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Quando me juntei à JP e ao CDS, em 2011, fi-lo por convicção ideológica. Antes deste acto, conheci suficientemente de perto as realidades da JS/PS e JSD/PSD, onde tinha e tenho vários amigos, mas sentia-me ideologicamente mais confortável num partido que proclamava alicerçar-se no liberalismo e no conservadorismo (para além da democracia cristã, principal pilar ideológico do partido), ainda que ali não conhecesse ninguém. Até residia perto do Caldas e, por isso, não foi complicado integrar-me rapidamente nas estruturas e ali encontrar pessoas interessantes.
Posto isto, como qualquer bom conservador sabe, o bem e o mal estão presentes em todo o lado, ou como ensina John Kekes, a natureza humana não é definitivamente boa nem má, é ambivalente. Depois de perceber que também na JP e no CDS fazem escola as práticas imorais que observei noutras organizações político-partidárias, decidi manter-me num partido onde me sinto ideologicamente confortável, mas no seio do qual sou apenas um militante de base com pouca ou nenhuma actividade política, pese embora tenha, nos últimos anos, subscrito as posições de alguns movimentos internos, em larga medida pela amizade e respeito que nutro por alguns dos seus membros, dos quais até discordo ideologicamente em alguns pontos.
Mas, actualmente, assistindo à onda que o partido tem vindo a cavalgar desde o resultado da sua líder nas autárquicas em Lisboa, não posso deixar de sorrir ao observar a pretensão de algumas hostes democratas cristãs de tornar o CDS no grande partido de direita em Portugal. Antes de ser militante e, aliás, acima disso, tenho uma profissão e sou cidadão e, portanto, permito-me observar aquilo que a minha experiência e a minha intuição enquanto politólogo me dizem: pese embora reivindique ser inter-classista, o CDS não deixa de ser uma agremiação dominada por indivíduos oriundos da burguesia, na sua maioria de Lisboa e Porto, sobretudo os chamados profissionais liberais (com destaque para os advogados), alguns empresários e aqueles que nas últimas duas décadas, com o crescimento do partido em resultado da liderança de Paulo Portas, se tornaram profissionais da política. Perdoem-me, portanto, os meus correligionários, mas mantendo-se a sociedade portuguesa e o nosso sistema político mais ou menos como os conhecemos, é altamente improvável que um partido com esta caracterização sociológica seja capaz de ultrapassar o PSD e tornar-se o grande partido da direita ou centro-direita (deixo as questiúnculas posicionais para outros). Quer se esvazie ideologicamente e procure ser um catch-all party, quer transborde de ideologia por todos os seus poros, seja ela liberal, conservadora e/ou democrata cristã, há uma enorme desconformidade social e política entre a maioria dos militantes do partido e suas ideologias e a sociedade portuguesa na sua generalidade - o que é evidenciado quer por as três mencionadas ideologias serem minoritárias em Portugal, quer pela fraca implantação do CDS a nível autárquico - que obsta a que o CDS possa substituir o PSD.
Por tudo isto, está coberto de razão o João Tavares:
É cíclico. Ao mínimo abalo nos partidos vizinhos, o CDS convence-se que os portugueses lhe darão, finalmente, o devido valor. Vai ser o grande partido da direita portuguesa, esperem só uns mesitos, que ele até se abre todo "à sociedade civil", aglutinador, total, moderníssimo, pragmático, eles merecem, é desta, é desta, foda-se. E depois, olha. Ia fondo mas não sendo. Poder-se-á dizer do CDS o que von Bismarck disse dos italianos: tem um grande apetite mas dentes fracos.
A Moção apresentada pela Juventude Popular ao XXV Congresso do CDS defende a redução do ensino obrigatório do 12.º para o 9.º ano de escolaridade, com argumentos que, a esta hora, já vários comentadores classificaram, pelo que me escuso a fazê-lo. Consegue, portanto, a proeza de colocar o Congresso perante o dilema entre aprovar uma Moção que contém uma ideia, no mínimo, polémica, e que gerará muita celeuma, quando o CDS contribuiu para o alargar do ensino obrigatório ao 12.º ano, ou reprovar a moção apresentada pela Juventude Popular, o que não é propriamente uma situação simpática.
