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O regresso do fim das ideologias?

por Samuel de Paiva Pires, em 12.03.22

Hoje escrevo no Observador sobre como a guerra na Ucrânia nos coloca perante um retorno da tese do fim das ideologias. Aqui fica um excerto:

Nesta conjuntura internacional, parece-nos importante questionar se não estaremos também a assistir ao regresso da tese do fim das ideologias, desta feita com base na dicotomia entre democracias liberais e regimes autoritários. Esta já era uma característica da política internacional pós-Guerra Fria, mas a interdependência económica entre as democracias liberais e, principalmente, a Rússia e a China, levou o Ocidente a lidar com uma certa bonomia com as interferências e tentativas de subversão das suas sociedades abertas. Agora que as aparências caíram por terra, somos todos, nas democracias liberais, convocados para um confronto político e ideológico. Com raras excepções, as divergências entre a esquerda e a direita parecem dar lugar a uma coesão social que se revela no apoio à Ucrânia e na consciência de que estamos perante uma ameaça existencial ao modo de vida demoliberal. A política internacional volta a definir as convergências e cisões ideológicas. O século XXI começa agora.

publicado às 09:24

A proposito da polémica sobre a Educação para a Cidadania, hoje escrevo no Observador sobre a crise que grassa na direita:

"Basta olhar para o programa da mencionada disciplina, como fizeram Pedro Mexia e João Miguel Tavares no Governo Sombra de 5 de Setembro, ou atentar no que escreveu Paulo Guinote no Público, para perceber que esta direita incorreu pela enésima vez na falácia do espantalho, facilmente explicada pela eterna obsessão com a igualdade de género, a sexualidade e o marxismo cultural, misturada com muita prosápia em torno de chavões como a liberdade de escolha e a doutrinação ideológica.
(...).
"Enquanto esta direita for incapaz de se organizar, de se consagrar como oposição efectiva e de apresentar um projecto político mobilizador que atenda às prioridades do país, continuará a infligir a si própria a menorização política a que temos assistido nos últimos anos em face de um PS cuja linha dominante não acolhe a inversão a que acima aludi e que, quando no governo, bem ou mal, vai procurando responder aos anseios concretos da maioria dos portugueses. Enquanto não conseguir sacudir-se de espantalhos, continuará uma penosa travessia do deserto."

publicado às 08:27

Isto está tudo ligado

por Samuel de Paiva Pires, em 29.10.19

Hoje escrevo no Observador sobre como a reforma do sistema eleitoral (que, mais uma vez, foi adiada para as calendas gregas), o centralismo, a regionalização, a valorização do interior, o regresso de emigrantes e o crescimento económico são questões intrinsecamente ligadas. Infelizmente, estamos reféns de partidos políticos que, parafraseando Lampedusa, andam há décadas a mudar alguma coisa para que fique tudo como está. Por isso, termino este artigo assim:

Dir-me-ão que estou a ser demasiado ambicioso e até irrealista com estas propostas, quando, afinal, eu próprio aventei acima que dificilmente os principais partidos abdicarão do statu quo, ao que acresce termos uma sociedade civil anémica com pouca capacidade de pressionar o sistema político. Mas tudo isto serve também outro propósito: evidenciar a distância entre o discurso e a acção dos partidos políticos nos temas a que aludi e a nossa incapacidade, enquanto sociedade civil, para fiscalizarmos e responsabilizarmos o poder político e o pressionarmos no sentido de se proceder a reformas realmente estruturais que aproveitem mais eficientemente os recursos naturais, humanos e financeiros do país. Como escreveu Miguel Torga, “Somos, socialmente, uma colectividade pacífica de revoltados.” Os partidos políticos agradecem.

publicado às 01:44

A crítica é a alma das democracias liberais

por Samuel de Paiva Pires, em 16.09.19

Hoje escrevo no Observador sobre como o processo de crítica imanente é central nas democracias liberais e na competição entre estas e potências revisionistas não-democráticas, como a China e a Rússia, que visam subverter a ordem internacional liberal. Aqui fica uma passagem:

A superioridade, nas mais diversas áreas, das sociedades demo-liberais em relação às não-democráticas resulta em larga medida deste processo de crítica que opera através da liberdade de expressão, do debate público, da concorrência e da inovação, permitindo às sociedades corrigirem o seu rumo com base nas experiências passadas, mudando de forma gradual, reformista ou evolucionista, não de forma revolucionária, como frequentemente acontece em sociedades fechadas.

