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Pedro Lomba, A hora negra do regime:
A verdadeira novidade é esta: a alteração das condições de legitimidade em Portugal para formar governo. Os governos minoritários (do PS ou PSD) foram sempre uma opção tida como viável e legítima não podendo o Presidente obrigar o partido ou partidos vencedores a uma maioria que estes não pudessem construir. A mudança abrupta das regras de legitimidade significa que os governos minoritários do centro-direita passarão a ser uma opção impossível podendo um grupo de partidos derrotados unir-se para impor ao Presidente uma maioria, mesmo que este a considere inconsistente. Os equilíbrios do nosso sistema político serão assim rompidos.
(...)
i) Por tudo isto, e sem que saibamos todos os desenvolvimentos deste processo, há desde já um facto a que possivelmente já não iremos conseguir escapar: a ruptura das regras de confiança política na nossa democracia. Uma ruptura que afectará as relações entre PSD, CDS e PS, mas também entre todos os restantes partidos. Uma ruptura nas regras de legitimidade na formação dos governos e nas fronteiras e equilíbrios que sempre nos habituámos a respeitar. Uma ruptura que impedirá a construção de consensos ao centro, ora mais para a esquerda, ora mais para a direita, o que atendendo às decisões parlamentares que carecem de maiorias de dois terços só irá agravar o bloqueio e a erosão do nosso sistema político. Ao ser mudada a regra de que quem ganha com maioria (relativa) afinal não governa, são os equilíbrios políticos entre a esquerda e a direita que sairão destroçados. Com isto regredimos anos e anos; e podemos regredir ainda mais. E não sei quantos mais levaremos depois para recuperar. A estabilidade de Portugal é o bem mais valioso. Boa sorte para todos nós.
O governo de Portugal pende desavergonhadamente para o perfil de um regime extremo que faz tábua rasa de princípios civilizacionais. A discriminação positiva assente na decisão de atrair imigrantes "de primeira" colide com a universalidade da condição humana, frágil e enferma. Certamente Pedro Lomba ignora o famoso poema de Emma Lazarus inscrito aos pés da estátua da Liberdade: "Give me your tired, your poor..."(...). A poetisa Emma Lazarus de origem sefardita portuguesa, decretou nos seus versos o desespero da diáspora, assim como o abraço caloroso de quem acolhe. A condição migrante é a antítese de sofisticação. Ela é miséria à chegada e glória na partida que muitas vezes não chega a acontecer. O que o governo pretende fazer soa a lei emanada de um regime nacional-socialista. Será que Pedro Lomba não sabe que um país se constrói através de um processo aleatório de selecção natural? Este tipo de engenharia social é muito perigoso – é fascista. Demonstra que estão dispostos a sacrificar o espírito humano em nome da eficiência, da economia, da produtividade, dos resultados - seja qual for o preço a pagar. Não sei se esta medida viola os princípios consagrados na Carta Universal dos Direitos Humanos, mas ofende descaradamente os indigentes dispostos a deixarem as suas pátrias em busca de uma vida melhor. Portugal, se deixarmos, tornar-se-á num reino distante daquele que pioneiramente aboliu a pena de morte. Aqui vos deixo o poema da portuguesa Emma Lazarus;
The new colossus
Not like the brazen giant of Greek fame
With conquering limbs astride from land to land;
Here at our sea-washed, sunset gates shall stand
A mighty woman with a torch, whose flame
Is the imprisoned lightning, and her name
Mother of Exiles. From her beacon-hand
Glows world-wide welcome; her mild eyes command
The air-bridged harbor that twin cities frame,
"Keep, ancient lands, your storied pomp!" cries she
With silent lips. "Give me your tired, your poor,
Your huddled masses yearning to breathe free,
The wretched refuse of your teeming shore,
Send these, the homeless, tempest-tossed to me,
I lift my lamp beside the golden door!"
by Emma Lazarus, New York City, 1883
O Diário de Notícias relata neste apontamento de redacção que o governo pretende criar uma agência para atrair imigrantes ricos. "Pedro - o Lomba" (sim, Tadeu diz "Pedro - o Lomba", vejam o filme) foi encarregado de anunciar esta nova loja do cidadão abastado. A ideia, que parece ser um Sonho Americano invertido, serve para confirmar que a ideia de "self-made man" não funciona em Portugal. O governo quer a papinha feita. Quer que jactos privados aterrem na Portela com passageiros carregados de massa, dispostos a largar o guito assim sem mais nem menos. Ou que génios, netos de Einstein, venham estagiar em Aveiro a troco de uma bolsa furada ou coisa que o valha. Este proto-projecto esbarra com a ideia de mérito, de sucesso alcançado a partir do nada, da mala de cartão que chega, que vem e não vai - rumo a Paris. Esta solução apenas confirma que duas décadas de presença de brasileiros e ucranianos não foi suficiente para que estes vingassem e fossem bem sucedidos nos seus intentos. O ambiente não lhes foi propício. Vieram com uma mão atrás das costas e foram-se com as duas feitas num oito. Esta magnífica ideia, para além de discriminatória, por apelar às elites intelectuais e financeiras de outros países, constitui um atentado ao pobre coitado (nacional ou não) que não reúne os requisítos propostos. O conceito anda perto de práticas de regimes nacional-socialistas - um processo de selecção de uns em detrimento de outros. São estes os valores que Portugal agora encarna? O país que foi o primeiro a abolir a escravatura. E pensam que os outros são idiotas? Esses prospectivos milionários que querem captar, muito provavelmente foram eles próprios os indigentes nos seus países de origem. Homens e mulheres com um par de sapatos sem sola, nada no estómago e nos bolsos, mas que foram capazes de se construir a partir de muito pouco. Este atalho chico-esperto não passa disso e há outra questão ética e financeira que se apresenta na alfândega, nos serviços de estrangeiros e dinheiros. Serão notas limpas as que trazem na mala? Ou será que ninguém quer saber, desde que seja uma divisa consensual? Ao subscrever este tipo de medida, o governo passa um atestado de incompetência aos esforçados da casa e manda-os dar uma volta. Vai trabalhar malandro, não vês que estamos aqui a atender um cliente como deve ser? Isto é mau demais para ser verdade. Olha lá? Só agora é que me lembrei: eu também sou um imigrante!
