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Há cerca de duas horas, a bordo do carro conduzido pela minha irmã, em plena 2ª circular deparámos com os reis de Espanha. Claro que devido à escolta não passavam despercebidos e foi sem surpresa termos verificado a grande estima que os portugueses nutrem pelos monarcas do país vizinho. Acenos, buzinadelas muito prolongadas, quatro piscas em modo de cortejo, enfim, o bom e generoso povo de Portugal. D. João Carlos muito sorridente, efusivamente correspondendo a quem o saudava. Oxalá a TVE e El País pudessem mostrar estas imagens.
Nós, portugueses, somos mesmo assim.
Em Espanha, os extremistas já entenderam perfeitamente o papel unificador da Monarquia. Tendo contemporizado com a instituição que permitiu as Autonomias e a democratização do Estado, conseguidos agora os seus primeiros intentos, já querem muito mais. As quiméricas independências ditadas sobretudo pelo despeito, baixezas várias e projectos caciquistas de alguns, encontram na Coroa o obstáculo intransponível. Total desconhecedores de outras realidades históricas que com o fim do Império Austro-Húngaro - e também da Jugoslávia e da Rússia/URSS - trouxeram o caos à Europa central e oriental, nada lhes serve de argumento para contrariar as pulsões mais ordinárias. Desta vez, organizaram uma monumental assobiadela aos soberanos espanhóis, quando da final da Taça do Rei em basquetebol.
Insultos ao Hino e apupos aos monarcas, foi aquilo que os bem organizados promotores da assoada fizeram escutar. De facto, os eventos desportivos são hoje um poderoso atractivo para todo o tipo de manifestações organizadas e a visão de qualquer reportagem acerca de um jogo de futebol "dos grandes", demonstra pela gritaria e certa simbologia utilizada, o que por ali vai em termos de marginalidade.
A política deixa-se sufocar nesse abraço mortal do velho pão e circo de outros milénios e assim, cede à comparência em locais onde devia estar ausente. O profissional-desporto, omnipresente na imprensa e numa televisão que a todos deixa exaustos de asco, obtém um tempo de antena desmedido e ocupa a abertura e fecho dos noticiários. Mal fazem os agentes da autoridade política - e decisores da informação - em aquiescer com todo o tipo de abusos que aviltam as instituições e embrutecem os espíritos, já por si atreitos à ligeireza de discernimento da hierarquia das coisas.
Imagina-se o que significará em Portugal, o próximo campeonato do mundo a realizar-se na África do Sul... Mais uma oportunidade para a total bestilização do momento, sofregamente aproveitada pelo laparotismo militante em todos palácios do regime.
Os reis de Espanha podem ter uma certeza e essa é sem dúvida, a consciência do papel fundamental que desempenham na união do Estado e daquela imensa maioria composta por castelhanos, bascos, galegos ou catalães que nada mais desejam senão a tranquilidade dos seus dias e a prosperidade em casa e no trabalho.
João Carlos e Sofia foram assobiados por marginais extremistas "nacionalistas". Não se preocupem Suas Majestades. No passado dia 31 de Janeiro de 2010, Cavaco Silva, o 1º ministro, o presidente do Parlamento e outros dignitários do Estado português, foram recebidos nas cerimónias comemorativas da derrota de 1891, aos gritos de "gatunos para a prisão!"
Não é a mesma coisa.
A rainha Sofia é talvez, o mais interessante e consistente elemento da família real espanhola. Desde o seu casamento com o então príncipe da Astúrias, João Carlos de Bourbon, exerceu determinante influência que beneficiaria o relacionamento com o regime franquista, ainda não totalmente rendido à necessidade ou inevitabilidade da instauração de uma nova monarquia no país. Eram públicas as profundas divergências entre o caudilho e o filho de Afonso XIII, D. João de Bourbon y Battenberg. A normalização do relacionamento com Franco, deu segurança à sucessão, evitando aquilo que ocorreria em Portugal, quando do fim do mandato de Salazar (1968).
Muitos apontam como bastante verídica, a sua decisiva intervenção durante o período de transição, quando as dificuldades eram óbvias. Os sectores do regime franquista eram adversos a uma abertura rápida e total e os poderes que o Chefe do Estado então detinha, foram usados para forçar a passagem para um regime constitucional, compatibilizando a Espanha com a Europa ocidental e solidificando o novo regime que conseguiu a prática unanimidade da opinião pública interna.
A rainha Sofia é considerada como uma conservadora de espírito bastante aberto e liberal. Sob o ponto de vista intelectual, é Incomparavelmente mais dotada que o rei seu marido e os interesses da soberana são diversificados, preenchendo a sua agenda com as naturais preocupações de índole social e também com uma importante intervenção no campo cultural, onde museus, academias e outras instituições beneficiam da sua especial atenção. Pode mesmo afirmar-se que desde a infanta Maria Isabel de Bragança - fundadora do Museu do Prado, inventariadora das colecções reais e rainha de Espanha pelo casamento com Fernando VII -, o país não contava com uma personalidade na cúpula do poder, tão interessada na preservação do património. A rainha Sofia é sem dúvida, a grande força orientadora da realeza espanhola e o seu papel tornou-se decisivo para o porvir da própria dinastia.
A esta mulher admirável, o E.S. presta uma homenagem no dia do seu septuagésimo aniversário.