Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A fronda que tem vindo a formar-se nos últimos dias, nos media e na chamada "vox populi", vive, em grande medida, das perorações tacanhas de meia dúzia de prebostes encartados que fizeram o grosso das suas carreiras à sombra do estadão. A burguesiazinha lisboeta que vive acomodada no recosto confortável do Estado começa, por fim, a sentir os efeitos de uma crise originada pela sua cupidez endémica. O mais curioso no meio disto tudo - ou não - é constatar que o nefelibatismo das elites políticas e económicas é partilhado pelo povoléu que, entre ameaças de manifestações e proclamações altissonantes orquestradas pelos bandos políticos do costume - sem esquecer, outrossim, a grande maioria silenciosa que viveu empestada no crédito e na supina crença de que o bem-estar carreado pelos dinheiros europeus seria eterno -, continua a viver na ilusão de que o ciclo pretérito, encerrado com a gestão ruinosa de Sócrates, revivificar-se-á num futuro não muito longínquo. De facto, os portugueses têm uma tendência incurável para o cultivo de apetites auto-destrutivos. As nossas maleitas colectivas são, mais do que um reflexo piedoso da nossa má organização congénita, a prova mais evidente da nossa irreformabilidade. John Martin revelou-se bastante profético na inspiração que o guindou a pintar o seu famoso "The Great Day of His Wrath": na verdade, o crescimento desmesurado das sociedades humanas, sem que haja o devido acompanhamento por uma sólida base de sustentação, termina sempre num declínio retumbante de proporções bíblicas. Portugal é a prova cabal desse facto.