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O vazio de António Costa

por John Wolf, em 17.10.17

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A política tem o condão de revelar a ausência de humanidade dos proponentes. O que mais chocou na intervenção do primeiro-ministro António Costa não foram os enunciados sobre políticas florestais nem a ausência de um pedido formal de perdão às famílias das vítimas. Para além da racionalidade intransigente existe algo que é captado instantaneamente pelos destinatários de mensagens. É uma frequência de onda que não se detecta nas frases. É uma vibração que não passa na lógica. Refiro-me ao olhar empático que transcende a política, a ideologia, o poder, os partidos e as convicções - trata-se de humanidade, mais nada. Se prestarmos atenção ao perfil de António Costa não sentimos na sua alocução o estado embargado da alma, a sinceridade no olhar que alcança onde mais nada chega. E Portugal regista em simultâneo o exercício de duas figuras de proa que se encontram nos antípodas desse espectro afectivo-racional. Numa extremidade da régua temos o presidente da república Marcelo Rebelo de Sousa que se manifesta nessa toada de emoções e sentimentos que o traiem no excesso - uma forma de estar que oblitera a capacidade crítica objectiva, obrigatória. No extremo oposto do espectro encontramos António Costa que é incapaz de manifestar o sentimento que vive fora da casa política. Assistimos ontem, incrédulos, ao debitar de axiomas de indução lógica. Faltou-lhe a intuição. Faltaram-lhe os instintos. Nem por um momento sequer sentimos a vulnerabilidade que deveria resultar dos eventos trágicos que devastaram Portugal. Foi essa frieza, comparticipada pela ministra da administração interna Constança Urbano de Sousa, que colidiu com a natureza solidária e sofrida dos portugueses. Os portugueses sentiram o terror dessa ausência. Viram o vazio do olhar. O lider que deveria guiar a nação é incapaz de se conectar para além da sua condição política. António Costa demonstrou os limites funcionais do seu perfil. Provou a sua tecnocracia quando o que o povo de Portugal necessitava era de algo à escala de alguém que também deve saber assumir a sua fragilidade, a sua insuficiência. Se essa aura existisse e fosse sentida, dispensaríamos o conceito de demissão, a perseguição seria de outra natureza. A responsabilidade política passaria a ter contornos distintos, próxima da agregação emocional, da tribe de inválidos, da comunidade de humildes que se remete ao silêncio, à prece das cinzas. António Costa deveria ter sido pequeno nessa hora fugaz que perdura e viverá na eternidade, na memória colectiva.

publicado às 11:05

SIRESPonsáveis

por John Wolf, em 20.06.17

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Os promotores do magistério intocável do luto podem transmitir às famílias das vítimas que o sistema de comunicações SIRESP provavelmente falhou e que alegadamente resultou na morte trágica dos seus parentes. Não existe árvore criminosa nem trovoada delinquente que possa ilibar a responsabilidade de políticos desprovidos de sentido ético. O luto, interpretado por todos menos os próprios inflamados, deixou de ser de pesar. O luto é indignação. O luto é raiva. O luto é exigir responsabilidades. O luto é pedir demissões. O luto não é um alibi para encapotar as verdades. O luto não é atribuir a culpa à natureza feroz. O luto não é silenciar aqueles que defendem a reserva natural da verdade e respectivas consequências. Não querem assumir a SIRESPonsabilidade? Deveriam ter vergonha na cara. Todos eles. Os governantes do passado, do presente e provavelmente do dia de amanhã. Em vez disso colocam paninhos quentes no eucalipto queimado.

publicado às 09:28

Qual o partido com mais dinossáurios?

por John Wolf, em 03.11.14

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Qual o continente com mais elefantes? O de Matosinhos.

Qual o partido com mais dinossáurios? O do Rato.