Por norma, tendo a menosprezar as quase sempre pouco inteligentes iniciativas políticas das juventudes partidárias, não por qualquer preconceito atrabiliário, mas, sim, pela parca influência que as mesmas têm na vida política quotidiana. Não obstante o facto de ser militante de uma juventude partidária, entendo, e não é de agora, que as juventudes partidárias são, com algumas excepções bem delimitadas, autênticos viveiros da mediocridade intelectual mais grosseira e sabuja. A JP, instituição na qual milito com todo o gosto, ainda que com as reservas normalíssimas de quem entende que os jovens deveriam ser integrados directamente no partido, tem sido, felizmente, uma excepção positiva, contudo, devido, provavelmente, ao pântano de ideias que tem tragado a actualidade política nacional, os jovens centristas resolveram emular os piores exemplos das outras jotinhas. Essa emulação redundou num lance pifiamente estarola, resumido na contagem, através de um relógio propositadamente instalado para o efeito, do número de dias que faltam para a saída da troika de território nacional. Não é que isto importe grande coisa ao comum dos terráqueos lusitanos, mas assentemos, mormente por uma questão de brio, as nossas ideias: em primeiro lugar, quer a troika fique ou saia, já ou daqui a 1000 anos, Portugal continuará a viver, forçosamente, sob os espinhos do estado de excepção financeira a que as elites regimentais tragicamente nos conduziram; em segundo lugar, entendam o seguinte, caríssimos jovens: mesmo que a troika saia oficialmente, as limitações políticas e financeiras permanecerão, com outro nome, talvez, ou, como ainda há poucas horas o primeiro-ministro asseverou, sob os auspícios de uma "linha precaucionária". Em resumo, é um erro político tremebundo instalar artigos de relojoaria para representar, com toda a pompa e circunstância, o fim de algo que, com toda a certeza, continuará por muitos e bons anos. Como dizia uma notabilidade de outros tempos, deixem o recreio e façam os trabalhinhos de casa.
Eu, português, militante da JP e militante do CDS, sinto-me envergonhado por esta patetice do relógio que marca o tempo que falta para a troika sair do país.
(foto de Nuno Roby Amorim)
O Gabinete de Estudos Gonçalo Begonha acaba de publicar "O CDS e a Democracia Cristã (1974-1992)", um artigo de leitura obrigatória, da autoria de Adolfo Mesquita Nunes, que passa em revista a história do CDS no período em análise e confronta algumas ideias genericamente aceites que não são tão lineares como alguns julgam, no que diz respeito aos pilares ideológicos do CDS.
É já daqui a umas horas que terei o prazer de moderar um debate que, além de oportuno, se afigura como um grande momento de formação política. Sendo aberto ao público, podem confirmar presença no Facebook.
Podem confirmar presença no evento no Facebook.
(Artigo publicado no n.º 3 do Lado Direito, jornal da Juventude Popular de Lisboa)
O mês que passou viu as ruas de centenas de cidades em todo o mundo serem varridas por uma vaga de indignações e ocupações. Enquanto na Europa o efémero movimento já perdeu força, nos Estados Unidos da América os ocupantes de Wall Street continuam a aumentar os seus números. Motivados pelo livro panfletário Indignez-vous! da autoria do intelectual francês Stéphane Hessel e, certamente, pelo revanchismo patente em Inside Job, uma película cinematográfica à boa maneira de Hollywood, plena de pseudo-moralismo esquerdista, os “indignados”, a começar por Hessel, acertam no diagnóstico mas falham redondamente na cura, conforme Axel Kaiser e Russ Roberts evidenciam.
