Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
As declarações, ao longo dos últimos dois meses, da Ministra da Saúde, da DGS e afins, em conjunto com o que estamos a viver, mostram a grosseira incompetência do Governo na construção e antecipação de cenários e planeamento atempado dos preparativos para o embate desta pandemia. Volto a salientar que já há semanas temos vindo a observar o que se passa em diversos países, já há centenas de estudos e artigos científicos que evidenciam quais as medidas eficazes na contenção, que um pico de infecções coloca imensa pressão sobre um sistema de saúde, especialmente nas unidades de cuidados intensivos, onde os ventiladores e máquinas de circulação extracorpórea são extremamente necessários.
Na conferência de imprensa de há umas horas, a Ministra da Saúde revelou estar a ser efectuado um levantamento dos ventiladores existentes, disponíveis e os que podem ser realocados de outros serviços não-urgentes, não querendo revelar números. Isto deveria estar feito há já 2 meses, ou pelo menos há cerca de 2 semanas, a partir do momento em que o sistema de saúde italiano colapsou.
Há pouco, na TVI, Fernando Medina sublinhava que seria dramático decretar o estado de emergência quando ainda não estamos preparados para isso, levantando-se questões como o abastecimentos de produtos alimentares e farmacêuticos às pessoas.
Também há pouco, na SIC, Ana Mendes Godinho explicou as medidas referentes ao apoio à família, manifestamente insuficientes e que estão a criar mais problemas.
O que quero dizer com isto? Que as pessoas que temos a liderar-nos durante esta crise não têm capacidade de construir cenários, antecipá-los e fazer o devido planeamento. Não estão atempadamente informados sobre o que se tem passado noutros países, não retiraram quaisquer lições da experiência destes e estão a improvisar sem tomar algumas medidas que se impõem há já vários dias (encerramento de portos e aeroportos, controlo das fronteiras, controlo da circulação de cidadãos nas ruas, desenvolvimento de um sistema de abastecimento de refeições e medicamentos). Que sejam as mesmas pessoas que andaram 2 meses a dizer que o vírus é apenas uma gripe e não chegaria cá a liderarem a resposta à crise não nos pode deixar tranquilos.
Esta característica, a falta de capacidade de planeamento, é comum à esmagadora maioria dos portugueses, infelizmente. Mas alguns conseguem planear melhor do que outros. Por isso, já deveria ter sido criado um gabinete de crise com plenos poderes em diversas matérias, liderado pelo governo mas integrado por pessoas com provas dadas na capacidade de planeamento - ou seja, de alocação de recursos de forma a alcançar determinados objectivos -, especialmente militares, polícias, economistas, gestores, médicos.
Isto tem de ser ultrapassado com um governo e uma economia de guerra, com centralização, planeamento e autoridade do Estado. Só assim poderemos ultrapassar esta pandemia com o mínimo número de vítimas possível e retomar a possível normalidade da economia de mercado. Quanto mais tempo demorarmos a fazê-lo, maiores serão os danos em vários sectores, especialmente na economia, e mais difícil será voltarmos às nossas vidas normais.
É certo que quando um dos principais arquitectos do euro reconhece aquilo que muitos vêm afirmando, que este é um projecto falhado desde o início, nos devemos regozijar. Mas convém ler a entrevista para perceber que os motivos não são os mesmos, e muito menos as soluções que perspectiva, ou não seja Delors um planeamentista. Para este, "It is a fault in the execution, not of the architects, which he claimed to have pointed out in 1997 when the plans for introducing the euro finally came together. At the time, he says, the best of the eurosceptic economists, whom he refers to as “the Anglo-Saxons”, raised the simple objection that if you have an independent central bank, you must also have a state." E o mesmo, como seria de esperar, pretende ver uma maior transferência de soberania dos estados nacionais para Bruxelas e não se importa com a existência de governos tecnocráticos não-eleitos. Seja como for, quando um dos míticos grandes líderes da UE, que o Dr. Soares e companhia referenciam a todo o momento, desfere um golpe tamanho no euro, pouco mais há a dizer.
Deixo uma breve passagem retirada do terceiro capítulo da obra O Caminho para a Servidão, mais concretamente da versão disponível no site Ordem Livre, de Hayek:
"A centralização absoluta da gestão da atividade econômica ainda atemoriza a maioria das pessoas, sobretudo pela idéia em si mesma, mas também devido à tremenda dificuldade que isso implica. Se, todavia, estamos nos aproximando rapidamente de tal situação, é porque muitos ainda acreditam que seja possível encontrar um meio-termo entre a concorrência "atomística" e o dirigismo central. Com efeito, à primeira vista nada parece mais plausível, ou tem maior probabilidade de atrair as simpatias dos homens sensatos, do que escolher como meta não a extrema descentralização da livre concorrência nem a centralização completa representada por um plano único, mas uma judiciosa combinação dos dois métodos. Não obstante, o simples senso comum não se revela um guia seguro neste campo. Embora a concorrência consiga suportar certo grau de controle governamental, ela não pode ser harmonizada em qualquer escala com o planejamento central sem que deixe de operar como guia eficaz da produção. Tampouco é o "planejamento" um remédio que, tomado em pequenas doses, possa produzir os efeitos esperados de sua plena aplicação. Quando incompletos, tanto a concorrência como o dirigismo central se tornam instrumentos fracos e ineficientes. Eles constituem princípios alternativos usados na solução do mesmo problema e, se combinados, nenhum dos dois funcionará efetivamente e o resultado será pior do que se tivéssemos aderido a qualquer dos dois sistemas. Ou, em outras palavras, planificação e concorrência só podem ser combinadas quando se planeja visando à concorrência, mas nunca contra ela."
Curioso e irónico ver um país perpassado por dogmas do socialismo e da infalibilidade do Estado governado por gente sem a mínima capacidade de previsão e planeamento de acordo com um certo savoir-faire, sentido de responsabilidade e de respeito pelo próximo. É a velhinha Lei de Murphy de que tudo o que pode ser mal feito, é-o.