(também publicado aqui.)

publicado às 00:41

Tempo de gula eleitoral

por John Wolf, em 04.08.15

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O Guia Eleitoral publicado pelo Observador deveria ser distribuído nas praias com as bolas de Berlim. O lindo mês de agosto é o mais indicado para leitura descontraída, seja qual for o género, prosa ou ficção. Os partidos políticos e forças afins são lestos na divulgação do seu mapa de intenções, mas a grande maioria dos temas apresentados carecem de fundamentação. Ou seja, é tudo muito bonito, mas não explicam grande coisa sobre como irão alcançar as faustosas metas. Em abono da verdade factual do exercício, o guia deveria ser rebaptizado. Chamar-lhe-íamos de bom grado "gula eleitoral". Por exemplo, o Partido Socialista (PS), no que toca a matéria de Investimento Público, refere sob o título de "compromissos principais" que será dada prioridade a investimentos seletivos e complementares que permitam valorizar o investimento de base já realizado. O que significa esta afirmação? Que darão continuidade a obras iniciadas por outros governantes ou que retomarão a sua linha ideológica própria de argamassa e betão? E no quadro de Justiça o PS nem sequer retira consequências da salganhada em que se viu metido Sócrates. O mesmo escrutínio e grau de exigência também deve ser aplicado aos outros partidos e as suas promessas. No entanto, deve recair sobre a principal força de oposição o ónus da argumentação sólida, da sustentabilidade e exequibilidade. Até ao momento o PS não tem conseguido convencer Portugal da sua capacidade, da sua elevação no contexto da emergência nacional. Também não soube aproveitar o período de defeso para explorar uma outra linguagem. Não soube credibilizar-se junto da sociedade civil, daqueles que querem lá saber de filiações partidárias. Para falar a verdade crua e dura, António Costa já é considerado um lider decepcionante dentro do próprio partido. Chavões como: o que prometemos fazemos, já não funcionam. Para além de tudo o mais, a aposta nos mesmos obreiros que conduziram Sócrates ao poder, parece ser uma fórmula questionável - a campanha mal arrancou e deixa muito a desejar. A máxima "em equipa vencedora não se mexe" não serve para grande coisa. Nem é isso que está a ser feito. A equipa socialista está agarrada a preconceitos antigos, a velhas glórias fora do prazo de validade. E Portugal tem de dar um salto em frente. Pelo andar da carruagem, quedar-nos-emos pela mesma carruagem - e o mérito será daqueles que não colocam o carro à frente do populismo conveniente - a instigação de instintos primários de hordas de eleitores enebriados nas festas que polvilham Portugal de sol a norte.

 

publicado às 17:29

"(Re)pensar a Constituição Portuguesa" (2)

por Samuel de Paiva Pires, em 23.04.15

No seguimento da iniciativa do Observador, António de Araújo e Gonçalo Matias escreveram um artigo que assinala diversos paradoxos, contradições e simplificações perigosas do projecto de revisão da Constituição esboçado pelos cinco convidados do Observador. Cumpre ainda assinalar um breve ensaio de António Barreto, que se não deixa de ter razão em muitas das críticas que tece, também não deixa de enveredar, infelizmente, pela ideia muito em voga de que cada geração deve ter a sua constituição. Trata-se, tão só, de uma manifestação do espírito jacobino, do racionalismo construtivista que advoga a eliminação das instituições existentes e a criação de novas instituições, que é contrário à tradição, ou seja, à transmissão entre gerações de instituições, costumes e convenções.

 

A Constituição deve ser revista, mas querer apagá-la ou expurgá-la da sua carga ideológica para fazer uma nova constituição ou incutir na actual uma carga ideológica liberal (a eliminação dos direitos sociais e do financiamento do acesso à saúde constituirão talvez a face mais visível desta agenda), é ceder às modas ideológicas do momento, é ceder apenas ao presente sem ter noção do passado, sem perspectivar o futuro e sem cuidar necessariamente de melhorar aquilo que é recebido e de transmiti-lo às gerações seguintes, ou seja, sem entender que, como diria Edmund Burke, a sociedade é um contrato entre os mortos, os vivos e os ainda por nascer.