Os indignados acertam em cheio quando reclamam contra a relação promíscua entre o poder político e a banca. Tanto nos EUA como na Europa, assistimos nas últimas décadas a uma convergência de interesses entre políticos e banqueiros. Os políticos expandiram o aparelho estatal a coberto do Estado Social, prometendo benefícios e direitos como forma de ganhar eleições, e ao aperceberem-se que não seria aceitável aumentar (ainda mais) os impostos cobrados aos contribuintes, descobriram que a forma que tinham de continuar a financiar as suas clientelas eleitorais e partidárias era através de empréstimos, ficando em larga medida à mercê da banca. Na Zona Euro, acresce ainda uma outra perversão, a da moeda única. Esta incentivou os países conhecidos jocosamente como PIIGS a endividarem-se a juros baixos, que se justificavam em virtude dos investidores terem encarado os títulos de dívida destes tão seguros quanto os da Alemanha, crendo que esta e a França os resgatariam se algum deles entrasse em incumprimento. Com estes incentivos, não admira que os políticos dos países do sul da Europa tivessem aproveitado a oportunidade para prometer aos eleitores mais benefícios, assim conseguindo vitórias eleitorais e alargando redes clientelares onde a promiscuidade entre políticos, banqueiros e empresários é a regra. E tanto na Zona Euro como nos EUA, a actividade dos bancos centrais é também ela perversa, pois não só criam dinheiro a partir do nada e mantêm taxas de juro artificialmente baixas, como se prestam ainda à função de credor de último recurso, resgatando bancos privados mal geridos em vez de os deixarem falir, como defende o mercado livre e o capitalismo.
Mas os ocupantes de Wall Street e os seus camaradas europeus falham redondamente quando ao criticarem este panorama o denominam como capitalista, visto que na realidade aquilo a que assistimos é mais correctamente designado por crony capitalism, ou seja, uma perversão do capitalismo em que os privados se tornam próximos do poder político e fazem depender o seu sucesso dos favores que este lhes confere. O diagnóstico dos sintomas está correcto, mas a doença não é demasiado capitalismo mas sim pouco capitalismo. O capitalismo e o mercado livre fundamentam-se, como Kaiser assinala, na concorrência entre actores privados como os bancos e empresários, na ausência de agências de planeamento monetário centralizado, na falência de empresas que são geridas de forma irresponsável, numa moeda forte que assegure o poder de compra do dinheiro das pessoas, e na ausência de relações promíscuas entre o governo e as elites económicas. Ou seja, exactamente o oposto daquilo a que vimos assistindo um pouco por todo o Ocidente.
A solução dos indignados para um problema que é reflexo da expansão do aparelho estatal é mais estado, o que é perfeitamente ilógico: é o paradoxo dos indignados. Para Hessel, se os políticos e burocratas tiverem mais poder, o sistema será menos corrupto. A evidência histórica mostra precisamente o contrário, e não é por acaso que os países mais corruptos são aqueles onde o estado e os políticos têm mais peso na sociedade. Esta solução errada baseia-se em ideias que há muito vêm fazendo escola no pensamento político, tendo contribuído para alguns dos maiores desastres da humanidade, nomeadamente a combinação entre o colectivismo e o bem comum na perspectiva de Rousseau e a rejeição da liberdade individual que é o fundamento essencial da civilização ocidental.
Torna-se, por tudo isto, perigoso que no debate público as ideias erradas dos indignados, subscritas por muitos intelectuais, criem raízes duradouras. Indignações fundamentadas em ideias erradas reflectem-se em soluções erradas, apenas agravando o problema. E é por isso que intelectuais, académicos e políticos com especial responsabilidade na criação e difusão de ideias devem esforçar-se para que o debate público não se torne, como em outras épocas, propício a que ideias potencialmente totalitárias se tornem dominantes.
(Artigo publicado no n.º 2 do Lado Direito, jornal da Juventude Popular de Lisboa)
Philipp Bagus, professor na Universidade Rey Juan Carlos de Madrid, escreveu recentemente um interessantíssimo livro que elucida de forma clara o caminho que a União Europeia tem percorrido, em particular no que diz respeito ao sistema monetário. Sugestivamente intitulado The Tragedy of the Euro, está disponível gratuitamente no site do Instituto Ludwig von Mises em http://mises.org/resources/6045/The-Tragedy-of-the-Euro.
