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Os pequenos devedores lá vão fazendo o que podem para pagar as suas prestações, quando em risco de incumprimento mal conseguem renegociar os seus créditos e aqueles que entram em incumprimento não se livram de ter as empresas de cobrança de créditos à perna durante anos, sem esquecer que são ainda incluídos na lista negra do Banco de Portugal, ficando impedidos de contrair empréstimos junto de qualquer instituição bancária. Por isso, da próxima vez que pensarem em pedir um empréstimo à CGD não sejam tímidos. Peçam logo em grande e não dêem quaisquer garantias. Se a coisa correr mal, paga o Zé Contribuinte. Não conhecem ninguém na Administração? Azar o vosso. Todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais que outros, já dizia Orwell. Talvez esteja na hora de pararmos de brincar com o erário público e privatizarmos a CGD. E já agora, se não for pedir muito, responsabilizar criminalmente quem esteve nas Administrações que autorizaram estes empréstimos escandalosos.
Que eu saiba não existe uma comunidade portuguesa na Crimeia, mas existe uma de dimensão assinalável na Venezuela. Não sei com o que anda entretido Machete nos dias que correm. O chefe dos negócios estrangeiros não assinou o manifesto dos 70 e ultimamente não tem andado a pedir perdão aos sete ventos. Pois bem, não é preciso ser um especialista em relações internacionais para observar que a situação em Caracas está muito perto de se tornar explosiva e irreversível. Deixemos por enquanto a ideologia fora do debate, a eterna discussão dos sucessos da revolução boliviana, as sociedades útopicas de pão, paz e liberdade para todos, e concentremo-nos na mera logística que implica Portugal de um modo substantivo. Segundo um amigo e correspondente de nacionalidade venezuelana: "Hoy queda en envidencia que: Venezuela se encuentra totalmente aislada en la región. Lo que pasó hoy en la OEA es una demostración de que el pasado no existe, el presente es lo que importa y en el futuro ya veremos. Además, queda en evidencia que la verdad aturde y es incómoda... no habrá un árbitro que intervenga en esa pesadilla de realidad y antes de ser árbitro, prefiere hacer el papel de los tres monos sabios. Por último, que el Gobierno que está técnicamente caído no tiene más asidero que la fuerza, la represion y las armas, solo asi se mantiene el gobierno, solo así saldrá. La población civil está derrotada, pisoteada y subyugada, el castrochavismo, el fascismo de América Letrina se impondran al estado de derecho, al progreso y a la integración, apenas porque un puñado de locos en Venezuela y en Cuba quieren que asi sea." E continua numa outra tirada em inglês não técnico: "(...) Regarding the situation in Venezuela, Chavez and Maduro make Salazar and Caetano look puny. However, because of the empathy with the situation, I expected Portugal to be in the frontline against the tyrant dictatorship. Even my colleagues in media and professionals in journalism, observe the situation in silence, oblivion and amnesia! I cannot blame them because they have not yet taken the side of the Government, but the few friends I have in Portugal, have been concerned and active about the situation in Venezuela. In Portugal, only when the selfish interest of the portuguese is at stake, the events are shown on the news in a very particular way (texto não-editado). De acordo com a mesma fonte, neste momento são governos, políticos chulos e parasitas que apoiam a ditadura na Venezuela. Refere ainda a tristemente célebre intervencão do Brasil na OEA (www.venezuelaaldia.com) e a dívida colossal que irá em última instância determinar o descalabro da sociedade venezuelana na totalidade do seu espectro. O "meu homem em Caracas" refere ainda as movimentações russas no sentido de esta instalar bases militares na Nicaragua, Cuba e Venezuela. Como nota final do meu correspondente, Portugal deveria seriamente preparar um plano para acolher uma boa parte dos 500.000 portugueses que vivem estes tempos tumultuosos na Venezuela. A serem obrigados a "se evadir" do regime, certamente que Portugal será entendido como porto de abrigo natural. Mas todos sabemos que não tem sido apanágio da política externa portuguesa preparar a eventualidade de certos acontecimentos de um modo racional e antecipado. Enquanto houver negócios a concretizar, o Palácio das Necessidades virará a cara às efectivas prioridades políticas, em nome de Magalhães e companhia.
