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É o título de um pequeníssimo livro de Karl Popper e John Condry, datado de 1993/94, no qual Popper alertava para os perigos da excessiva liberdade da televisão que levou à degenerescência no tipo de conteúdos fornecidos. Popper propunha, talvez utopicamente, que se criasse uma ordem que emitisse e retirasse licenças aos trabalhadores e produtores televisivos, que deveriam jurar uma espécie de código deontológico. Deixo aqui dois breves parágrafos de Popper, e um pequeno parágrafo do posfácio de Jean Baodouin. Depois de há uns tempos ter escrito um post indignado com certa degenerescência da televisão portuguesa, foi com agrado que li esta obra.
A proposta que aventei não tem apenas um carácter de urgência, corresponde também a uma necessidade absoluta do ponto de vista da democracia. Eis, resumidamente, a razão: a democracia consiste em submeter o poder político a um controle. É essa a sua característica essencial. Numa decmocracia não deveria existir nenhum poder político incontrolado. Ora, a televisão tornou-se hoje em dia um poder colossal; pode mesmo dizer-se que é potencialmente o mais importante de todos, como se tivesse substituído a voz de Deus. E será assim enquanto continuarmos a suportar os seus abusos. A televisão adquiriu um poder demasiado vasto no seio da democracia. Nenhuma democracia pode sobreviver se não se puser cobro a esta omnipotência. E é certo que se abusa deste poder hoje em dia, nomeadamente na Jugoslávia, mas esses abusos podem ocorrer em qualquer sítio. O uso que se faz da televisão na Rússia é igualmente abusivo. A televisão não existia no tempo de Hitler, ainda que a sua propaganda fosse organizada sistematicamente com um poderio quase comparável. Com ela, um novo Hitler disporia de um poder sem limites.
Não pode haver democracia se não submetermos a televisão a um controle, ou, para falar com mais precisão, a democracia não pode subsistir de uma forma duradoura enquanto o poder da televisão não for totalmente esclarecido. De facto, os próprios inimigos da democracia apenas possuem uma débil consciência desse poder. Quando tiverem compreendido verdadeiramente o que podem fazer com ele, utilizá-lo-ão de todas as formas, inclusivamente nas situações mais perigosas. Mas então será tarde de mais. É agora que devemos tomar consciência desse risco e submeter a televisão a um controle através dos meios que indiquei. (Karl Popper)
Se uma sociedade democrática tem necessidade de liberdade para neutralizar o poder devorador do Estado, também necessita da arma regulamentar para reduzir as más utilizações da liberdade. Popper sempre achou que a economia de mercado era a companheira mais ou menos insubstituível da democracia política. Porém, não aceita que ela generalize inconsideradamente as suas lógicas a todos os registos da vida social. Sobretudo quando, em nome da eficácia e da rendibilidade, submete as cadeias de televisão aos ditames cegos da concorrência, abrindo assim o caminho aos programas mais nefastos e mais deseducativos. Entre a hipótese obsoleta de um monopólio de Estado da radiotelevisão e o panorama actual da privatização e da concorrência selvagem talvez haja lugar para uma solução intermédia: a criação de uma ordem corporativa que emita licenças e possa, em qualquer momento retirá-las. Nem todo o poder ao Estado, nem todo o poder ao mercado. (Jean Baodouin)