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Crónica de uma queda anunciada

por Samuel de Paiva Pires, em 11.03.25

Luís Montenegro poderia ter-nos poupado ao penoso espectáculo desta tarde, cujo desfecho estava mais do que anunciado. Já se tinha percebido que o Primeiro-Ministro não tem respeito pela função (“circunstância”, nas palavras do próprio) que desempenha, mas foi particularmente ilustrativo do irregular funcionamento das instituições vermos o Governo a aventar uma proposta de Comissão Particular de Inquérito em que o escrutinado é que decidiria o tempo de que os escrutinadores disporiam, numa clara intromissão do executivo no poder legislativo. Ao actuarem quase exclusivamente no domínio da táctica, acabaram a violar princípios basilares da democracia liberal e do republicanismo. Verdadeiramente notável.

Entretanto, com a rejeição da moção de confiança, chega ao fim um Governo despudoradamente classista e elitista, que governou a pensar essencialmente em determinados grupos e faixas etárias e para o qual a generalidade da população entre os 36 e os 67 anos de idade serviu apenas para pagar impostos que financiaram medidas e políticas públicas socialmente injustas e fiscalmente desiguais, cujo objectivo principal foi fidelizar determinados segmentos do eleitorado que o anterior Governo do PSD e CDS tinha alienado. A tão propalada estabilidade política não passa de uma farsa com que o Governo tentou escamotear a tragédia da continuada decadência de sectores cruciais para o desenvolvimento do país e o futuro da população, como a saúde e a educação, a habitação e a justiça. Abre-se, agora, uma janela de oportunidade para que um novo Governo tente fazer mais e melhor - e, de preferência, que não tenha problemas de carácter ético e/ou legal que, pese embora aproveitem invariavelmente aos populistas desavergonhados, são sintomáticos da lamentável degradação do regime.

publicado às 20:43

Um extraterrestre que aterrasse em Portugal, transportado pela recente poeirada subsariana, julgaria certamente que Pedro Nuno Santos (PNS) era o chefe incontestável da tribo lusitana, o manda-chuva, o chefão — o vencedor das eleições legislativas. A carta é curta, mas é grossa. Exige alguma transliteração. Requer tradução. Ou seja, para quem domine minimamente o idioma socialistês, e tenha um grau de proeficiência ideológico q.b., a coisa torna-se translúcida, fácil. Há abundância da forma condicional — o "se" e mais outro "se" e ainda outro "se". E soa tudo a charada — a chantagem dissimulada por floreados de facilitismos, a generosidade de espírito que encaixa bem na época festiva das liberdades, dos cravos e das revoluções. Pedro Nuno Santos instrumentaliza a Administração Pública como se a mesma fosse um cão amestrado para o circo das vontades socialistas. A negociação prévia é um oximoro-paradoxal — nada significa. As organizações dos trabalhadores há muito que foram organizadas pelos mesmos de sempre. E para demonstrar que o Partido Socialista soube acomodar-se à mudança horária, disponibiliza um cronómetro temporizado aos 60 dias, que quase rima com os 50 anos da invenção democrática, a solução congeminada em exclusivo pelos antepassados de Pedro Nuno Santos. Se o lider da oposição, com "enorme vontade de colaborar", já se manifestara publicamente, esta carta é perfeitamente dispensável. Sugere cabeça de cavalo numa cama ensanguentada da Aliança Democrática. Se eu fosse alguém, passava o tempo todo a olhar por cima do ombro. Se eu fosse o Montenegro, ou o Montecristo...

 

