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A descalçada portuguesa

por John Wolf, em 27.11.13

A calçada portuguesa é a impressão digital (pedonal?) do país. Basta travar um estrangeiro na Baixa lisboeta e pedir que partilhe o perfume da cidade, e da sua boca saem a correr pastéis de nata, azulejos e a maravilhosa calçada da cidade - wonderful! marvelous! A operação plástica que António Costa quer levar a cabo através do Plano de Acessibilidade Pedonal colide com o traçado idiossincrático de Portugal, apunhala a tradição e a saudade com uma mesma navalhada. Pelos vistos o chão de uns é o tecto de outros - ou vice-versa. Depois dos atentados ao património que se conhecem e aqueles que estão para breve, como a transexualização do Odeon em centro comercial, começamos a ter um certo receio - o medo residente que acompanha a certeza de mais violações. E não será apenas o desenho na pedra a ir pela sarjeta. Os mestre-calceteiros que não estão munidos de um Arménio Carlos para se defenderem, assistem ao varrimento da sua arte. Venha de lá essa pedra lisa convertida em lioz para gaudio de burgueses ignorantes e destruam a assinatura de um povo com um simples escarro municipal. A calçada portuguesa não é apenas encosto de sola gasta, conta várias histórias em simultâneo. Lembra o desgaste, assinala humor e arranca aplausos. Mas é sobretudo um exercício de participação democrática - primeira pedra, pedra a pedra. A pedrinha da calçada passa da mão para o pé, na construção das paisagens urbanas e marca o compasso, ora mais lento ora mais veloz. Atrasa os transeuntes distraídos e fá-los olhar de alto a baixo do magistério da sua alegada superioridade, assinala com pontos negros ou brancos onde tudo aconteceu, romance ou quebra de tensão. A calçada molda-se, retoca-se e apresenta-se como uma desdentada a precisar de cuidados. Está viva, respira e encanta como puzzle lusitano. A seguir a este trespasse o que nos espera? Serão os azulejos que devem ser estilhaçados porque levam a luz para longe? Ou serão as telhas que devem partir para calar o cio felino? E ficaremos ao relento da nossa ignomínia, descalços sobre um tapete mágico sem mácula de tropeços - andar apressado.

publicado às 14:45





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