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O presidente da Câmara Municipal de Lisboa pode apresentar-se "durante cerca de duas horas e perante uma plateia cheia de caras conhecidas da política à cultura" para fazer o balanço de quatro anos de mandato, e vangloriar-se deste e daquele feito, mas em abono da verdade, quem deve proferir palavras de congratulação ou de crítica são os residentes da capital. Teria sido mais imparcial se fosse um colégio de moradores a fazer o relatório; a expressar se a vida na capital melhorou ou não. Se apenas ouvimos a parte "orgulhosa" da obra feita, e descuramos os destinatários finais da execução camarária, nunca saberemos objectivamente o que pensam os contribuintes IMIdiatos. As caras conhecidas da política e da cultura não vivem na cidade. Residem num espectro que faz parte do imaginário dos outros que vivem na grande Lisboa, muito perto da fronteira da indignidade. Os ilustres, identificados nessa plateia de notáveis, não se servem dos transportes públicos, não fazem uso de uma bicicleta, do magnífico corredor verde recentemente inaugurado, e provavelmente não recolhem os dejectos dos seus cães que os seus empregados levam a passear. A casa cheia que o escuta, não é o povo da sardinha em riste. Aqueles que o aplaudem não são os almeidas e os calceteiros que sustentam as pisadelas e o lixo dispensável. O que constato, nestes anos de mandato de António Costa, é uma certa pompa e circunstância na inauguração, uma certa vontade de querer transformar Lisboa numa metrópole moderna, mas as obras parecem não obedecer a um plano conceptual de longa duração, a uma ideia sociologicamente relevante. Vejo muitos equipamentos a reluzir no dia de abertura, para, volvidos poucos meses, a sua manutenção ser abandonada. Vejo muita coisa que soa a falso alarme; eventos que criam um efeito de dinâmica até à seguinte vernissage, até ao seguinte radar avariado. O presidente da Câmara Municipal de Lisboa apenas fala do hardware, das viaturas que dispensou, dos muros que levantou e dos dinheiros por vencer. Mas não consegue mexer no mais complexo - o cultivar de uma mentalidade cosmopolita, civilizada. Como se trata do estacionamento de carros sobre os passeios ou em segunda fila? Como se trata o péssimo hábito de cuspir sobre a calçada? Como se ensina a não fazer ruído? Como se sugere eventos interiores, geradores de calma, da alma, quando a maior parte dos eventos in acontecem out. Sei que existe aquele programa através do qual os residentes na capital podem sugerir soluções, mas no meu entender parece ser um canal aberto de sentido único - um eco-ponto para a recolha das ideias dos outros. Naquele palco de apresentações o que deveria ser partilhado com a elite seriam as verdades inconvenientes. Se nos basearmos apenas no testemunho de uma das partes envolvidas seremos levados a pensar que Lisboa não tem problemas graves. E sabemos que isso não é verdade. Conveniente, não é?