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Quase todas as pessoas que eu conheço apreciam uma bela salada de fruta – fresquinha é ainda melhor, um mimo - uma tentação. E há uma razão fundamental para que assim seja. No meio da selva, da orgia de frutos silvestres, dos gomos sumarentos e do “tudo ao molho e fé em dióspiros”, existe sempre a possibilidade de cada um praticar a sua modalidade preferida, de escolher o seu parceiro adocicado – já se sabe, gostos não se descuram. Há quem queira a banana ou deseje o ananás e exclua, sem mais nem menos, a laranjinha das considerações gustativas. A saladinha de fruta obedece a esse princípio de que o cliente nunca sai de mãos a abanar – a satisfação será garantida seja qual for a língua. De maneiras que é assim; quando não se aprecia o kiwi basta pescá-lo e recambiá-lo para a Nova Zelândia, retirá-lo à linha da taça transparente – o vidrão onde geralmente a fruta é exibida de um modo despudorado. A colher, que parece insonsa, afinal é uma ferramenta fetichista que trata do assunto sem remorsos. Mas apesar destes golpes, não existe sobremesa mais democrática do que uma bela rapsódia de fruta – o homem e a mulher quando confrontados com essa fartura mesclada de sensações, apenas chupam o que querem e não são obrigados a engolir em seco. A fruta-pão até pode vir descascada, mas só por não ter caroço não significa que não possa ser devolvida. E nessa gala de tentações e guloseimas apanhadas à mão da árvore mais próxima, há fruta que fica por cima e outra que é esmagada pela virilidade concorrente de um belo cacho. Dizem que as nêsperas são melhores que os abrunhos e isso é mau – é discriminação natural com vitaminas de todas as cores metidas ao barulho de uma alimentação saudável. Mas deixemo-nos de eufemismos e chamemos as coisas pelos nomes: há fruta sexy e outra nem por isso - ponto final. Há néctares de glamour feitos na hora e reles sumos de segunda. Sempre foi assim e duvido que haja um espremedor que produza uma outra casta de ideias. O bicho do fruto pode andar por aí a fazer das suas, mas ainda não conseguiu destronar o governo afrodisíaco da cultura frutícola. No entanto, e apesar das nossas genuínas intenções, estamos a ser limitados na nossa apreciação gastronómica. E os legumes? Que é feito deles? Será que existe um ranking de verduras eróticas? Estava a pensar em todas essa ricas peças que abarbatamos no mercado mais próximo, mas que não merecem o olhar atento da nossa libido. A batata e a courgette vão diretamente para a panela sem uma palavra amiga. Colocamos a tampa, pomos o fogão a debitar calor e não se fala mais no assunto. A beringela – coitadita -, lá por ter curvas acentuadas e vestir tamanhos grandes, não deve ser dispensada do ménage. A dama farta veste látex como o diabo veste Prada. O seu toque escorregadio não é lycra não senhor – é textura natural e pode fazer as delícias de gente de espírito aberto. Mas existem ainda outros desprezados no jogo de sedução hortícola que decerto guardam algum rancor na despensa. A couve-flor tem inveja do pepino. Esta flor que não se cheira há muito que vem sendo vilipendiada pelo pickle. Este garanhão da horta da fonte está sempre a receber convites para festas temáticas. O pepino avinagrado mal sai do boião de rosas, raramente regressa ao imaculado caldo. O raio do vegetal parece mais um animal e não tem descanso por isso. A couve é outra desgraçada que não sai da casa. Fica acordada em sobressalto, pesarosa e pensar na sua vida. Quando de repente escuta o trinco da porta a altas horas da noite e diz: “ah, és tu cenoura. Pensava que era o pepino. Saiu às 10 da noite com aquele tomate ordinário e ainda não voltou.” Estão a ver o que eu quero dizer? Há aqui muita verdura magoada como se fossem batatas esmurradas. O sexo que dizem ser dos anjos também é dos legumes, não tenham dúvidas disso. Não é justo que as frutinhas estejam sempre no centro de mesa das atenções. Por que razão a abóbora não pode ter glamour? E a cebola não pode ser gastro-orgásmica? Só de pensar nisto vêm-me lágrimas aos molhos. Vivemos num mundo cruel e destemperado - pretensioso. Alho francês? Estão a ouvir? Francês? Que mania é esta que lá por ser estrangeiro é melhor – italians vegetables do it better? Não me parece. Somos realmente nabos, nabiças – noviços de uma religião frutada. Venha de lá esse caldo verde.
Na mesa ao lado, uma animada conversa entre uns tipos de uns vinte e tal anos, que num bar de praia se refrescavam com cerveja.
- "Mas como é que o Cavaco anda a fazer o papel do 1º ministro? Até parece que vivemos num regime presidencial!"
- "Pois... mas numa República o regime presidencialista é o único lógico e credível, o presidente não tem nada que ser imparcial, foi eleito por um sector político. O Obama está-se a c... para os republicanos, sempre que pode impõe a agenda dele!"
- "Recuso-me a deixar todo o poder nas mãos de um gajo, mesmo que tenha sido eleito. Em Portugal, imagina o que seria. Acho que ficávamos a ganhar se voltássemos já para a Monarquia. Mudava-se a Constituição, o fulano que ficava no topo seria mesmo imparcial e serviria como reserva para as crises. Para o marketing do país é brutal, até a bandeira da Monarquia é de cair pró lado. Assim, isto já não dá mais, estamos a morrer aos poucos!"
- "Ahahahahahahah, uma Monarquia? Não é possível pá! Isto é qu'é bom, roubam à fartazana e dividem os tachos todos entre eles!"
Estamos assim. Uns alegres tatuados, com argolas nas orelhas e um deles com rastas. Ganhei o Sábado.
Da "azeitice" mais banal às duckfaces, slutlooks, tatuagens, v-necks com decotes até ao umbigo e camisas abertas também até ao umbigo, das festas da aldeia às discotecas do Algarve, o Verão parece tender a revelar no Facebook e meios de comunicação tradicionais toda uma estética atroz, feliz ou infelizmente, interclassista. Os gostos educam-se e cultivam-se. Mas num país que actualmente tem como uma grande referência - ou preferência, se acharem mais apropriado - musical Tony Carreira, onde se fazem coisas como esta e onde um dos programas televisivos com mais audiência é um antro de douchebags, temo que a degradação seja irremediável.
Sara Sampaio, a modelo portuguesa que é a cara da Calzedonia para este Verão. Palavras para quê?
E pronto, senhores: podem parar de se babarem para cima do teclado e por a aliança de volta no dedo. E tenham juízo, ela tem idade para ser vossa filha.