Pois é, parece que à esquerda não há, efectivamente, nada de novo debaixo do sol.O Bloco, fazendo jus à sua tradição de parlapatice enfatuada, vai-se esfumando progressivamente, levando, nessa espiral destrutiva, os pouquíssimos rostos mediaticamente apelativos que ainda restavam nas caves bolorentas da Almirante Reis. A coisa tem uma história e genealogia próprias, que, para abreviar o possível cansaço dos leitores com as tranquibérnias do esquerdismo caviar, se resume no facto de a tradição política da extrema-esquerda ter no seu âmago constitutivo o dissídio e o confronto intestinos. Nada que, em boa verdade, surpreenda os espectadores mais cautos das guerras civis da esquerda portuguesa. Aliás, se há ilação que se pode retirar da imensa confusão em que caiu o Bloco de Esquerda é que o aggiornamento das esquerdas portuguesas, sob este regime, e com estes protagonistas políticos, é, ao cabo, uma autêntica miragem. Passada uma década e meia, o Bloco implode sem que, ao menos, tenha logrado europeizar, política e intelectualmente, um sistema político configurado às arrecuas. Mas, no fundo, o que tem de ser tem sempre muita força, e, neste caso, a força reside inapelavelmente do lado dos que desejam, sem desprimor para Schumpeter, a destruição pouco criativa da civilidade inerente ao bom trato da coisa pública. O problema é que, com esta implosão, a governabilidade futura do país ficará, em grande medida, superiormente limitada. Mais: pensar numa esquerda que governe unida, carregando solidariamente as dores da governação, é, para todos os efeitos, uma ilusão que doravante, atenta a crise presente, importa não alimentar. Tudo leva a crer, portanto, que serão os portugueses a pagar, mais uma vez, a factura desta romaria festiva, pela singela razão de que não será de todo possível regenerar a República sem uma extrema-esquerda que entre no arco da governabilidade, desobstruindo, com essa abertura, o imobilismo político crismado pelo PREC. Foi isto que, com muita bufonaria política à mistura, o séquito de Louçã diligentemente legou aos seus compatriotas.
Relanceio o meu olhar pelo ano de escrita que está prestes a acabar. Derramei-me. Como sempre. Se agora um torpor alastra pela minha alma, espécie de fadiga por tanto ter lutado, não no meu reduto, mas no da mesma trincheira hostil da mais retinta incompreensão, insulto e oposição pessoal, meses consecutivos houve em que nada me deteve na fabricação da violência feita palavra reactiva a vestir a ideia filigrana contra o terror de ver resvalar o meu Portugal para a agitação estéril e o vazio.
Era necessária uma barragem de verve contra os que nos VídeoMedia berram mais alto e por mais tempo na defesa de mais do mesmo, toda a prosperidade e adaptabilidade globalista de que a velha Esquerda é incapaz. Contra a sedição dos soares, a malícia dos sócrates e a rebelião em pólvora seca das esquerdas, marchei, marchei.
Pausa, portanto.
Entre o meu corpo e a minha alma desenrola-se agora o justo armistício, apaziguamento momentâneo de que careço. As naus das minhas palavras seguiram, seguiram viagem, deram-se à trópica rota de contundir ou consolar. Reparo, no entanto, que não há ninguém. Vejo que estou morto. Cercado de silêncio e frieza. Morto. Pobre e morto. Na verdade, não tenho ganho absolutamente nada com a minha escrita apaixonada na defesa de causas, princípios e éticas fora do grande lastro esquerdejante nacional mentiroso. Não lucrei nada, a não ser experiência escrevente, prazer no acto escritor e a espessa solidão do eremitério da escrita, vantagem da liberdade sem venalidade de emitir o que penso.
Zeros. É tudo quanto me é dado contemplar. Nenhuma oportunidade. Nenhum convite. Nenhum apreço. Nenhum horizonte. Zero. Sina. Portugal. Um dia será diferente. O mais provável é que seja diferente, mas longe, lá, onde possa voltar à vida social e financeira que o Regime, na sua horrorosa corrosão moral e propensão para a falência, comprometeu no meu caso e no de milhares.
Entretanto, estendo a mão. Sou qualquer um que estende a mão pelas ruas, avenidas e ruelas de Lisboa e Porto e perante quem o cidadão desvia a face enfastiada pela viciosa recorrência rotineira, pela habitualidade viscosa das ciganas romenas. No meu caso, os cortes foram muitíssimo mais radicais e só há uma maneira de reagir em devida conformidade com eles: estendendo a mão e defendendo o Ajustamento contra os soares, contra alguma maçonaria, contra os fósseis-sindicalistas, contra os comunistas do PCP, contra os rendeiros e devoristas do Regime, contra a tal nomenclatura endogâmica, neocorporativista e partidocrata que explica eloquentemente a minha penúria, o meu desemprego, o meu naufrágio.
Continuação de um bom dia, se puderem.
Aclamação de D. João IV, Veloso Salgado
Dia 1 de Dezembro do ano de 2013, um dia que ficará indelevelmente marcado com o ferrete da ignomínia, pois foi nesta precisa data que, pela primeira vez na história da querelante III República, um dos feriados mais relevantes da nossa pátria deixou, aviltantemente, de ser celebrado. Os adjectivos são poucos para descrever com exactidão a crueldade infligida às gentes portuguesas pela ignorância excruciante de uma elite rancorosa e desmemoriada. Dói ainda mais saber que o fim desta celebração foi chancelado por um Governo composto, dizem muitos, pela direita saudosista dos tempos da outra senhora. No fundo, o que ontem sucedeu representa, pelo menos para aqueles que amam, sincera e denodadamente, Portugal, a confirmação oficial de que a memória histórica da Nação foi, em definitivo, esventrada. Foi esse, em grande medida, o desiderato de sempre do jacobinismo republicano. 100 anos de aventureirismos atrabiliários na política e na cultura tiveram, e teriam forçosamente de ter, como desenlace a corrosão insidiosa da comunidade e a ruína dolorosa do memorialismo respeitante aos feitos mais notáveis da grei portuguesa. Hoje, para o grosso do povo português, o 1 de Dezembro de 1640 é uma data como outra qualquer num país que, colectivamente, só enxerga a mísera brutalidade do presente, encarando a lembrança dos apertos pretéritos como um espectáculo entediante e descartável. São poucos, demasiado poucos, os que resistem ao rolo compressor do presentismo desmemoriado, mas, parafraseando Pessoa, tudo vale a pena se o amor à pátria não é pequeno. E, afortunadamente, ainda há quem ame o espírito do Portugal antigo, e deseje, fidelissimamente, recobrar a essência da alma portuguesa. Num futuro que não promete ser radioso, esse resquício de bom senso é e será, em todo o tempo, uma bênção.
Publicado aqui.
Por vezes, nós, os comentadores das politiques quotidianas, esqueçemo-nos, talvez inconscientemente, de firmar, em pratos limpos, o óbvio. E o óbvio, nas últimas semanas, é o crescendo da violência verbal na política portuguesa. Por norma, a violência verbal proclamada pelos profetas jacobineiros não tem uma correspondência visível no dia-a-dia dos portugueses. O zé povinho sabe, com antecedência, que os clamores soaristas, prenhes de ódio e ressentimento, são uma mera descarga de adrenalina de um político freneticamente habituado à propagação de dichotes e à boa vida marialva. Aliás, não faço, ao contrário de muitos, parte do clube que dá grande valor à maledicência dos decanos regimentais, por uma razão simplicíssima: é evidente que, num cenário de aumento exponencial da violência, com repercussões no sistema político, Mário Soares e os respectivos compagnons de route seriam, com grande previsibilidade, os primeiros a apanhar, perdoem-me a expressão vernacular, no lombo. A vida é mesmo assim, e Soares, ainda que inconscientemente dominado pelos ardores de quem não aceita a alternância democrática, sabe que brincar com o fogo traduz-se, quase sempre, em péssimos resultados. Dito isto, é imperioso reconhecer que os apelos formulados por algumas notabilidades treteiras demonstram, se dúvidas existissem, que o faccionalismo socialista já não é capaz de tragar a legalidade democrática vigente. É certo que a violência papagueada pelos Lourenços e Rosetas não passa de uma converseta cheia de perdigotos, em que a aparência é tomada, com alguma burrice, pela realidade. Estes senhores sabem, perfeitamente, que aquilo que propuseram é, mais do que desaconselhável, uma enormíssima asneira. Mas é, igualmente, verdade que a irresponsabilidade de que se têm revestido visa, em última instância, deslegitimar o executivo perante a opinião pública, criando, ou pelo menos, ajudando a criar, as condições favoráveis à desestabilização violenta da ordem instituída. No fundo, atendendo à história pátria dos últimos 100 anos, nada do que se tem passado constitui uma assinalável surpresa. A canalhada jacobina entende, há muito, que o domínio das instituições demanda uma hegemonia que, a não ser efectivada pelos meios legais, terá, obrigatoriamente, de recorrer à brutalidade da violência armada. As condições presentes são, claramente, distintas das que caracterizavam o Portugal de antanho, mas Soares, devido provavelmente à sua parca formação política, continua, pelos vistos, a crer que a direita não dispõe do direito a governar o país, pelo que o único caminho a tomar, em caso de teimosia das gentes da não-esquerda, é a desestabilização política, com recurso, caso seja necessário, à violência de rua. Uma coisa é certa: se o presente exercício governativo falhar, a direita, sob os auspícios deste regime, jamais será capaz de governar em verdadeira paz de espírito com os seus e com os portugueses. Para bom entendedor meia palavra basta. Com gente desta é impossível fazer seja o que for de bom e positivo pelo país. Que a direita tire as suas próprias conclusões, é o que se exige por agora. E que vá, de preferência, a tempo.
O novo partido criado pelo ambíguo Rui Tavares presta-se a variegadas interpretações, todas elas passíveis de alguma barafunda. No fundo, a hermenêutica deste "fenómeno" depende, como quase todas as coisas, da perspectiva em que cada um se coloque. A minha, no caso em apreço, prima por alguma credulidade, pela simples razão de que, não obstante a pungente história desta III República, ainda creio na possibilidade, duvidosa, é certo, das nossas esquerdas se "europeizarem". Nessa medida, não vejo com maus olhos este acometimento político espoletado por Rui Tavares. Quem conhece a história nacional dos últimos 39 anos sabe que o regime se consolidou no rescaldo do dissídio verificado entre as esquerdas emergentes no pós-25 de Abril de 1974. Esse dissídio teve como consequência necessária a imposição do Partido Socialista como o árbitro do sistema político conformado pela Constituição de 76. O Partido Comunista liderado, então, pelo, hoje, incensadíssimo Álvaro Cunhal acabaria por aceitar o equilíbrio político gizado pelos socialistas, aceitando em troca a participação no jogo parlamentar. Esta troca, vista à distância, teve, como não podia deixar de ser, múltiplas implicações, que, nos dias que correm, ajudam, sobremaneira, a explicar o imobilismo político que, mormente, abalroa as governações socialistas. Na prática, o PS tornou-se, com os anos, numa espécie de PRI à portuguesa, sendo, em função disso, o centro político da democracia nacional. Como é bom de ver, a extrema-esquerda acusou o toque, recusando, desse modo, o aggiornamento ideológico imprescindível a uma política pactista. O Bloco de Esquerda surgiu, em grande medida, como a resposta ao bloqueio político originado no PREC, visando renovar, com uma plataforma política repleta de pós-modernices fracturantes, a esquerda portuguesa, no entanto, os resultados da fantasia bloquista comprovam, uma década e meia depois, que não basta meia dúzia de pechisbeques caviarianos para alterar uma lógica incrustadíssima no âmago político do regime. É neste contexto que surge o partido de Rui Tavares, um contexto marcado, fundamentalmente, pela impossibilidade de haver entendimentos largos entre as diversas forças políticas das esquerdas portuguesas. Como referi no início desta posta, ainda creio, talvez ingenuamente, num entendimento governativo ao nível das esquerdas, porque, sem ele, o regime, tal qual o conhecemos, tenderá, necessariamente, a erodir-se. Alguns leitores perguntar-se-ão, certamente, o porquê de alguém, como eu, pertencente ao campo da direita conservadora ansiar por um compromisso à esquerda. A resposta é muito singela: o regime só se normalizará (entenda-se por normalização o enfraquecimento das reminiscências ideologizantes do regime) com a "europeização" das esquerdas, isto é, se a esquerda socialista souber pactuar com a extrema-esquerda, o sistema político, polarizado em torno do Partido Socialista, adquirirá, necessariamente, uma feição nova, na qual a direita terá, finalmente, uma oportunidade de ouro para afirmar um projecto político alternativo, que aparte, definitivamente, a práxis das inenarráveis cedências políticas às cantilenas socializantes. Do ponto de vista de quem se reclama da área política da direita, um entendimento à esquerda seria, em boa verdade, um excelente tónico para a renovação programática que continua, infelizmente, a ser adiada para as calendas gregas. Não sei se Rui Tavares será capaz de levar avante uma proposta política que se arrogue uma concertação à esquerda. Para dizer a verdade, olhando para o histórico deste regime democrático, tenho as mais sinceras dúvidas que um novo partido, ainda para mais alicerçado nos descontentes do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda, obtenha o menor êxito. Ademais, não é líquido que Rui Tavares disponha do talante político indispensável à tarefa referida. O próprio eurodeputado, fazendo uso da sua natural ambiguidade, como é, aliás, seu timbre, não tem dado razões suficientes para acreditar que o partido em causa não seja uma plataforma fulanizada. Mas a política ensina-nos que não há impossíveis, porque, vistas bem as coisas, o homem é, como dizia Ortega, o homem e as suas circunstâncias. Resta saber se as circunstâncias de Rui Tavares se coadunam com um projecto político desta envergadura. O futuro será o juiz desta empresa.
Começo a pensar que existe relação de sangue entre Mário Soares e José Sócrates. A relação simbiótica entre os dois merece um documentário do National Geographic. Há qualquer coisa aqui de empatia entre o hipopótamo e o pássaro que cata a carraça escondida atrás da orelha. Não sabemos se Soares vê em Sócrates o filho político que nunca teve, ou se pretende, com estas afirmações tontas, ajudar as causas socialistas. E desde quando é que os portugueses tiveram de aprender com os franceses a fazer política? Sem dúvida que existiram grandes pensadores políticos franceses, mas não foram contemporâneos de Soares ou Sócrates. São intemporais e pertença inegável de todos nós - amigos socialistas ou nem por isso. Alexis de Tocqueville, embora francês, contribuiu para o pensamento e a acção política norte-americana. Ou seja, o capitalismo diametralmente oposto ao socialismo, também radica nos franceses. Rousseau, por sua vez, esteve efectivamente exilado no sentido mais dramático e político. Soares, embora se queira apresentar como membro do clube dos diasporizados, que eu saiba, nunca conheceu os calabouços que Mandela experimentou ou a tortura de compatriotas caídos na malha limoeira da PIDE. O estudo comparativo de Soares deve ser considerado insultuoso e ofensivo por distintas razões. Portugal conheceu casos mais extremos de perseguição política e os visados não tiveram a sorte de sobreviver numa gaiola dourada em Paris. Quanto a Sócrates e o seu destino academico infantil, não encontro termo de comparação com o que quer que seja. Quatro anos de estadia de Soares, somados a dois anos de lua de mel de Sócrates, não produzem grandes dividendos políticos. Se quisermos ser cínicos e pouco complacentes, poderemos dizer, ao abrigo do contraditório, que os ares franceses podem ter contribuído negativamente para o modelo económico e social sonhado para Portugal no verão quente de 74 ou em tempos políticos mais recentes (A Europa, as Comunidades e a União Europeia estão a ser postas em causa e não o contrário). Parece que cada vez que Portugal e os seus governantes se viram para o exterior a coisa não corre de feição. E se Seguro um dia quiser estudar na Alemanha, será que poderá regressar com o crachá de exilado agrafado ao peito? Soares e Sócrates regressam de diferentes passados políticos, mas nem sequer podem ser chamados de retornados. Se Soares se quiser comparar a alguém, talvez se possa equiparar a Machete. Cada vez que abrem a boca entornam o caldo.
Diz Sócrates, o garanhão pletórico do comentário televisivo, que a afirmação de José Manuel Barroso, vulgo o Durão para os portugueses, sobre o Tribunal Constitucional passou das marcas. Se passou ou não, sinceramente não sei. Na verdade, tudo o que Durão diz tem, na minha humilíssima óptica, uma credibilidade próxima do zero para baixo, contudo, dada a minha generosidade ingénita para tudo o que sai fora da caixa do politicamente correcto, sou obrigado a assentir com as declarações do presidente da Comissão Europeia. De facto, um hipotético chumbo do Tribunal Constitucional colocaria o país numa situação complicadíssima. Pensem comigo: se o sacrossanto tribunal chumbar as medidas aprovadas pelo executivo, o passo seguinte será, naturalmente, composto pela aprovação de medidas ainda mais gravosas, com a consequente procrastinação do prazo de regresso aos "mercados". Numa situação destas, a tímida recuperação que se tem verificado em certos indicadores económicos, tenderia, com toda a certeza, a ser sonegada pela vertigem da crise política e institucional. É óbvio que, a não ser que sejamos todos uma cambada de sádicos, um cenário deste cariz não interessa de todo a ninguém. Há, ademais, outra componente nesta crise que importa não desprezar: a insolubilidade da crise europeia. Em França, a extrema-direita lepeniana vai ganhando pontos, galgando posições na apreciação positiva do povoléu francês, enquanto que na Alemanha a indecisão quanto à política macroeconómica a seguir continua a estar na ordem do dia. É evidente que o remédio imposto, aos quatro ventos, na Europa periférica, pura e simplesmente, não funciona, dado que, como a realidade vem demonstrando a diário, as economias nacionais não conseguem responder eficazmente à lógica confiscatória imposta por Bruxelas. O que advirá daqui é, infelizmente, difícil de perscrutar, o certo é que, qualquer instabilidade institucional a nível interno, será, neste cenário de debilidade económica, um factor de potencial agravamento da crise vigente. É por isso que, em face destes desafios, entendo que a solução da crise passa por 1) uma profunda revisão da Constituição (a meu ver, seria preferível uma mudança de regime, mas isso são outros quinhentos), 2) um debate amplo sobre a permanência no euro, 3) a renegociação da dívida, e last but not the least, uma reforma radical do Estado. O contexto em que estamos não permite, porém, a discussão atempada destes tópicos, pelo que, no cenário actual, em virtude da ausência de estímulos e forças políticas, sociais e culturais, que permitam este debate, o melhor a fazer será, indubitavelmente, manter tudo como está, cumprindo o acordado com a troika, tentando, em simultâneo, diminuir consideravelmente a carga fiscal sobre o grosso da população portuguesa. Se este programa de mínimos olímplicos será ou não exequível dependerá, sobretudo, da facção jacobineira imperante em determinados órgãos da República. Caso não seja, uma coisa é certa: a certidão de óbito da III República será, por fim, uma questão de tempo.
Após tomar conhecimento disto, volto a perguntar: é assim tão difícil compreender que o actual desenho institucional do regime premeia o imobilismo socializante que nos trouxe a esta balbúrdia política e económica? A dogmática do regime esgotou-se. É tempo de a direita (existe?) arrepiar caminho.
O ódio a Paulo Portas continua em alta. A razão de tamanha cegueira é fácil de perscrutar: o regime tem os seus favoritos, e, numa cultura de favoritismo distribuído a preceito, o ego alheio é sempre uma ameaça à estabilidade cósmica do modo-habitual-de-fazer-as-coisas. Soares é um bom exemplo do amiguismo atrás referido. Diz o papá do regime, na entrevista que deu, hoje, ao periódico I, que "a promoção do vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, que Cavaco Silva teve de engolir depois de ter dito publicamente o contrário, como o país todo sabe, não augura nada de bom". Não augura nada de bom para quem? Para os fautores do amiguismo socialista? Provavelmente, não. Para o país, a resposta é, muito provavelmente, diferente. Mais à frente, Soares acrescenta que Portas não é "a pessoa indicada para discutir com a troika". Não é? Porquê? António Costa é a pessoa mais indicada? Porque é que Paulo Portas não é a personalidade política mais indicada para essa negociação? A resposta não é difícil de antolhar: se Portas conseguir, com bons resultados, acomodar os interesses nacionais nas negociações a encetar com a troika, é evidente que o peso político do actual vice-primeiro-ministro subirá em flecha. Como é simples de calcular, os donos do regime não desejam um desfecho em que Paulo Portas possa capitalizar politicamente os ganhos de uma boa negociação com os credores internacionais. O que importa a este gente é que o Governo falhe clamorosamente na concretização dos objectivos a que se propôs. Quando o ódio é assim tão pronunciado, o melhor mesmo é agir com celeridade, acautelando o que verdadeiramente interessa: o bem-estar dos portugueses.
Miguel Castelo-Branco, A ruína chegou à ruína:
«Nunca teve forma. Foi sempre negação. Hoje, pela noitinha, a ruína soçobrou. Perante o abismo, sem presente nem futuro, há que pensar o país sem o regime. Há quem persista, teimosa e cegamente, em aplicar receitas que nos trouxeram ao colapso. Portugal precisa de um novo regime, de uma nova constituição e de novos governantes. Que o regime o compreenda e saia com aquele mínimo de dignidade que o interesse nacional exige.»
Silva Porto, O Guardador de Rebanhos
Quando olho para a República, mormente para Cavaco, o representante-mor deste conjunto de instituições e práticas políticas apoucadas pela ridicularia dos oligarquismos, tenho a ligeira sensação de que, mais cedo ou mais tarde, o país desabará estrondosamente, quedando-se inerme sob um amontoado de escombros sem remição. O estado actual do país não aconselha grandes optimismos. Enquanto alguns, mal ou bem, criticam e apontam falhas, outros vão-se dedicando a explorar o ressentimento do povoléu, exacerbando dissídios que não existem. Desafortunadamente, a grande política, o múnus da pólis, deu lugar à fulanização extremada. O debate que vemos e ouvimos todos os dias na televisão, nas rádios e nas redes sociais tem em comum a pessoalização pueril. Esta tendência não é de agora, nem de ontem. A sociedade do espectáculo, que o situacionista Debord tão bem escalpelizou, é um dado adquirido que vem permeando de lés a lés a pós-modernidade de um Ocidente enfraquecido por relativismos esconsos. Cavaco não foge à regra. É, e sempre foi, um péssimo político. Não pelas razões apontadas pela esquerda roufenha dos Soares e companhia limitada, mas sim pela inépcia com que, desde sempre, pautou a sua acção política. Cavaco comunica mal e decide de um modo tacanho. Ademais, não sabe, por norma, avaliar as condicionantes dos diversos momentos políticos, o que faz com que a sua "práxis" política seja orientada em demasia pela revanche pessoal. Com um histórico deste jaez é fácil intuir que o actual chefe de Estado é um ponderoso factor de instabilidade, o que, convenhamos, não augura nada de bom para o futuro do regime. Com uma crise em pleno crescendo, a falta de talante político de Cavaco tornar-se-á progressivamente num carcinoma de difícil extracção. O incidente com Miguel Sousa Tavares - que, repito, teria feito bem melhor figura se tivesse estado calado - revelou, se dúvidas existissem, que Cavaco não tem a "gravitas" necessária para o exercício de um cargo que exige, em primeiríssima mão, prestígio e autoridade. Para mim, e estou certo de que para muitos, esta ausência de predicados não constitui uma surpresa. Para alguém que defende o retorno a um regime monárquico, como é o meu caso, e o da maioria dos convivas deste blogue, a depauperação a que tem sido sujeita a presidência da república é o resultado óbvio de um regime que promove a mediocridade das suas elites. O problema de Portugal começa justamente nesta palavrinha que, amiúde, é mistificada até ao delírio: elites. Sem elites que pensem, estudem, raciocinem e decidam com peso, conta e medida, não sairemos desta modorra peçonhenta que seca tudo o que floresce neste doce cantinho do Atlântico.
Resumo de uma semana atribulada: há relatórios e relatórios, há políticos e políticos, há tautologias e tautologias, mas no fim destas peripécias e desventuras quem perde é o indivíduo e o cidadão. O indivíduo que perde a sua propriedade e o cidadão que perde a participação activa no poder político. As repúblicas caem de podre, lenta e inexoravelmente, e quando desabam, o estrépito é sufocante.
Rui Ramos, inteligentemente, alertava na edição do passado sábado do hebdomadário Expresso para um facto que poucos comentaristas têm realçado: o Portugal troikado é uma tradução eufemística para aquilo que, na verdade, é já o fim da política. Converge-se, pois, no essencial, secundarizando o acessório. E o essencial é a transposição da lógica lampedusiana para a política portuguesa, ou seja, é necessário que algo mude para, no fim, ficar tudo na mesma. Sem política nem desígnio, somente com a gestão das dependências no fio do horizonte.
Sente-se no ar o princípio do fim de qualquer coisa. Tudo encareceu, desde as amizades até ao amor. A ruína e a desgraça tomam conta de muitas famílias. Muitos lares passarão, neste ano que hoje começa, dificuldades ingentes, sofrimentos múltiplos e desesperos vários. O medo está bem presente nas nossas vidas. O medo de que tudo se perca, o emprego, a família, o bem-estar duramente almejado durante anos de porfia. Entrementes, o Leviatã continua gordo, poderoso e activo, afogando tudo e todos com a impostocracia do Estado todo-poderoso. Nada muda, nem mesmo os rostos da ruína. Não sei o que este ano reservará a muitos de nós, não sei sequer se chegaremos todos vivos ao final do presente ano para contar a estória das nossas vidas, o que sei, e já é muito, é que o país está gasto. Cansado e exausto. Prestes a rebentar de ódio e revolta. 2013 será um ano perigoso, um ano em que o regime, a partidocracia, a oligarquia da finança e os prebostes da mesmice serão colocados permanentemente em causa. Nada será como dantes. As imposturas serão desnudadas e as mentiras verberadas. Espero que o torniquete fiscal seja combatido com fé e zelo por todos aqueles que não se revêem no esbulho do nosso futuro. Espero mesmo que algo mude para que tudo não fique na mesma.
O cursus honorum do político profissional na partidocracia portuguesa é o exemplo mais saliente da gritante ausência da palavra Liberdade na narrativa ideológica oficial. Desde o beija-mão rastejante até à obediência servil às chefias partidárias, que atravessa curiosamente todos os estamentos etários, a carreira política é uma fonte inesgotável de arrivismo. Como explicar, por exemplo, a ascensão do atrevimento ignorante nas juventudes partidárias do centrão? O problema da liberdade em Portugal não se reduz apenas à deficiente concepção dos institutos da propriedade e do contrato. O problema é bem mais agudo e começa na Política. Na política com P maiúsculo. Na incompreensão, perigosa e letal, de que a democracia só funciona se for devidamente temperada pela lei e pelo direito. O principal problema deste "torpe dejecto de romano império" é a fraqueza do Estado de Direito. Sem ele, o despotismo e a corrupção dos costumes serão, inevitavelmente, uma realidade tangível. Já estamos nesse estádio. E digo mais, caso não atalhemos de vez esta putrefacção generalizada acontecer-nos-á aquilo que Jules Winnfield (Samuel L. Jackson) diz na passagem em baixo, citando Ezequiel: "abençoado é aquele que, em nome da caridade e da boa-vontade pastoreia os fracos pelo vale da escuridão, pois ele é verdadeiramente o protector do seu irmão e aquele que encontra as crianças perdidas. E Eu atacarei, com grande vingança e raiva furiosa aqueles que tentam envenenar e destruir os meus irmãos. E saberão que eu sou o Senhor quando eu tiver exercido a minha minha vingança sobre eles"- Ezequiel 25:17. Os germes do totalitarismo andam por aí, ocultos sob a neblina da ilusão. E por mais que tentemos negar o óbvio, a liberdade encontra-se ameaçada. Seja no estupro económico do país, seja no abastardamento da democracia pela costumeira imundície dos pastores do regime, a liberdade está a sofrer vários abalos. E, mais cedo ou mais tarde, a gana de ter um Pastor que nos comande será infinitamente maior que a vontade de agir e viver em, e com, Liberdade. Cuidado.
O desrespeito pelas liberdades em Portugal não é uma coisa de antanho. Esta III República tem provado à saciedade que há orgãos no Governo que servem, também, para violar os direitos individuais. Como o Samuel exemplificou, há quem veja no controleirismo uma arma indispensável no combate político, mesmo que isso signifique o desrespeito pelo Estado de Direito. A monitorização da blogosfera por uma entidade desconhecida, e já agora financiada com que dinheiros?, sob a alçada governamental é algo que qualquer espírito livre deve condenar radicalmente. Sem contemplações. Entendamo-nos, o erário público não pode nem deve servir para financiar os delírios liberticidas de meia dúzia de garotos ignaros.