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O tópico menos abordado da crise que, desde há alguns anos a esta parte, atemoriza o nosso querido Portugal é o abaixamento intelectual das gentes lusitanas. Esse abaixamento desdobra-se em múltiplas expressões, algumas delas bem preocupantes, mas há uma que, pela relevância que tem e pelo olvido deliberado a que tem sido sujeita, ganhou, a meu ver, foros de cidade. Falo, pois, do menoscabo a que os clássicos da literatura nacional (sobretudo na escola, o local em que é suposto transmitir avidamente os conhecimentos pretéritos às gerações vindouras) têm sofrido por banda daqueles que deveriam ser, natural e obrigatoriamente, os seus maiores apologistas. Ler como li, e ver como vi, que responsáveis da Associação de Professores de Português crêem que é um claro retrocesso voltar à leitura de Eça, Camões, Vieira, Pessoa, Herculano, Antero ou Garrett, faz-me pensar até que ponto o país regrediu vários degraus nos faróis da civilização. Este desconchavo cultural é o resultado mais paradigmático de décadas de facilitismo no ensino e na sociedade. Mais do que uma crise de valores e referências perdidas, o facilitismo dos nossos dias é um sintoma da degenerescência que o espectáculo niilista de uma sociedade luzidia e opulenta produziu no âmago de uma cidadania alienada. Hoje, não se lê, não se trabalha, e não se porfia afincadamente na prossecução de um objectivo plenamente consciencializado, em suma, nada vale a pena porque, ao arrepio do dito pessoano, a alma é muito pequena. Mas o que mais preocupa é a leviandade com que as ditas elites, ou, pelo menos, aquelas que passam por tais, descuram as minudências mais comezinhas de um arremedo de cultura. Encarar o ensino como um palco de fraca exigência e de leituras fáceis e rectilíneas, é despir a mente dos jovens formandos de tudo o que há de mais sublime e intelectualmente estimulante. Sair desta modorra analfabeta não será uma tarefa fácil, que possa realizar-se a breve trecho, pela simples razão de que não há, na sociedade presente, os estímulos necessários a uma renovação da alma nacional. Mas o certo é que, com ou sem associações burrificantes, os Camões, Eças e Camilos continuarão a ser uma referência para os poucos moicanos que ainda restam. Porque, ao inverso daqueles espantalhos que impõem programas de baixo alcance intelectual, nós sabemos que sem literatura não há alma que se eleve, e sem uma alma forte não há país que se afirme vigorosamente no concerto das nações.
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