Começando por contextualizar historicamente a introdução do Euro, Bagus perspectiva a União Europeia como sendo um projecto resultante de duas visões opostas. A primeira é a visão liberal, que preponderou no início do projecto europeu, tendo sido promovida por políticos liberais, conservadores e democratas-cristãos de países como Inglaterra, Alemanha e Holanda. A segunda é a perspectiva socialista, que tem nos franceses Jacques Delors e François Miterrand expoentes máximos. Enquanto os primeiros consideram a liberdade individual como o valor mais importante, defendem os direitos de propriedade, o mercado livre e uma Europa sem barreiras fronteiriças que assim permita a livre circulação de pessoas, mercadorias, serviços e ideias, e são extremamente cépticos em relação ao processo de transferência de soberania, centralização e concentração de poder numa entidade supra-estatal, os segundos, por seu lado, sonham precisamente com a reprodução a nível europeu do estado-nação, fundamentado no modelo do Estado Social e, portanto, operando a nível central os processos de redistribuição, regulação e harmonização da legislação de toda a Europa.
A visão socialista é a que tem preponderado desde a entrada do Euro em circulação, que se tornou um factor ao serviço da centralização de poder em Bruxelas, reforçando tendências como a realização de políticas de redistribuição de riqueza e regulamentação excessiva, ao mesmo tempo que fomentou o endividamento público financiado pelo BCE. Tendo falhado o projecto de uma constituição europeia, o Euro é hoje um dos últimos instrumentos ao serviço desta visão. Citando Philipp Bagus, “o Euro provoca o tipo de problemas que podem ser vistos como um pretexto para a centralização da parte dos políticos. De facto, a construção e instalação do Euro provocaram uma corrente de severas crises: os estados membros podem utilizar a impressora para financiar os seus défices; esta característica do Sistema Monetário Europeu invariavelmente leva a uma crise de dívida soberana. A crise, por sua vez, pode ser usada para centralizar o poder e políticas fiscais. A centralização das políticas fiscais pode então ser utilizada para harmonizar a taxação e acabar com a competição”.
Infelizmente, e embora eu seja um simpatizante dos objectivos primordiais da UE, norteados pela visão liberal, não é difícil observar que a UE encontra-se hoje dominada e liderada por partidários da visão socialista, sendo uma entidade que tende para um constante reforço do processo de centralização de poder, que aumenta o défice democrático – que, como o filósofo britânico Roger Scruton evidencia em As Vantagens do Pessimismo, não é uma deficiência a ser colmatada pela UE mas sim uma característica estrutural do funcionamento das instituições europeias – e que produz cada vez mais legislação que já ninguém pode entender no seu todo, regulamentando cada vez mais aspectos da vida dos indivíduos e acabando por realizar uma espécie de planificação económica através da via monetária que se tem revelado particularmente ruinosa, como a crise das dívidas soberanas tornou evidente.
Até na intolerância por muitos demonstrada, que reduz o debate a europeístas vs. eurocépticos, como se muitos dos alegados eurocépticos não fossem também europeístas, embora não partidários desta visão socialista da UE, e na linguagem utilizada, por exemplo, ainda recentemente, por Durão Barroso quando propôs que todos amássemos incondicionalmente a UE, observamos cada vez mais reminiscências de uma mentalidade socialista que pretende reproduzir o nefasto nacionalismo a nível europeu, cujas experiências históricas passadas parecem ainda não ter servido de lição a quem nos lidera. Permitam-me ironicamente adaptar aqui uma célebre – pelos piores motivos – expressão de um ex-Presidente da República, Jorge Sampaio, para finalizar afirmando que há mais vida para lá do europeísmo socialista. Bagus está sem dúvida cheio de razão quando nos diz que “está longe da verdade que o fim do Euro signifique o fim da Europa ou da ideia Europeia; significaria apenas o fim da versão socialista desta”.
A narrativa política europeia encontra no seu cerne, desde há décadas, o propalado Estado Social. As raízes deste datam de um dos grandes teóricos políticos da era vitoriana, Jeremy Bentham, pai do utilitarismo. Embora este fosse um defensor do laissez-faire e de um estado pouco intervencionista, o seu princípio utilitarista da “felicidade do maior número” inspirou muitos dos políticos britânicos do século XIX, contribuindo directamente para a justificação de uma crescente intervenção do estado na sociedade, acompanhada por uma expansão das suas competências administrativas.
