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A Constituição foi revogada

por Pedro Quartin Graça, em 01.12.12

Foi simples. Bastou uma discreta declaração pública da nova Procuradora-Geral da República para que tudo fosse publicamente conhecido: a revogação da Constituição da República. Na verdade, foi através desta notícia que se percebeu que foi já efectivada a transferência do poder legislativo em Portugal. A Constituição da República Portuguesa foi discretamente revogada durante um jantar ontem à noite entre o nº 1 e o nº 2 do Governo. Ambos concordaram que não era necessário informar o Presidente da República. Os restantes ministros foram informados esta manhã. Os deputados serão só na próxima 3ª feira (2ª há contacto com o eleitorado e não convém...).

Revisão da Constituição? Para quê complicar as coisas quando elas são tão simples?

publicado às 09:59

Edvard Munch, O Grito, 1893
Ao iniciar a redacção desta posta pensei na célebre pintura de Edvard Munch, O Grito. Porquê esta obra? Este quadro serve um pouco para tudo, pois é, de certo modo, uma alegoria perfeita da melancolia solipsista do homem moderno. Não se cura aqui de efectuar um exame filosófico ou sociológico do homem-massa, que é indiscutivelmente um dos principais atributos das pós-democracias actuais, mas sim fazer um paralelismo entre o desespero englobante da pintura referida e a inquietação que acometeu o povo português nos últimos anos. A perscrutação das maleitas da pátria, a que tenho dedicado a grande maioria das minhas postas neste blogue, tem-me feito pensar no grau de derisão colectiva a que chegámos. Há uma angústia latente no rosto gasto e abatido dos portugueses. Atingimos o limite. Assistir à decomposição de um país tão sofrido, de uma nação secular, de uma pátria que passou e sobrepujou obstáculos múltiplos, dói e magoa. O desejo suicida veiculado por Herculano já não basta como brado de revolta face a este caos pútrido que nos encharca diária e quotidianamente. Hoje, mais do que nunca, só um potente grito será capaz de salvar-nos enquanto povo: um grito torrencial, vívido e fulgurante, sem peias nem grilhetas. 
Estas divagações têm como ponto de partida os últimos desenvolvimentos da já avelhentada crise portuguesa. As recentes declinações passistas a propósito da refundação do memorando, ainda que imerecedoras de interpretações rebuscadas, são dignas de algumas notas. O que significa, em concreto, a "refundação" do memorando de entendimento? Esta pergunta, objectiva como não poderia, aliás, deixar de ser, é fruto da incompreensão berrante que a narrativa política construída por este Governo amiúde impõe. A proclamação de Passos Coelho, além de nebulosa e torva, obliterou a menção aos detalhes e pormenores que irão ser arrolados na árdua tarefa da refundação. Não basta afirmar que se pretende reformar e refundar, é necessário, outrossim, dizer como e quando. Ademais, há um aspecto que passou completamente despercebido na comunicação do primeiro-ministro: a revisão da Constituição. Será que Passos Coelho acredita na reforma do Estado sem a alteração da vigente narrativa constitucional? É assim tão espinhoso compreender que a superação dos bloqueios nacionais exige, pede, e demanda o fim do verniz socializante vertido na CRP.
Como se isto tudo não fosse suficiente, António José Seguro resolveu brindar-nos com mais uma reflexão política de fôlego. O secretário-geral do PS, nas já famosas alocuções facebookianas - o exemplo do preclaro Presidente da República fez escola -, veio rememorar aos mais desprevenidos que o PS, e passo a citar (sic), " não está disponível para nenhuma revisão constitucional que ponha em causa as funções sociais essenciais do Estado." Estamos, pois, conversados quanto à viabilidade de uma "refundação" verdadeiramente consequente do memorando de entendimento. Contar com o PS para uma revisão constitucional que reenquadre as funções sociais do Estado num cenário de escassez de recursos? Nunca, ou como diria o saudoso Mário Lino, jamais! A partidocracia do regime chegou ao pináculo irrecuável da irreformabilidade. Já escrevi sobre isto, e volto a repetir: "este regime, na catrefada de erros que o tem caracterizado, chegou ao seu crepúsculo terminal. O tribalismo "devorista" das nossas elites, e a impermeabilidade das mesmas ao pulsar da vida quotidiana, conduzirão, mais dia menos dia, a um fim súbito."
Para terminar esta breve glosa das declarações do primeiro-ministro trago à colação um facto que, devidamente menosprezado pelo comentarismo caseiro, é de enorme revelância para o que se seguirá neste "torpe dejecto de romano império": o Governo não está, nem estará interessado em seguir a teoria da "negociação honrada" tão cara a Miguel Cadilhe. Renegociar prazos, juros, não, nem pensar, cruzes credo. Não congregar esforços com os restantes PIIGS (que acrónimo mais horroroso) é a senha de ordem de Gaspar e companhia. Espero que - concedo que talvez seja mero wishful thinking -, o credo aventado por Paulo Portas nas jornadas parlamentares PSD/CDS se concretize: Portugal deve ser proactivo nas negociações com a troika. É tempo de Portas levar à prática o conselho dado à estampa nas páginas do Público por Paulo Rangel: proactividade e autonomia negocial no seio do MNE. Ironia ou não, começo a achar que uma diplomacia bifronte até teria algumas virtualidades.
As breves reflexões acima esparramadas têm como corolário lógico a seguinte conclusão: com esta política, com estes protagonistas, com estas elites, não sairemos deste letargo. Caros leitores, convençam-se que, enquanto permanecermos enrodilhados no cárcere da perfídia regimental alinhavada pelos cortesãos do costume, não lograremos sair desta austeridade brutal que atinge o âmago da nossa existência. Munch retratou na perfeição o frenesi do homem moderno, todavia, receio que hoje o grito seja bem mais arrebatado e impetuoso. Talvez Hemingway tivesse razão ao dizer que um homem pode ser destruído mas não derrotado. Falta saber se o povo português concorda com esta tese. 

publicado às 23:58

A gestão do declínio

por João Pinto Bastos, em 29.09.12

Por Adolfo Mesquita Nunes:

  

"Temo bem que, com o enquadramento constitucional que temos, e não existindo qualquer disponibilidade socialista para o rever, estejamos de facto sem verdadeiras alternativas, obrigados a cortar toda e qualquer despesa que não toque na dimensão do Estado, porque a Constituição não deixa. E não há forma justa e eficaz de o fazer, porque o problema continua lá. A Constituição, feita para nos proteger, está, afinal, a condenar-nos, com maior ou menor sentido de justiça, à mera gestão do declínio."

 

À laia de conclusão, é forçoso sublinhar o facto de o debate acerca da revisão do actual enquadramento constitucional ser totalmente inexistente. Nem a consumpção lenta do país nas inclementes garras da crise é capaz de provocar uma comoção nacional que desvele de vez a exaustão do regime. O célebre grito rimbaudiano de "mudar a vida", alcandorado a lema de mudança - que bem nos faria juntar à apoteose poética do bardo francês, a genuína vontade de alterar a putrefacção reinante - jamais terá  mutatis mutandis um amplo seguimento em terras lusas. Aqui mudar a vida é, sobretudo, manter tudo como está. 

publicado às 12:46






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