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publicado às 19:27

Como não vai ser o governo

por John Wolf, em 22.03.24

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Ainda no rescaldo dos resultados das eleições fifty-fifty — 50 anos do 25 de abril, 50 deputados do Chega, o que vai suceder nos próximos tempos de governação será relativamente simples de prever. Montenegro, íntegro e fiel aos seus princípios, não cedeu à solução da coligação, ao dispositivo de governação galvanizado, imune a reações políticas adversas, ou seja, a neutralização da oposição por via de uma maioria forçada e conveniente. Pedro Nuno Santos, raposa política oportunista por natureza, apresenta-se como estadista moderado, homem aparentemente respeitador do escrutínio e da vontade do povo — simpático, não parece? À primeira vista lembra o monge trajado com o hábito pacífico, inofensivo. Mas mal abram o debate no parlamento, a coisa mudará de figura. A ambição dos socialistas e dos afilhados da esquerda é de tal modo intensa, de tal ordem ideológica e reaccionária, que arrestará o superior interesse de Portugal para proveito partidário, faccioso. Querem o poder (novamente) custe o que custar aos portugueses. Qualquer proposta da Aliança Democrática (AD) que esteja dependente do consenso e da convergência, de todos e de tão diferentes sabores políticos da esquerda, resultará em impasses e paralisias — pura e simplesmente na anulação de ideias que tenham no seu ADN o mais pequeno indício de genes da direita. Nem vale a pena escutar a Mariana Mortágua, a Sousa Real, o Paulo Raimundo ou o Rui Tavares — sabemos qual será o seu software: um virus igualmente demolidor, por mais adequadas que sejam as propostas emanadas de um governo minoritário, serão sempre consideradas infecciosas e fatais, por serem da direita. André Ventura e Rui Rocha saberão gerir as incertezas que irão pairar sobre o espectro da governação, sem que possam trair ao que prometeram vir — contribuir para a edificação de uma vida melhor para os portugueses. Montenegro está a ser inteligente e estratégico — não deixou escapar pela boca, por onde morrem os peixes, um nome sequer. Os comentadores andam comichosos a tentar adivinhar quem serão os senhores que se seguem, para naturalmente iniciarem o seu processo contraprodutivo, destrutivo. Não sentimos que Montenegro esteja a pensar à socialista, à jobs for the boys. Com alguma sorte, se Marcelo não estragar as coisas, pode ser que vejamos em Portugal algo diferente e eventualmente melhor. No entanto, sem surpresa, tudo isto cheira a caldeirada típica dos atavismos e empates de Portugal. A expressão de um país inimigo de si mesmo, que esbanja mundos e fundos. E assim termino, prestando homenagem à figura que melhor corporiza essa ideia de divisão e caos, de desprogresso — Augusto Santos Silva, com quem não contamos para nada. Nem antes contávamos,  nem depois contaremos.

publicado às 19:16

Governo socialista à Bairrada

por John Wolf, em 18.03.24

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Devemos prestar muita atenção às palavras dos socialistas nos tempos que correm. Têm mau perder. Alexandra Leitão já começou a girar o espeto dos resultados eleitorais, a virar o prego do rombo das legislativas. As suas palavras são uma afronta à democracia, um insulto à ideia de legitimidade eleitoral e sugerem o extermínio do Chega. A ex-ministra (já nem sei de que pastel) já pegou na velha calculadora do Rato para fazer contas à vida de um putativo governo liderado pelos socialistas. A Aliança Democrática deve prestar um serviço ao país e não admitir que o jogo se faça apenas numa das metades do campo. Portugal corre o risco de se manter no mesmo marasmo e em semelhante pasmaceira, se aceitar este golpe palaciano pós-eleitoral. Cada vez mais julgo que Montenegro deve deixar-se de salamaleques e entrar em negociações cruas e nuas com o Chega. Se sabe quais são as linhas vermelhas e os traços encarnados que o Chega transpõe, deve expô-los para que sejam escrutinados, excluídos ou mitigados. Leitão conta com os emigrantes, diz ela. Mas os emigrantes não contam com ela. Deixaram Portugal devido a décadas de falência governativa de socialistas e, em abono da verdade, também de social-democratas. Marcelo Rebelo de Sousa, eminente constitucionalista, deveria saber ler as consequências de atos abonatórios de uma coligação que não tem uma maioria para reger. O que falta aos socialistas é modéstia e respeito pelas regras democráticas. Mas o que têm em demasia é mania de grandeza — um enorme complexo de superioridade moral e saudades de maiorias absolutas. Espero que haja alvoroço a sério. Porque existem limites de decência e de dignidade que não podem ser esfrangalhados por arrivistas que já lá estão há tempo demais. Alexandra Leitão quer assar o Chega à bairrista, à moda do Largo do Rato.

