Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Sobre Marine Le Pen e a Web Summit, tenho apenas a dizer que, como democrata liberal e conservador, estou nos antípodas de qualquer pensamento de carácter totalitário, seja fascista ou comunista, mas como adepto da liberdade de expressão e de pensamento, creio que todas as opiniões, por mais estúpidas que sejam, devem poder manifestar-se na esfera pública de qualquer democracia liberal, desde que possam ser desafiadas e expostas as suas fragilidades e as que são expressamente intolerantes possam ser contrariadas pelo debate racional e, caso se esteja na iminência de se tornarem hegemónicas, possam então ser suprimidas para salvaguardar o espaço público demo-liberal. Estou apenas a glosar Karl Popper e o seu paradoxo da tolerância, que aqui deixo em tradução da minha autoria:
“Menos conhecido é o paradoxo da tolerância: A tolerância ilimitada tem de levar ao desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada mesmo àqueles que são intolerantes, se não estivermos preparados para defender uma sociedade tolerante contra o ataque dos intolerantes, então os tolerantes serão destruídos e a tolerância com eles. — Nesta formulação, não quero dizer que, por exemplo, devamos sempre suprimir a expressão de filosofias intolerantes; enquanto as possamos contrariar por argumentos racionais e mantê-las sob controlo pela opinião pública, a supressão será certamente insensata. Mas devemos reivindicar o direito de as suprimir, se necessário até pela força; pois pode facilmente dar-se o caso de elas não estarem preparadas para discutir racionalmente connosco, começando por denunciar todos os argumentos; elas podem proibir os seus seguidores de ouvir argumentos racionais, porque são enganadores, e ensiná-los a responder aos argumentos utilizando os seus punhos ou pistolas. Devemos, portanto, reinvindicar, em nome da tolerância, o direito de não tolerar o intolerante. Devemos afirmar que qualquer movimento que pregue a intolerância se coloca à margem da lei, e devemos considerar o incitamento à intolerância e à perseguição como crime, da mesma forma que devemos considerar como crime o incitamento ao homicídio, ou ao sequestro, ou ao regresso do comércio de escravos.”
Paddy Cosgrave não necessitava de pedir desculpa pelo jantar no Panteão Nacional. Existe enquadramento legal para este tipo de eventos e o jantar não poderia ter acontecido sem autorização da tutela, que também autorizou a NAV a organizar um jantar de gala no Panteão. Ademais, em eventos da magnitude da Web Summit, tudo é planeado ao pormenor com meses de antecedência, pelo que é óbvio que o Governo tinha conhecimento do jantar e autorizou-o. De todas as atitudes pouco edificantes com que o Primeiro-Ministro já nos presenteou, armar-se em virgem ofendida e tentar culpar o despacho proferido pelo governo anterior pelo sucedido, como se o Ministério da Cultura (em particular, a Direcção-Geral do Património Cultural) não tivesse de autorizar o jantar, é certamente das mais repugnantes.
Portugal regozija-se por ser a capital mundial de start-ups durante uns dias de Novembro. Mas não passará disso. Alguém que me responda à seguinte pergunta que poderia ser colocada por um sovina-capitalista-empreendedor-americano": digam-me os nomes de empreendedores estrangeiros e respectivas empresas que existam ou tenham vingado em Portugal? Não conheço. Em plena época de graves dúvidas trumpianas, os Estados Unidos da América continua a ser o porto seguro para uma arraia alargada de inventores, génios e empreendedores norte-americanos, mas nascidos "lá fora". Portugal é a antitese dessa realidade. E porquê? Porque a dimensão anónima não existe. Voltámos à mesma questão. É preciso conhecer gente dentro do aparelho. É preciso fazer parte da estrutura de poder. É preciso alavancar o esforço com prémios, estímulos e fotocópias. Faço-me entender? Como descendente de imigrantes alemães que chegaram aos States em 1848, sei do que falo quando refiro o elemento dinâmico da criação e do empreendedorismo. Não houve facilidades, mas também não houve dificuldades acrescidas resultantes da não pertença à textura "nativa". A influência faz-se pelo mérito das ideias, da força dos projectos. Enquanto Portugal não entender esse movimento pendular, de nada serve receber 50.000 empreendedores. Isso não será suficiente para realizar a ignição ou mudar a mentalidade local que não está muito receptiva a incursões excêntricas. A não ser que sejam mercearias de indianos que sempre dão muito jeito quando faltam bananas lá em casa. Não sei se me faço entender. Os mais bem sucedidos de Portugal até poderiam ter nascido em Madagascar ao lado de uma colónia de macacos. Web Summit? Muito bonito. Para inglês ver.
(O link inserido no post é 1000 vezes mais importante do que o meu texto. A ler...)