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Alberto Gonçalves, É proibido permitir:
«Após festejar um golo do Benfica durante um programa de comentário desportivo em que participava regularmente há anos, João Gobern foi despedido da RTP. Argumentando que "a liberdade de cada um de nós termina quando conflitua com a de alguém" e que "houve quebra na confiança com o espectador", o responsável pela informação da estação, Nuno Santos, decidiu, nas suas palavras, "cortar a direito". Embora eu guarde de João Gobern boas recordações (do tempo em que foi meu director nos primórdios da revista Sábado), acho que, perante a extrema gravidade do gesto, nem Nuno Santos tinha alternativa nem Nuno Santos tem prestado a devida atenção aos restantes conflitos de liberdade e quebras na confiança com o espectador recorrentes na televisão pública.
Dado que Nuno Santos aparentemente desconhece, aproveito para informá-lo de que os canais que dirige estão repletos de parlatório futebolístico no qual, mais do que a comemoração de golos, os intervenientes contratados afirmam-se sem pudor adeptos de um clube e defendem esse clube acima de toda a racionalidade. Também denuncio a Nuno Santos os relatadores, comentadores e repórteres que exibem às claras a preferência por equipas portuguesas (mesmo sem portugueses) em detrimento de equipas estrangeiras (mesmo com portugueses), os péssimos profissionais que falam no Real Madrid "de" José Mourinho e os falsos profissionais que em directo "torcem" pela selecção nacional contra selecções de países que podem merecer a simpatia de qualquer cidadão.
E não é só na bola que se conflituam liberdades e quebram confianças. Nuno Santos obviamente nunca viu, mas a sua empresa transmite com frequência debates sobre a actualidade política que opõem militantes ou dirigentes partidários sem vestígio de isenção. Ou "telejornais" que dão por adquirida a veracidade de mitos da estirpe do "aquecimento global" e da bondade da "rua árabe". Ou noticiários regionais que se limitam a reproduzir propaganda autárquica. Etc.
Acima de tudo, se Nuno Santos não sabia, fica a saber que, entre a qualidade e o lixo, a RTP opta, com raras excepções, pelo segundo, o que compromete fatalmente a desejada neutralidade. Aliás, a própria existência da RTP, por contraposição ao seu fecho sumário, representa uma tomada de posição que, além de estilhaçar a confiança dos espectadores sem liberdade de escolha, abalroa-lhes as finanças. O que, se Nuno Santos me permite a opinião (em podendo, não permite e faz muito bem), ainda é pior.»