publicado às 13:53

Chegou-lhes

por John Wolf, em 11.03.24

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Os comentadores da praxe podem dar a volta que quiserem à lábia. Estão em choque após a noite eleitoral de ontem. Estão a apanhar os cacos da sua arrogância e das suas certezas absolutas. O Chega é filho de uma família disfuncional. E chegou à idade adulta. Tem como pai o Partido Socialista que passou os últimos oito anos a ignorar as queixas existenciais dos Portugueses. Tem como madrinha os media que tentaram castigar o menino, trancando-o num quarto escuro, sem que tivesse direito a recreio. E ainda insistem em ostracizar aquele que apenas espelhou o estado de alma de um milhão de cidadãos. Ventura realizou o milagre da sua multiplicação, de 1 para 12, e agora para 48 deputados. Não é pouca coisa e já não pode ser encostado a um canto do Parlamento. Gostem ou não, cause-lhes comichão democrática ou não, os outros partidos, incluindo o vencedor númerico da noite de ontem, estão obrigados ao diálogo, à argumentação e à negociação. Se insistirem no cordão sanitário arriscam-se a ver um partido com uma maioria de facto nas próximas eleições, que alguns como o Pedro Nuno Santos anseiam para que sucedam (as eleições!), ainda antes do Natal, para abater de uma vez por todas (pensa ele...) o peru da direita. A Aliança Democrática (AD) atirou tinta ao Chega. Recusa ajuizar com uma força política que nunca antes governou. Mas faz mal. O Chega é um partido teórico, sem cadastro, a partir do qual não se podem extrair certezas sobre o que fará, se ainda não há nada que tenha feito digno desse nome. Se é um governo minoritário que Montenegro deseja validar, deve aproveitar essa vontade para demonstrar que o processo governativo deve estabelecer pontes com aqueles que são considerados infecciosos, anti-democráticos. Se é o Orçamento que Pedro Nuno Santos aguarda para que o governo da AD caia, não passa de uma jogada oportunista, igual a tantas outras a que nos habituaram os socialistas. Não é esse o caminho. Não há volta a dar. O Chega passou de canário na mina a elefante na sala. Agora resta ver se Portugal chegou à idade adulta democrática após 50 anos de crescimento. E com isto tudo esqueci-me de falar do padrinho do Chega — Marcelo Rebelo de Sousa. Mas teremos o aniversário da prima para discorrer sobre o presidente de república democrática portuguesa.

publicado às 19:19

Taça de Portugal das eleições

por John Wolf, em 01.03.24

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Ao contrário do que vai suceder na Taça de Portugal (falo de futebol, obviamente!), as eleições legislativas de 10 de março não sucedem a dois tempos, com eliminatórias. A Aliança Democrática (AD) e o Partido Socialista (PS) assumem-se deste modo como finalistas, mas existe um terceiro jogador que poderá inclinar o terreno de jogo — o Chega. O Chega será uma espécie de árbitro, ou VAR, se quiserem. Os portugueses têm visto e revisto os lances da governação, nos últimos oito anos, e podem deixar a sua paixão clubística de lado neste campeonato por manifesta insatisfação em relação aos resultados. Podem dar alguma razão ao partido da arbitragem. A equipa inicial da Geringonça, com jogadores de outras cores que nunca saltaram do banco, foi substituída para além do tempo regulamentar pela seleção da maioria absoluta, recheada de craques e com grandes planos para a liga dos campeões políticos. Mas as coisas não correram de feição. Os avançados socialistas simularam faltas, mas falharam os penáltis inventados. Os extremos marcaram os cantos, mas a bandeira nem se mexeu. E os centrais do executivo não foram capazes de conter as jogadas de ataque dos rivais da semi-circular do parlamento. Estamos assim a poucos dias do fecho do mercado de incumbências com muitas incógnitas a pairar no boletim de voto. O novo treinador do PS não conseguiu galvanizar a sua massa adepta e gizar o seu esquema táctico. Não sabemos sequer que equipa organizará para dar continuidade a Mr. Costa que saiu do clube do Rato. A AD, uma equipa em construção, sente que chegou o seu momento na segunda volta do campeonato. Mas provavelmente terá de ir buscar o apoio de uma equipa que joga noutra liga ideológica, mesmo que alguns jogadores da divisão de honra possam ser contratados para certas alas.  Aguardemos então pelo apito final. E com ainda maior entusiasmo pelo tempo extra que começa logo no dia 11 de março após a contagem dos pontos...

publicado às 11:58






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