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Para quem observa o declínio de Portugal, como é o meu caso, e assiste, com pesar e inquietação, ao deslaçamento do contrato social, a sucessão de acontecimentos dos últimos dias não oferece uma boa disposição de espírito. Para qualquer observador minimamente arguto, é claro e cristalino que a resolução da crise terá de passar, inevitavelmente, por um compromisso de regime. O título desta posta é, aliás, premonitório. Porquê o Compromesso Storico? A política pactista alinhavada pelo PCI de Berlinguer - que teve entre os seus apoiantes nomes sonantes como Norberto Bobbio - visava acomodar os diversos interesses políticos em jogo na cena política italiana. Com o terrorismo em alta, e a emergência de um clima de caos político larvar, o PCI, pela iniciativa do seu secretário-geral, gizou uma política de aproximação aos interesses orgânicos do Estado italiano, de molde a controlar as forças centrífugas que então ameaçavam a unidade do poder político italiano. As semelhanças com o que Portugal necessita terminam, contudo, aqui. A experiência italiana não pressupunha uma reforma do Estado, nem o rejuvenescimento da economia. O PCI estava bem longe, longíssimo se quiserem, de aceitar, ou poder aceitar, uma política reformista. A ligação a Moscovo, esfriada é certo, ainda impunha alguma contenção na hora de admitir concessões políticas de vulto.
Esta resenha histórica tem a óbvia vantagem de indicar as vantagens de um espírito compromissório, mormente quando estão em confronto visões da sociedade diametralmente opostas. O espírito de compromisso quando existe, falho ou não, permite superar divergências políticas praticamente inconciliáveis. No Portugal "troikado" dos dias que correm temos um PS pouco disposto a participar na regeneração da pátria - sem que haja, todavia, a divisão política que existia entre o PCI e a Democracia Cristã italiana -. A insistência na histrionice política não cede o passo ao realismo das dificuldades. A recusa do PS é, em grande medida, a recusa das elites em aceitar a falência de um modus vivendi que arremessou o país no precipício da ruína generalizada.
De António José Seguro já não há muito a esperar: falta-lhe estatura política, um desígnio, um pensamento próprio, coerente e realista que vertebre um programa claro e exequível. Por mais que se bosqueje, por mais que se busque, não se encontra nada. A política socialista afogou-se no lamaçal do fechamento político. Há excepções, sempre as houve, o busílis da questão prende-se tão-só com o facto dessas vozes estarem apartadas da liderança do partido. Veja-se o caso de Luís Amado - bem sei que muito boa gente discorda desta opinião -, um político que, concordando ou discordando, vem mantendo uma linha que, se fosse adoptada pelos dirigentes máximos do seu partido, poderia auxiliar sobremaneira a consecução de um pacto de regime.
Entendamo-nos, a reforma do país dependerá, sobremodo, do espírito pactista dos principais partidos do regime. Ou há uma abertura para aceitar as alterações de fundo que o Estado e a economia demandam, ou então o regime acabará por pagar a factura da inadimplência política da partidocracia vigente. Um compromisso histórico, que verta o seu âmbito nas áreas fulcrais da governação, é a peça que falta na reforma do regime. Um compromisso que junte, congregue, englobe e não exclua. Um compromisso pragmático. Só assim lograremos sair do pântano político em que estamos imersos. Haja coragem!
Luís Amado, provavelmente o único Ministro do Governo de José Sócrates que é tido em apreço pelas três forças partidárias do arco governamental, que tantas vezes afirmou o fim do neo-liberalismo (assisti a duas em conferências), veio hoje dizer que a "economia portuguesa deve ser submetida a um choque liberal". Posição ingrata esta, a de MNE, em que se viu provavelmente forçado a embalar na onda que tomou forma após a queda do Lehman Brothers, para agora reconhecer aquilo que muitos, entre os quais esses temíveis seres que se intitulam de liberais, já sabem desde há bastante tempo a esta parte. Não deixa, contudo, de ser interessante notar o timing, num rasgo de "vira-casaquismo" que deixa para trás muitos dos que se preparam para o mesmo. Pela falta de consistência e coerência de grande parte dos actores políticos da nossa praça, tem toda a razão o Henrique Raposo: "Liberais-conservadores vão começar a sair debaixo das pedras, numa espécie de milagre de multiplicação ideológica. Vai vir charters de liberais".
