existentes e de apresentação de utopias ou sociedades ideais, numa linha de «construtivismo» ou «engenharia» social.
Neste construtivismo ou engenharia social, as instituições e comunidades naturas, como a família, a propriedade e a nação, são consideradas como instrumentos de domínio de classes, de grupos, de raças ou de sexos. Enquanto a direita tende a respeitar as instituições de longa duração, e uma longa duração, pela «prescrição» histórica, é na linha do pensamento de Burke, um sinal de vitalidade e funcionalidade, a esquerda tende a sujeitá-las a uma espécie de juízo negativo, com base na própria passagem de tempo, privilegiando a ideia permanente de mudança que culminou no conceito de «revolução permanente» de Leon Trotsky, conceito para o qual Estaline não encontrou aplicação nem viabilidade.
A contraposição esquerda-direita é, em certo sentido, incapaz de classificar e arrumar fenómenos políticos como o fascismo que tinham características de direita – enquanto eram pessimistas e orgânicos – mas também de «esquerda» enquanto eram socialmente transformistas e aspiravam a um Estado revolucionário e totalitário. Essa dificuldade classificatória mantém-se hoje em dia em relação a certas ideologias como, por exemplo, em relação ao fenómeno do nacionalismo e do populismo nas suas várias manifestações.»
(imagem daqui)
Jaime Nogueira Pinto, António de Oliveira Salazar - O Outro Retrato:
«Depois do 25 de Abril, com estes padrões por únicos, e aproveitando-se da hegemonia política então alcançada, as esquerdas, que já muito antes da Revolução tinham ganho a hegemonia na «República das Artes e Letras» e na opinião mediática (apesar, ou por causa, da Censura), conseguiram que os seus valores e metas se firmassem como valores e metas indiscutíveis da sociedade portuguesa – ou de qualquer sociedade que se preze. E os partidos de não-esquerda – o PSD e o CDS – entraram neste jogo, por medo, por oportunismo ou até por convicção dos seus dirigentes. Não sendo capazes de apresentar uma alternativa de ideias e valores para o discurso dominante, inspirado na ideologia jacobina do século XIX e nas várias versões da utopia comunista.
Custos ocultos
Este foi um dos custos ocultos do salazarismo. O facto de o seu discurso político se basear nos grandes princípios do nacionalismo conservador, sob forma autoritária, tem sido um obstáculo à afirmação de alternativas políticas – em democracia – que os contenham. E como esses princípios e valores –Deus, Pátria, Família, Propriedade, Justiça – entendidos como concepção transcendental do político, a Nação como valor supremo da ordem temporal e a abordagem orgânica da organização social são o núcleo do pensamento substancial da direita (e são ainda hoje, de Reagan a Sarkozy), a direita partidária continua fraca, ainda mais e na medida em que o PS abandonou o discurso jacobino e a vulgata antifascista.
Assim, a direita partidária não tem ideias políticas, nem sequer as da direita da Esquerda que emigrou para a Direita e luta por ganhar a sua hegemonia intelectual.
Noutro sentido, o modo de reorganização da unidade da Direita que, nos anos 30, Salazar constituiu, perdeu-a na sua dependência e tutela. No que foi seguido por Marcello Caetano. E foi outro custo grande para a Direita, que perdeu o sentido da luta das ideias, da luta política, da afirmação de convicções. E, a avaliar pelos seus actuais dirigentes partidários, que encarreirou definitivamente pelo amorfismo ideológico, pelo oportunismo dos processos, pela pura manobra táctica, sem princípios, estratégia ou iniciativa. Aguardando que, por uma lei fatal da geometria partidária, em sistema de dois partidos fortes no Centrão, um tenha um problema e dê oportunidade à oposição. E o terceiro aspire a ser bengala de suporte a uma maioria relativa formada no seu espaço. Não é brilhante.»
Jaime Nogueira Pinto, O Fim do Estado Novo e as Origens do 25 de Abril:
«Aliás é uma das notas tradicionais da Esquerda, na sua propaganda, insistir sobre a «estupidez», a «brutalidade» e a «boçalidade» dos anticomunistas; como se os admiradores do sistema concentracionário de Estaline, os sequazes do «realismo socialista», que deu e continua a dar alguns dos mais sublimes monumentos do mau gosto universal, os fanáticos de todas as repúblicas que dispensaram sábios e poetas, fossem os mais aptos a atirar a primeira pedra.»
A tese da desnacionalização das elites políticas e económicas aventada, hoje, por Jaime Nogueira Pinto é particularmente interessante. O menosprezo por elementos fundamentais da nossa identidade histórica é assustador e demonstra, outrossim, que o móbil mais marcante da III República, a Europa dos dinheiros e fundos ilimitados, esgotou-se inexoravelmente. O labirinto da saudade voltou para ficar e confundir, sem Europa que nos valha e acuda na aflição generalizada. O regime chegou à ruína no meio de um turbilhão de políticas e conceitos pouco consentâneos com uma ideia mínima de amor à pátria. A mistura de paternalismo estatizante - bem sublimado pelo terror a um suposto neoliberalismo, como ressaltou recentemente Vasco Pulido Valente - com o indiferentismo perante a identidade e independência nacionais, estimulados pela hipnose europeia, conduziram-nos a este beco paralisante. Não direi, como alguns, que a pátria está em perigo, mas, de uma coisa estou certo: sem uma identidade bem definida não conseguiremos sair desta mesmice.
Jaime Nogueira Pinto em entrevista ao i:
«Eu quando lhe perguntava se ainda sofre com a perda de soberania era a pensar nos dias de hoje e no tal directório europeu.
Ai isso sofro! Isso é uma causa como a do 1.o de Dezembro. Mas nós não vamos perder porque nada disso se vai fazer, não vai haver qualquer espécie de entendimento na Europa.
Porque tem essa convicção?
A indiferença perante a soberania política aparece muito do lado da Alemanha. O único país que tem escolha entre uma Europa federal e uma Europa desfeita é a Alemanha. Os estados que têm formação histórica de estado nacional não querem perder soberania. Para os que não têm essa forma, como a Bélgica ou até Espanha, a questão da soberania não se põe nesse termos. Nas classes políticas dominantes há uma preponderância dos federalistas e europeístas, mas muito maior que nas populações. A soberania e a independência nacional são a coisa mais importante que há.
Mas está garantida, tendo em conta a oposição das populações?
Não, está dificílima. Há uma desnacionalização enorme das classes políticas e também das empresariais. Por exemplo, a forma leviana e tonta como se acabou com o 1.o de Dezembro como feriado, um dia fundacional, que acabou na página de um decreto sobre legislação do trabalho, não lembra a ninguém. Dá um sinal de grande inconsciência política e é assustador.
(...)
É um motivo de preocupação em Portugal, a liberdade de imprensa?
Não vejo. Acho mais importante a perda progressiva da maior parte dos centros de decisão e acho horrível a indiferença com que se vê isso acontecer. Acho que há uma profunda desnacionalização das pessoas e das consciências. Isto foi tudo feito em nome da economia e as pessoas ainda não viram sequer que, mesmo do ponto de vista económico, se perderem a identidade e a independência nacional vão ser uma espécie de trabalhadores por conta de outrem, de escravos, e não sabem de quem. E fizeram isto tudo alegremente em nome da liberdade, da democracia e da igualdade, sem perceberem que o país vai estar cada vez mais dependente e vai ser cada vez menos importante. Nos anos 60 podia ser mal visto, mas era um país importante.»