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Ainda The Tudors

por Samuel de Paiva Pires, em 27.07.08

Maria José Nogueira Pinto escreveu um excelente artigo no DN, que aqui deixamos (via Eternas Saudades do Futuro)


Acomodei-me no meu sofá para ver The Tudors, um drama histórico televisivo sobre a vida de Henrique VIII de Inglaterra. A série prometia, tinha sido difundida pelas televisões de vários países (em Portugal pela RTP) e tivera honras de Emmys e Globos de Ouro. E eu, que pertenço a uma geração que aprendeu História sem audiovisuais, vejo neste género de produção televisiva um modo entretido de relembrar episódios históricos com ganhos de familiaridade com os personagens que a simples leitura, por definição, não propicia.

Qual não é, pois, o meu espanto quando um tal personagem denominado "Princess Margaret", supostamente irmã de Henrique VIII, é dada em casamento ao Rei de Portugal, (D. Manuel I ?). Sabendo que este nosso Rei se casara três vezes, pensei que a princesa inglesa me tinha escapado, uma falha de memória, sei lá! Inquieta, mas com a curiosidade aguçada, aguardei com expectativa as cenas relativas ao casamento, a entrada em cena da corte portuguesa num periodo aúreo da nossa História. Vi, então, como a princesa choramingava porque D. Manuel era um velho corcunda, implorando ao irmão que a troco de tão grande sacrifício lhe desse liberdade para escolher segundo marido quando enviuvasse, o que, esperava, ocorreria rapidamente.

Após uma imagem de rara beleza do Tejo e da Ribeira das Naus, seguiu-se uma sucessão de cenas de verdadeiro horror. D. Manuel era um gnomo marreca e saltitante, desdentado e de olhar lúbrico, baboso, falando um português mal amanhado. A corte, um conjunto de velhotas vestidas de negro, clérigos encapuçados, homens feios e sujos. As cerimónias pareciam ter como cenário uma espécie de barracão e as músicas eram espanholas (Falla?). O casamento consumou-se no que poderia ser um quartinho do Castelo de S. Jorge, com uma data de basbaques de mau aspecto rodeando o tálamo conjugal e aplaudindo grosseiramente.

No dia seguinte - assim prossegue a série - a princesa Margarida, após lançar um olhar nostálgico à sua nau, prestes a partir do Tejo, não está com meias medidas e assassina o nosso Rei, sufocando-o com uma almofada. A última imagem com que o realizador arruma o episódio português é um grande plano dos reais pés, sujíssimos, explicitando que nem para o casamento este se dera ao trabalho de ablações mínimas.

A indignação venceu qualquer inércia que ainda restasse para confirmar a desconformidade de tão burlesca narrativa com a realidade dos factos. D. Manuel casou três vezes, com duas filhas dos Reis Católicos, Isabel e Maria e, pela segunda vez viúvo, casou novamente com D. Leonor, irmã de Carlos V. Todas eram excelentes partidos, demonstrando bem a importância, à época, de Portugal e do seu Rei. Entre a consulta à História de Barcellos e o recurso à Internet foi possível constatar a existência de muitos outros erros grosseiros. De facto a "Princess Margaret" nunca existiu e é um personagem composto a partir das duas irmãs Tudor de Henrique VIII; o rei português de então era D. João III, de vinte anos de idade; não existiu nenhum Papa Alexandre desde 1503; o cardeal Wolsey não foi preso nem se suicidou e Thomas Tallis não consta que fosse bissexual. Até na escolha dos adereços se repetem os erros, ridículos, tal como a utilização de um mosquete por Henrique VIII, arma que só foi inventada em 1630, ou seja um século mais tarde.

Posto isto, coloco duas questões. A primeira tem a ver com este, ou qualquer outro, drama histórico televisivo. Embora se possa e deva esperar algum tempero fantasioso da narrativa, não é suposto que tal fantasia deturpe a História, alterando os seus factos, a sua cronologia, a sua geografia ou a identidade das suas figuras. Perdida a dimensão de relato histórico, o que resta passa de ficção a embuste. A segunda tem a ver com a nossa reputação nacional e quem é suposto defendê-la. Num país onde já não se ensina História, o canal estatal difundiu, que eu saiba sem qualquer reparo, uma versão vergonhosa e falsa do nosso passado colectivo. Se a Internet não mente, todos os que se sentiram atingidos foram reagindo e rectificando, excepto nós. Porque será?|

publicado às 17:20

RTP recarrega bateria The Tudors

por Nuno Castelo-Branco, em 24.07.08

 

A falta de vergonha, o desleixo, ignorância, profunda e mesquinha estupidez e desrespeito pelos contribuintes que lhes dão o pão de cada dia. É uma súmula daquilo que há a dizer acerca da anunciada intenção de voltar a transmitir a mérdica e fedorenta estorieta a que ousam chamar The Tudors, enganando os incautos que sempre aguardam com alguma expectativa a emissão de programas que fujam ao bolês regimental ou às entrevistas dirigidas por mentecaptas apadrinhadas ou em envolvimento de dossel com qualquer potentado do momento.

 

Esta série não vale um milésimo do capital nela investido. O dinheiro, o considerável esforço de pesquisa e de arregimentação de vontades para conceber cenários e um fabuloso guarda roupa, destinam-se apenas à promoção e exploração á saciedade, dos abdominais e glúteos de um fulaninho do género garoto de programa que episodicamente nos entra em casa em anúncios onde tenta impingir-nos "perfumes" cuja sumária e grotesca sigla denota a má qualidade e a massificação do reles.

 

Creio que Sua Excelência o Provedor de Programas da RTP, decerto irá submeter-se à penosa tarefa de ler uma enxurrada de e-mails e cartas de portugueses indignados e pouco interessados em vasculhar as particularidades chulicas e anatómicas do menino Jonathan Rhys Meyers. É que o onanismo - neste caso a única desculpa para a compra da série - dos seleccionadores dos programas a destinar a apáticas audiências, deve ficar reservado à intimidade. Basta de desaforo, pois esta soap-opera é péssima, desrespeita a verdade histórica, insulta os portugueses e segundo consta, foi  caríssima.

publicado às 17:12






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