E quando é que Francisco Assis vira a casaca e cai na real? Uma pessoa com a formação intelectual de Assis sabe bem (ou deveria saber) que uns 99% do que andou por aí a dizer não passava de patranhas para manter o querido líder no poder, em nome de um pseudo-maquiavelismo há muito prejudicial do tão propalado "interesse nacional". Estamos à espera, take your time. Amado vai na frente mas a prova ainda agora começou.
Kadhafi acaba de declarar o cessar fogo. Pode consistir num estratagema susceptível de dilatar no tempo, as possibilidades de sobrevivência do seu regime. Ainda ontem ameaçava "partir para loucuras" e fazer a vida de outros "num inferno". Hoje e numa das habituais reviravoltas, o discurso é outro.
No entanto, se a notícia se confirmar no terreno - o que é ainda muito duvidoso -, trata-se de uma extraordinária vitória de uma ONU muito desprestigiada. Prova-se assim absolutamente correcto o voto de ontem e para o qual Portugal contou. Entretanto, em S. Bento continua a demagogia de sempre e neste caso, Sócrates tem razão.
Os britânicos também tinham a razão do seu lado e isto, desde o primeiro dia.
* Se pretenderem rir um pouco com o farsante em causa, poderão obter algumas informações neste artigo do Público: pobrezinhas tendas como cenário "a fazer de conta", bunkers, piscinas de 100 metros, cirurgiões estéticos à Berlusconi, um "Ho(l)me(s) Place" e outras excentricidades à disposição do homem que declaradamente gostava de ser "como" a Rainha de Inglaterra.
Portugal de regresso à normalidade: fez o que devia, ministro Luís Amado
A actual situação de guerra total e sem olhar a meios, exige a obliteração do regime do Sr. Kadhafi. Não pode haver qualquer ensejo de contemporização para com o déspota, ou pretender a reforma de um regime que durante quarenta anos, empilhou provas insofismáveis da sua marginalidade. Propor um "período de transição" com a gente que comanda em Trípoli, pode levar muitos a pensar que consiste numa tentativa de "salvar o que possa ser salvo". Ali, pouco ou nada existe para aproveitar e este deve ser um capítulo definitivamente encerrado.
O ministro Luís Amado finalmente acedeu a esclarecer a posição portuguesa, que contudo permanece prisioneira ao estranho princípio de um compromisso que todos sabemos muito difícil. De qualquer forma, as suas declarações no Maputo representam já qualquer coisa, mesmo verificando-se a existência de algumas zonas cinzentas no discurso. De facto, qualquer apeasement é inaceitável.
Hoje, nem Kadhafi pai ou qualquer outro membro da família, são hipóteses minimamente aceitáveis para a instituição de um Estado de Direito. Percebe-se facilmente que se não for possível obter uma vitória total com as óbvias consequências dela decorrente, o regime pretende pelo menos uma trégua que lhe permita reagir mais tarde, identificando adversários, consolidando posições e plausivelmente contra-atacar quando lhe for mais conveniente. Os Kadhafi não têm um mínimo de idoneidade no jogo diplomático entre potências, são avessos a qualquer noção básica de Direito Internacional, ameaçam sem escolher as palavras, não aceitam regras, nem hesitam quanto a reacções desproporcionadas. Pior que tudo, sempre foram absolutamente imprevisíveis. Comprovada esta verdade de décadas, deverão desaparecer da cena, por muito que isso custe aos seus amigos e recentes interlocutores da política e dos negócios. Que isto fique bem claro, pois para evitar desastres futuros, não há lugar para uma solução "à romena-Illiescu". Nas Nações Unidas, os aliados tácitos de Kadhafi - russos, chineses, e comparsas menores, alguns dos quais, envergonhados europeus que não valerá a pena mencionar -, demonstram bem a necessidade de um forte sinal a enviar à comunidade internacional.
O comércio pode esperar, mas os princípios impõem-se a um Ocidente que não pode nem deve transigir. Até os americanos finalmente parecem render-se a esta necessidade.
Adenda: são 21.01H e dentro de uma hora, o C.S. da ONU votará a resolução. Esperamos para ver qual será a posição portuguesa. Ficaremos a saber se Portugal votará ao lado da sua aliada de mais de sete séculos - além da França e EUA -, ou se tergiversará no sentido da decisão ou apetite do seu "tutor" de Berlim, o que possivelmente significará uma abstenção igual á russa ou chinesa.
