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O snobismo do Portugalório doutorado

por João Pinto Bastos, em 18.09.13

 

 

Artigo originalmente publicado na edição n.º 57 do Jornal da Juventude Popular da Maia, "O Jovem":

 

Os recentes desenvolvimentos da política portuguesa trouxeram novamente à liça, ainda que sub-repticiamente, o duradouro problema do snobismo social das nossas elites. Em quê, perguntarão, e bem, os caríssimos leitores. A resposta é simples: no desprezo olímpico a que foi votado um governante que, com ou sem um talante político de nomeada, ousou trespassar o consenso do doutorismo pátrio. Falo, pois, de Álvaro Santos Pereira. Durante dois anos, com uma inalterada paciência de Job, o ex-ministro da economia foi trilhando o seu caminho, tentando reformar o que, amiudadas vezes, parece totalmente irreformável. Alçou a sua voz face aos grandes potentados neo-feudais que vivem das rendas públicas, redefinindo, em simultâneo, ainda que com alguma parcimónia, a relação dos poderes públicos com a economia privada. Mas a grande inovação que Álvaro Santos Pereira trouxe à política portuguesa foi, indubitavelmente, o seu despojamento relativamente à ética doutorista que permeia as elites do regime. Ao pedir para ser tratado apenas por “Álvaro”, o ex-ministro da economia concitou contra si o que há de pior nesta República gasta e caduca: o vício esparvoado do título académico. O caso de Álvaro Santos Pereira é sintomático sobretudo pelo facto de as elites amesendadas no Estado português, e que têm governado o país nas últimas décadas, não aceitarem reinvenções de trato pessoal que impliquem uma certa igualização no modo como são encarados os titulares de determinados cargos. O atraso e provincianismo do Portugal democrático desvela-se, em grande medida, nesta pecha cultural, que percorre, com uma certa toada à la “Ancien Régime”, todos os estratos sociais da sociedade portuguesa, não deixando incólume um único recanto da alma nacional. O título académico serve de feição aos interesses reputacionais dos Cresos milionários das nossas elites, pois, sem esse pedacinho de papel com o “doutor” bem garatujado, o tão almejado prestígio social seria um pesaroso quebra-cabeças, cujo desfecho tenderia a ser, necessariamente, a inclemente zombaria dos pares. Para o Zé povinho, o título académico serve um propósito de ascensão social, temperado pela ideia de que só existe, socialmente falando, quem é “doutor”. Não importa, pois, se um indivíduo sabe ler, contar, raciocinar ou discretear sobre o estado do céu, o crescimento da economia, os dotes pictóricos do Mestre da Lourinhã, ou as amantes de Júlio César. O que realmente interessa aos preconizadores deste caldo cultural snob e pseudo-ilustrado é a ideia, ingénua e torpe, de que a diferenciação social depende, fundamentalmente, do título académico. A democracia, enquanto regime das massas, ajuda a entender, numa pequeníssima porção, a influência desta mentalidade castradora, porém, na verdade, o mal do snobismo não nasceu com esta III República desrepublicanizada. O zângão do doutorismo tem, infelizmente, um largo arraigo no nosso país, atravessando regimes, guerras, divisões e uniões esporádicas. O que os últimos 30 anos trouxeram foi, sem dúvida nenhuma, o empolamento exacerbado deste vício, levando a que uma classe média em crescimento contínuo encarasse o carimbo do “doutor” como a oportunidade de uma vida. A geração mais qualificada de sempre, fruto de uma democracia jovem formada nos preconceitos de uma esquerda reaccionária, é, com grande probabilidade, a mais ignara nos preceitos básicos da etiqueta e da boa educação. A educação não nasce no “doutor” ou no respeitinho por quem põe e dispõe do pão e do verbo. O que distingue um ser humano de uma besta quadrada com doutor aposto antes do José ou Estanislau é a dignidade e a honra, e essas nascem do trabalho diário, da labuta constante, e do esforço interminável de cada dia. Estes predicados parecem, aos olhos de hoje, um tanto ou quanto apartados do ar do tempo, mas são eles que fazem a dignidade de cada ser humano, não o facilitismo do título. Em Portugal, vive-se ainda na peçonhenta ilusão de que a fronteira do desenvolvimento só se ultrapassará com a ajuda prestimosa do vírus da doutorite aguda, descurando, em nome da massificação do doutorismo, a qualidade e o mérito. O preço desta incúria está a ser pago, com língua de palmo, por todos os portugueses. O caso do “Álvaro” foi apenas e tão-só mais uma centelha num mato que arde todos os dias, descontrolada e desapiedadamente, com o silêncio desgarrado de um povo alienado pela balbúrdia moral, sem que haja uma só alma que se apreste a debelar o incêndio dos nossos valores. É nestes momentos que me vem à memória uma das sentenças mais infelizes de Descartes, que dizia, na abertura do seu “Discurso do Método”, que o bom senso é a coisa do mundo mais bem distribuída. Lamento profundamente que o matemático francês não tenha incluído na sua análise filosófica as particularidades psicológicas e sociológicas do povo português, pois, caso o tivesse feito, certamente teria escrito que o bom senso é a coisa do mundo pior distribuída. Basta olhar para a doutorite aguda do povoléu lusitano.