 

Temos a Constituição que foi possível aquando da sua elaboração e que tem sido possível rever. Está longe de ser perfeita, e nunca nenhuma constituição o será. É verdade que, como qualquer conservador bem sabe, quando as instituições existentes são efectivamente más e não permitem vidas boas, não há nada a preservar ou reformar. Mas apesar de tudo, apesar de todos os defeitos da Constituição, Portugal faz hoje parte das sociedades mais livres e desenvolvidas do mundo. Isto foi conseguido, também, em parte, graças à Constituição.  Por isso, talvez importe relembrar novamente Burke:

The science of government being therefore so practical in itself, and intended for such practical purposes, a matter which requires experience, and even more experience than any person can gain in his whole life, however sagacious and observing he may be, it is with infinite caution that any man ought to venture upon pulling down an edifice, which has answered in any tolerable degree for ages the common purposes of society, or on building it up again, without having models and patterns of approved utility before his eyes.

 

Leitura complementar: "(Re)pensar a Constituição Portuguesa".

publicado às 13:16

Same same, but different.

por Ana Rodrigues Bidarra, em 21.05.14

Atenção, qualquer semelhança entre a reportagem de Sónia Simões no novíssimo Observador e este texto de 2011 (não) é mera coincidência. 

 

É pena. 

publicado às 23:40

Sobre o Observador

por Samuel de Paiva Pires, em 21.05.14

Já li as mais diversas apreciações sobre o novo jornal, bem como interpretações e reacções, à esquerda e à direita, à entrevista a Mário Machado. Registo que uns acusam o Observador de tentativa de branqueamento. Em resposta ao celeuma que se gerou, José Manuel Fernandes escreveu umas breves linhas em que afirma que procuraram apenas contar uma história de forma crua e objectiva.

 

Acontece que um jornal que pretende romper com a hipocrisia da suposta isenção jornalística em Portugal, assumindo um posicionamento político, não pode estranhar quando é criticado pela ideologia que subjaza às suas peças, procurando então escudar-se numa alegada objectividade e numa angelical ingenuidade de quem diz que só quer contar uma história. É que há ideologia aparente, latente e por omissão. Um jornal que pretende ter um determinado posicionamento político-ideológico na realidade portuguesa não é um jornal no sentido clássico que o termo toma entre nós, é uma organização política. Faz jornalismo, mas também faz política. Logo, por definição, tem de tomar opções. Os jornais ditos isentos também o fazem, mas num jornal que se diz ideologicamente comprometido estas opções devem ser ponderadas com muito maior cuidado - especialmente aquando da sua génese, que marcará o espírito do jornal e o que a sociedade pensará sobre ele.

 

Os editores do Observador tomaram opções, conscientes ou não das suas consequências. Em dois dias de existência fizeram duas peças sobre Mário Machado, sendo uma delas uma reportagem extensa que, independentemente do espírito que presidiu à sua elaboração, é lida por muita gente como sendo uma reportagem que o procura reabilitar.

 

Não tomando posição na contenda que tem vindo a opor os que criticam o jornal e os que o defendem, lembro apenas uma célebre afirmação de Salazar: "Em política, o que parece é." Se a ideia era alcançar muitas visitas e visibilidade, conseguiram-no. Agora, não se admirem se não se conseguirem livrar da fama. Ainda para mais quando até o nome pode levar-nos facilmente a outro Observador, o Völkischer Beobachter, jornal oficial do partido de Hitler.

 

No meio disto tudo, o mais preocupante é que um jornal dito liberal, ideologia que os editores alegadamente professam e que em Portugal a ignorância de tanta gente tende a associar ao fascismo, vê-se, assim, associado ao neo-nazismo. Escudarem-se na ingenuidade angelical não adianta de nada. Talvez valesse a pena relerem as considerações de Karl Popper a respeito do paradoxo da tolerância:

  

"Unlimited tolerance must lead to the disappearance of tolerance. If we extend unlimited tolerance even to those who are intolerant, if we are not prepared to defend a tolerant society against the onslaught of the intolerant, then the tolerant will be destroyed, and tolerance with them. — In this formulation, I do not imply, for instance, that we should always suppress the utterance of intolerant philosophies; as long as we can counter them by rational argument and keep them in check by public opinion, suppression would certainly be unwise. But we should claim the right to suppress them if necessary even by force; for it may easily turn out that they are not prepared to meet us on the level of rational argument, but begin by denouncing all argument; they may forbid their followers to listen to rational argument, because it is deceptive, and teach them to answer arguments by the use of their fists or pistols. We should therefore claim, in the name of tolerance, the right not to tolerate the intolerant. We should claim that any movement preaching intolerance places itself outside the law, and we should consider incitement to intolerance and persecution as criminal, in the same way as we should consider incitement to murder, or to kidnapping, or to the revival of the slave trade, as criminal."

publicado às 21:08






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