publicado às 10:18

Revoltas e aborrecimentos

por Samuel de Paiva Pires, em 01.04.13

Ando há 10 anos a insurgir-me contra várias situações ilegais, ilícitas ou injustas. Primeiro na escola, depois na universidade, mais recentemente em relação a partidos políticos e à actuação de governos e da administração pública, várias vezes recorrendo ao instrumento da denúncia pública. Algumas destas situações até foram bastante badaladas, como a denúncia relativa à actuação do governo PS na primeira edição do PEPAC, a denúncia quanto ao funcionamento da FCT na atribuição de bolsas de doutoramento e, mais recentemente, esta que hoje o Público divulga, em relação ao teste de cultura geral para a admissão à carreira diplomática. Às vezes chego a perguntar-me se sou eu que atraio este tipo de situações, pois que já aconteceu vislumbrar, ainda à distância, o que vai acontecer e como isso vai obrigar-me a fazer algo. É certo que a procura da justiça está inscrita na minha alma, mas recuso-me a assumir qualquer papel de paladino. O mundo já está cheio destes - embora normalmente recusem olhar-se ao espelho e reconhecer os seus próprios falhanços morais. Se algum dia me perguntarem por que me dou ao trabalho, responderei apenas que estava aborrecido. Parece-me uma motivação tão boa como qualquer sentimento de revolta, além de ter mais piada e permitir aliviar o estado de espírito de quem se dê ao trabalho de me ler ou ouvir. Afinal, como assinalou Chesterton, há que manter a comicidade em face de qualquer tragédia.

publicado às 17:40

Always look on the bright side of life

por Samuel de Paiva Pires, em 22.11.12

G. K. Chesterton, via The Imaginative Conservative:


«The comedy of man survives the tragedy of man. Always be comic in a tragedy. What the deuce else can you do? He is a [sane] man who can have tragedy in his heart and comedy in his head. An inconvenience is only an adventure wrongly considered; an adventure is an inconvenience rightly considered. Man must have just enough faith in himself to have adventures, and just enough doubt of himself to enjoy them.»

publicado às 13:52

A balsa dos afogados

por João Pinto Bastos, em 03.10.12
Théodore Géricault, A Balsa da Medusa, 1818-1819

Quando Théodore Géricault apresentou no Salon de Paris a famosa pintura A Balsa da Medusa, já sabia de antemão que a obra iria provocar uma acesa polémica. O tema subjacente a este quadro é a famigerada tragédia que vitimou o navio francês Méduse em 1816. Em certa medida, este acidente foi um exemplo clássico do menoscabo a que sempre foi votado o povoléu pelos estratos superiores da sociedade. A tragédia resumiu-se basicamente à condução desastrada do navio por banda do comandante. Num navio que levava ao todo 560 pessoas apenas 15 sobreviveram. À semelhança do que ocorreu com o navio Costa Concordia, o Méduse foi um típico caso de negligência grosseira, em que a corrupção e depravação humanas atingiram o clímax na pessoa do comandante - um Francesco Schettino do século XIX. Ao inverso do que seria expectável, o comandante preocupou-se, sobretudo, em salvar a própria pele, abandonando à desfortuna o resto da tripulação. O solipsismo das chefias foi de tal monta que, contrariando as mais elementares regras do bom senso, optaram por reservar um triste destino aos restantes passageiros, sem cuidar das funestas consequências que adviriam dessa decisão imponderada. Este affaire representou uma forte machadada na credibilidade de uma monarquia recém-restaurada, em que o espavento político era a regra número um.

A menção a este episódio, brilhantemente condensado nas pinceladas geniais de Géricault, tem como motivo o desnorte que vai grassando nas hostes governativas do país. Se há lição que pode ser retirada do episódio em causa é que a soberba e sobranceria que amiúde tomam conta do poder, são o princípio do fim da bonança. O acidente representado no quadro de Géricault é uma metáfora singela da "húbris" descarnada das elites. O caso português é particularmente paradigmático, basta atentar no facto de o comandante deste navio lusitano, em risco de afundamento definitivo, não se preocupar minimamente com o destino dos seus passageiros e tripulação. Com uma população afogada no terrorismo fiscal e no empobrecimento desabrido, os celerados que nos governam apenas cuidam dos seus ínvios interesses, agindo à revelia de uma noção mínima de equidade. Mas, como o próprio caso Méduse ensinou, o egoísmo exarcebado nunca leva a consequências benfazejas a longo prazo. O Governo pode continuar a fazer uso de argumentos ad terrorem para justificar o inaceitável, contudo, o servilismo não é eterno. As novas medidas de austeridade são mais uma pedrada num charco já de si fétido, mas como escreveu Shakespeare no Acto Primeiro de Otelo, "nem todos podemos ser amos e nem todos os amos podem ser fielmente servidos". A conclusão é fácil de extrair: se esta sanha fiscal suicida continuar, os nossos amos, venais e néscios, correrão o sério risco de deixarem de ser fielmente servidos pelos zelosos e depenados contribuintes.

publicado às 23:39






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