No centro da Europa, Otto von Bismarck, feroz opositor do socialismo, aplicou programas de apoio social na Prússia e na Saxónia, e após a unificação alemã (em 1871) criou os alicerces do moderno conceito de Estado Social ao introduzir um sistema de segurança social com pensões de invalidez, doença e reforma e acesso a cuidados médicos providenciados pelo estado. O Chanceler alemão pretendia garantir a coesão social e impedir que eventuais descontentes pudessem ser ideologicamente tolhidos pelo socialismo de cariz mais radical, mas o mundo não se livrou de ver aplicados regimes políticos assentes no socialismo – fascismo, nazismo e comunismo – aquilo a que Friedrich A. Hayek chamou de “hot socialism”, por oposição ao “cold socialism” do Estado Social.
Após a II Guerra Mundial e no rescaldo da Grande Depressão, o Relatório Beveridge de 1942 propôs um amplo modelo de Estado Social que se tornou politicamente consensual, sendo perspectivado como uma terceira via entre o comunismo e o capitalismo, inspirando, portanto, a social-democracia. O princípio chave deste modelo é o conceito de justiça social que permitiu, por um lado, novas reivindicações por parte dos cidadãos em relação ao governo, mas por outro, permitiu também a este alargar discricionariamente os seus poderes em nome da justiça social.
Que o conceito de justiça social seja desprovido de sentido e se fundamente em pouco mais que a redistribuição de rendimentos para atingir propósitos políticos, é algo que não impediu que este se tornasse o mais eficaz argumento na discussão política contemporânea, servindo os propósitos de justificação de qualquer medida e rapidamente enfraquecendo a eventual oposição a esta. Acontece que, conforme Hayek assinala, ao contrário do socialismo original, o conceito de Estado Social não tem um significado preciso, e prova disto mesmo são os modelos diversificados aplicados em vários estados – assim como o debate de surdos ferido de morte pela demagogia, para o qual, em Portugal, o Partido Socialista liderado por José Sócrates contribuiu de forma determinante.
Certo é que, também de acordo com Hayek, nas sociedades industriais contemporâneas, não há razão, dados os níveis de riqueza alcançados, para não garantir um mínimo de segurança económica a todos os cidadãos, sem que tal coloque em causa a liberdade individual, até porque ao estado compete assegurar a manutenção da regras gerais de conduta e funcionamento da ordem alargada da sociedade, deixando aos indivíduos uma larga esfera de liberdade individual, mas também providenciar bens e serviços que o mercado não produz ou não pode produzir adequadamente. O problema surge quando o estado não se confina a si próprio e, legitimando e disfarçando as suas intenções sob o manto da justiça social, acaba por utilizar os seus poderes coercivos (por exemplo, a capacidade de cobrar impostos), para atingir propósitos políticos não consensuais na sociedade, reclamando ainda direitos sobre determinadas áreas da vida desta, e criando uma miríade de instituições que actuem nestas áreas. Este alargar das competências do governo fundado na distribuição de recursos e rendimentos, para além de distorcer o funcionamento da economia de mercado, levou ao enorme crescimento de um aparelho para-governamental que consiste em associações comerciais, sindicatos e organizações profissionais que tentam captar favores governamentais em troca do seu apoio político.
Foi desta forma que durante a segunda metade do século XX assistimos a um aumento exponencial de clientelas políticas e dependentes do estado e à captura deste por grupos de interesses organizados, degenerando o modelo do Estado Social em algo que vai muito para lá dos seus alegados propósitos de bem-estar social (saúde, educação, segurança social). Mais grave ainda, os defensores do intervencionismo estatal – sejam comunistas, socialistas ou social-democratas – não compreendem que foi precisamente o Estado Social que acabou por quebrar muitos dos vínculos tradicionais entre os indivíduos, tornando-os mais isolados e mais egoístas (num sentido pejorativo), e deixando-os à mercê de máquinas burocráticas que assumem crescentemente características de organizações ou sociedades de pendor totalitário.
Se queremos manter os propósitos do Estado Social, este necessita de uma refundação urgente que o resgate dos seus efeitos verdadeiramente anti-sociais e lhe dê sustentabilidade financeira. Não é financeira nem moralmente viável continuar a aumentar impostos para sustentar um modelo social degenerado. E o facto de, em Portugal, termos levado o endividamento externo (e toda a dívida estatal significa impostos futuros) a níveis que estão muito para lá do aceitável é mais que suficiente para nos fazer pensar nisto, porquanto está indelevelmente colocado em causa o princípio da solidariedade inter-geracional. Chegamos ao actual estado de coisas com a nossa liberdade cada vez mais reduzida, obrigados à submissão para que nos seja possível sobreviver, enquanto a União Europeia vai navegando à vista nesta crise das dívidas soberanas que arrisca fragmentar ou aprofundar o processo de integração europeia.