Ontem, ameaçava o Ocidente com a retirada das concessões na exploração de petróleo e jogava a cartada da divisão na ONU, oferecendo-as à China, Rússia e Índia. Hoje, numa arenga televisiva, confirma plenamente aquilo que há muito se sabe. Se as suas tropas conseguirem vergar uma cidade de quase 700.000 habitantes como Bengazi, a chacina será total. Como dissemos desde os primeiros dias, os ingleses parecem estar envolvidos na muito legítima sublevação contra o ditador.
De mãos atadas por alemães, russos e chineses, do que estarão à espera americanos, ingleses e franceses? Completamente fora de si, Kadhafi também "decreta" o fim da Liga Árabe.
Nos primeiros dias da sublevação, Portugal tomou uma posição firme, mas agora, onde está ela? Porque razão o sr. Luís Amado não deixa a zona turva e faz aquilo que deve, reconhecendo a oposição ao tirano enlouquecido? Estará à espera de San Marino, da Estónia ou da Eslovénia? Pior que tudo, agora parece querer agradar a Kadhafi e pretende voltar atrás. Embora os jornais nacionais façam a censura - nenhum publica uma só linha - que lhes é típica, a Aljazeera noticia que Portugal acaba de se juntar aos alemães e África do Sul, mostrando "dúvidas" quanto à implementação da zona de exclusão aérea, aliás uma medida insuficiente.
Não há quem nos livre de vergonhas sobre vergonhas?
Todos sabemos o que a França significou, ou melhor ainda, o que foi. No entanto, ontem teve a coragem de fazer aquilo que se esperava noutras latitudes. Assim sendo, do que estará à espera o governo português? Após as declarações mornas do sr. Luís Amado, já não se pode ficar a meio do caminho. Fazem sequer uma ínfima ideia acerca do esquizóide com quem têm gostosamente lidado em Trípoli? Pensam que Kadhafi e o seu bando de rufias facilmente esquecerão? Ainda há pouco, o jornalista da Aljazeera presente na reunião da U.E. em Bruxelas, dizia que as "pequenas nações" estão á espera daquilo que as "grandes" - França, Reino Unido, Alemanha e Itália - decidirem. O sr. L. Amado ontem declarou ter transmitido a mensagem ao enviado de Kadhafi, afirmando ter o seu regime terminado. Do que está então à espera? Dos letões, lituanos, croatas, dinamarqueses, austríacos, búlgaros, belgas, estónios, gregos, eslovacos ou eslovenos?
Julga o sr. Amado que Portugal estará a esse nível? Não valerá a pena esperarem por Washington.
Endireitem a coluna vertebral, pelo menos uma vez na vida.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, vem agora dar a voz ao seu governo. Após os negócios com o regime de Kadhafi, pretende responder às generalizadas críticas, algumas das quais, bastante violentas.
As relações de Portugal com outros países, não podem pautar-se por sentimentalismos, é certo. Se de outra forma fosse, permaneceríamos isolados e a realidade diz que nem sequer os nossos mais próximos aliados - Estados Unidos, Alemanha ou Espanha, por exemplo - podem eximir-se a críticas quanto a certas políticas consideradas como obscuras. Há uns anos, já aqui falámos da necessidade de Portugal competir com outros Estados, procurando a obtenção de vantagens políticas e económicas, mesmo que nalguns casos, possamos tropeçar num ou noutro déspota. Angola é o caso mais evidente e do qual ainda ouviremos falar. A política não pode ser feita de outra forma, sob pena da condenação ao completo ostracismo, desperdício de possibilidades, usura da capacidade económica do país e porque não?, do prejuízo geral.
O que tem sido controverso, é o patamar atingido quanto a certos relacionamentos, sempre ligados a negócios que transcendem em muito, os interesses directos do Estado. Tudo isto torna ainda mais evidente, a total falta de transparência da conhecida transumância entre o dinheiro e a política portuguesa, seja esta qual for. Agravando as dúvidas, o governo arremete em direcção ao total comprometimento político, consagrado em actos simbólicos.
No que respeita à Líbia, não estamos a falar numa ditadura semelhante à egípcia, se é que o forte autoritarismo dos militares de 1952, pode ser considerado como um sistema ditatorial. A diferença entre o despotismo de Kadhafi e a oligarquia cairota, é abissal em todos os aspectos a analisar, com a agravante da Líbia ser um país escassamente povoado e detentor de uma colossal riqueza petrolífera que há muito poderia tê-la guindado a uma indiscutível prosperidade. As imagens transmitem uma realidade de penúria, desorganização, falta de infraestruturas e o caos urbano, aspectos típicos de sociedades no limiar da subsistência.
