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O meu pai, ex-militante centrista, militar, ex-cavaquista e posterior eleitor de Guterres por uma única vez, foi - e é - um homem moderado no voto e nas opções políticas, apesar de ser radical no verbo. Talvez por isso tenha sido, durante os anos do reinado de Cavaco Silva, um alternado, mas assíduo, leitor d'O Independente e do Tal & Qual. Não sei. Mas como teve a ideia de me ensinar a ler precocemente, lembro-me de ler estes jornais desde sempre. Mesmo que não percebesse nada do que lá estivesse escrito. Como me habituei, também desde cedo, a admirar a figura de Paulo Portas, por influência indirecta do meu pai, primeiro, e por minha vontade, depois. Talvez isto explique alguma coisa. Talvez não explique nada. Explica, pelo menos, o legado de Paulo Portas enquanto grande - e única - figura da nova direita portuguesa dos últimos 25 anos, pelo menos. Primeiro nos jornais, depois no partido. E desde cedo na minha consciência política.
Por motivos profissionais e por interesse pessoal (re)li recentemente algumas peças d'O Independente. E li, há não muito tempo também, edições do Público de 1998 a propósito da eleição de Paulo Portas como líder do CDS. Admirei os seus diários de campanha de 1995, como repudiei a forma como venceu o Congresso de 1998. Admirei a sua influência ideológica no monteirismo, como repudiei a forma como tantas vezes derivou à esquerda para fins eleitorais. Admirei-lhe sempre o estilo ("o meu estilo é trinário - digo sempre três ideias fortes. O [Fernando] Nogueira é binário", dizia em entrevista a'O Independente) e a inovação que trouxe ao discurso político, como repudiei brutalmente a demissão irrevogável de 2013.
Vi sempre nele o melhor líder partidário do Portugal da minha idade adulta. Mesmo enquanto fui militante do PSD nunca escondi isso de ninguém - e votei CDS sempre que entendi fazê-lo. Paulo Portas tinha os defeitos de todos os outros. E tinha qualidades que nenhum outro tinha. Depois do intervalo na liderança, o seu regresso vincou essas qualidades. É por isso que, como dizia ontem o Bernardo Ferrão no Expresso, o CDS já não é o partido de um homem só.
O seu ritmo trinário deu-nos três razões para a sua saída: o tempo do passado, o tempo do futuro e o tempo de um novo ciclo político. A única coisa que eu desejo agora é que este novo ciclo nos traga uma direita conservadora, mas descomplexada, liberal, mas com sentido de autoridade, humanista, mas não assistencialista. Que saiba ser uma direita com agenda social. Que pense à direita, mas que fale à esquerda. Sendo certo que os novos ciclos não começam por outro motivo que não seja a vontade dos sucessores, este é, apesar disso, um novo ciclo que começa. Outro se iniciará depois deste. Um ciclo em que sejam os pais a votar nos filhos.
O que me interessa por agora é realçar um facto apenas. Paulo Portas não foi perfeito - e ninguém, excepto um louco, lhe pedia que o tivesse sido. Mas foi um líder. E a capacidade dessa liderança vê-se, em grande medida, na hora da saída. Para o caso de não terem reparado nela durante os últimos anos.
Não fosse Paulo Portas (entre outros, como Miguel Esteves Cardoso, mas com ele à cabeça) e ainda hoje a direita portuguesa vivia entalada entre socialistas cristãos e saudosistas do Estado Novo. Nem que seja por isso, julgo que todos lhe devemos um agradecimento. Eu devo.