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"A passagem do Ancien Régime para a sociedade moderna é consumada na França com uma ruptura e uma brutalidade únicas. Do outro lado do Canal da Mancha, na Inglaterra, o regime constitucional foi instaurado progressivamente, as instituições representativas advêm do parlamento, cujas origens remontam aos costumes medievais. No século XVIII e XIX, a legitimidade democrática se substitui à legitimidade monárquica sem a eliminar totalmente, a igualdade dos cidadãos apagou pouco a pouco a distinção dos "Estados" (Nobreza, clero e povo). As idéias que a revolução francesa lança em tempestade através da Europa: soberania do povo, exercício da autoridade conforme a regras, assembléias eleitas e soberanas, supressão de diferenças de estatutos pessoais, foram realizadas em Inglaterra, por vezes mais cedo do que em França, sem que o povo, em sobressalto de Prometeu, sacudisse as suas correntes. A "democratização" foi ali (em Inglaterra) a obra de partidos rivais.
(...) O Ancien Régime desmoronou-se (em França) de um só golpe, sem quase se defender, e a França precisou de um século para encontrar outro regime que fosse aceite pela grande maioria da nação."
Raymond Aron, L'Opium des intellectuels, 1955
Depois desta, aqui fica uma outra breve passagem de Aron, a respeito dos postulados de Tocqueville acerca das revoluções nas sociedades democráticas (As Etapas do Pensamento Sociológico, 7.ª ed.,Lisboa, Dom Quixote, 2004, p. 250):
"Afirma em primeiro lugar que as grandes revoluções políticas ou intelectuais pertencem à fase de transição entre as sociedades tradicionais e as sociedades democráticas, e não à essência das sociedades democráticas. Noutros termos, as grandes revoluções tornar-se-ão raras nas sociedades democráticas. E contudo essas sociedades serão por natureza insatisfeitas.
Tocqueville escreve que as sociedades democráticas não podem ser nunca sociedades insatisfeitas, porque sendo igualitárias, são invejosas, mas que, a despeito da sua turbulência superficial, são fundamentalmente conservadoras.
As sociedades democráticas são anti-revolucionárias pela razão profunda de que à medida que as condições de vida melhoram, aumenta o número dos que têm alguma coisa a perder com uma revolução. Há demasiados indivíduos e demasiadas classes que possuem alguma coisa nas sociedades democráticas para se disporem a arriscar os seus bens no lance de dados das revoluções."
Quando se tira notas enquanto se percorre dezenas de livros, só para escrever um simples paper. Uma breve passagem de Raymond Aron, a respeito de Tocqueville, retirada da obra "As Etapas do Pensamento Sociológico" (7.ª ed.,Lisboa, Dom Quixote, 2004, pp. 245-246):
"Os franceses contraíram o gosto pela ideologia, porque durante séculos não puderam realmente ocupar-se dos assuntos públicos. Esta interpretação é de longo alcance. De um modo geral, os jovens estudantes têm tanto mais teorias em matéria política quanto menos experiência da política têm. Pessoalmente, sei que na idade em que tinha teorias mais firmes em matéria política não tinha a mínima experiência da maneira como a política se faz. Temos nisto quase uma regra do comportamento político-ideológico dos indíviduos e dos povos."