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Não gosto, habitualmente, de bater na mesma tecla, mas esta notícia obriga-me a repisar na seguinte pergunta: quem pagará estes prejuízos? Nós, cidadãos contribuintes?
Há, hamletianamente falando, um método na loucura. Esse método é particularmente visível no debate económico sobre as grandes variáveis do Orçamento do Estado. Se os caríssimos leitores prestarem atenção ao que se vai escrevendo e dizendo sobre a política financeira do estadão, decerto repararão que, amiúde, o tema do socialismo bancário é chutado para um canto muito recôndito. A razão é simples de captar: não convém, de modo algum, incomodar o baronato bancário com perguntas dúbias. Vejamos, por exemplo, o seguinte dado: é sabido que o défice público comunicado pelas Finanças ao Instituto Nacional de Estatística no final de setembro, quantificado em 5,5% do produto interno bruto, não inclui os 700 milhões de euros dispendidos na "ajuda" ao Banif. Perante isto, o que é que a opinião publicada tem salientado nas suas croniquetas domingueiras? A resposta é sintomática e preocupante: as resmas de páginas escritas sobre este assunto versam exclusivamente sobre o incumprimento da meta acordada com a troika. Não há, como certamente já repararam, uma única página sobre o facto de o Estado continuar a entregar de bandeja os dinheiros públicos a meia dúzia de sátrapas bancários, cuja gestão obedece a critérios estranhos ao normal funcionamento de uma economia de mercado. Não há, pois, ninguém, com relevo, vá, que questione na praça pública o porquê de a banca continuar a ser bafejada pelos ventos quentes de um Estado absolutamente desrespeitador da propriedade privada. Como escrevi no início desta posta, há, efectivamente, um método nesta loucura. Os responsáveis deste monstro das bolachas obedecem, em primeira mão, ao sindicalismo financista, e aí quedarão até que um vento contrário os leve a procurar um novo porto de abrigo. A propriedade privada funciona, para esta gente, em circuito fechado. Se alguém cai, levando consigo as poupanças de milhões de aforradores, o poder público acorre imediatamente, qual Estado-providência dos Salgados e Roques necessitados. Quando o alvo é o zé povinho, a propriedade privada é uma asneirola a ser prontamente corrigida pelo bastão macerado da administração. É assim que a mundividência da República abrileira encara quem produz e empreende a expensas próprias. Portanto, o conselho que vos dou é que abram, o quanto antes, um banco. Se precisarem de ajuda, recorram aos Rendeiros e aos Oliveiras e Costa. Eles acederão sem demora.
Há coisas que são mesmo do arco da velha e que comprovam que vivemos em regime de socialismo bancário. O caso Monte Branco, que hoje vem amplamente noticiado em alguma imprensa, é a prova final e acabada de que a finança é um negócio da China. Fazem-se trapaças, ludibriam-se os patetas, extraem-se rendas e comissões, mas, atenção, falir como ocorre amiúde em qualquer actividade normal sujeita à livre concorrência, isso é que não. O capitalismo da "creative destruction" schumpeteriana só se aplica ao Zé da mercearia. De preferência, com a banca, esse potentado feudal, a ganhar. E, perdão que já me ia esquecendo, a destruir. Por fim, não poderia terminar esta posta sem referir o silêncio sepulcral que reina na blogosfera liberal a propósito deste assunto. Silêncio esse, sintomático e indiciador de algo bem mais nefasto que, por respeito aos leitores, me abstenho de dizer. Tristes tempos.
A crítica do neoliberalismo provinda do centro-esquerda é um must imperdível. Estamos, basicamente, a falar dos sectores políticos que mais beneficiaram do conluio com o sector financeiro. Entretanto, como não poderia deixar de ser porque o que é tem sempre muita força, o sector financeiro, por outras palavras, a bancocracia, continua incólume e intocada no altar dos dogmas inamovíveis. Como disse há tempos o Jorge Costa, vivemos no regime do socialismo bancário. No fundo, uma boa descrição do estado a que chegámos. Um regime que acolheu tudo e todos, esquerda e direita, esquerdinhas e direitinhas. E não me venham com os neoliberalismos, paleoliberalismos e capitalismos do costume, porque isto não tem rigorosamente nada a ver com um sistema de mercado e de livre concorrência. Trata-se tão-só de socializar os prejuízos, uma espécie de senhoriagem global que ninguém controla. Sobretudo nós, os papalvos que amarfanhamos tributos e contribuições infindáveis. Sempre em nome da sacrossanta democracia de pechisbeque.