 

Publicado aqui

publicado às 13:36

Nabos políticos

por John Wolf, em 26.06.13

Semedo tem razão. O que fizeram às sementeiras? António Costa deve explicações ao povo e aos lavradores da cidade. Não acho graça nenhuma que tenham destruído a horta comunitária. O acto exprime o estado de desenvolvimento político do edil. Os dirigentes municipais demonstram que vivem na idade da pedra. O minifúndio urbano representa a resposta sensata aos excessos do urbanismo, ao avanço desmesurado do betão sobre a base agrária original. A paisagem rural precede a cidade, mas mais importante do que essa dimensão histórica ou arqueológica, será a resposta que a população encontra para suprir necessidades alimentares. Não estão a trabalhar para aquecer. Estão a plantar couves e batatas. Estão a homenagear a alface. E fazem-no alegremente, a cantar. A reforma agrária que lançou pânico nos latifúndios nos anos 70 parece ter sobrevivido e se mutado geneticamente para desbastar esta iniciativa que nem sequer aconteceu na floresta de Monsanto, e que nem sequer envolveu a empresa de transgénicos que também vai pelo nome de Monsanto. Ainda por cima a empresa agrícola era, ao que parece, uma multinacional. Ouvi falar na detenção de uma agricultora francesa e outro proveniente da Turquia. A polícia municipal que efectuou as detenções provinha de que ramo? Era polícia agrícola ou polícia dos costumes? Mesmo assumindo que havia questões regulamentares relacionadas com licenciamentos de hortas urbanas, o espírito empreendedor e integrativo da batata na cidade foi assaltado. Não havia necessidade de agredir a fruta e a nabiça. No contexto da crise seria expectável que um quadro favorável fosse estabelecido para autorizar talhões de cultivo um pouco por toda a cidade. Isso aconteceu um pouco por toda a Europa no contexto da miséria resultante da segunda grande guerra. Mas eu nem peço tanto. A praça do Império tem terreno? É rústico ou urbano? A alameda da cidade universitária está disponível? Então, faça-se uso da terra fértil e ponham os académicos a dar à pá, à enxada, em vez de encherem o peito com presunção. Não tinha sido Cavaco a afirmar que era um especialista, que sabia tudo sobre plantar árvores e sobre como arrancar as vinhas? Portugal não precisa de ser a Holanda nem a Noruega, mas ao menos deveria respeitar a sua matriz cultural. Lisboa foi sempre uma capital provinciana. Pelos vistos, deve haver quem não aprecie o regresso às origens humildes, de trabalho de sol a sol, na Horta do Monte ou noutro qualquer quintal da capital. O cooperativismo não é um exclusivo da Esquerda (Semedo, esta é para ti). A colaboração humana positiva floresce com muito pouco adubo, longe da política e dos pesticídas. Há quem se vá servir disto como espantalho autárquico, mas não vamos deixar. Não passa de um rebento.

publicado às 09:24

Um mundo de modas

por Samuel de Paiva Pires, em 26.01.10

 

Não haja dúvidas, somos um mundo de modas. Modas essas que, quanto mais abruptamente se precipitam sobre nós e passam a fazer parte do quotidiano, enchendo páginas de jornais e horas de telejornais, mais rapidamente parecem também desvanecer-se. Vivemos numa constante e ilusória ânsia pela mudança, por algo novo que faça as manchetes e passe a condicionar a nossa vida. Quando não é a política, é o futebol, quando não é a educação é a saúde, quando não é a justiça é a religião, enfim, é só escolher a moda. E todas elas profeticamente antecipam um qualquer armagedão que nos vai dizimar a todos. Exageros e mais exageros, com muita irracionalidade e pouco bom senso à mistura.

 

Há tempos, escrevi aqui que "somos um povo de provincianos, na acepção pessoana, deslumbrados com o exterior e com o que vem de lá. Primeiro foi a doença das vacas loucas, de seguida a gripe das aves, depois os nitrofuranos, agora é a vez da Gripe A. Alarmistas como mais ninguém, queremos mesmo muito ter Gripe A. Tuga que é tuga quer estar na vanguarda do que se passa lá por fora". 

 

Pois bem, parece que, afinal, a Gripe A não passou de um alarmismo à escala mundial. Mais uma vez, como no caso do Climategate, distorceu-se a ciência em nome de determinados interesses e agendas. É tudo uma questão de modas, claro está.

 

P.S.- ler a Elisabete Joaquim, n'O Insurgente.

publicado às 16:59

 

Somos um povo de provincianos, na acepção pessoana, deslumbrados com o exterior e com o que vem de lá. Primeiro foi a doença das vacas loucas, de seguida a gripe das aves, depois os nitrofuranos, agora é a vez da Gripe A. Alarmistas como mais ninguém, queremos mesmo muito ter Gripe A. Tuga que é tuga quer estar na vanguarda do que se passa lá por fora. E o que está a dar é mesmo a Gripe A. Eu não tomo precauções (o quê mesmo a não ser lavar as mãos?), viajei duas vezes nos últimos meses, na semana passada organizámos um seminário com quase 30 participantes estrangeiros de países tão longínquos como o Tajiquistão, ando de metro todos os dias, trabalho e estudo como normalmente. Continuo aqui vivinho da silva e ainda não apanhei Gripe A. Se apanhar, resta-me apenas ir ao hospital - nem imagino o que vou encontrar, unidades hospitalares em estado de alerta máximo, secções em quarentena e fatos dignos da NASA, sabe-se lá.

 

 

Como há tempos escrevia o Henrique Raposo, somos uma colmeia de hipocondríacos. Para quê tanto alarmismo? Há dois anos eram os incêndios, o ano passado era a criminalidade violenta, este ano o que está mesmo a dar é a Gripe A. Lá por fora ninguém é tão alarmista quanto nós. Teorias da conspiração à parte, alguém sabe se este ano há incêndios ou assaltos violentos? Não haja dúvidas, mais do que informar, a comunicação social constrói a realidade...e tuga que é tuga, quer mesmo apanhar o que está na moda lá fora.

publicado às 23:49






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