Uma excelente crónica de Pedro Lomba, a respeito das recentes afirmações do Embaixador de Israel em Portugal (via Corta-fitas):
«Na semana passada a Gulbenkian acolheu a conferência Portugal e o Holocausto patrocinada, ao que sei, pela Embaixada dos Estados Unidos. Lendo os jornais, apercebi-me que saíram da conferência declarações estranhas. Mas nenhuma ultrapassou em desaforo histórico o que foi dito pelo embaixador de Israel, segundo o qual Portugal "foi o único país que colocou a sua bandeira em meia haste durante três dias", logo que Hitler morreu. E o embaixador de Israel acrescentou: "É uma nódoa que para nós, judeus, vai aparecer sempre associada a Portugal."
Tenho demasiado respeito e simpatia por Israel para deixar passar estas afirmações sem resposta, até porque aparentemente ninguém na própria conferência reagiu. Fui, pois, investigar. E escutar quem investigou. Ora, o sr. embaixador de Israel não sabe, não considerou que os demais Estados neutros europeus na guerra procederam como Portugal. Vejamos a imprensa da época:
No Diário de Lisboa de 3 de Maio de 1945 refere-se que "continuaram a meia haste as bandeiras da Nunciatura Apostólica, da Embaixada de Espanha e das Legações da Suíça e da Suécia". Em Dublin, o mesmo luto protocolar conduziu o primeiro-ministro (e ministro dos Estrangeiros) Éamon de Valera a apresentar condolências à legação alemã. Como pode o sr. embaixador afirmar que Portugal "foi o único com a bandeira em meia haste", quando a prática foi comum aos outros Estados neutrais?
Mas compare-se o luto protocolar do Estado português perante a morte de Roosevelt e o que se registou com a de Hitler. Quando Roosevelt morreu, Salazar deslocou-se pessoalmente à embaixada americana para apresentação de condolências. A propósito dos regulamentos protocolares, lê-se no recente livro do embaixador Bernardo Futsher Pereira sobre a diplomacia salazarista (p. 436): "Neste mundo convulso, Portugal permanecia a mesma plácida ilha de paz. As minudências jurídicas protocolares continuavam a ser rigidamente observadas. A 4 de Maio, quando correu a notícia da morte de Hitler, as bandeiras foram colocadas a meia haste. Quando o embaixador inglês protestou no dia seguinte, Teixeira de Sampaio argumentou que, fosse ou não fosse Hitler o maior criminoso da História, continuava mesmo assim a ser o chefe de Estado de um país com o qual Portugal mantinha relações diplomáticas. Os regulamentos prescreviam uma salva de artilharia e uma visita pessoal de condolências pelo Chefe do Estado ou seu representante. Tudo isso tinha sido eliminado e as formalidades reduzidas a deixar cartões e pôr as bandeiras a meia haste."
Não terá o sr. embaixador omitido o contraste entre a postura de Portugal aquando da morte do Presidente americano e os "serviços mínimos" verificados na morte de Hitler? Não sou historiador e não me pronuncio sobre Portugal na II Guerra. Mas dir-se-á que quer Portugal quer a Irlanda agiram, não por qualquer afinidade com o regime nazi, mas no respeito pelo formalismo protocolar inerente à neutralidade, numa lógica de "correcção diplomática" e de afirmação soberana.
Custa ter de fazer este reparo ao representante de Israel entre nós. Mas a acusação que fez é factualmente errada, é injusta e ignora o cânone protocolar. A 22 de Dezembro de 2011, a Assembleia Geral da ONU cumpriu um minuto de silêncio pela morte do ditador norte-coreano Kim Jong Il, mas esclarecendo à partida que se tratava de um acto protocolar. Foi uma nódoa que mancha Israel e os restantes membros? Ou foi apenas diplomacia as usual, de que o sr. embaixador aqui se esqueceu?»
(...) "Pessoas como o meu pai tiveram "convicções". Tiveram acima de tudo bom senso. Tiveram acima de tudo vergonha. Conservadores nos costumes e crentes de que o Estado deve ajudar os mais desfavorecidos, foram eles os "pais" do serviço nacional de saúde. Hoje, contemplam com estranheza um mundo de patos-bravos e oportunistas sanguessugas. Mereciam mais das instituições que serviram. Mereciam melhor que um país de Armandos Varas e Dias Loureiros. Mereciam melhor do que um país falido.
Pedro Lomba, a ler via Facebook aqui
A Real Associação de Lisboa promove no próximo dia 2 de Março pelas 20,00hs o 1º Jantar debate “Conversas Reais” subordinado ao tema “Semi-presidencialismo à Portuguesa: funciona ou não?” que contará com a presença dos convidados especiais Pedro Lomba, docente universitário e colunista do ”Público” e Miguel Morgado, professor de Ciência Política na Universidade Católica de Lisboa.
O Jantar decorrerá em Lisboa no Restaurante Maritaca na Av. 24 de Julho, 68F (ao lado da discoteca Kapital).Para mais informações contacte a Real Associação de Lisboa para o telefone 213 428 115 ou reserve desde já o seu lugar comodamente na loja on-line. Aberto a não sócios.