É impossível o sr. Luís Amado poder um dia declarar, o seu desconhecimento em relação aos crimes que a comunidade internacional aponta a Kadhafi. Este homem, é um velho conhecido dos meandros do terrorismo internacional, desde o seu patrocínio a bandos como a Fracção do Exército Vermelho, o grupo Baader-Meinhof, a OLP na sua fase sequestradora e bombista de linhas aéreas, os grupos terroristas que quase derrubaram o regime italiano na década de setenta, etc. O caso Lockerbie foi um episódio de uma longa e sangrenta lista de atrocidades cometidas, às quais se somam todo o tipo de atropelos ao direito internacional, respeito pela soberania alheia e bem identificadas agressões militares além-fronteiras. Durante os anos 80 e numa sensacionalista declaração de estadista de pacotilha, Kadhafi ousou declarar a Madeira como parte integrante de África, ou seja, um "território a descolonizar". Se não encontrou qualquer eco, tal se deveu ao enraizado sentimento português naquele arquipélago. No entanto, a atoarda consistiu numa ostensiva ameaça à integridade e segurança do nosso país e o ministro dos Negócios Estrangeiros devia disso ter a plena consciência. A personalidade errática de Kadhafi, tornou-se numa permanente fonte de instabilidade e a tão imediata, como inesperada reacção ao seu recente amigo Itália-Berlusconi, é elucidativa.
No caso da Líbia, o governo não esteve bem, nem actuou em conformidade com a exigida prudência, especialmente quando se tratava de um Estado bem conhecido pelos problemas acima apontados. Houve um claro e desnecessário comprometimento político e excesso de efusividades, evidenciadas em atitudes que transcendem em muito, os normais procedimentos que a convivência entre Estados determina. Nem sequer nos aventando a considerar os ainda desconhecidos detalhes económicos das relações estabelecidas, a forma geral consistiu num desastre que era de antemão previsível. Aliás, o tempo escolhido para estes contactos com os chamados "Estados párias", é sempre em contra-corrente com o sentido de decoro que a situação internacional recomenda. A dimensão portuguesa aconselha a uma grande prudência, coisa que parece faltar a um governo que faz a gestão da política externa, ao sabor de alguns interesses privados e das suas prioridades mediáticas. Não só nos referimos à Líbia, como também ao Irão e principalmente à Venezuela, onde o nosso governo - e pior ainda, Portugal - tem sido de forma ultrajante, exposto à mais acintosa propaganda de Chávez.
Luís Amado tardou em tomar uma posição inequívoca e nos primeiros dias da sublevação, todos escutámos as suas palavras contemporizadoras e sugerindo "adaptações inadiáveis"! Estamos perante a notória queda de um regime e o que lhe sucederá, poderá pedir contas a S. Bento. Não tardaremos em sabê-lo.
A entrevista ao Diário de Notícias, surge numa fase de previsível desenlace, decerto fatal para as hostes dos até agora estranhos amigos da república portuguesa.
Adenda: após uma noite bem dormida, tive o prazer de ler este texto de Henrique Raposo. Diz o essencial.
Oferecemos aos "corporativos", uma foto feita em Lisboa: um futuro ex-caudilho, um intérprete, um futuro ex-1º ministro e duas futuras ex-bandeiras "nacionais"
Não é nossa norma, faltar ao respeito ao presidente da república ou ao 1º ministro. Podemos criticar ou aprovar atitudes, sem que isso queira dizer estarmos perante qualquer intenção destrutiva ou pelo contrário, subserviente. No entanto, existem aqueles que optaram pela destruição de reputações, enquanto outros exageram em superlativos afectos.
Há por aí um grupo de convivas, alegadamente boys a soldo do erário público, muito aflitos com certos abraços e beijos prodigalizados por quem fechou rendosos negócios com o coronel Tapioca de Trípoli. O problema não está neste mundo de negócios e nas normais relações entre Estados. Os "corporativos" sabem que houve quem ultrapassasse e muito, as fronteiras da normalidade. Quanto á Venezuela e Irão, o futuro o dirá.
Na última semana, decidiram publicar fotos com personalidades nacionais e estrangeiras, como o embaixador Martins da Cruz, Barack Obama, Jacques Chirac, Condoleeza Rice e N. Sarkozy. Surgem em fotografias feitas quando de encontros com o já ex-camarada Kadhafi.
