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Tenho a forte convicção - ou, pelo menos, esperança - que daqui a uns anos o discurso político em Portugal será bafejado por um conjunto de indivíduos que em termos de teoria política estão bem mais preparados para fazer corresponder as políticas públicas à teoria e à realidade do que a comummente chamada "Geração de Abril" e os seus sucedâneos - falta apenas saber se até lá entramos na bancarrota ou não. Portugal precisa de uma grande mudança (para que fique tudo como está, diria Lampedusa) em toda a escala, no que diz respeito à arquitectura constitucional e administrativa, e alternativas não faltam, falta apenas vontade política - a qual também não poderá nunca vir daqueles que se sentam à mesa do orçamento do dinheiro dos contribuintes.
E uma dessas necessárias mudanças é a refundação da direita portuguesa, sob a égide de um partido verdadeiramente de direita liberal e conservadora. A palavra chave é o "verdadeiramente": um partido que não tenha medo de assumir que é de direita, liberal e conservador, e que não continue a dizer-se social-democrata e a ser subserviente à esquerda e às suas políticas que nos vão levando para o abismo. Um partido que tenha quadros de valor e não idiotas úteis e especialistas em golpadas; que saibam do que falam e se desprendam do velhinho discurso da social-democracia, que, na verdade, pertence de todo o direito ao PS. Talvez não fosse mal pensado, como sugere José Manuel Moreira, voltar a utilizar a sigla PPD, para mais tarde deixar cair o PSD. Pelo meio, talvez refundir o PPD e o CDS/PP num só partido com uma clara definição e distinção ideológica dos restantes - esta seria uma hipótese para talvez tentar recuperar alguma da credibilidade que há muito o sistema partidário perdeu. É também necessário acabar com os complexos do povo de que tudo o que é de direita é mau e tudo o que é de esquerda é bom, algo bem mais complicado de alcançar, mas que sem uma refundação do discurso político-partidário torna-se, certamente, tarefa impossível.
Até lá, apetece transcrever na íntegra muito daquilo que vou lendo, especialmente das crónicas de José Manuel Moreira, agora que finalizei a leitura da obra Leais, Liberais & Imparciais, e que me debruço sobre a caipirinha aroniana do Henrique Raposo.
Sobre a necessidade de termos jovens quadros que saibam o que fazem, transcrevo aqui uma parte do artigo de José Manuel Moreira intitulado "Os Pequenos e a Praia Grande", acerca de um convite que aceitou para ser orador numas jornadas da JSD há uns anos:
"Foi uma experiência única, para não mais esquecer. Ninguém tirava um apontamento, o pessoal parecia estar ali a fazer um frete, e mais preparado para a praia e a noite do que para o duro trabalho de reflexão política.
Desconfiei até que, para a sala estar sempre mais ou menos composta, havia uma espécie de rotação de jovens, talvez para permitir, por turnos, a cada um fazer outras coisas mais interessantes do que aturar os oradores convidados.
Como seria possível esta gente estar preparada para enfrentar os problemas do País com este desinteresse pela discussão dos princípios e fundamentos da política e das políticas? A resposta veio logo a seguir, com a incoerência, a inconsistência e, por fim, a trapalhada de que os governos do PSD deram mostras. A vitória de Sócrates surgiu assim naturalmente; a surpresa veio só de o seu programa ser tão social-democrata.
Só que os "sociais-democratas" do PSD ainda não descobriram, talvez porque lhes falta preparação política, que o espaço da social-democracia já está ocupado, e bem, e que o futuro depende agora de serem capazes de forjar um novo espaço onde possam explorar alternativas ao modelo de Estado de Bem-estar.
Um prestigiado académico de esquerda, Patrick Dunleavy, costuma dizer que o principal desafio aos fundamentos do modelo socialista e social-democrata de sociedade, está na argumentação filosófica e teórica desenvolvida pela escola austríaca de economia e pela teoria da escolha pública.
Será por isso difícil fazer verdadeira oposição a Sócrates se se vive na ignorância sobre as bases dessa argumentação. Mas, infelizmente, é dessa ignorância que tanto as bases vencedoras como as elites perdedoras do PSD, dão sobejas provas, ainda que mostrem saber como compensar a carência de ideias com excesso de intriga, jogadas de bastidores, golpes baixos e ultrapassagens rápidas."
(imagem picada daqui)
Ainda não vou sequer a meio, mas este livro que reúne diversas crónicas de José Manuel Moreira é, de facto, um must na biblioteca de qualquer liberal português, ou de qualquer português interessado nestas matérias. Aqui ficam os dois últimos parágrafos do artigo "Liberalismo e Democracia", cuja leitura integral fortemente recomendo:
O objectivo liberal permanente é fraccionar os sistemas sociais, dividir os poderes do Estado, fraccionar os cargos e funções do topo à base, tão a fundo quanto seja possível, e estabelecer controlos e equilíbrios. Um dos fins desta preocupação generalizada de limitar o Governo e fraccioná-lo é o de preservar um espaço cívico tão vasto quanto seja possível para a acção voluntária dos indivíduos e suas associações.
Não basta o desejo de liberdade, requer-se a sua disciplina, de preferência a autodisciplina. Tem por isso razão Fernando Pessoa para afirmar que "a ânsia de liberdade é comum ao homem superior e ao mendigo que não quer trabalhar. Assim, as instituições liberais tanto podem significar a expressão da liberdade, como a expressão da incúria e do desleixo".