Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Vamos ver se a demissão de Paulo Ferreira da direcção de informação da RTP, e a sua substituição por José Manuel Portugal (que tem um apelido que vem mesmo a calhar para o país), servirá para arrastar para o olho da rua o comentador José Sócrates. De um modo geral, este género de dança de cadeiras acontece de acordo com uma certa orientação política - um guião pré-determinado. Habitualmente, os que saem, invocam razões pessoais para explicar a partida, e os que chegam, vêm com o gás todo, felizes e contentes pela promoção - o bónus de fim de ano. Consigo imaginar o recém-nomeado-director José Manuel Portugal (que vem dos serviços internacionais) a contratar Guterres para vir dar à manivela num programa de informação, feito à la carte para o funcionário das Nações Unidas, que ainda há dias foi figura de proa de alguns jornais britânicos, alegadamente por ingerência em assuntos internos daquele país. A máxima - ano novo, grelha nova - não tardará a ser posta ao serviço de um novo alinhamento televisivo - é esperar para ver. Só não entendo a justificação do demissionário; "a defesa dos interesses da RTP". Ora isso não faz sentido algum, porque não sei se a vinda de Sócrates ajudou ou não as audiências da estação de televisão. E é neste tipo de afirmações que reside uma parte da contradição. A compatibilidade entre jornalismo e audiências, o acordo entre servir o país e a agenda de uma empresa pública intensamente deficitária e que ainda não foi sujeita ao escrutínio de uma auditoria como manda a lei. Há demasiado tempo que a RTP tem sido tratada como uma vaca sagrada, a deambular por aí, a entrar porta dentro, pela casa dos portugueses - a qualquer hora e sem a qualidade que se exige de uma estação pública.
1) As democracias hodiernas têm uma característica muito "sui generis": tudo é atingível, excepto a sacrossanta televisão pública. Quando a há, claro está. O aparelho mediático governamental é intocável. A Grécia não constitui, pois, uma excepção. Lá como cá, a televisão pública é um bem intocável e intocado. As prebendas e os privilégios que advêm do domínio comunicacional pertencem ao domínio da eternidade intangível. Há funcionários a mais? Não interessa, o contribuinte paga. Há despesas a mais? Não importa, o Patropoulos paga. A programação é péssima? Os privados fazem ainda pior. O cenário é dantesco, mas serve na perfeição os objectivos cimeiros das elites demomedíocres.
2) Há um pormenor que quedou, estranhamente, fora da discussão, e do clamor público, diga-se de passagem, em torno desta questão: falo, pois, da imensa corrupção que grassa no sector comunicacional público grego. É no mínimo esquisito que, de um momento para o outro, a televisão grega tenha passado a ser um modelo de boas práticas. Esquisito e extravagante. Qualquer estudante de jornalismo do 1º ano sabe que, na pátria do verdadeiro e autêntico Sócrates, a televisão pública era e é uma coutada de favores, permeada pela mãozinha aconchegante do poder político. É, e, no fundo, continuará a ser.
3) Uma decisão destas, num país em ebulição, arrisca-se, de facto, a criar um torvelinho político de proporções inimagináveis. Mais: os pormenores desta decisão permanecem absolutamente nebulosos. Continua ou não a haver televisão pública? Caso a resposta seja negativa, o Governo grego manterá ou não uma posição de influência nos restantes media privados? Isto é, há ou não uma verdadeira reforma da comunicação social? Numa altura em que a instabilidade financeira em redor do euro volta a ganhar tracção, este tipo de incidentes só causam mossa. A "weimarização" grega continua, lenta e inexoravelmente, o seu caminho de destruição.