Surpreendentemente, os bem denominados Câmara Corporativa - funcionando em matilha, que melhor nome poderiam ter? -, acharam por bem publicar uma foto em que o Duque de Bragança cumprimenta o embaixador líbio em Lisboa, numa cerimónia comemorativa do dia nacional da Líbia. Não existiu qualquer encontro com Kadhafi. A Casa Real jamais participou nos eventos tripolitanos e comemorativos da ex-revolução que agora cai por terra e muito menos, terá alguma vez lucrado com qualquer tipo de negociatas firmadas com Trípoli. A Casa Real não vende computadores, cimentos, armas ou telecomunicações. Isso fica para o lato âmbito "corporativo".
Os tolinhos de serviço, ainda não percebram algumas coisas:
1. Pelo seu frenético dedilhar no teclado, fazem cair a alegada "não relevância" do Duque de Bragança. De facto, as regras do protocolo e da diplomacia, ditam que o sucessor dos reis de Portugal, seja sempre convidado para cerimónias institucionais e o simples facto de ser chamado como representante da História de um país que os "corporativos" não conhecem, demonstra-o bem.
2. Os "corporativos Abrantes" - "diz-se" que este nome cobre um "colectivo", uma panóplia de boys - deviam consultar os convites endereçados pelo seu governo e pela sua presidência da república. Ainda há poucos meses e quando da visita de um conhecido Chefe de Estado a Portugal, a RTP mostrou o banquete oferecido por Cavaco Silva na Ajuda. Na mesa principal, apenas estava o casal presidencial, o casal visitante e o casal real. Para quem pretende demonstrar "irrelevâncias", não deixa de ser um tanto ou quanto difícil justificar esta constante.
Nota: neste último caso, o facto a reter, é aquele que se prende com o insólito de o Duque de Bragança ser convidado para jantar na sua própria casa que para o efeito, abre as portas a primos vindos do centro da Europa. Para cúmulo, o anfitrião é o verdadeiro intruso jamais referendado!
(foto do El País)
A partir de hoje, a crise financeira ficará suspensa por uns dias. A comunicação social irá concentrar-se no assunto que ocupará o topo da hierarquia da agenda mediática: a Wikileaks trouxe a público telegramas que confirmam as autorizações de José Sócrates e Luís Amado ao sobrevoo do espaço aéreo português por aviões da CIA que transportavam suspeitos de terrorismo. Não me interessa debruçar-me do ponto de vista moral sobre o assunto. O que interessa é que nos próximos tempos, a começar pelas manchetes dos jornais que sairão daqui a umas horas, andará meio país a falar deste assunto.
Ana Gomes, classificada por um assessor diplomático do Primeiro-Ministro como "uma senhora muito excitada que é pior que um rottweiler solto", voltará à ribalta já amanhã. Alguns pedirão que Amado cumpra o prometido e se demita. Sócrates será, também ele, instado a demitir-se - o que, obviamente, não fará. Cavaco, em campanha, não saberá bem como se manifestar e, provavelmente, optará pela gestão de silêncios. Alegre, a quem Lello se refere jocosamente, preferirá, também ele, a gestão de silêncios a comprometer o fraco apoio que tem do PS Socratista. Marcelo Rebelo de Sousa fará deste o tema central do seu comentário de Domingo. O Prós e Contras da próxima semana será dedicado ao assunto.
Passadas umas semanas, tudo ficará na mesma, excepto a situação do país, que continuará a agravar-se. Nessa altura, a crise voltará.
Uma sondagem de fim de semana, diz que o ministro Luís Amado é o mais popular membro do governo. Não nos admiramos.
Já não estamos na época em que gente como Talleyrand, António Vieira, D. Luís da Cunha, Metternich, Bismarck, Edward Grey, Kissinger, H. D. Genscher ou até um Palmela, Soveral ou Franco Nogueira conduziam negócios diplomáticos, fossem estes decorrentes do exercício da pasta ministerial, ou da actividade de representação numa importante capital. Quanto à praxis, a diplomacia quer dizer antes de tudo, discrição. Os assuntos de Estado, especialmente aqueles que envolvem negociações políticas e militares, devem ser protegidos por uma cortina de silêncios que conservem a bom recato, as trocas de informações e os convénios que visem a segurança geral ou de um determinado número de Estados. O mesmo poderemos dizer quanto a aspectos económicos, pois os melhores negócios são feitos pelas empresas, sempre que estas se encontrem respaldadas pelo indispensável suporte político que desbaste caminhos, afastando dificuldades de pormenor.
