Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
O governo geringonço quer defender as criançinhas dos cigarros digitais - que bonito. Mas como quase tudo que é feito às três pancadas (uma do PS, uma do Bloco e outra do PCP) sai mal, não vale a pena esperar por grandes virtudes regulamentares. A proibição de fumar à porta de escolas e hospitais parece excepcional, mas é um tiro ao lado, o acertar em cheio no alvo pela mira de uma zarolho. E nos parques infantis? Já foram ao Jardim Guerra Junqueiro (da Estrela)? Encontram ali mesmo junto ao escorrega e ao baloiço, as dondocas e as tias de Marlboro em riste, enquanto o Martim, o Salvador, a Benedita e a Noémia inspiram os ares nebulosos da passa seguinte. O mesmo se passa no parque recreativo do Alvito. Para além dos malefícios do tabaco, lidamos com a possibilidade de uma criança ver o seu braço queimado pela gesticulação descontrolada de uma espécie ainda mais elaborada - aqueles que fumam e falam ao telemóvel. Depois existe uma outra questão de carpintaria. Definam lá porta, vá lá. Falamos de uma porta de correr? Referem-se àquelas giratórias? E isso inclui portões ou portinhas? Chamem lá o engenheiro, agora que ele pode falar, para que possa explicar em inglês técnico os contornos da proibição. Esta medida parece ser algo para compensar o falhanço da obra da segunda circular. É a única explicação racional que encontro.
Alberto Gonçalves, Cinzas:
«Interditar o fumo nos restaurantes (e aparentados) significa condenar de vez um sector que, só no primeiro trimestre do ano e sem a ajuda do Governo, despediu 15 900 funcionários e registou uma queda de 30% no negócio.
Por espantoso que pareça, se ainda nos espantarmos com alguma coisa, é isto o que um obscuro secretário de Estado da Saúde, um tal Leal da Costa, anunciou todo contentinho: até 2020, será proibido fumar em todos os "espaços públicos". Razoável? Com certeza, se os protótipos de governantes não considerassem públicos os espaços privados que o Estado assalta materialmente e, pelos vistos, agora orienta espiritualmente.
De resto, a restauração é apenas um exemplo dos alvos da "lei de restrição de não fumo" (é verdade, o sr. da Costa não subiu na carreira graças ao domínio da língua). Outro exemplo são os carros particulares, perdão, os carros públicos que os cidadãos compraram com o seu dinheiro e pelos quais pagam abusivas fortunas ao fisco no momento da compra e em incontáveis momentos posteriores.
Pois bem: se os carros transportarem crianças, não haverá cigarro para ninguém. O sr. da Costa explica: "Está demonstrado que a concentração de fumo na parte de trás do veículo é muito grande, além de que os plásticos ficam embebidos por material carcinogénico que vai sendo lentamente libertado" (o homem não aprendeu português, mas é versado em análises minuciosas a habitáculos).
Por acaso, também está demonstrado que a concentração de poder nas mãos de nulidades estimula a arrogância e é prejudicial ao sossego alheio. Por mim, frequento poucos restaurantes, raramente vou a cafés, não fumo no carro e nunca, nem sob ameaça de arma, conduziria na companhia de uma criança. Mas mesmo quando a opressão não nos atinge, a opressão incomoda. Mais do que o tabaco, o qual, aliás, possui a virtude de abreviar a partilha de um mundo absurdo com incontáveis srs. da Costa. Um já sobra. Ou sobramos nós.»
João Pereira Coutinho, Mocidade Portuguesa:
«Todos os anos morrem mais crianças em acidentes de viação do que vítimas do fumo dos pais. Por que motivo o governo não está interessado em proibir a circulação de crianças no interior dos automóveis? No interior e, já agora, no exterior também: um estado verdadeiramente atento à saúde dos seus menores teria autoridade plena para afastá-los de todos os ambientes nefastos. Que o mesmo é dizer: interditar o acesso a bares (álcool), praias (afogamentos), restaurantes de fast food (obesidade) ou partidos de extrema-esquerda (drogas e debilidade cognitiva). O ideal, aliás, seria retirar as crianças da guarda dos pais e educá-las em ambientes rigorosamente esterilizados, onde vigorassem os princípios da abstinência, do vegetarianismo e, em dias de festa, do látex (reforçado). Depois, quando chegassem aos 18 anos, os petizes seriam novamente devolvidos à sociedade civil onde uma carreira política os esperaria, de preferência nas instituições europeias.»
Declarando desde já que não sou fumador, sobre as medidas do governo para restringir a oferta de tabaco e dissuadir os fumadores de continuarem com esse vício (que só diz respeito a cada invidíduo, não ao estado), ler o João Campos:
«1. Acabar com as máquinas automáticas de venda de tabaco. Disparate - se nos cafés e nos restaurantes o tabaco se voltar a vender "em mão", nem por isso deixa de ser mais difícil para os miúdos arranjarem tabaco (se o objectivo for esse). De resto, quem quiser realmente fumar continua a procurar tabaco - e, em último caso, há sempre o contrabando (que tem a vantagem de provavelmente ser mais barato). Se é possível comprar haxixe em plena Rua Augusta durante a tarde, não há-de ser muito difícil comprar um volume de Marlboro algures.
(...)
Enfim, mas é o tabaco - a desculpa (esfarrapada) da saúde pública perdoa muita coisa a muita gente (que não vai gostar nada quando a ofensiva chegar ao vinho, ao café, à carne vermelha). Quem vai perder com isto vai ser, justamente a tasquinha lá do bairro. Não vale a pena frequentá-la com a mesma regularidade quando for proibido fumar naquele espaço - o Benfica posso ver em casa, e, de resto, sai mais barato fazer café em casa, tal como comprar minis ou whisky no supermercado. E sempre se pode fumar à vontade (pelo menos por enquanto - há-de chegar o dia).»