Entretanto, considerando o acordo com a Troika FMI/BCE/CE, temos uma apertada margem temporal para operar uma verdadeira reforma estrutural que diminua o peso do estado na economia e na sociedade, o que passa por extinguir milhares de organismos, institutos, fundações e privatizar ou também fechar muitas das empresas do sector empresarial estatal. Nesta matéria, o Orçamento Geral do Estado para 2012 será a prova de fogo do actual governo PSD-CDS. Simultaneamente, precisamos também de pensar o nosso lugar no Mundo. O vector europeísta da nossa política externa está cada vez mais esgotado e esta, que sempre serviu para que procurássemos no exterior recursos para nos desenvolvermos internamente, precisa de se virar para onde estes existem e onde, ainda por cima, os seus detentores nos são histórica e culturalmente próximos. O Atlântico sempre foi o principal vector desta, até 1974. Talvez esteja na altura de recuperar esta orientação para que, como escreveu Fernando Pessoa, possamos cumprir Portugal.
(Artigo originalmente publicado no primeiro número do Lado Direito, jornal da Concelhia de Lisboa da JP, conforme aqui referido.)
O primeiro número do Lado Direito, jornal da Concelhia de Lisboa da JP, já está disponível. Para além das entrevistas a Miguel Pires da Silva (Presidente da JP) e à nossa Raquel Paradella Lopes (Presidente da Concelhia de Lisboa da JP), podem encontrar também um artigo do Michael Seufert onde revela o seu percurso na JP, bem como vários artigos de opinião, entre os quais um da minha autoria intitulado "Do anti-social Estado Social à necessidade de cumprir Portugal". Podem aceder aqui ao Lado Direito.
Quem me conhece e/ou quem me lê, sabe que fui e sou um acérrimo crítico de determinadas práticas partidárias e das respectivas juventudes. Sabe, também, que as realidades que conheço mais de perto são a da JS e a da JSD. Não por acaso, em tempos, estive perto de me filiar na JSD, mais por uma questão de amizade e lealdade para com algumas pessoas, do que propriamente por convicção ideológica - aliás, um liberal-conservador como eu, em pouco ou nada se pode rever na social-democracia, ainda que o PSD tenha correntes que vão desde a social-democracia mais esquerdista ao conservadorismo mais direitista.
Contudo, porque não devo obediência a não ser à minha consciência, e porque ainda gosto de estar em paz com esta, certas práticas que, a meu ver, são imorais, ilícitas e/ou ilegais, a que assisti recorrentemente, causaram-me ainda mais repulsa em relação às juventudes partidárias, pelo que não poderia nunca pautar-me pelas mesmas. Mas as realidades das quais tinha mais conhecimento em nada se comparam ao que encontrei na Juventude Popular, quer pelas pessoas que me acolheram com uma simpatia que não me recordo de encontrar noutros lados, quer pela própria postura destas perante a política e, acima de tudo, pelo facto de me rever ideologicamente na matriz do CDS-PP.
Ainda que não precise da política para viver, e não tencione vir a precisar, pois que a carreira que pretendo fazer é a académica, certo é que me custa continuar a assistir impávido e sereno a este caminhar para o abismo em que principalmente o PS nos tem levado. É preciso não só intervir na academia e na blogosfera, mas também na sociedade. E em democracia, goste-se ou não, os partidos são determinantes para o rumo que um país tenha.
Sendo que o que me move são causas que vejo reflectidas na retórica do CDS-PP, perante este actual estado de coisas, considerando os incertos e negros tempos que se avizinham e tendo a clara noção que os portugueses apoiam a democracia mas estão cada vez mais exigentes, pelo que o tradicional centrão cada vez vai servindo menos os propósitos do país, decidi, portanto, intervir mais activamente, pelo que, desde hoje sou membro da Juventude Popular.