De Ribbentrop, antigo negociante de bebidas espirituosas que acabou como Aussenminister do III Reich, o seu colega Goebbels dizia que ..."conhece a Inglaterra através do whisky e a França pelo cognac". Falador incontrolável, cada uma das suas conferências de imprensa, significava mais encomendas de tanques que o governo francês apresentava à Renault, ou mais umas dúzias de Spitfires entregues às esquadrilhas da RAF. Foi este, o resultado da substituição do mais circunspecto von Neurath, pelo impetuoso, arrogante, sequioso por comendas e pouco polido "senhor do Partido".
Um ministro hiper-activo nos media, apenas poderá significar uma, de duas coisas: ou o seu país se encontra numa dificílima situação internacional devido a um conflito - recordamos o viajante Kissinger dos tempos da Guerra do Vietname ou Moshe Dayan nos anos 70-, ou então, na melhor das hipóteses, o titular dos Negócios Estrangeiros, nada mais é senão uma triste criatura ávida pelo protagonismo noticiário - quantas das vezes por motivações políticas de ordem interna -, sem um correspondente conteúdo na acção. De facto, a maior parte daqueles que cedem à tentação da oratória descontrolada, enganam-se na análise, ofendem os seus pares sempre atentos a quebras do rigoroso protocolo entre Estados, cometem muitos erros de apreciação, causam uma generalizada sensação de insegurança e concitam a aversão de outros, geralmente aqueles que estão mais próximos geograficamente, ou então, no caso português, dos países que connosco partilharam um espaço soberano outrora muito extenso.
O nosso país não se pode dar ao luxo de ter um ministro dos Estrangeiros ocioso, ou um inveterado palrador, cujo exemplar perfeito foi aquele titular das Necessidades que lamentando-se à imprensa, dizia que o seu ..."salário apenas chega para comprar uns charutos".
O ministro Amado não fala demais, nem parece ter de se auxiliar com sorrisos fáceis e palmadinhas nas costas. É discreto no seu deambular pelo mundo e não aparenta viver obcecado com a estreita meta europeia. Embora nem sempre concordemos com a aparência que este ou aquele assunto apresente, tem feito o seu trabalho de forma bastante satisfatória, há que dizê-lo. Os resultados estão à vista. A ideia absurda de obrigar um ministro dos Negócios Estrangeiros a proferir em público - seja na imprensa ou em pleno Parlamento -, aquilo que deve ser reservado à boa condução da política nacional, apenas servirá os desígnios dos próprios inimigos do Estado, sejam estes internos ou externos. Também será uma verdade, reconhecer que muito trabalho terá pela frente, pois a reorganização das nossas representações diplomáticas - onde a cultura e a economia deverão prevalecer de forma decisiva -, acompanhando a sensível modificação na correlação de forças no mundo. A Ásia deve ser cuidadosamente tratada e consiste precisamente, num espaço onde Portugal possui um considerável prestígio que provém de uma história ainda bem presente na memória de povos e dos seus dirigentes. Como exemplo, a recente visita do N.E. Sagres a Goa, revestiu-se de uma intensa carga emocional, bem presente nas manifestações de regozijo da população local. A isto, acrescentemos o facto de termos de tratar com alguns países, que parecendo territorialmente modestos para padrões asiáticos, ombreiam facilmente com qualquer potência europeia, seja pelo factor populacional, seja pelas oportunidades oferecidas pela situação geográfica, riquezas naturais, espantoso crescimento económico ou receptividade a produtos portugueses, até agora os eternamente ausentes nas prateleiras dos mercados.
A sondagem do Expresso, diz que o actual ministro dos Negócios Estrangeiros é o preferido pela generalidade dos portugueses. Pelas reacções já lidas, aqueles que andam na rua e passam os dias a ler A Bola, são mais conscientes do que a maioria dos "comentadores de partido".
Bem vistas as coisas, Luís Amado poderia ser ministro de qualquer governo, fosse ele formado pelo PSD, ou da responsabilidade do PS. Bem serve a República, como um dia poderá bem servir o Reino.
Mas uma coisa é certa, as relações Portugal-Sérvia não andam propriamente na mó de cima: