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O cidadão português tem motivos de sobra para andar baralhado. Os próprios analistas económicos e de mercados já não sabem a quantas andam. Se por um lado o governo apregoa o sermão do milagre económico e o fim da recessão, os estrangeiros que passam os cheques afirmam que o caminho de regresso aos mercados é estreito (não confundir com straight). A glória técnica que se traduz num crescimento de 0.2% da economia, embora seja um minúsculo sinal positivo, não se irá traduzir no dia a dia do trabalhador, empregado ou não - estes estão longe de tirar dividendos desta notícia. Na longa lista daqueles com a mão estendida, os indivíduos serão os últimos da fila a receber. O regresso aos mercados em condições normais, não é mais do que o princípio de um longo fim. Existe um conceito económico que se chama "velocidade do dinheiro" e que tem a ver com a forma fluente ou não, com que o dinheiro, ao abrigo instrumentos variados de substituição da dinâmica económica, chega aos destinatários da economia - as empresas, por um lado, e os consumidores, por outro. Quando se procura ficcionar a saúde económica do país, normalmente dá asneira. E regressar aos mercados em péssimas condições é quase a mesma coisa que ter a Troika à perna. O mercado consegue ser ainda mais implacável do que a mão pesada de uma entidade externa. Por isso, quando nos vêm falar em facilidades e da luz ao fundo do túnel, aconselho alguma prudência. Um programa cautelar ou um segundo resgate pode ser, em algumas circunstâncias, menos dramático do que o comportamento aberto de um mercado pertença de ninguém. Mas há ainda outros factores; o abrandamento da economia alemã poderá vir a ser uma preocupação séria para o resto da Europa, assim como para o sistema económico e financeiro global. O governo, que está de certo modo obcecado com a alegada "libertação" aquando do regresso aos mercados, trata a "mão invisível" dos mercados como um aliado inquestionável. O mercado, mesmo sem ser uma entidade soberana, decide desumanamente e sem a necessidade de um governo eleito. O mercado determina as condições de sobrevivência dos países, e chuta para canto questões ideológicas de fundo. O ideal seria o país pensar a sua grande estratégia como se não existisse mercado, como se não houvesse Troika. E é aí que reside o problema. Existe a tomada de consciência nefasta que a austeridade veio para ficar. O caminho de regresso aos mercados de que falam é de facto muito estreito. É uma linha ténue e perigosa. Quanto aos mercados - esses são eternos.
Ontem era dia de "regresso aos mercados". Não foi. Ao invés, recebemos da boca do administrador-delegado da Troika a promessa de um 2º resgate. Do Gabinete do Primeiro-Ministro nada se ouviu. O país regressou à "normalidade".
Houve há uma semana um temporalzinho da treta. Uma perturbação que devia ter sido irrisória, se ao menos o país tivesse aproveitado bem as benesses que lhe foram concedidas. Aproveitado o clima plácido, aproveitado a geografia acolhedora, aproveitado a ausência de guerras e pestes, aproveitado o dinheiro que recebeu da Europa, aproveitado a abertura da Cidade e do Mundo ao progresso trazido pela globalização, aproveitado a sorte.
Como sabemos, nada disso foi aproveitado. Os portugueses continuam a não governar-se nem a deixarem-se governar. Ninguém lhes come as papas na cabeça, a não ser os chico-espertos dominantes, que entre uma promessa e um tacho lá vão comendo e deixando migalhas aos tansos.
Volvidos sete dias sobre a tempestade, há gente que ainda não tem água nem luz nas suas casas. Os monopólios vigentes, sendo por natureza impávidos às vicissitudes de quem lhes paga a existência, estão perfeitamente a lixar-se para a situação.
O Estado, afoito no controle fitossanitário das ostras e na certificação das rendas de bilros, afaga o lombo aos monopólios, onde tem a patorra aconchegada. Asinus asinum fricat.
Entretanto foi criada uma petição pública que me honra aqui referir. Subscrevê-la-ei e faço votos de que surta o efeito pretendido, para que seja dado mais um passo seguro no sentido de obliterar esta gente cujo carácter desafia qualquer descrição. Recomendo ainda a leitura do editorial do Jornal de Leiria, onde pode ser encontrado um retrato mais próximo da situação terceiro-mundista que aflige agora muitos dos nossos compatriotas.
E fica, de facto, no ar a pergunta para que todos e cada um de nós, os mais e os menos complacentes, deveríamos ter, na ponta da lingua, a resposta: e quando vier um temporal a sério, ou outra coisa qualquer daquelas "que só afectam os outros lá longe"?
Não digam nada, já estou a imaginar. Refila-se muito e não se muda nada, paga-se os impostos porque eles é que mandam e é melhor não criar muitas ondas porque senão ficamos malucos.
O disparate da venda da TAP foi momentaneamente adiado. No fundo, e apenas, porque o Governo não tinha garantias de que iria mesmo receber o dinheiro prometido e nada mais do que isso. Ou seja, iria vender a TAP e, em troca, recebia um aperto de mão. Isto porque a vontade de privatizar a TAP continua lá, inteirinha, adiada agora para 2013, ano do propagado regresso aos mercados. O cesto de Gaspar ainda vai, portanto, meio-cheio...