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Se não for pedir muito, gostaria (aqui, aqui, e aqui) que me apresentassem, com cuidado e serenidade, uma alternativa séria, credível e exequível às medidas anunciadas pelo Governo, e que seja, de preferência, uma alternativa que cumpra os requisitos acordados com a troika relativamente ao limite exigido e exigível do défice orçamental. De mais a mais, gostaria, também, que, nessa busca de alternativas, não se esquecessem do facto de existir entre a função pública e a economia privada uma rotunda diferença de regimes e práticas. É que continuar a ouvir a ladainha vertida no falacioso argumentário, utilizado, entre outros, pelo honorável Jorge Miranda, de que o alargamento da CES é um imposto sobre os mais fracos é, em boa medida, aceitar o ramerrão imobilista do regime. Mas, bem lá no fundo, viver num regime feito de e para velhos rezingões anafadíssimos teria sempre estas perniciosas consequências. Quando assim é, o melhor mesmo é arrumar as malinhas e emigrar.
Gosto desta proposta. Mas gostaria ainda mais que fosse apresentada uma proposta legislativa que incluísse uma alteração radical no modo de escolha e cooptação dos juízes do Tribunal Constitucional. É que, vendo bem, o problema do TC não se resume, única e exclusivamente, às Assunções reformadas e às ditas "reformas-relâmpago" que alguns juspublicistas "renomados" auferem. O problema do TC é bem mais fundo, e envolve, entre outras coisas, indivíduos que mês e meio após terem sido nomeados juízes do TC já estavam a labutar no Governo da Nação. O Estado de Direito vê-se, sobretudo, nestas coisinhas. Ou não.
No rescaldo do anúncio do acórdão do Tribunal Constitucional escrevi que o "regime já deu tudo o que tinha para dar". Não errei no diagnóstico. Fui até bastante brando. Os dias que se seguiram, com a azáfama que tolheu meio país, designadamente o que vive na "Lesboa" das intrigas, confirmaram a crueza desta sentença. A oposição socialista, liderada por uma vacuidade desconcertante (um bem haja ao Rui A. pelo brilhantismo com que caracterizou a nulidade andante que lidera o dito partido), provou mais uma vez que não tem uma alternativa plausível para o caos em que o país está. A semana passada foi, aliás, bastante esclarecedora no que toca à inabilidade política de uma liderança que não tem mais nada para oferecer a não ser pusilanimidade. Desde uma moção de censura desajeitada até uma carta para a troika que diz e se desdiz no mesmo instante, passando, também, pela exigência de eleições, descartando, nesse acto, uma solução credível para os problemas do país, a última semana dos compagnons socialistas foi deveras penosa, para não dizer outra coisa. Ademais, ontem, o país inteiro ficou a saber, não obstante o triunfo de audiências do preclaro Marcelo, que Sócrates é o verdadeiro líder da oposição. Um líder "madurizado", populista e demagogo como nos horrendos velhos tempos. Um comunicador nato, que mentindo e omitindo continuará a trilhar o seu caminho de revanche e de ódio. Seguro é um mero peão a ser despejado da arena na hora certa. O próprio facto de Seguro marcar uma conferência de imprensa para as 18h30 do dia de hoje, atesta toda a sua fragilidade política. Não é desfaçatez, é pura desorientação, acompanhada de ignorância. Tudo isto é hilariante, no mínimo. Mas se os nossos problemas se reduzissem a Seguro, o cenário não seria tão cruel, porém, do outro lado da ladeira temos um Governo que, em boa medida, tem pela frente a verdadeira hora H. O Governo não tem mais desculpas para atrasar as reformas que se exigem. Passos falou, queixou-se e lamuriou-se, mas prometeu acção. Cumprirá o que disse? Não sei, para dizer a verdade, duvido muito. O histórico não avaliza uma leitura positiva de quaisquer boas intenções provindas de um Governo sumamente descredibilizado. Mais: se Passos quisesse realmente reformar este Portugalzinho já o teria feito há muito. Agora, será mais difícil fazê-lo. A base social de apoio do Governo diminuiu consideravelmente, e parte das elites do regime desejam uma "penedização" que, como é óbvio, só pioraria as coisas. O certo é que, com reformas ou não, o país tem pela frente desafios muito espinhosos. Basta dar uma vista de olhos pela imprensa internacional para constatar que a crença no ímpeto reformista deste Governo é quase inexistente. Das duas, uma: ou Passos reforma e liberaliza o país de vez e sem retrancas, ou a falência virá irremediavelmente. O tempo para as escusas da inacção terminou. Ou sim ou sopas.
O acórdão do Tribunal Constitucional trouxe à colação um dilema de difícil resolução: o Governo deve ou não demitir-se? Sim ou não? Bem sei que a indústria do comentário de uma certa "Lesboa", que vive da e para a intriga, já está assanhada com a possibilidade de o Governo cair a breve trecho, porém, é de bom tom recordar aos mais incautos que, com ou sem demissão, o essencial da política em curso não se alterará. Com a Europa bloqueada no imobilismo merkeliano e uma soberania nacional completamente espartilhada é utópico conceber que um acto eleitoral prenhe de demagogia permita a tão ansiada mudança. Mais: em boa verdade, a situação tenderá a piorar significativamente. Dito isto, é evidente que este arranjo governativo não responde de uma forma satisfatória aos problemas do país. Portugal precisa de paz, de trabalho e, acima de tudo, de um espírito de compromisso. Tenho alertado frequentemente para esta necessidade nos meus escritos. Mas, olhando para os rostos desta elite partidocrática, não me parece de todo crível que esse espírito surja, ou, pelo menos, irrompa no curto prazo. O compromisso histórico português não passa, em bom rigor, de um mero sonho. Perante isto, o mais avisado é acender uma velinha e rezar, porque o futuro mais imediato será negro. Muito negro. No fundo, este regime já deu tudo o que tinha para dar. E falhou no essencial: a consolidação de uma democracia madura e civilizada.
Nova definição de suspense dada pelo Real Dicionário do Tribunal das Constitucionalices: atrasar ao máximo o anúncio de uma decisão, que demorou meses a fio a ser tomada, de molde a criar um estado de ansiedade inusitado no opiniarismo linguarudo que vive da intriga e do crime político passional.
Nota: esta ideia, peregrina, claro está, de anunciar algo, que ainda não se sabe o que é, só no final do dia, demonstra que, de facto, as instituições da República vivem um momento crepuscular. Mais: é curioso assistir a este desvelo pelos mercados por banda de um Tribunal que, com grande probabilidade, anunciará uma tomada de posição contrária aos apetites desses mesmos mercados. Ele há cada uma.